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Redacção

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O sistema de votação chamado “Eleições Turbo” criado pelo político moçambicano Venâncio Mondlane pode ser alargado para chefes de prédio e chefes de família. A fórmula de democracia espontânea que o Mondlane inventou e divulgou na semana passada foi inicialmente pensada para chefes de quarteirão, chefes de bairro, administradores de distrito e governadores de província. Contudo, investigadores sociais chegaram à conclusão de que este sistema pode também ser utilizado em escalões inferiores.

 

A partir de agora, esta fórmula pode ser aplicada a grupos menores e mesmo a pessoas individuais como as que padeçam de megalomania ou que sofram de transtornos bipolares. Nestes casos, o candidato coloca-se perante um espelho ou um ecrã de computador e elege a sua personalidade favorita. Caso não haja unanimidade, o candidato pode reclamar dos resultados e acusar de fraude a outra personalidade que habita a sua pessoa. Em casos extremos de transtorno de bipolaridade é possível a ocorrência de manifestaçõesviolentas com episódios de vandalização psicológica praticadas pelo candidato contra si próprio.

 

Na sua última comunicação nas redes sociais, o engenheiro Venâncio classificou esse procedimento eleitoral como verdadeiramente “africano” e uma invenção genuinamente “moçambicana” (ainda que baseada na Grécia antiga). Segundo fontes não identificadas, esta descoberta está a suscitar muito interesse entre os psicólogos e chefes de seitas político-religiosas.

 

Na realidade, esse sistema de votação pode ser organizado apenas numa semana, dispensa qualquer instituição e produz resultados imediatos. Os vencedores tomam posse na internet e prestam juramento virtual perante uma nova bandeira e uma nova constituição que serão anunciadas durante a cerimónia de tomada de posse. O evento da tomada de posse está recheado de outras instigantes surpresas porque, nesse mesmo dia, os novos dirigentes conhecerão os novos nomes das ruas, das praças onde se localizará os seus futuros gabinetes de trabalho.

 

Nessa última “live”, o engenheiro Venâncio Mondlane explicou como funcionam as chamadas Eleições Turbo: basta que os candidatos se apresentem presencialmente nos bairros e diante deles se formem as filas dos votantes. Não ficou claro como e quem conta os votos e que entidade valida os resultados, mas o método parece ser tão simples que se prevê que as Nações Unidas encorajem a comunidade internacional a adoptar esta proposta.

 

A grande vantagem desta invenção é que ela prescinde totalmente da necessidade de instituições e de observadores, declarou um activista de uma ONG chamada “Observatório para a transparência que recebe fundos não transparentes”.

 

 

 

 

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UMA MENSAGEM LANÇADA AO MAR

 

O navio afunda-se, os passageiros perguntam, em pânico: mas quem é o capitão? A quem nos devemos dirigir para não irmos todos ao fundo? Àquele personagem que, algures num canto qualquer do mundo, não se cansa de atiçar o fogo que já nos consome? Ou dirigimo-nos ao suposto comandante do navio que faz de conta que nada acontece?

 

A quem pedir socorro? A um candidato que existe por excesso? Ou ao comandante que está totalmente ocupado em fazer de conta que existe? Pedimos ajuda ao pregador de serviço que, de meia em meia hora, nos dá ordens e contraordens em direção ao caos? Ou pedimos a um governo que se encerrou na sua concha de silêncio e que nos abandonou à nossa triste sorte?

 

Merecíamos melhor, compatriotas. Num outro qualquer país, uma força da oposição é uma estrutura colectiva com a sua composição orgânica, com rostos distintos e vozes diversas, com o seu programa e as suas opções ideológicas. Num outro país, a oposição não se resume a um pregador solitário, que improvisa todos os dias instruções avulso, sem nenhum programa coerente e construtivo. Um dia garante que não luta pelo poder e que aceita qualquer cargo num eventual futuro governo. No dia seguinte, teima que só aceita ser Presidente. Num dia, diz que todos devem sacrificar as festas do Natal e do final do ano. Na semana seguinte, deseja festas felizes a todos. Num dia, anuncia que vai ser o caos total. No dia seguinte, pede para que haja ordem e civismo. O que não muda nunca é o apelo constante ao ódio, ao confronto e à destruição. As diretivas mudaram de nomes automobilísticos (4x4 e Turbo) para um apelo final a que ele dá o nome futebolístico de “ponta de lança”. Este clamor é um convite a um banho de sangue. De sangue dos outros, é claro.

 

Merecíamos melhor, meus amigos. Merecíamos uma melhor oposição. Mas merecíamos igualmente um governo melhor. Ou de forma mais simples: merecíamos um governo que simplesmente existisse. Num outro país, num momento de crise como esta, teríamos um presidente da República a falar aos seus cidadãos e a partilhar planos que nos entregassem uma saída, uma esperança. Teríamos um governo a interagir com as pessoas, a tranquilizá-las de modo que não se sentissem tão desamparadas. Teríamos um Chefe da polícia que procedesse como fizeram os seus congéneres em situações semelhantes noutros países do mundo: distribuiria informação adequada sobre os bandidos à solta, partilharia fotografias dos foragidos e manteria um canal de comunicação permanente para fazer com que os agentes da ordem e a população dessem as mãos na identificação e captura dos criminosos evadidos.

 

O que temos hoje? O pânico espalhou-se por toda a cidade, com fantasmas à solta armados de catana (felizmente, mais imaginária do que real). Não dormimos antes por causa das panelas, não dormimos por causa das vuvuzelas, agora não dormimos por causa do vandalismo. E não dormiremos durante um tempo com medo de um futuro que se avizinha e que será de desemprego e de fome. Pouco importa quem tem a culpa: cada dia de violência são anos de retrocesso. Não precisamos de mediadores internacionais. Precisamos que os donos deste caos sejam mediados pelo amor ao seu povo, pela generosidade desinteressada para com a sua pátria.

 

E é assim que nos encontramos: o candidato a capitão está fora, tão longe que mesmo ele só sabe que existe quando se escuta a si próprio e quando se vê no ecrã do facebook. É por isso que tem de estar sempre online. Por outro o lado, o governo está dentro, tão dentro de si mesmo que acaba por estar fora.

 

O que aconteceu, caros compatriotas, é que nós percebemos que temos de ser nós a apagar o fogo e a colocar o navio fora da zona de perigo. Sim, vamos ser nós a salvar este navio que nos pertence por direito histórico. Sim, meus irmãos, chegaremos, sãos e salvos, à outra margem. E diremos aos que nos abandonaram e aos que nos tentaram atirar para o abismo: estão ambos dispensados, fiquem para sempre longe de nós. Não precisamos de quem não deu provas de que está connosco nos momentos mais difíceis. Outros dirigentes, mais comprometidos com o seu povo, irão surgir. Esses dirigentes podem já estar presentes, mas precisam de se apresentar com a ética, a credibilidade e a generosidade que se espera de um servidor do povo.

 

Cidadania e governação são como os contratos matrimoniais: uma promessa de amor e de respeito mútuo na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza. Nenhum de vocês, governo e oposição, cumpriu essa promessa. A ambição do poder tornou-vos cegos e surdos. Ou mudam radicalmente de atitude ou ficam enterrados no porão do passado. Serão lembrados apenas como os que colocaram os seus interesses pessoais acima de tudo e de todos. Os que diziam servir a Pátria, mas apenas colocaram a Pátria ao serviço das suas ambições.

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A Associação Moçambicana de Empresas Petrolíferas (AMEPETROL) assegurou hoje, sábado, 28, que o país conta com um stock de combustíveis para 23 dias, vincando o compromisso com o fornecimento e distribuição, mesmo no actual contexto de violência e destruição, que têm acompanhado as manifestações contra os resultados das eleições gerais de 11 de Outubro.
 
“Neste momento, o país tem um stock para 23 dias, portanto, não há risco de falta de combustível, fora os navios programados e já a caminho do país”, refere um comunicado da AMEPETROL, a que ''Carta'' teve acesso.
 
Porém, aquela entidade admite que as empresas do sector estão a enfrentar dificuldades em operar os postos de abastecimento e realizar a distribuição de combustível, devido à insegurança pública, cenário que tem limitado as operações e provocado atrasos na reposição dos produtos petrolíferos.
 
Ainda assim, “queremos garantir à população que estamos a trabalhar activamente e em estreita colaboração com o Governo, as instituições públicas e os nossos fornecedores de serviços. Essa colaboração tem sido fundamental para superar as dificuldades e assegurar que os combustíveis cheguem de forma segura e eficiente a todos os que dependem deste recurso essencial”, pode ler-se na nota.
 
A AMEPETROL apela ao não recurso à violência e pede a colaboração de todos para que os postos de abastecimento, os camiões-cisterna e toda a cadeia logística dos produtos petrolíferos realizem a sua actividade, sem ameaças e riscos. (Carta)
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As agências de viagens sul-africanas enfrentam perdas no seguimento da agitação política em Moçambique que afasta turistas e interrompe rotas atractivas. A agente de viagens da Charmap Travel, Charity Ndlovu, disse que a sua empresa foi forçada a cancelar todas as viagens de Dezembro para Moçambique por causa da agitação.
 
“Temos estado a perder negócios desde que os protestos começaram em Moçambique por volta de Outubro. Tivemos de sair a correr de Moçambique depois que os protestos começaram em Outubro. Disseram-nos para sair antes da meia-noite e fomos forçados a passar pela Suazilândia”, disse.
Nozipho Ndzukula, da iNozi Africa Tours, uma agência de viagens que ajuda turistas a chegar a Moçambique, disse que os protestos recentes também afectaram os seus negócios, pois muitas pessoas cancelaram as suas viagens.
 
“Desde Outubro, as pessoas têm vindo a cancelar as suas viagens e, devido aos protestos recentes, temos visto mais cancelamentos. Cerca de 65% das nossas reservas giravam em torno de Moçambique. Muitos dos nossos clientes estão confusos e frustrados devido à política de não reembolso da agência, porque pagaram as suas férias anuais, mas tiveram de mudar os planos ou ficar em casa”, disse Ndzukula.
 
Clientes confusos e frustrados
 
“Cerca de 90% da taxa não é reembolsável. Ela só permite um reagendamento das viagens ou fazer uma viagem diferente. Como uma empresa pequena, foi muito afectada pelos protestos.”
 
A Agência de Turismo e Parques de Mpumalanga (MTPA) disse que os recentes distúrbios afectaram a sua rota de Mpumalanga para e-Swatini via Moçambique.
 
“Estamos muito preocupados com a agitação em Moçambique, pois ela tem um impacto negativo na nossa rota Triland”, disse o porta-voz da MTPA, Simphiwe Shungube.
 
“No entanto, ainda não recebemos relatos de viajantes cancelando as suas viagens para Moçambique devido à agitação. Continuaremos monitorando a situação.”
 
O ministério das relações internacionais e cooperação da África do Sul emitiu recentemente uma declaração dizendo que estava pronto para mediar a crise em Moçambique com o objectivo de trazer a paz e estabilidade ao país vizinho.
 
A mais recente agitação começou logo após a decisão do Conselho Constitucional na segunda-feira (23), em que dezenas de pessoas foram mortas durante confrontos com a Unidade de Intervenção Rápida (UIR). (The Citizen)
 
O presidente da Comissão da União Africana (UA), Moussa Faki Mahamat, expressou na quinta-feira (26) preocupação com a violência pós-eleitoral em Moçambique.
 
Numa declaração, o chefe da UA apelou para uma resolução pacífica da crescente violência pós-eleitoral em Moçambique, particularmente após o recente pronunciamento dos resultados finais das eleições pelo Conselho Constitucional, que resultou na perda de dezenas de vidas.
 
Expressando condolências aos enlutados, ele apelou à calma e instou os serviços de segurança a exercerem moderação em meio à violência e a manterem a lei e a ordem.
 
O presidente da organização continental de 55 membros também apelou ao governo de Moçambique e a todos os actores políticos e sociais nacionais para que procurem uma solução pacífica para a crise actual, a fim de evitar mais perdas de vidas e destruição de bens.
 
Ele reafirmou o compromisso da UA em colaborar com as partes interessadas moçambicanas e a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral para acabar com a violência e salvaguardar a democracia constitucional no país.
 
Na segunda-feira (23), o Conselho Constitucional, órgão responsável pelos assuntos constitucionais e eleitorais, proclamou Daniel Chapo vencedor das eleições gerais de 9 de Outubro. (UA News)
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O Conselho de Administração da Electricidade de Moçambique, E.P. (EDM) anunciou na tarde de hoje um conjunto de medidas promocionais, por meio de um comunicado oficial, destinadas a mitigar os impactos das manifestações em curso e a garantir o bem-estar das famílias durante a quadra festiva. Essas iniciativas, que fazem parte das orientações do Governo, entrarão em vigor imediatamente e incluem:
 
A isenção do IVA para clientes da Tarifa Social: esta medida será válida até 31 de Janeiro de 2025, beneficiando famílias de baixa renda.
 
A isenção de juros de mora: onde os clientes com facturas em atraso poderão regularizar a sua situação sem o pagamento de juros de mora até 28 de Fevereiro de 2025.
 
A isenção da Taxa de Religação: esta medida permite que os clientes que tiveram o fornecimento de energia interrompido, por razões comerciais, técnicas ou a pedido, possam solicitar a religação sem custos adicionais até 28 de Fevereiro de 2025.
 
A regularização de consumos irregulares: onde todas as instalações que consumirem energia de forma irregular nas tarifas MT, MTA e GCBT serão georreferenciadas, com consumos retroactivos facturados. Os clientes serão religados com um contador Split Meter, eliminando o pagamento de 25% dos consumos não facturados. Além disso, a Taxa de Desconto sobre a energia retroactiva durante as compras será reduzida de 75% para 50%.
 
A revogação de normas internas conflitantes: foram revogados todos os instrumentos normativos internos que contrariavam estas medidas. Estas acções reafirmam o compromisso da EDM com a acessibilidade energética e o bem-estar social, especialmente durante um período marcado por desafios económicos e sociais em todo o país. (Carta)
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Cerca de duas mil e quinhentas famílias moçambicanas do distrito de Morrumbala, na Zambézia, entraram nos últimos dias no distrito de Nsanje, no Malawi, fugindo da tensão pós-eleitoral em Moçambique, caracterizada por manifestações à escala nacional, convocadas pelo candidato derrotado Venâncio Mondlane, que rejeita o Acordão do Conselho Constitucional. A crise já levou ao assassinato de mais de duzentas pessoas, incluindo crianças, baleadas pela Unidade de intervenção Rápida, e a destruição de várias infra-estruturas públicas e privadas, para além de bloqueio de estradas.
 
O Comissário do Departamento  para os Refugiados, General Ignacio Maulana, disse que o fluxo de refugiados de Moçambique para Malawi não pegou a sua instituição de surpresa, uma vez que já era esperado. "Todas as agências, incluindo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), o Programa Mundial da Alimentação (PMA) e o Departamento de Assuntos de Gestão de Desastres (DODMA), entre outros, estão em alerta [e sabem] o que está a acontecer em Moçambique", disse a fonte.
 
Por seu turno, o Comissário Distrital (DC) de Nsanje, Dominic Mwandira, disse que se espera que mais moçambicanos entrem no Malawi. O distrito de Nsanje, no extremo sul do Malawi, faz fronteira com os distritos moçambicanos de Morrumbala, na Zambézia e Doa e Mutarara em Tete.
 
Os refugiados moçambicanos estão actualmente abrigados nas comunidades de Mlolo, Tengani e Mbenje no distrito de Nsanje. "O que é desafiador é [a disponibilidade de] alimentos e outros itens essenciais para sustentar os moçambicanos. Há uma necessidade urgente de distribuição de alimentos nessas áreas", disse Mwandira.
 
Ele informou que o Departamento de Serviços de Imigração e Cidadania está a registar todas as famílias moçambicanas que entraram no país.
 
Por outro lado, equipas do Departamento de Gestão de Desastres estão a registar todas as famílias que chegam em Nsanje para garantir que recebam assistência humanitária. O Comissário Distrital confirmou que todas as famílias que entraram em Nsanje são provenientes do distrito de Morrumbala, província da Zambezia, depois de atravessar o Rio Chire.
 
No início deste mês, Morrumbala foi palco de manifestações que culminaram com o espancamento do comandante distrital da polícia e a destruição de várias infra-estruturas, como o comando distrital da polícia, o tribunal distrital, a comissão distrital de eleições, o secretariado técnico de administração eleitoral, e a penitenciaria distrital, incitando a fuga de reclusos.
 
A imprensa malawiana apurou que as autoridades montaram um acampamento na Escola Primária de Chikonje em Mlolo e outros centros em Tengani e em Chazuka.
 
Por sua vez, o Comissário para Assuntos de Gestão de Desastres, Charles Kalemba, disse que os preparativos estavam em curso para fornecer alimentos e suprimentos essenciais às famílias deslocadas.
 
'Esforços estão em curso para avaliar as necessidades das famílias afectadas e fornecer a elas suporte adequado", disse Kalemba. A tensão em Moçambique também afectou a rota de importação de combustível para Malawi. No passado dia 10 de Dezembro, a Companhia Nacional de Petróleo do Malawi (NOCMA) disse que o problema de escassez de combustível no país foi agravado pelas manifestações em curso em Moçambique.
 
De acordo com o porta-voz da NOCMA, Raymond Kambale, a crise em Mocambique afectou o fornecimento de produtos petrolíferos ao Malawi. "Actualmente, estamos a contar apenas com uma rota, a rota da Tanzânia. Estamos, no entanto, gerindo a situação", disse Likambale.
 
De forma recorrente, Malawi tem sido ao longo dos anos, abrigo seguro dos moçambicanos que procuram refúgio naquele país, em caso de conflitos ou desastres naturais em Moçambique.
 
Durante a guerra dos dezasseis anos em Moçambique, cerca de um milhão de moçambicanos, maioritariamente das províncias de Tete, Zambezia e Niassa refugiou-se no Malawi, e com o fim do conflito foram repatriados pela Organização Internacional para as Migrações (OIM).
 
Actualmente, mais de cinquenta mil moçambicanos vivem e trabalham no Malawi, quase todos em condições precárias. De acordo com o Banco Mundial e outras organizações internacionais, Malawi é dos países mais pobres do mundo e encravado dentro do território moçambicano. Por essa razão, é sujeito a suportar o fardo de uma eventual crise política ou humanitária em Moçambique, situação agravada pelo facto de não ter acesso directo ao mar. (Daily Times/Carta)
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Um Relatório Gerencial do Gabinete de Gestão de Activos, consultado pela “Carta”, revela que grande parte dos bens apreendidos e geridos pelas autoridades moçambicanas são provenientes do tráfico de drogas, um dos delitos mais comuns no país. Atrás do tráfico de drogas está a corrupção e os seus crimes conexos; os raptos; o branqueamento de capitais; e a pirataria.
 
A publicação, que detalha os bens (móveis e imóveis) na posse do Gabinete de Gestão de Activos, o seu valor de mercado e os crimes pelos quais foram apreendidos, ilustra que grande parte dos bens apreendidos das mãos dos criminosos são viaturas, algumas de luxo.
 
Mercedes-Benz, Volvo, Porshe e Range Rover são algumas das marcas de viaturas luxuosas que chegam às mãos das autoridades moçambicanas, numa lista que inclui também condomínios, estâncias hoteleiras, vivendas e postos de abastecimento de combustível. Aliás, as viaturas são os bens mais apreendidos pelas autoridades moçambicanas entre os produtos do crime.
 
Refira-se que Moçambique é considerado um dos principais corredores mundiais do tráfico de estupefacientes, tendo as zonas litorais das províncias de Inhambane e Nampula como os principais pontos de entrada de estupefacientes no país.
 
Dados do Gabinete Central de Prevenção e Combate à Droga indicam que, em 2023, foram apreendidos 78,57 Kg de cocaína; 600,09 Kg de heroína; 154,690 kg de metanfetamina; e 1.542,148 kg de cannabis sativa, vulgo soruma. Igualmente, foram registados, em 2023, 423 processos criminais e detidos 923 indivíduos.
 
Lembre-se que, no dia 03 de Outubro, o Gabinete de Gestão de Activos leiloou parte dos bens em sua posse, tendo conseguido arrecadar, em receitas, pouco mais de 9.2 milhões de Meticais, em resultado do arrematamento de 70 bens, entre viaturas luxuosas, tractores, contentores e mobiliários. (Carta)
sexta-feira, 27 dezembro 2024 10:55

Espectro da fome paira no Hospital Central de Maputo

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O Hospital Central de Maputo, a maior unidade sanitária de Moçambique, adverte que corre risco de não ter alimentação para oferecer aos pacientes ali internados, que poderá ser exacerbado pelo défice de cerca de 200 profissionais da saúde devido ao impedimento da circulação das ambulâncias perpetrado por alegados manifestantes.
 
A preocupação foi expressa pela directora clínica substituta do Hospital Central de Maputo, Eugénia Mozanha, em conferência de imprensa havida na manhã do feriado do Dia da Família, 25, em Maputo. O HCM tem 1500 camas e neste momento estão internadas cerca de 900 pacientes em diversas enfermarias.
 
“Não há pacientes que ficam sem comida, mas precisávamos de ter refeições para todos esses que estão internados, não há pacientes, estamos com problemas sérios de alimentação porque os nossos fornecedores não conseguem chegar à unidade sanitária”, disse Mozanha.
 
Explicou que existem profissionais da saúde que conseguem chegar a tempo e hora e estão a trabalhar entre 48 a 72 horas, dando o máximo para prestar cuidados aos pacientes. O HCM tem estado a fazer um esforço de ir até às residências dos funcionários através de ambulâncias, algumas conseguem passar.
 
A nova onda de manifestações violentas teve o início após a validação e proclamação dos resultados das eleições de 9 de Outubro último pelo Conselho Constitucional (CC) na passada segunda feira (23), tendo sido declarado vencedor Daniel Chapo, candidato presidencial da Frelimo, partido no poder.
 
““Estamos a atravessar um momento crítico no Hospital Central de Maputo com um número de doentes por trauma maior em relação a outros anos, nesta época, um número de profissionais da saúde reduzido”, referiu.
 
“Por isso, voltamos a apelar que haja permissão para que os trabalhadores da saúde e as ambulâncias passem e assim possamos prestar os cuidados de saúde aos doentes que chegam ao HCM”, disse Mozanha.
 
Sobre o rescaldo das 24 horas da véspera de Natal, sublinhou que o Serviço de Urgências de adultos recebeu 161 pacientes dos quais 117 por trauma.
 
No ano transacto foram atendidos 141 pacientes, dos quais 67 por trauma. “Destes (67) pacientes, 19 por queda, 14 acidentes de viação, 8 por agressão física, 4 feridos por arma branca e 62 feridos por arma de fogo”, disse.
 
Nos serviços de urgência de pediatria, nas 24 horas anteriores ao Dia da Família foram atendidos 24 pacientes contra 13 de igual período do ano transacto, devido à dificuldade de os pacientes chegarem à unidade sanitária tendo em conta os protestos violentos que se registam nos últimos dias.
 
Já, os serviços de genecologia obstétrica receberam, de 24 para 25 de Dezembro, 31 pacientes contra 20 registados em igual período do ano transacto, dos quais 23 tiveram parto.
 
“Um grande problema nesta altura do ano é o sangue, pois temos tido dificuldades. Temos muitos doentes por trauma, esta unidade sanitária consome em média 100 unidades por dia, e estas unidades são acrescidas neste período do ano, principalmente na presença das situações que estamos a viver actualmente ” referiu.
 
Mozanha, informou que o stock actual de sangue é de 111 unidades de sangue. (AIM)

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Começo pelo fim: o engenheiro Venâncio (que agora nos deseja boas festas) já nos tinha ameaçado que não haveria festas de Natal nem celebrações de fim-do-ano. Decretou que as festas religiosas deviam ser celebradas não nas nossas casas, mas em manifestações nas ruas. Sou católica, venho de uma família católica. Nunca pensei que alguém pudesse ter a veleidade de interferir em algo tão sagrado como as celebrações natalícias. O ditador Maduro, da Venezuela, já tinha mandado alterar as datas do Natal. Todos se riram dessa presunção. Só podia ser uma anedota, só podia sair da boca de um palhaço. Infelizmente, no nosso caso, os mandamentos do Venâncio Mondlane não podem ser motivo de riso. Nunca em Maputo se destruiu tanto num só dia: hospitais, postos de energia, armazéns de medicamentos, lojas, condutas de água, bens públicos, repartições e serviços. Tudo que era nosso, agora ficou de ninguém. Tudo que era construção, ficou ruína.

 

O banco de sangue do Hospital Central que eu, por razões imperiosas de saúde, preciso de frequentar, deixou de funcionar. Os funcionários e os dadores de sangue ficaram bloqueados na estrada. Agora, já não há reservas de sangue. A minha vida ficou nas mãos dos caprichos de um todo-poderoso. Que fique claro: o senhor pode não ser o único responsável. Mas é o senhor o maior culpado da massiva destruição. O senhor é, como dizia o presidente Bush, uma arma de destruição massiva.

 

A pergunta é a seguinte: quantos anos de construção do nosso património comum foram destruídos num único dia? Conheço e reconheço os argumentos dos que acusam a FRELIMO como uma causa de toda esta tensão. Eu também partilho dessa acusação. A corrupção de uma elite predadora está na raiz da nossa pobreza. Mas os pobres, senhor engenheiro, os pobres não são estúpidos, os pobres não são desprovidos de moral, os pobres sabem que a saída desta situação não pode ser por via desta violência. Por isso, deixemos de palavreado. Os donos das pequenas lojas que foram vandalizadas no meu bairro não vão vender argumentos políticos aos seus clientes. Não vão dar de comer aos filhos as culpas de uns ou de outros. Todos os que foram vítimas desta violência cega (e fomos todos nós, do Rovuma ao Maputo) não poderão ser consolados com a sua retórica política. Os únicos que talvez estejam contentes com esta destruição do nosso tecido social serão os extremistas que, em Cabo Delgado, cortam a cabeça dos nossos irmãos. Não se esqueça, caro engenheiro Venâncio: o caos serve o terrorismo. São irmãos gémeos, filhos de um mesmo pai e da mesma mãe.

 

Deixemos, pois, de invocar razões políticas para aquilo que apenas tem a ver com o bom senso, com o amor à nossa pátria. Só existe um sentimento que, agora, nos pode unir: reconhecer que esta destruição cega não pode ser o caminho. O inimigo político tem um nome? Pois atinjam esse inimigo. E deixem-nos em paz. Estes tumultos que o senhor insiste em chamar de “manifestações” só agravam a miséria em que vive a grande maioria. Essa pobreza foi, em grande parte, provocada pela má gestão e pelo desgoverno dos últimos anos. Mas um dirigente da oposição não pode convidar ao suicídio coletivo do seu próprio país. Nenhum médico pode mandar incendiar o hospital onde ele promete tratar os seus pacientes.

 

Ainda estávamos a pagar uma dívida oculta que serviu criminosamente uma pequena elite. Agora vamos pagar durante muitos anos uma nova dívida que foi provocada pelo vandalismo comandando pelo engenheiro VM7. A nuvem de fumo que cobriu a cidade das acácias vai continuar a pairar durante anos e anos. Dentro dessa nuvem vão crescer os nossos filhos. Não há bombeiro que apague esse fumo.

 

Nunca tive paciência para assistir a uma “live” do pastor. Pela primeira vez, dei-me ao esforço de seguir o anúncio da Turbo8. Era véspera do Natal. E fiquei assustada mesmo antes de VM7 começar a pregação. Enquanto ele dava tempo para juntar uma audiência mais volumosa, fui lendo os comentários dos seus seguidores. Aquilo não era uma plataforma virtual: era um templo e os crentes saudavam não um líder político, mas uma entidade divina.

 

Como já disse, sou religiosa e já assisti a diversos cultos transmitidos por via televisa. Mas eram assumidamente cerimónias religiosas. Não misturavam propaganda eleitoral com os assuntos de Deus. O que mais me assustou nessa “Live”, porém, foi o tom de ódio com que o pastor invocava constantemente um Deus vingativo, um Deus munido de machados, fogachos e punhais. Um Deus sedento de sangue, de cinzas e de ruínas. Não era esse Deus que eu conhecia. O meu Deus é o do amor, do abraço e da reconciliação. Mas foi esse outro Deus das pragas e dos apocalipses que o pastor Mondlane convocou.

 

O país, decretou Venâncio, estava entre a “paz e o caos”. Moçambique estava entre a “vida e a morte”. Disse isto antes de ontem. Pois todos nós despertamos hoje no meio do caos, no meio da morte. E fomos todos castigados como se fossemos todos nós os culpados. A nação moçambicana, toda inteira, foi condenada. O mundo vai olhar para nós como um território de desordeiros, onde não vale a pena investir, para onde não vale a pena sequer viajar de férias porque sabe-se lá se, chegando ao aeroporto da capital, apenas se pode circular de ambulância ou de carro funerário de acordo com as ordens “superiores”.

 

Por isso, senhor Venâncio, faça as suas reivindicações, faça a sua luta de modo a não matar Moçambique. Outros países brigaram, ainda recentemente, pela verdade eleitoral. Na Venezuela, juntaram-se milhares de pessoas nas ruas. Mas os protestantes nunca paralisaram as cidades. Nunca incendiaram, saquearam ou bloquearam as estradas que, como alguém já aqui escreveu, pertencem a todos e não aos caprichos de um candidato. Na Geórgia, milhares de pessoas juntaram-se nas ruas para protestar contra os resultados das eleições. Mas nunca ninguém os encorajou a criar o “caos em todo o país”. Agora, senhor engenheiro, é tarde demais par desdizer o que está gravado. O senhor disse que, caso não validassem a sua vitória, seria desencadeado o “caos”. E cumpriu-se a sua vontade: vandalizaram-se lojas, armazéns, escolas, repartições, tudo foi alvo de destruição. Um ciclone chamado Chido matou gente em Moçambique. Pois um ciclone chamado “caos” devastou toda a nossa economia. Saquearam pequenos negócios mas atacaram também grandes projectos que dão emprego a milhares de pessoas e que trazem divisas para a nossa economia. Vandalizaram prisões e libertaram perigosos criminosos. Tudo isto lembro para lhe dizer, senhor Venâncio, as nações são entidades com raízes na história. Mas há países que se partiram ao meio, que deixaram de ser países, que passaram a ser ingovernáveis por causa da absoluta ganância pelo poder. Este nosso país é grande, mas é frágil como todas as criaturas vivas.

 

Comecei este texto pelo fim. E, agora, acabo por onde devia começar. Caro Venâncio Mondlane: não volte nunca mais a cantar o hino nacional. Porque esse hino, esse hino chama-se a “Pátria Amada”. E o senhor não ama a sua pátria. Você ama-se a si mesmo. Não, senhor Venâncio, não nos volte a mandar cantar o hino. Porque, da próxima vez, cantaremos quando nós quisermos. E cantaremos contra si que usa as costas dos mais pobres para fazer sozinho a sua carreira. Não se esqueça, senhor Venâncio: o hino nacional fala contra os tiranos. Que não são apenas os corruptos da FRELIMO. Você também é um deles. Um tirano que, mesmo sem chegar ao poder, já nos está a escravizar com mais cem anos de fome e de pobreza. 

 

Margarida Ntsai

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