UMA MENSAGEM LANÇADA AO MAR
O navio afunda-se, os passageiros perguntam, em pânico: mas quem é o capitão? A quem nos devemos dirigir para não irmos todos ao fundo? Àquele personagem que, algures num canto qualquer do mundo, não se cansa de atiçar o fogo que já nos consome? Ou dirigimo-nos ao suposto comandante do navio que faz de conta que nada acontece?
A quem pedir socorro? A um candidato que existe por excesso? Ou ao comandante que está totalmente ocupado em fazer de conta que existe? Pedimos ajuda ao pregador de serviço que, de meia em meia hora, nos dá ordens e contraordens em direção ao caos? Ou pedimos a um governo que se encerrou na sua concha de silêncio e que nos abandonou à nossa triste sorte?
Merecíamos melhor, compatriotas. Num outro qualquer país, uma força da oposição é uma estrutura colectiva com a sua composição orgânica, com rostos distintos e vozes diversas, com o seu programa e as suas opções ideológicas. Num outro país, a oposição não se resume a um pregador solitário, que improvisa todos os dias instruções avulso, sem nenhum programa coerente e construtivo. Um dia garante que não luta pelo poder e que aceita qualquer cargo num eventual futuro governo. No dia seguinte, teima que só aceita ser Presidente. Num dia, diz que todos devem sacrificar as festas do Natal e do final do ano. Na semana seguinte, deseja festas felizes a todos. Num dia, anuncia que vai ser o caos total. No dia seguinte, pede para que haja ordem e civismo. O que não muda nunca é o apelo constante ao ódio, ao confronto e à destruição. As diretivas mudaram de nomes automobilísticos (4x4 e Turbo) para um apelo final a que ele dá o nome futebolístico de “ponta de lança”. Este clamor é um convite a um banho de sangue. De sangue dos outros, é claro.
Merecíamos melhor, meus amigos. Merecíamos uma melhor oposição. Mas merecíamos igualmente um governo melhor. Ou de forma mais simples: merecíamos um governo que simplesmente existisse. Num outro país, num momento de crise como esta, teríamos um presidente da República a falar aos seus cidadãos e a partilhar planos que nos entregassem uma saída, uma esperança. Teríamos um governo a interagir com as pessoas, a tranquilizá-las de modo que não se sentissem tão desamparadas. Teríamos um Chefe da polícia que procedesse como fizeram os seus congéneres em situações semelhantes noutros países do mundo: distribuiria informação adequada sobre os bandidos à solta, partilharia fotografias dos foragidos e manteria um canal de comunicação permanente para fazer com que os agentes da ordem e a população dessem as mãos na identificação e captura dos criminosos evadidos.
O que temos hoje? O pânico espalhou-se por toda a cidade, com fantasmas à solta armados de catana (felizmente, mais imaginária do que real). Não dormimos antes por causa das panelas, não dormimos por causa das vuvuzelas, agora não dormimos por causa do vandalismo. E não dormiremos durante um tempo com medo de um futuro que se avizinha e que será de desemprego e de fome. Pouco importa quem tem a culpa: cada dia de violência são anos de retrocesso. Não precisamos de mediadores internacionais. Precisamos que os donos deste caos sejam mediados pelo amor ao seu povo, pela generosidade desinteressada para com a sua pátria.
E é assim que nos encontramos: o candidato a capitão está fora, tão longe que mesmo ele só sabe que existe quando se escuta a si próprio e quando se vê no ecrã do facebook. É por isso que tem de estar sempre online. Por outro o lado, o governo está dentro, tão dentro de si mesmo que acaba por estar fora.
O que aconteceu, caros compatriotas, é que nós percebemos que temos de ser nós a apagar o fogo e a colocar o navio fora da zona de perigo. Sim, vamos ser nós a salvar este navio que nos pertence por direito histórico. Sim, meus irmãos, chegaremos, sãos e salvos, à outra margem. E diremos aos que nos abandonaram e aos que nos tentaram atirar para o abismo: estão ambos dispensados, fiquem para sempre longe de nós. Não precisamos de quem não deu provas de que está connosco nos momentos mais difíceis. Outros dirigentes, mais comprometidos com o seu povo, irão surgir. Esses dirigentes podem já estar presentes, mas precisam de se apresentar com a ética, a credibilidade e a generosidade que se espera de um servidor do povo.
Cidadania e governação são como os contratos matrimoniais: uma promessa de amor e de respeito mútuo na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza. Nenhum de vocês, governo e oposição, cumpriu essa promessa. A ambição do poder tornou-vos cegos e surdos. Ou mudam radicalmente de atitude ou ficam enterrados no porão do passado. Serão lembrados apenas como os que colocaram os seus interesses pessoais acima de tudo e de todos. Os que diziam servir a Pátria, mas apenas colocaram a Pátria ao serviço das suas ambições.