Director: Marcelo Mosse

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Textos de Marcelo Mosse

Pode ser que os procedimentos de justiça na vara comercial do Tribunal Superior de Londres estejam a ser transparentes para as partes envolvidas – juiz Robin Knowles conferencia com todos sobre o avanço do processo e é assertivo nas suas decisões quando as comunica aos directamente interessados –  mas o Tribunal Superior de Londres, dizia, não está a ser transparente para a sociedade moçambicana, a principal vítima do calote de 2 mil milhões de USD – com custos estimados para Moçambique na ordem dos 11 mil milhões de USD (ver Custos e Consequências das Dívidas Ocultas para Moçambique Edson Cortês, Aslak Orre, et. al – 2021- Bergen & Maputo: Chr. Michelsen Institute/CIP).


Os efeitos colaterais do calote podem ter custado a Moçambique USD 11 biliões – quase todo o PIB do país em 2016 – e quase 2 milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza, diz o estudo.


O que está em causa em Londres são os interesses (e o futuro) de milhões e milhões de moçambicanos, e não apenas os interesses e o futuro de uma meia dúzia das elites políticas locais envolvidas na trama. E, em certa medida, os interesses da sociedade moçambicana não estão representados em Londres. 


O juiz Knowles devia saber que nem sempre os interesses imediatos dos representantes do nosso Estado correspondem aos interesses estruturantes da sociedade moçambicana. Há um desfasamento entre Sociedade e Estado. O Estado representa, muitas das vezes, uma pequena minoria elitista virada para a acumulação e enriquecimento à custa da sociedade. Foi o que aconteceu com o calote.

 

De como que a sociedade moçambicana não está necessariamente representada em Londres. 


A nossa PGR ainda precisa de mostrar que pratica a transparência, pois a mesma PGR que convocou uma conferência de imprensa há dias, onde disse quanto já gastou com escritórios de advogados em Londres, nunca convocou uma conferência de imprensa para dizer quanto gastou com o escritório Mabunda Inc. em Joanesburgo, para tentar trazer Manuel Chang para Moçambique. Quanto foi? 


A PGR foi assertiva quando anunciou o acordo entre o Estado e o Credit Suisse (UBS), mas agora parece que voltou a cobrir-se do mesmo véu de secretismo que sempre vestiu. 


Ontem, de Londres chegou um despacho da Reuters dizendo que Moçambique desistiu de uma parte significativa da sua reclamação contra o construtor naval franco-libanês, Privinvest, citando o advogado Jonathan Adkin (Serie Court), que representa a PGR no caso contra a turma do Iskandar Safa. Jonathan Adkin disse que Moçambique desistia da reivindicação de mais de 800 milhões de USD da Privinvest por “perdas macroeconómicas”. 

 

Mas Moçambique abdicou porquê mesmo? Qual foi o racional? Quais os ganhos? No caso do Credit Suisse, o ganho foi um extensivo cancelamento da dívida, de cerca de 600 milhões de USD. E no caso vertente? Qual foi o quid pro quo? Isto não foi ainda explicado detalhadamente nem por Adkin e muito menos pela nossa PGR.

 

A Reuters citava, também ontem, o advogado da Privinvest, Duncan Matthews, dizendo que Moçambique abandonou o caso contra a Privinvest porque era "inútil" e teria levado a um interrogatório "profundamente embaraçoso" das testemunhas arroladas pela PGR.

 

Quem são as testemunhas de Moçambique no caso contra a Privinvest?

 

Das incidências de ontem, o mais espantoso foi o que veio vertido num despacho da Lusa, que rezava assim: o grupo naval Privinvest prescinde de chamar o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, como testemunha no julgamento sobre o caso das dívidas ocultas de Moçambique no Tribunal Comercial de Londres. “Concluímos que não vamos envolver o Presidente Nyusi”, afirmou Duncan Matthews, advogado da Privinvest, falando ao Tribunal.

 

O que se está a passar em Londres? Moçambique prescinde da Privinvest e esta prescinde da sua obsessão de arrastar o Presidente Nyusi? Como assim? Há um acordo secreto em curso entre a PGR e a Privinvest? Se há, onde é que ficam os interesses da sociedade nesse eventual acordo? Este acordo é uma consequência directa do acordo com o Credit Suisse? Terá o Credit Suisse exigido que assim fosse?

 

A Privinvest confessou ter subornado (se bem que eles falem em taxa de sucesso) funcionários do Estado moçambicano e do Credit Suisse (estes confessaram em sede de justiça americana que receberam subornos). Ou seja, a Privinvest esteve no centro do calote. Ora, ao abdicar do processo contra a Privinvest, não estaria a PGR também retirando toda a substância ao caso local das “Dívidas Ocultas”?

 

Se o principal caloteiro, corruptor activo, é perdoado por Moçambique, por que razão quem recebeu suborno, esteve na planilha do Boustani, comprou carros e casas, vai ser mantido em prisão? Falo dos Ndambis, dos Nhangumeles desta vida e companhia.

 

Ou, depois das eleições autárquicas, vai todo o mundo ser liberto por seus prazos de prisão preventiva estarem precludidos há demasiado tempo? E de repente fica todo o mundo impune, mas nada muda na vida dos milhões de moçambicanos que foram as principais vítimas deste calote. Abdicamos de cobrar a Privinvest, mas continuaremos a pagar milhões e milhões de uma dívida odiosa. Será este o nosso fim? Afinal, o que está a acontecer em Londres?

Várias notícias avançaram na semana passada que está a ser negociado um acordo extrajudicial para Moçambique deixar cair o caso contra o Credit Suisse que poderá envolver uma compensação de cerca de 100 milhões de dólares.

 

Um comunicado conjunto emitido hoje pelo Ministério da Economia e Finanças (MEF) e a Procuradoria Geral da República (PGR) anunciou uma conferência de imprensa para amanhã, para se falar "sobre o processo do Estado moçambicano em Londres, envolvendo o Credit Suisse (CS)”.

 

De acordo com a imprensa estrangeira, as negociações em curso envolvem a PGR e o banco suíço UBS. Recorde-se, este banco adquiriu o CS em Março deste ano e, em Agosto, decidiu integrá-lo totalmente, e o CS vai desaparecer como marca de banco de retalho até 2025.

 

O CS, que se debatia com graves problemas financeiros, foi vendido por 2,8 mil milhões de USD ao UBS em Março, quando na bolsa de valores suíça valia mais de sete mil milhões de USD. O UBS herdou os processos judiciais do Credit Suisse, incluindo a exigência de Moçambique de que as garantias dos empréstimos fossem declaradas nulas e sem efeito, e que o Credit Suisse pagasse uma compensação.

 

Até muito bem recentemente, nomeadamente em Junho, o CS ainda tentou convencer a secção comercial do processo do Tribunal Supremo de Londres para que o caso fosse arquivado, alegando que a falha do governo moçambicano em divulgar documentos significava que não podia haver um julgamento justo. 

 

Como o Tribunal recusou essa alegação e marcou o julgamento para iniciar na terça-feira, 3 de Outubro, o UBS parece ter mudado de abordagem e quer evitar um despique nas barras com o potencial de perder, mas também com o risco de danos reputacionais de grande monta.

 

A cifra de 100 milhões de USD foi avançada por fontes do UBS à imprensa internacional como um dado adquirido. Os advogados do UBS estão empenhados em evitar que a disputa vá a julgamento e pressionam por um acordo, escreveu o londrino Financial Times, na sua edição de 27 de Setembro. Amanhã, ficaremos a saber se o Estado moçambicano aceita esse valor e decide abandonar a acção em Londres. Para já, consta que os advogados da PGR estão de mangas arregaçadas para o julgamento.

 

Mas 100 milhões de USD para o caso vertente parecem amendoins. Aceitar isso seria mais um calote. Eis as razões:

 

Para “Carta”, 100 milhões de USD é um valor insignificante relativamente aos danos de reputação que o banco poderá sofrer durante 13 semanas longas de julgamento, em que vão ser expostas as fragilidades gravosas da "compliance" do Credit Suisse. 

 

A confissão dos três banqueiros do CS (Andrew Pearse, Detelina Subeva e Surja Singh envolvidos no calote) em sede da justiça americana mostra que a possibilidade de sucesso da PGR é grande, também porque Jean Boustani confessou nos EUA ter pago subornos a funcionários moçambicanos. Neste sentido, a anulação das garantias soberanas pode ser conseguida por parte de Moçambique. Aliás, a oferta do UBS é também um reconhecimento de culpa.

 

Ora, o calote adiou a vida de milhões de moçambicanos, afugentou os doadores do apoio orçamental e a nossa economia nunca recuperou desde então. Por isso, 100 milhões de USD parecem-me insultuosos. 

 

A PGR nunca revelou o valor da sua acção em Londres. O que sabemos é o que a imprensa internacional tem revelado, ela que tem acesso aos advogados londrinos da PGR. No passado dia 28 de Setembro, o The Wall Street Journal, de Nova Iorque, escreveu o seguinte: “UBS Poised to Settle Mozambique’s ‘Tuna Bonds’ Lawsuit Against Credit Suisse/The southern African nation had sought as much as $2.5 billion By Margot Patrick Updated Sept. 28, 2023 2:50 pm ET)”.

 

Ou seja, para além da anulação das garantias soberanas ilegais, Moçambique exige uma compensação de 2.5 mil milhões de USD.

 

Por sua vez, a 27 de Setembro, o jornal Financial Times, de Londres, escrevia que “além dos danos pelos alegados subornos, a reclamação de Moçambique incluía mais de 1000 milhões de USD pela retirada do apoio financeiro internacional (apoio internacional dos doadores), mais de 260 milhões de USD por custos de dívida mais elevados e cerca de 100 milhões de USD em taxas sobre os empréstimos”, citando um documento do Supremo Tribunal do Reino Unido.

 

Qualquer um destes valores coloca como irrelevante a oferta do UBS, uma oferta de certa forma arrogante e desprezível se tivermos em conta os biliões de USD de lucros que o banco tem vindo a fazer, incluindo agora depois da fusão com o Credit Suisse.

 

Em finais de Agosto deste ano, o UBS anunciou um lucro líquido recorde de 29,9 mil milhões de USD, sete vezes superior ao registado no mesmo período do ano passado. O UBS disse na altura que previa poupar 10 mil milhões de dólares até ao fim de 2026, graças à fusão com o Credit Suisse.  

 

O USB nada em dinheiro e até renunciou à garantia de 9 mil milhões de USD dada pelo Governo suíço para adquirir o Credit Suisse, como afirmou várias vezes a ministra das Finanças da Suíça, Karin Keller-Sutter.

 

A oferta de 100 milhões de USD é ainda mais desprezível considerando que o credor suíço se tem concentrado em resolver disputas legais desde que concordou em assumir o controlo de seu antigo rival em Março e noutros casos está a considerar pagar compensações bilionárias.

 

Na quarta-feira, de acordo com o FT, o Tribunal Superior de França disse que daria o seu veredicto final em Novembro num caso de evasão fiscal de longa data do UBS, no qual o banco contestou uma multa de 1,8 mil milhões de euros.

 

No mês passado, o UBS concordou em pagar 1,4 bilião de USD para resolver uma investigação regulatória dos EUA sobre a suposta venda indevida de títulos hipotecários residenciais no período que antecedeu à crise financeira de 2008, encerrando o último caso remanescente movido pelo governo dos EUA contra Wall Street.

 

O banco também concordou em pagar 388 milhões de dólares aos reguladores dos EUA e do Reino Unido pelas falhas do Credit Suisse em torno do colapso da Archegos Capital, que causou uma perda comercial de 5,5 mil milhões de dólares ao credor falido e ajudou a provocar o seu desaparecimento.

 

O UBS também resolveu uma acção movida pelo Credit Suisse contra um blog popular de Zurique, Inside Paradeplatz, sobre o que alegou serem comentários de leitores abusivos e não verificados.

 

Por último, o UBS tem pouco menos de 10 biliões de USD em provisões e passivos contingentes para litígios e questões regulatórias, de acordo com estimativas do JPMorgan.

 

 

Em face de tudo isto, é óbvio que Max Tonela e Beatriz Buchile devem declinar a oferta dos 100 milhões de USD e obrigar o UBS a subir a fasquia. 100 milhões de USD? Shame on you UBS! Vergonhoso! (M.M.)

 

*Texto escrito minutos antes de recebermos o despacho da “Lusa” revelando o acordo anunciado pelo UBS.

É uma coincidência abismal! O terrorismo em Cabo Delgado está a terminar! O mandato de Filipe Nyusi na Presidência da República também. Nos últimos dias, abunda noticiário sobre o abate dos cabecilhas do terrorismo e seus lugares-tenentes. 30 líderes já foram mortos recentemente, escrevem as parangonas. Dentre eles, o Bonomade, seu chefe maior. O Abu Kital. O Ali Mahando. Eles foram mortos. Ninguém foi capturado, para ser levado a julgamento e relevar os tentáculos das suas traficâncias.

 

Estamos perante um assomo de bravura por parte das nossas Forças Armadas e também por conta do estoicismo do Comandante Policial, Bernardino Rafael. Nyusi é esperto: ele quer sair mostrando que foi ele quem eliminou o terrorismo, fenómeno que nasceu e floresceu no seu consulado. Nasceu em 2017. E desde 2021 que a identidade do Bonomade foi revelada. Ele andou passeando sua matança. Escapou aos ucranianos do Prigozhin, aos mercenários doDyck Advisory Group (DAG), às tropas da SAMIM, aos bravos do Kagame, para finalmente sucumbir às nossas forças. Grande feito! Inolvidável! De repente, as nossas forças fazem sentido. Habemus Moçambique, outra vez?!

 

Este golpe final no terrorismo será o grande legado do Nyussismo, sobretudo porque nasce e morre com ele. Vai ser acrescentado ao DDR - a pacificação ardilosa com a Renamo, que compreendeu remendos constitucionais por cima do joelho. Quando o terrorismo nasceu, tratava-se de um mero assunto de Polícia, diziam, a pés firmes, o Bernardino Rafael, e o putativo candidato a candidato, Basílio Monteiro.

 

Queriam o exército lá longe! E foram arrastando a matança. E foram usufruindo do poder decisório sobre as compras para a guerra policial, equipamento, munições, comida, contratações de Wagner’s a troco de minerais, dos mercenários da Dykc Advisory Group a troco de milhões do Tesouro (sem procurement), e das tropas ruandesas a troco de pedaços de soberania e preferência no conteúdo local. E os aviões do Kagame sobrevoando Cabo Delgado na calada da noite, levando não sei o quê.

 

Ao logo do caminho, o Primo Basílio foi empurrado para fora do banquete. E o assunto tornou-se assunto militar. Mas o enredo macabro, de resto nada queirosiano, continuou com matanças e decapitações. O Bernardino Rafael manteve-se firme em Cabo Delgado, extrapolando-se, mesmo quando o assunto deixou de ser meramente policial. Mesmo quando passou a ser eminentemente assunto do Exército. Ele lá estava, em todas, e hoje certamente que é um dos responsáveis deste triunfal final pintado com as cores do sangue e os tons garridos da ambição. 

 

Mas a eficácia brutal das tropas deve ser elogiada. A limpeza tem de ser cabal, eliminando-se todos e quaisquer vestígios do terror, dos seus chefes e dos contactos do lado de cá. Tudo está a ser feito para nada sobre. Nem os indícios da instrumentalização da guerra, para engordar os bolsos, a desordem reinventada, adulada! 

 

E quando o mandato de Nyusi terminar, começaremos uma nova vida. Ele começará uma nova vida, limpinho, limpinho! O PR está empenhado nisso! Agora removeu a Ministra Arsénia Massinga, do Interior. A narrativa vendida cá para fora coloca os raptos no centro da remoção. Uma espécie de penalização pelo fracasso geral do Estado no combate a uma indústria que solidificou suas entranhas no aparato castrense, nomeadamente no seio das forças de investigação criminal (SERNIC) e na Unidade de Intervenção Rápida (UIR).

 

Mas onde estava o chefe operativo policial? Enredado na guerra, controlando os negócios do Interior, num teatro ruinoso. Como no Fado do Ladrão Enamorado: “Nunca fui grande ladrão/Nunca dei golpe perfeito/Acho que foi a posição/Que me aguçou o jeito”! 

 

Massingue sozinha não podia fazer nada! Ninguém esperava dela nada. Demiti-la faz parte do enredo do fingimento. Ninguém combate os raptos sozinho! Ela não tinha a necessária protecção política (ou não é a função ministerial uma função política? Ou o combate aos raptos não precisava de vontade política para lá da sua expressão verbal? De recursos; da aceitação da cooperação da “mão externa”; da pronta colaboração interinstitucional?).

 

Massingue surgiu do cenário como um bode expiatório. Foi usada e quando se apercebeu disso ainda tentou impor um travão no fartar vilanagem sobre Cabo Delgado, mas foi confrontada com a mais pueril insubordinação.

 

E sobre os raptos, o operativo central nunca foi chamado à responsabilidade. (E não será o combate aos raptos uma função operativa da polícia? Ele fica e os Ministros passam, sendo conotados na opinião pública com incúria e laxismo? E ele não é mexido?). Ou estamos perante o derradeiro inamovível, uma versão mais sólida que o Gilberto Mendes com sua pretensiosa retórica de intocável, mais sólida porque a fonte da deferência nyussista para com ele não decorre de uma mera representação teatral da perfídia frelimista, mas da sua descendência matrilinear – e a autoridade subjacente – no seio do conclave nortenho.

 

Na verdade, ele é uma reedição do antigo Ministro do Interior, Manuel António: “daqui não saio, daqui ninguém me tira”. Esta exoneração de Massingue faz prever que seu (do Bernardino) percurso até ao fim do mandato no Nyussismo será incólume. E para desfazer quaisquer dúvidas, Pascoal Ronda, zás, o carcereiro de Montepuez é repescado do fundo do sofá para vir fazer figura de corpo presente. O que resulta disto tudo e esta assumpção assombrosa: Bernardino Rafael empurrou Massingue para a rua e passa ele a ser, agora, o todo poderoso no Interior, relegando Ronda para a inoperatividade. Isso lhe permitirá encerrar no Interior o “dossier Cabo Delgado”, sem qualquer oposição ou tentativa de escrutínio interno. E isso é absolutamente necessário. É absolutamente necessário apagar os vestígios do terrorismo, das mordomias derivadas do esforço da guerra, não só no campo de batalha como também na papelada centralizada do procurement castrense. (M.M)

O actor Gilberto Mendes, Secretário de Estado do Desporto, considera-se um “intocável” no Governo de Nyusi. 

 

Faz sentido! Na semana passada, ele foi ao Conselho de Ministro dizer umas mentirinhas e o Presidente Nyusi parece ter engolido sua narrativa manipuladora sobre os episódios mais recentes do basquetebol feminino. É claro que enquanto Nyusi não levantar o martelo, Mendes vai fazendo e desfazendo na Secretaria de Estado. 

 

Eu desafio-lhe a uma entrevista televisionada sobre a economia política do desporto em Moçambique. É obvio que ele cairia ao tapete logo na primeira ronda de perguntas, derrubado pelas evidências gravosas de uma gestão errática do desporto no seu consulado. 

 

Mendes diz que ninguém lhe derruba mas foge ao escrutínio. Porquê não convoca uma conferência de imprensa? Tem medo! 

 

Ele diz que ninguém lhe derruba! Mas não aceita críticas. E tenta descaracterizar quem lhe critica. A mim chamou-me “mentiroso”; ao Salomão Moyana “gagá”, mostrando como este Governo de Nyusi está moralmente nivelado por baixo. 

 

A gestão desportiva está uma lástima e Nyusi ainda não percebeu que está sendo aldrabado. Se a Rady Gramane não fizer um milagre em Dacar, nas qualificações do boxe, Moçambique não irá aos Jogos Olímpicos de Paris. Quando Nyusi se perceber que está sendo enganado, seu mandato terá chegado ao fim, com um legado e ruim.

Mozland vital min

Na semana passada, uma adjudicação feita pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável (FNDS), no quadro do Projecto Mozland II, também chamado “Projecto de Administração da Terra (Terra Segura)”, que visa a “delimitação de comunidades e planeamento básico do uso da terra e regularização fundiária, demarcação de parcelas, levantamento de limites, preparação e emissão de DUATs (títulos de uso de terra)”, causou uma estrondosa polêmica nas redes sociais moçambicanas.

 

Essa polêmica fez sentido? Ou estava ferida de preconceito e julgamentos a priori, sem uma exaustiva apuração dos factos relevantes A maioria dos títulos de imprensa destacou a alegada fraude, por causa do recente registo legal de uma empresa denominada Terra Vital Sociedade Unipessoal. Sua publicação em BR (Boletim da República) foi feita em Fevereiro e a adjudicação em causa, para a segunda fase de implementação do Mozland, publicada em Abril no matutino Notícias.

 

A generalidade da opinião pública foi levada a suspeitar que o processo não foi transparente e que a adjudicação à empresa “Terra Vital Sociedade Unipessoal” pode ter sido irregular, nomeadamente pela proximidade entre a sua constituição, em 13 de Fevereiro de 2023, e anúncio da adjudicação, em Março, para além do seu exíguo capital social (100 mil Meticais), num concurso em que terá ganho lotes cujo custo de implementação ascende aos 20 milhões de USD.  O matutino governamentalizado escarrapachava em parangonas que, por razão da alegada fraude, o FNDS iria responder no Gabinete Central de Combate à Corrupção (GCCC).

 

Nesta semana, a ladainha da alegada corrupção continuou a circular nas redes sociais, apontando-se o dedo ao Ministro Celso Correia, cujo Ministério (Agricultura e Desenvolvimento Rural) mantém projetos com financiamento do Banco Mundial, como este Mozland, uma espécie de nova encarnação do “Programa Terra Segura”, que o Ministro levou a cabo no primeiro mandato de Nyusi, com o antigo MITADER, e o PR calcorreou o país distribuindo DUATs, capitalizando o dinheiro do banco para sua projecção política.

 

Um dos exemplos foi a entrega, em Agosto de 2019, de 30 mil títulos de Direito de Uso e Aproveitamento de Terra (DUAT) a cerca de 18 mil beneficiários, entre mulheres, homens e jovens, em varios distritos.

 

Mas, e então, em que ficamos? Houve uma adjudicação inquinada, cheia de irregularidades, politicamente manipulada? Ou estivemos perante uma narrativa assente em julgamento apressado, sem o mínimo do contraditório?

 

“Carta” foi desafiada a escrever sobre o caso, tendo uma rigorosa apuração dos factos, para benefício dos seus leitores. Ei-los.

 

O principal objectivo do projecto é “fortalecer a segurança da posse da terra em distritos seleccionados e melhorar a eficiência e acessibilidade dos serviços de administração da terra”. Tem duração de cinco anos (2018-2024) e financiamento (100 milhões de USD) do Banco Mundial. A cobertura geográfica do projecto abrange 71 distritos (45% dos 157 distritos do país) em todas as províncias do país.

 

No fim, a intervenção das empresas a quem foi adjudicado o projecto deverá resultar no seguinte: Delimitar e registar no Sistema de Gestão de Informação sobre Terras (SiGIT) 1,200 Certificados de delimitação da comunidade, incluindo um plano de micro-zoneamento; Regularizar e registar no SIGIT 2,000,000 de DUATs; Abranger 700,000 beneficiários com DUATs registados no SiGIT (dos quais 40% registado em nome de mulheres ou em co-titularidade); Assegurar pelo menos 75% de nível de satisfação dos beneficiários dos DUATs em relação à regularização sistemática de terra; Reduzir até pelo menos USD 35 o custo de emissão por DUAT registado no SiGIT através de um processo sistemático de regularização da terra e garantir que 90% do SiGIT esteja actualizado, operacional e disponível para uso, incluindo um portal web que permite o acesso do público aos dados cadastrais nacionais.


Mozland Fase I: Terra Vital Consortium ganha concurso em 2021

 

O Projecto Mozland (RFB 29/MLAND/NCS/2018) tem dois momentos. A primeira fase (13 milhões de USD) – delimitação de comunidades e planeamento básico do uso da terra e regularização fundiária, demarcação de parcelas, levantamento de limites, preparação e emissão de DUATs - Fase I (Lotes 1 e 3) – começou com o anúncio do concurso e publicação no website do Banco Mundial em Junho de 2020 e no “Notícias” em Julho do mesmo ano. A recepção e abertura das propostas dos concorrentes, designadamente 19 propostas de 10 concorrentes, entre os quais três nacionais e sete estrangeiros teve lugar em Agosto.

 

Deste concurso, a Terra Vital Consortium ganhou dois lotes e o terceiro foi atribuído a uma empresa de nome IGNFI/METOP/ETOP. A notificação da Intenção de Adjudicação foi feita a 19 de Março de 2021, a assinatura dos contratos a 30 de Abril de 2021 e o visto do Tribunal Administrativo ao contrato entre o FNDS e a Vital Terra Consortium estampado em Agosto de 2022

 

Um aspecto que a generalidade da opinião pública desconhece – mas essencial para ela fazer seu julgamento isento sobre se esta contratação foi ou não transparente – é que a Vital Terra Consortium é justamente isso: um consórcio estrangeiro, sem registo em Moçambique e que se se meteu em competição livre em nosso país no projecto financiado pelo Banco Mundial.

 

O consórcio, com domicílio fiscal na África do Sul (Registration number K2021/964187/07, de acordo com uma referência (https://www.sacompany.co.za/companies/TERRA-VITAL-CONSORTIUM/K2021964187/) encontrada durante nossa apuração, é composto pelas seguintes entidades: Vital Capital Investments, Ltd (Suíça), (ii) Data World (África do Sul) e (iii) e Evaluations Enhanced Property Apraisals (Pty).

 

De acordo com a documentação consultada pela “Carta”, a primeira fase do Mozland teve seu Kick of Meeting para início de uma implementação que estava calendarizada para terminar em Agosto deste ano. Alguns dos “outputs” desta primeira fase foram capitalizados pelo Presidente da República, nomeadamente com a entrega, em vários distritos do país, de milhares de títulos de DUAT a beneficiários rurais.



Mozland Fase II: a aparente confusão entre Terra Vital Consortium e Terra Vital Sociedade Unipessoal

 

As manifestações de interesse para a Fase II do processo seriam publicadas em Fevereiro de 2022 e o prazo para o seu efeito estava determinado para encerrar às 15:30 do dia 18 de Abril de 2022, de acordo com informação constante do mesmo website.

 

De acordo com a documentação do concurso consultada por “Carta”, tanto a Verde Azul como a Terra Vital Consortium voltaram a fazer parte da lista dos vencedores do concurso. Desta vez, a firma Verde Azul, que na primeira fase fez o trabalho de controlo de qualidade, concorreu agora para fazer a implementação.

 

Todos os passos legais da contratação pública, diz o FNDS, foram seguidos à risca: a notificação da intenção de adjudicação foi feita em Dezembro de 2022, a assinatura dos contratos a 30 de Março e o visto do Tribunal Administrativo foi atribuído a 17 de Maio de 2023, poucas semanas depois do escândalo ter rebentado. Os passos teriam também recebido o no objection do Project Task Team Leader, Camille Bourguignon, do Banco Mundial em Washington DC. 

 

“Carta de Moçambique" tentou, em vão, obter uma reacção de Camille sobre este processo. Ligamos para o seu gabinete em Washington DC, mas seu assistente disse que ela se encontrava reunida.

 

A referência técnica para segunda fase do Mozland II foi esta: RFB 57/MLAND/NCS/2022 - Delimitação de comunidades e planeamento básico do uso da terra e regularização fundiária, demarcação de parcelas, levantamento de limites, preparação e emissão de DUATs - Fase II.

 

Nesta segunda fase do Mozland, a Terra Vital Consortium voltou a integrar as mesmas empresas como no anterior concurso, ganhando um contrato de cerca de 20 milhões de USD. No total participaram neste segundo concurso 12 concorrentes, entre nacionais e estrangeiros, dos quais acabaram ganhando as seguintes empresas: Terra Vital Consortium (Lotes 4, 5, 7, 10 e 13); Lote 6 – GIS-Empresa Nigeriana de Transportes); Lotes 8 e 9 – Verde Azul Consult, Lda. (empresa moçambicana) e Lotes 11 e 12 – Geomaps Africa (Quénia) em parceria com a Top Map (Moçambique).

 

A generalidade da opinião suspeita que o processo não foi transparente e que a adjudicação à empresa “Terra Vital Sociedade Unipessoal” pode ter sido irregular, nomeadamente pela proximidade entre a sua constituição e a adjudicação, e o seu exíguo capital social (100 mil Meticais apenas).

 

Mas nos documentos do concurso, nomeadamente na carta de adjudicação, nas minutas de negociação contratual, bem como nas minutas do contrato e visto do Tribunal Administrativo, o nome que consta sempre é Terra Vital Consortium. Ou seja, nenhuma Sociedade Unipessoal participou do concurso. Aliás, a Terra Vital Sociedade Unipessoal nem podia participar de um concurso internacional, com seus requisitos apertados.

 

Os critérios estabelecidos para a qualificação dos concorrentes neste processo incluem os seguintes aspectos: i) experiência comprovada (pelo menos sete anos) em consultorias de natureza similar; ii) experiência de trabalho em países da África Subsaariana; e iii) experiência na formalização de ocupação de terras pelas comunidades e em parcelas individuais ou outras actividades relacionadas. Uma empresa constituída em Fevereiro deste ano não podia, objectivamente, participar num concurso cuja chamada para manifestação de interesse teve lugar um ano mais cedo, ou seja, em Fevereiro de 2022.

 

O que explica o registo da Terra Vital Sociedade Unipessoal?

 

Como dissemos, a Terra Vital Consortium foi registada na África do Sul, tendo participado como implementadora na primeira fase. Para a Fase II, o Consórcio, assim como outros participantes, receberam a notificação da intenção de adjudicação, em finais de Dezembro de 2022, pelo FNDS.

 

Seguro de que ia ganhar alguns lotes do concurso (ganhou lotes ascendendo os 20 milhões de USD), o consórcio, explicou uma fonte, decidiu abrir uma espécie de sucursal em Moçambique, com domicílio fiscal no nosso país, visando agilizar coisas como pagamento de serviços e transferências interbancárias com fornecedores e clientes. Ou seja, parte do dinheiro que o Consórcio vai ganhar com o projecto será gasto em Moçambique, para além dos 20% da taxa liberatória (que já paga).

 

A sucursal moçambicana do Consórcio foi registada como Terra Vital-Sociedade Unipessoal, Limitada, em nome de Gil Zilberman, com capital social de 100 mil Meticais. Isto vai exigir que a empresa pague em Moçambique as imposições fiscais devidas.

 

Na sua reacção à polémica levantada por um anúncio de adjudicação feito em Abril, mas que apenas foi amplamente veiculado nas redes sociais em Julho (já no contexto vibrante do processo eleitoral), com um rótulo prévio de corrupção, o FNDS realça que a gestão, coordenação, supervisão, monitoria e avaliação do Projecto é assegurada pelas seguintes entidades: Direcção Nacional da Terras e Desenvolvimento Territorial (DNDT), Centro Nacional de Cartografia e Teledetecção (CENACARTA) do Ministério da Terra e Ambiente (MTA) e Direcção Nacional de Organização Territorial (DNOT) do Ministério da Administração Estatal e Função Pública (MAEFP).

 

Ou seja, garante fonte do FNDS, as contratações no âmbito do Mozland têm vindo a ser feitas em colaboração com uma gama de entidades do Estado e não isoladamente pelo fundo. Este foi mais um caso de tempestade em copo de água, de manipulação da opinião pública sem dó nem piedade, mostrando que a comunicação social baixou a guarda diante da exigência do contraditório e apuramento dos factos.

 

(Marcelo Mosse)

 
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