Vi hoje com muito agrado uma petição do causídico e activista social Custódio Duma, dirigida à Procuradoria-Geral da República, a exigir uma investigação séria e independente da violência policial, que tem estado a acontecer um pouco por toda a cidade e Província de Maputo, por causa das manifestações convocadas por Venâncio Mondlane, candidato presidencial suportado pelo Partido PODEMOS. No artigo, Custódio Duma faz o apelo na qualidade de primeiro Presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos de Moçambique.
Escreve Duma que o atropelamento brutal, violento e covarde de uma manifestante, na quarta-feira, em plena Avenida Eduardo Mondlane, no centro da capital do país, por um blindado das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), foi o “pico” de uma “onda crescente de violência”, perpetrada por agentes das Forças de Defesa e Segurança (FDS).
O apelo do Advogado Custódio Duma reflecte muito bem o desejo de boa parte da sociedade moçambicana, de que a Polícia actue dentro dos limites da lei e com a devida proporcionalidade. De facto, os casos de cidadãos baleados com arma de fogo, como resultado destas manifestações, começam a assumir contornos alarmantes. Nisto, estamos juntos.
Entretanto, não é sobre isto que quero falar.
Na mesma quarta-feira, primeiro dia da terceira etapa, da quarta fase das manifestações convocadas pelo candidato Venâncio Mondlane, circulou um vídeo em que uma cidadã é obrigada, sob ameaça dos manifestantes, a parar a sua viatura, estacionar e ir tomar café, porque eles tinham ordens do “PRESIDENTE”, segundo as quais, ninguém deveria circular. Outro vídeo que me deixou chocado é de duas jovens mulheres, membros da Polícia da República de Moçambique, cercadas por uma dezena de jovens, obrigadas, intimidadas e coagidas a segurar cartazes com dizeres a favor do candidato Venâncio Mondlane, enquanto caminhavam. Uma situação humilhante e degradante.
Pelas redes sociais, circulam inúmeros vídeos de crianças e adolescentes que colocam barricadas nas estradas, para impedir a livre circulação dos cidadãos. No meio de tudo isto, estas acções são acompanhadas de uma dose muito grande de violência psicológica sobre aqueles que ousam desafiar as decisões do “Presidente”. Sem falar, claro, nas acções de vandalismo contra lojas, estabelecimentos públicos e, mais recentemente, ataques a postos policiais, que resultam na posse de armas nas mãos de civis.
No meio deste processo, os cidadãos de Maputo e Matola estão entregues à sua sorte, até que alguém ponha fim a este espectáculo degradante da nossa sociedade.
Se para os casos de violência policial, os nossos activistas de plantão, incluindo a Ordem dos Advogados de Moçambique, são céleres a emitir comunicados de condenação e a pedir investigações sérias, no caso da violação dos direitos civis dos cidadãos, por parte dos apoiantes de Venâncio Mondlane, o silêncio é confrangedor, assustador e até cúmplice. Não sei se por medo de perderem popularidade, já que é mais fácil “bater” no Estado, ou, se é porque realmente a defesa dos direitos dos cidadãos de Maputo e Matola não lhes interessa. Em todo este processo de manifestações, assistimos de forma clara à presença de crianças e adolescentes, que são usadas para atirar pedras, proferir insultos, queimar pneus, vandalizar lojas, sem que ninguém diga uma única palavra. Onde estão as organizações da sociedade civil.
Não conheço muito bem o Dr. Custódio Duma. Tive oportunidade de conversar com ele apenas uma vez, na casa de um amigo em comum e fiquei com a sensação de estar diante de um homem decente, cumpridor da lei, amante de Moçambique e, acima de tudo, de um acérrimo defensor dos Direitos Humanos, aliás, a sua carta à PGR demonstra muito bem isso.
É por isso que lhe escrevo, para pedir-lhe que seja igualmente defensor dos milhares de moçambicanos que, nas Cidades de Maputo e Matola, estão privados de exercer os seus mais básicos e elementares direitos, incluindo o direito de ir e vir. Muitos concidadãos são forçados a parar e aderir às manifestações de forma involuntária, muitos são obrigados, sob coacção, a cantar ou a executar um determinado acto a favor do candidato Venâncio Mondlane, para poderem seguir viagem ou evitar ter as suas viaturas vandalizadas, ou ainda, simplesmente ao direito de terem uma opinião contrária à dos manifestantes.
Como pode ver meu caro Duma, estamos neste momento sujeitos à vontade dos manifestantes e da sua liderança, sem observância de nenhuma salvaguarda legal, que nos garanta o direito de seguir as nossas vidas de forma normal. O medo e o pânico a que os cidadãos da Cidade de Maputo e Matola estão sujeitos colocam em causa os seus direitos, deveres e liberdades fundamentais. Este não é o tipo de Estado de Direito Democrático que queremos construir.
Nas suas próprias palavras, quero dizer ao Caro Duma: “Não agir diante destas situações seria negligenciar o nosso compromisso com os princípios fundamentais consagrados na Constituição da República e nos tratados internacionais dos quais Moçambique é signatário. Este é um momento decisivo para reafirmar o nosso compromisso como nação de proteger os direitos fundamentais de todos os moçambicanos”.
“Vamos fazer diferente, para obter resultados diferentes”.
Victor Nhatitima