Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

Nando Menete

Nando Menete

segunda-feira, 28 dezembro 2020 12:42

E o fundo do Fundo Soberano?

“O que me preocupa não é o grito em torno do que será feito com o  Fundo Soberano (FS), mas sim o silêncio sobre as suas fontes de financiamento”. Volto a esta frase, mas antes um lembrete: na novela brasileira “O Bem Amado”, o perfeito Odorico Paraguaçu atribuía ao poeta Rui Barbosa algumas das suas eloquentes frases. Questionado sobre a  autenticidade de uma delas, o  Odorico  respondeu: “Se o Rui Barbosa não disse, devia ter dito”. O mesmo com a frase acima: se Martin Luther King ou uma outra figura mundial não disse, devia ter dito”. 

 

A citação é a propósito da auscultação em curso sobre o FS. Ao que parece, o FS é uma resposta para alojar e distribuir a (excedente) verba do gás de Palma e não só (rubis, grafite, etc), tendo a diversidade das fontes sido até teor de  uma recente observação do presidente da República na cidade da Beira, aquando da inauguração do edifício do Banco de Moçambique, a instituição na liderança da proposta e debate sobre o FS. E ainda a propósito: “Por acaso já houve uma auscultação sobre as fontes de financiamento do FS? Quiçá, por aqui fosse um caminho a considerar, lembrando, à luz da citação,  que não é só o ponto de chegada (destino)  do dinheiro  que preocupa, mas sim, e sobretudo,  o seu ponto de partida (origem) e este pode até não ser soberano, atendendo que o país não controle o negócio, e nem saudável, atendendo, por exemplo, a certas  circunstâncias do processo de exploração/produção como as de guerras e de violação dos direitos humanos, tal o caso do mundialmente famoso  “diamantes de sangue”, e ainda de políticas (fiscais, laborais, etc)  prejudiciais ao país.

 

E  longe de qualquer analogia (tipo “gás de sangue”), e bem  para concluir, urge que se traga  à mesa do debate as fontes de financiamento do FS, e do desenvolvimento em geral, e ainda, e é imprescindível, a necessidade de  aferir quão soberanas e saudáveis  elas são sob pena do FS ser, a partida, um fundo com um fundo falso e problemático. De contráio, e também dizia o citado perfeito: “Em cavalo manso todo o mundo monta”. E já agora: caso o perfeito Odorico Paraguaçu não tenha o dito, que tivesse dito.

Uma boa parte das celebrações  do meu aniversário não estive presente. O motivo é simples: foram celebrações-surpresa, incluindo a ausência do aniversariante. Todavia, com ou sem a minha presença ( o aniversariante), a festa ou o corte de bolo acontecia. Lembro-me disto a propósito da celebração dos 30 anos do multipartidarismo em Moçambique cuja arena  principal, o  aniversariante-mor, o Parlamento, que há 30 anos  aprovou a constituição democrática e a posterior  os subsequentes actos afins,  esteve ausente ou não teve a presença merecida quer nas celebrações promovidas por terceiros quer,  e não me consta, em iniciativas por si organizadas. A condução da celebração aparentou mais do Governo em  parceria com Organizações da  Sociedade Civil (OSC) e algum destaque presencial, tipo “pendura”,  do Conselho Constitucional.

 

Contei a um amigo esta constatação. Este não me pareceu surpreendido e até disse que não esperava tanto, pois o Parlamento foi sempre o parente frágil/pobre da nova ordem democrática saída da constituição de 1990.  Ele defende, e eu concordo, que o Parlamento, a nossa Assembleia da República, não  ocupa o espaço que merece no xadrez político e de desenvolvimento de Moçambique. Para o dito amigo e cito:  “O que seria um espaço para o confronto de ideias/propostas,  o nosso Parlamento não  passa de um local de conforto para o Governo e de local de aulas promovidas pela sociedade civil”.  Para ele, e a justificar a condução  da celebração dos 30 anos por parte do Governo e OSC, tal explica-se porque “são os beneficiários históricos da fragilidade do Parlamento, pois facilita a aprovação da agenda do Governo e cria oportunidades para as OSC  desenvolverem  os seus projectos  de capacitação”. Na senda,  e em jeito de conclusão, soou o alarme: a ausência do Parlamento é extensiva aos 30 anos (na verdade, em termos efectivos, são 25 anos, contados a partir de 1995, o ano do início do funcionamento do Parlamento multipartidário).  

 

E na sequência conclusiva, e desta, para fechar,  voltando às celebrações do  meu aniversário: a minha ausência nunca fora motivo para cancelamento ou adiamento da celebração. No mesmo diapasão: será que cola celebrar a democracia/o multipartidarismo sem o Parlamento? No mínimo, é par(a)lamentar!

terça-feira, 01 dezembro 2020 06:07

A constituição no banco dos réus

Imagine  a seguinte notícia: “Correm rumores citadinos de que um grupo de cidadãos, entre jornalistas, académicos, ONGs e destas os respectivos beneficiários de projectos de promoção da cidadania, deu recentemente entrada um processo judicial contra a constituição. O grupo acusa o documento mãe  de alta traição e de autoria moral do grosso das sevícias de que foram e são vítimas desde que a constituição democrática veio à luz do dia aos 30 de Novembro de 1990, passam 30 anos”.

 

Ainda o seguimento da notícia: “O  grupo, alega que os seus membros, e não só,  estimulados e supostamente protegidos pela constituição democrática, aplicaram-se à fundo no exercício dos direitos de expressão e informação; os de liberdade de reunião e de manifestação; e os de liberdade de associação, mas que tais direitos não passa(va)m de uma armadilha, conforme é atestado quando avaliado o resultado, sobretudo o número de vítimas  por força do apego zeloso e exemplar cumprimento da constituição”.

 

Ainda a notícia: “No entanto, o grupo, popularmente conhecido por “-30”, pondera retirar o processo caso o resultado de um parecer jurídico, solicitado a um causídico renomado da praça, confirme que o que está consagrado na constituição é sagrado e sendo assim - uma vez sagrado - não se move”.

 

E já a fechar, imagine o seguinte  parecer do douto causídico: a constituição é sagrada e intocável. O cidadão que se dê por satisfeito em poder contemplar a sensual e monumental beleza dos seus artigos, desde os mais vistosos aos mais íntimos.

A euforia, a alegria, o riso espontâneo e a sensação de  relaxamento são alguns dos efeitos atribuídos ao consumo da cannabis sativa, vulgo marijuana/suruma, fumada com um charro ao estilo de cigarro e feito à mão. Há dias lembrei-me destes efeitos enquanto lia um texto sobre Diego Armando Maradona, o El Pibe, escrito por ocasião da passagem do seu 60º aniversário celebrados no passado dia 30 de Outubro. Da lembrança conclui, e não sabia,  que nos anos da adolescência correu-me pelas veias a adrenalina do melhor charro do mundo: o indelével  charme do futebol do El Pibe.

 

Nesta quarta-feira,  o El Pibe partiu. Partiu ao encontro de Deus, um velho conhecido que lhe emprestara a mão para fazer um mágico golo no mundial de futebol México-86, o mundial de Maradona cuja equipe, a Argentina, eu nem apoiava, mas era e serei eternamente, como tantos pelo mundo fora, um leal adepto do El Pibe. É a segunda vez que ele parte. A primeira, e não física, foi quando da sua despedida dos campos e desde então o mundo deixou de saborear o melhor charro do universo e só, e apenas, ocasionalmente para o delírio de quem matava saudades dos efeitos atribuídos a cannabis sativa.

 

E tal como acontece com a cannabis sativa, cuja venda e consumo é crime em alguns países, incluindo Moçambique, e em outros como a Holanda, está legalizada, em torno de El Pibe também pairou muita controvérsia, sendo uma delas a de saber se o El Pibe é ou não o melhor futebolista de sempre. Alguns alegam que a qualidade dos seus dotes dependia do vício de outros tipos de charro. Sobre tal, alguém respondeu nos seguintes termos: “Fumem todos (os jogadores) e vamos ver se fazem o que Maradona faz”. Do próprio El Pibe, o acórdão: “Imaginem-me sem a droga, o quanto teria sido melhor”.

 

EL PIBE DE ORO, ÉS O MELHOR DE SEMPRE! E na hora de despedir, a minha solene vénia diante do indelével charme do teu futebol, o meu charro da adolescência. Um charro diferente, exclusivo e terapêutico. Um charro  que duvido que tenha sido enrolado por mãos terrenas. Porventura, um charro de outra galáxia e para onde Diego Armando Maradona regressa.

 

Saravá El Pibe!

quarta-feira, 25 novembro 2020 13:41

Afinal o que será que Deus pôs ali?

O título é uma ligeira adaptação de um trecho de  uma música doce do cantor brasileiro Djavan e vem a propósito do que se acompanha na imprensa sobre uma (suposta) guerra entre organizações da sociedade civil pelos lugares que a cabem na Comissão Nacional de Eleições (CNE). Pelo histórico é uma rixa periódica, normalmente, salvo erro, de cinco em cinco anos. Agora a curiosidade é a de saber sobre o que tanto de doce tem a CNE? A curiosidade ainda adensa  quanto a razão da guerra e se ela existe por que não evitá-la?  

 

A dita guerra foi acirrada por uma  decisão da Assembleia da República que marcara  o tempo oficial de 15 dias de entrega de candidaturas para os cargos em pauta. Uma parte da sociedade civil quer que se avance para a entrega e uma outra não concorda e quer que se adie e, ainda, que antes haja um debate público sobre as regras, pois, e o tempo testemunha, o actual modus-operandi não passa de um exercício que só alimenta cada vez mais a desconfiança e a fertilidade da cooptação. De resto, em conta-corrente, é muito estranho que se faça tanto alarido para ser parte de um órgão que a mesma sociedade civil, e não só, rotula-o de parcial, manipulável e ao serviço de um determinado partido.

 

Neste contexto, que  saídas? A renúncia geral definitiva pode ser uma boa e pacifica saída. E que as partes desavindas proponham como alternativa um concurso público aberto a candidatos singulares, desde que  reúnam os requisitos e a altura da competência e idoneidade  exigidas. Aliás, havendo alguma guerra a ser feita que seja dirigida para a definição dos requisitos dos candidatos a título singular  e do respectivo processo de selecção. Não seria esta uma simpática saída? Sobretudo, e apenas, quanto ao preenchimento dos lugares da sociedade civil.

 

Infelizmente (e para qualquer mudança), o tempo dos 15 dias já se esgota.  O mesmo com o tempo deste texto, e com a sensação de que teria sido melhor gasto a ouvir Djavan. E para quem leu até aqui, certamente que também pergunta: Afinal o que será que Deus pôs ali (na CNE)? Djavan até que vai mais longe quando a dado momento canta: “Por que  será que Deus pôs ali.”

É líquida a ideia  de que a implantação de (grandes) projectos de exploração de recursos naturais e parte deles esgotáveis, fora os seus entretantos, gera benefícios para as comunidades locais. E uma vez que a terra dos rongas acolhe a capital do país - igualmente um grande projecto - há quem pergunte pelos benefícios locais disso, sobretudo, e como qualquer projecto, a capital também tem o seu tempo (indeterminado) de duração. Foi assim pelo mundo, incluindo o caso da Ilha de Moçambique, a antiga capital de Moçambique, que em 1898 foi preterida a favor de Lourenço Marques, actual Maputo. Tal possibilidade, a de um dia  Maputo deixar de ser a capital, e no quadro do debate  sobre a sustentabilidade da exploração dos recursos naturais, leva à reflexão sobre a sustentabilidade da exploração da terra dos rongas como a capital do país, atendendo, e a história prova, que o recurso terra-capital  é também esgotável.

 

E depois que o recurso terra-capital esgotar do que se sustentará Maputo? Não será uma nova Ilha de Moçambique que mal consegue preservar o património erguido por ser a capital, um estatuto que lhe fora retirado, e que se saiba,  sem nenhuma indemnização e de nenhuma alocação orçamental  anual por ter sido  a capital. Provavelmente haja quem não tema a mudança e ache que a cidade das acácias  sobreviverá assim como a cidade brasileira do Rio de Janeiro que, em 1960, perdeu o estatuto de capital para Brasília e nem por isso perdeu o seu fulgor. Mas, segundo alguns escritos que não vêm ao acaso, a perca do estatuto de capital do Brasil é apontada como a responsável da crise crónica em que o Rio vê-se  mergulhado até hoje, incluindo a da auto-estima do carioca (o ronga do Rio de Janeiro), nunca recuperado desde que a cidade maravilhosa perdeu o estatuto de capital.

 

Curiosamente, nos dias que correm, parte das razões que ditaram a mudança da capital da Ilha para a então Lourenço Marques – alguns apontam as de ordem económica/financeira (minas sul-africanas) e de soberania (receio da tomada do estratégico porto de Lourenço Marques) face a interesses ingleses, colonizadores da África do Sul -  estão novamente à superfície (cofre à norte e soberania ameaçada também à norte) e não me admira que se comece a futurar uma nova mudança. Aliás, este debate não é novo, e por existir uma experiência amarga de uma vítima entre nós o seu desfecho  merece um tratamento constitucional no sentido de assegurar direitos vitalícios para a cidade que perca o estatuto de capital. Certamente um assunto para ser ponderado no devido tempo, mas que não deixa de ser um bom ponto de reflexão por ocasião da passagem de mais um aniversário da cidade de Maputo (10 de Novembro). Parabéns cidade das acácias pelos seus 133 anos e também, por arrasto, embora não saiba o dia e mês, pelos 122 anos com o estatuto de capital.   

Berlim, 12 de Junho de 1987. Nesta data e em plena Guerra-Fria,  Ronald Reagan (1911-2004), então presidente norte-americano, fez um discurso histórico diante do portão de Brandemburgo, um símbolo na delimitação entre a  Berlim oriental (socialista/comunista)  e a Berlim ocidental (capitalista). Neste discurso, Ronald Reagan, dirigindo-se ao então líder da então União Soviética,  Mikhail Gorbatchev, disse: “Secretário Geral Gorbachev, se você busca a paz, se você busca a prosperidade para a União Soviética e a Europa Oriental, se você busca a liberalização, venha aqui para este portão. Sr. Gorbachev, abra este portão. Sr. Gorbachev, derrube este muro!”

 

Matola, 09 de Novembro de 2020. Trinta e um anos depois da queda do muro de Berlim e na data consta que Ronald Reagan ressuscitara pela terras matolenses.  Quem o viu conta que Reagan, diante da vedação da nova sede municipal, proferiu um discurso dirigido ao actual edil da Matola. No final disse: “Sr. edil da Matola,  se você busca a prosperidade para a Matola, se você busca a democracia participativa e apregoa a presidência sem paredes, a vedação da nova sede municipal é uma oportunidade ímpar para o demonstrar.  Sr. Edil da Matola, esta vedação não faz nenhum sentido.  Sr. edil da Matola, remove esta vedação!”

 

O discurso de Ronald Reagan de Junho de 87 é apontado como um dos principais catalisadores para a queda do muro de Berlim o que veio a ocorrer  dois anos mais tarde. Espero que o discurso de 09 de Novembro não leve tanto tempo a produzir resultados. E pelo o que me consta, para fechar, o edifício da nova sede municipal da Matola é, entre pares, o primeiro vedado a nível nacional. Nem a sede do  Município de Maputo, a capital do país, está vedado. E aqui o munícipe e o turismo agradecem.   

 

PS: O actual  aparato de obras no novo edifício do Município da Matola é um indicador de que está para breve a inauguração. Provavelmente, e pela proximidade da efeméride, será no dia 05 de Fevereiro de 2021, a data de celebração de mais um aniversário da Matola. Até lá é possível remover a vedação e alocá-la para escolas com problemas de segurança e  que certamente existam na Matola. Assim, na data de inauguração, inaugurasse-a também a vedação de escolas abrangidas. Também, e até lá, até que se podia fazer algumas alterações nos acessos e circulação pedonal em benefício de uma mobilidade mais segura. Mas isto é um outro texto. 

Na área metropolitana do Grande Maputo quem assim responde está a comunicar que não vem ou que não tem hora para chegar, mas sempre tarde. O certo é de que não se encontra na portagem, o posto de cobrança pelo uso da estrada localizado na divisória entre as cidades de Maputo e Matola. Pensei nisto quando vi um trecho de uma entrevista do actual edil de Maputo a propósito dos 133 anos da cidade capital que foram celebrados no passado dia 10 de Novembro. Na entrevista, entre outras promessas, a de que em 2021 ter-se-á novidades do metro de superfície. Não é a primeira vez que ouço deste edil tal promessa. No seu primeiro consulado (2004-2008) prometera-o para o (suposto) mandato seguinte, mas tal, o mandato, fora barrado pelo seu partido, preterindo-o a favor da candidatura do anterior edil de Maputo que nos seus dois mandatos, reiterou copiosas vezes a promessa. E como um bom filho, a promessa está de regresso à casa. 

 

Será desta o metro? Se eu fosse um dos assessores do actual edil, um guru e referência de exemplar gestor público, recomendá-lo-ia alguma prudência, a par da experiência anterior, a menos que não esteja interessado num segundo mandato, esperando assim despachar tudo num único, incluindo o metro de superfície. Aliás, na entrevista o edil deixa bem claro de que não é o tipo de político que promete e não cumpre. Contudo, e perante mais uma promessa do metro vir à superfície, um meu próximo e grande observador dos processos de governação do país, perguntaria: “Sobrinho! Esse tal de metro o que vem mesmo fazer? Complementar o caos?”. Para o meu saudoso tio a melhoria da mobilidade não parte do vazio e de que o primeiro passo seria o de acabar com o caos instalado, incluindo o das ideias. E quanto a este tipo de caos, temo que as ideias estejam também “a passar portagem”.

 

Por acaso, e a propósito de qualidade, salta-me à memória um treinador americano de basquetebol do Benfica de Portugal que em tempos, perante a falta de talentos, dissera de que antes da qualidade o objectivo era a quantidade. E assim o clube saiu às ruas de Lisboa a procura de potenciais jogadores tomando a altura como um critério-chave. Aposto que se o mesmo raciocínio fosse aplicado na melhoria da qualidade da mobilidade na área metropolitana do Grande Maputo o metro não só viria à superfície como complementaria a qualidade existente. Ou seja: que antes de pensarmos em trazer o melhor, começássemos pelo que se devia ser feito em prol da qualidade do que temos disponível (infra-estruturas, meios, políticas e serviços). É bem provável, e para fechar, que seja por aqui a razão da resposta dada pelo “Metro de Superfície” quando perguntado se ainda vinha (à Maputo).

Decorrente do frenesim das eleições americanas, e porque disputadíssimas, a media internacional, e não só, tratou de concluir que a América estava profundamente dividida. E no caso, o estar dividido, dito como se fosse um assunto da mais alta gravidade. Confesso que até fiquei com dúvidas em relação a democracia como um bom modelo de governação, pois não cola  que uma eleição com a maior participação de sempre e disputadas até ao período de compensação fosse dada como um problema de “saúde pública”.  O contrário – que um dos concorrentes ganhasse com uma larga maioria –  é que seria o saudável? Talvez sim, porque, supostamente, significasse que a América saísse mais unida.   

 

Afinal, em democracia, e porque divide, os altos níveis competitivos entre concorrentes não é saudável e deve ser combatido. E eu convencido de que os resultados das eleições americanas estavam a demonstrar a vitalidade da sua democracia, e quiçá a da democracia pelo mundo fora. Puro engano. E ainda mais, sendo a América a democracia mais consolidada do mundo e com o actual inquilino da Casa Branca aos berros, chego a triste conclusão de que em democracia o equilíbrio não é salutar e que o melhor é que uma das partes ganhe e quanto possível de forma retumbante.

 

Neste contexto, diante do equilíbrio entre os candidatos  e na sequência a ideia de que tal (uma América competitiva) não é saudável, pois divide,  e de que a união só com uma maioria retumbante, dei por mim a pensar no processo eleitoral  moçambicano que fora na mesma diapasão é mais maduro.  Aliás, uma escassa vitória eleitoral entraria em choque com a constituição, particularmente com  um dos objectivos fundamentais do Estado moçambicano  que é a consolidação da unidade nacional.

 

Em síntese, para fechar, o equilíbrio eleitoral não é bem-vindo  (em Moçambique e pelos vistos  nem na América) e  que uma vitória retumbante é um imperativo nacional de união e tal decorre, na Pérola do Índico,  de um comando constitucional.  Neste aspecto, os Estado Unidos da América  deviam colher a experiência moçambicana para que em próximas  eleições não brinquem em serviço.

Nos últimos meses um dos  pratos fortes da media é a corrida eleitoral para a presidência americana. Hoje, 3 de Novembro, é o dia decisivo. Fora as candidaturas o que me chama atenção é a “ausência” do homólogo americano do nosso presidente da Comissão Nacional de Eleições (CNE), o Cheikh Abdul Carimo.  Daí a pergunta se alguém o terá visto ou,  e é possível, que tal figura nem exista na América.

 

Faço a pergunta porque não estou habituado a ver eleições em que os organizadores não são os principais protagonistas ou mesmo em  que os candidatos sejam os principais protagonistas. Por cá, a  Pérola do índico, a CNE/STAE é o centro das eleições. Esta é mais famosa   do que os candidatos e de longe dos respectivos manifestos eleitorais. Por cá o debate político não é entre os candidatos, mas sim no seio da CNE/STAE. E como se não bastasse,  posso estar enganado, a nossa CNE/STAE dá a sensação de funcionar como se fosse o Colégio Eleitoral para os americanos que é quem, na verdade, elege o presidente da nação mais poderosa do mundo.

 

Em síntese, e para terminar (hoje tenho pouco tempo por força das eleições americanas) passo a concluir, e a propósito do título do texto,   que o homólogo americano  da nossa CNE/STAE é o Colégio Eleitoral e este, pelo que eu saiba,  não anda desparecido. Isto, pelo menos, até ao anúncio dos resultados da eleição americana, pois, em caso de derrota de Trump (candidato republicano), é bem possível que o homólogo americano do Cheikh Abdul Carimo ( ou figura similar) venha a terreiro e passe a ser a figura principal. Afinal de contas, e mesmo a fechar, a Pérola do Índico também consegue  interferir nas eleições  da nação mais poderosa do  mundo. Aliás, há poucos dias, tal não deixou dúvidas  quando uma comitiva de Biden  (candidato democrata) foi impedida de fazer campanha no Estado de Texas, uma espécie de província de Gaza  para os republicanos.

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