Director: Marcelo Mosse

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Actualizado de Segunda a Sexta

Juma Aiuba

Juma Aiuba

sexta-feira, 22 fevereiro 2019 08:30

Procurando sentidos

O Tribunal sul-africano negou liberdade provisória a Manuel Chang porque:


1. Se Chang estiver fora da cadeia, mesmo vivendo numa casa fortemente guarnecida, ele pode fugir. Os advogados de Chang usaram o argumento da doença (diabetes) e do aconchego familiar, mas não funcionou. 


2. Há receio que Chang fuja para Moçambique. Aliás, foi por causa dessa possibilidade (de Chang fugir para Moçambique) que foi questionada a escolha da casa de Malelane, em Mpumalanga, que dista cerca de 50 quilómetros da fronteira. O Tribunal fincou o pé mesmo com proposta de uma outra casa "bem ao lado" tribunal de Kempton Park.


3. Há certeza de que, em Moçambique, Chang goza de proteção do Estado, do Governo e do seu partido (que aqui é tudo mesma coisa). Na verdade, o Tribunal sabe que se Chang estiver em Moçambique (por fuga ou por extradição), nada vai acontecer e não será nem julgado nem condenado. A imunidade e a influência de Chang em Moçambique são visíveis a olho nú. O Tribunal tem "certeza" da inoperância do nosso sistema de justiça.

 
4. Quem mandou prender Chang foram os americanos baseando-se em acordos nesse sentido. Quando os americanos pediram a prisão de Chang não era para ser colocado numa montra e ser assistido, era (e é) para ser extraditado para lá e ser julgado lá, tanto que os outros amigos dele estão lá mesmo nos É-U-Â. 


Estou aqui a tentar encontrar uma razão que justifique a entrega de Chang à Moçambique de bandeja. Que Estado é esse que faz de tudo para que um gatuno perigoso internacional não fuja para a sua casa e volta e meia deixa, assim de mão beijada, o mesmo bandido na mesma casa para onde o mesmo Estado temia que o mesmo gatuno fugisse? Você entendeu? Acredito que não. Eu também não tenho como fazer entender isso. É que, realmente, não tem como se entender uma coisa dessas. Não tem lógica. Não faz sentido.


É que, se os sul-africanos devolverem Chang à Moçambique, a humanidade estará doente. Os Infulenes serão poucos para tanta demanda. E aí os sãos serão, de facto, aqueles que hoje pensamos que roubaram o nosso dinheiro. Afinal, seremos nós os ladrões. Talvez até, muito possivelmente, os vizinhos parem de fumar suruma de vez. 


- Co'licença!

quarta-feira, 20 fevereiro 2019 07:02

Advogados fosfóricos

Corvo onde não é conhecido chamam-lhe pato. Pois é, pessoal. Uma coisa é você ser um grande lambe-bota, daqueles reconhecidos na praça, com língua flexível e peluda, que faz o seu trabalho como ninguém, e outra, bem diferente, é você ser chamado a exercer aquela profissão que você tem diploma. Ou seja, uma coisa é você atrapalhar a opinião pública, fazendo-se passar por grande sábio, e outra é você ter que trabalhar mesmo, mostrar o que você aprendeu na escola e na vida. Uma coisa é você andar a cantar por aí que é advogado e outra, bem diferente, é você mostrar com A+Bê que você é advogado de verdade. 


Não é fácil. Enquanto o mundo está roer unhas para saber até onde o seu cliente está metido neste crime financeiro que deixou o país de tanga, você aparece a falar de um pudim contaminado com pesticidas orgânicos fosfóricos que a família dele, por sorte, não comeu. As pessoas querem saber como o seu cliente recebeu as "galinhas" e você fala da irmã dele que foi assassinada pelo marido. O público quer saber onde está o dinheiro que seu cliente roubou e você traz uma conversinha de esconde-esconde que se joga lá no partido que até bem pouco tempo o pai dele era chefe. Isso é burrice ou é mesmo a arte da atrapalhação?


Mas também, em abono da verdade, não se sabe se esses advogados têm mesmo experiência em crimes financeiros. É que malta Krause estavam à altura da coisa. Agora endossar um amigo que trabalha apenas com processos de fofoca, de divórcio, de compra e venda de "Honda-Civic" e de dependências tipo-um na Malhangalene pode não ajudar muito. 


Mas, prontos, seja como for, o que me deixa feliz, neste momento, é aquele gatuno diabético, que alugou uma casa ali na fronteira, mas que não pode viver nela porque está quase a embarcar. Isso é confortante. Esses advogados fosfóricos já não me atrapalham mais. Seriam tristes, se não fossem cómicos. 


- Co'licença!

segunda-feira, 18 fevereiro 2019 06:20

Um "Indivíduo" inexaltável

Ahhh, porque vou combater o espírito de deixa-andar. 
Ahhh, porque vou acabar com o cabritismo. 
Ahhh, porque vou erradicar a pobreza absoluta. 
Ahhh, porque vou eliminar o espírito de mão estendida. 
Ahhh, porque a pobreza está nas nossas cabeças. 
Ahhh, porque vou desenvolver o país com jatrofa. 
Ahhh, porque vou melhorar a vida dos moçambicanos com revolução verde. 
Ahhh, porque um aluno uma planta, um líder uma floresta é bom. 
Ahhh, porque com Ematum vamos comer e vender muito peixe de primeira. 
Ahhh, porque com a Proindicus vamos defender a nossa costa.
Ahhh, porque o carro "Madjedje" vai catapultar a nossa indústria automóvel. 
Ahhh, porque o aeroporto de Nacala vai trazer eficiência no tráfego aéreo internacional.
Ahhh, porque com carvão vamos fazer isto, com gás aquilo e com petróleo aquiloutro. 


Ahhh, porque quem não gosta da minha governação é apóstolo da desgraça. 
Ahhh, porque manifestação é coisa da mão externa. 
Ahhh, porque temos que ter auto-estima. 
Ahhh, porque enquanto o cão ladra, a caravana passa. 
Ahhh, porque vou plantar bonecos de Samora em todas as cidades. 
Ahhh, porque o distrito é o polo de desenvolvimento. 
Ahhh, porque os 7 bis vão alavancar o distrito. 
Ahhh, porque reitero o meu comprometimento. 
Ahhh, porque temos que exaltar a pátria. 
Ahhh, porque temos que exaltar Mondlane. 
Ahhh, porque eu exalto a minha pátria. 
Ahhh, porque eu luto pela minha pátria. 
Ahhh, porque vocês também deviam fazer o mesmo. 
Ahhh, porque é a mesma pátria. 
Ahhh, porque a liberdade de imprensa e de expressão que vá a p*ta que a pariu. 
Ahhh, porque a sociedade civil que se f*da.
Ahhh, porque o Cambaza bebe vinho de 70 mil por mês. 
Ahhh, porque o Manhenje comeu tako de fardamento de cinzentinhos. 
Ahhh, porque Munguambe pagou bolsas dos filhos com dinheiro do meu inestimável povo. 


E os papagaios, então... 


Ahhh, porque o filho do tio Emílio é um visionário. 
Ahhh, porque ele é o filho mais querido. 
Ahhh, porque ele conhece a dor do seu povo. 
Ahhh, porque ele está preocupado em melhorar a vida do seu povo. 
Ahhh, porque não se negocia duas vezes com o mesmo bandido. 
Ahhh, porque a compra de armas modernas se justifica.
Ahhh, porque a sua vitória foi retumbante, esmagadora e asfixiante. 
Ahhh, porque ele quer ser lembrado como amigo do povo. 
Ahhh, porque isto, porque aquilo. 
Ahhh, porque etecetera, etecetera.
Ahhh, porque bla, bla, bla. 


Afinal, tudo não passava de colóquio flácido para acalentar bovino. Hoje o homem está aí todo bilionário, com cara de rico-coitado, fugindo de si mesmo, desconfiando da própria sombra, se assustando com o próprio peido, com toda a parentada à boca do xilindró e, para piorar, com o país a travar com jantes de segunda-mão. Definitivamente, não dá para se exaltar uma pessoa assim. É inexaltável. 


- Co'licença!

sexta-feira, 15 fevereiro 2019 07:05

O presente que queremos

Olha, o que aconteceu ontem é normal. Dia dos namorados é assim mesmo. Uns preferem oferecer a lua; outros, embrulhar o mundo; há quem ache mais romântico catar as estrelas; há quem goste de oferecer rosas ou bebidas e há quem se contente com "eu te amo". Não há nada de estranho nisso. É o dia do amor. As pessoas querem expressar os seus sentimentos à pessoa que amam e neste São Valentim não podia ser diferente. 



Há indivíduos que gostam de oferecer ou receber presentes estranhos e impossíveis como esses que têm a coragem de oferecer a lua mesmo sabendo que ela [a lua] é de todos. Pode ser estranho para uns, mas há quem goste desse tipo de presentes. Neste São Valentim, uma madame entendeu que devia surpreender o namorado oferecendo quase meia dúzia dos nossos gatunos. Aqueles daquela coleção. Aquela nossa relíquia. 



Assim, o amor está no ar lá em casa. Exaltaram o cupido. É normal. É assim mesmo quando chega esse dia, mas já passou. O dia dos namorados foi ontem. Ontem qualquer loucura era válida: paixão é assim mesmo. 



Hoje é outro dia e estamos "bizis" com o Chang. Queremos saber se Chang sai ou se fica na "djela-house". Queremos saber se Chang será extraditado ou resgatado. Estamos impacientes. Esses gatuninhos que vocês embrulharam ontem que guardem lá mesmo onde estão. Continuem a colecionar, podem servir para o dia da mentira. 



O presente que queremos está na África do Sul, e o nosso desejo é guardá-lo no cofre do primo Trump, com a ajuda da dona Elivera. Por isso, não atrapalhem a doutora. Nada de palhaçadas! Brincadeira tem hora. Hoje é dia 15. 



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terça-feira, 12 fevereiro 2019 06:55

Exaltemos a viagem do Chang

Ahhh, porque Emerson esteve de férias no Brasil e visitou lugares paradisíacos e fantásticos em Angra dos Reis e Arraial do Cabo. Ahhh, porque Samito foi intimado pelo partido e há pretensão de ser expulso da Frelimo. Ahhh, porque o Benfica ganhou dez à zero, mas não viu "gueme" na "Txhampion". Ahhh, porque membros da Renamo, em Sofala, contestam as recentes nomeações de Ossufo Momade. Ahhh, porque Pacheco já disse que Diamantino Miranda não pode trabalhar em Moçambique. Ahhh, porque etecetera, etecetera. 



Exaltemos a viagem do Chang, irmãos. Exaltemos a viagem do Chang e lutemos pela sua viagem. 



Não percamos o foco, irmãos. Samito e Momade que resolvam as suas sinucas lá nos seus partidos. O Emerson que vá à Disney se quiser. O mister Diamantino que vá treinar a décima-quinta divisão de honra de sei-lá-onde e que ganhe prémios. O Benfica que ganhe mais jogos por dois dígitos à zero e que venda os seus jogadores ao Real Madrid. Mas, faxavor, exaltemos a viagem do Chang às Américas. 



Enquanto estamos aqui entretidos, o gatuno vai saindo do xilindró de mansinho e, quando acordarmos, o gajo já estará numa wella em Tchumeni-Dois a tomar chá de moringa com limão em jejum, nas manhãs, enquanto se prepara para ir à reunião do Comité Central, ao mesmo tempo que espera ser nomeado assessor de um ministro qualquer. 



Coisa por coisa. Assunto por assunto. Foco. Estejamos atentos às novas manobras, dia 15 está perto. Agora dizem que não precisam da casa da fronteira, mas pode viver em Joannesburg na casa de uns "bradas" e daqui a nada vão dizer que pode viver na dependência tipo-três de Zuma. Foco, pessoal. Se aquele gatuno for resgatado, perdemos a pescaria toda. Não nos esqueçamos que na sua tribo aquele gatuno é afilhado do rei. É menino. 




Esse apetite de pagar caução é "quali"!? Esse interesse de pagar muito dinheiro para sair sabendo que uns dias depois será exportado, hummm... eu não entendo. 



Estejamos atentos. Exaltemos a viagem do nosso ladrão. Eu exalto a viagem do Chang. Eu luto pela viagem do Chang. Você também devia fazer o mesmo. É o mesmo Chang. O Samito tem a mãe dele. O Benfica tem os seus adeptos. A Renamo tem os seus membros. Nós não temos ninguém, nem na nossa própria justiça podemos confiar. Se não ficarmos atentos, vão nos dar "djoló". 



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sexta-feira, 08 fevereiro 2019 06:36

Felizmente, mas também infelizmente

Juma Aiuba

FELIZMENTE, já tomaram posse os Presidentes dos Conselhos Autárquicos eleitos. Falo daqueles candidatos que foram verdadeiramente eleitos pelo povo, com voto verdadeiro no boletim de voto, numa urna verdadeira e com edital também verdadeiro. Falo de voto limpo. Urna limpa. Edital limpo. Falo desses Presidentes legítimos que tomaram posse para cumprirem os seus manifestos eleitorais que foram legitimamente eleitos pelos munícipes. 



Mas também, INFELIZMENTE, tomaram posse os pseudo-presidentes. Falo dos presidentes falsos, dos presidentes artificiais, dos presidentes piratas. Falo daqueles presidentes dos Conselhos Autárquicos que, na realidade, são candidatos derrotados. Aqueles que viraram presidentes graças aos atletas contratados que conseguiram correr e fugir com urnas e editais. Aqueles presidentes que tiveram "mais" votos na urna do que eleitores inscritos nos cadernos eleitorais. Falo daqueles candidatos que viraram presidentes graças às armas e cassetetes da FIR. Falo igualmente daqueles presidentes que são fruto dos cortes de energia e da escuridão. Aqueles que começaram a vencer o escrutínio na calada da noite.



Também falo daqueles presidentes que, em última instância, foram apadrinhados pela Cê-Ene-É e pelo Cê-Cê. Aqueles que tiveram dois resultados de apuramento diferentes. Aqueles cuja vitória foi parida por via de votos no gabinete. Aqueles que perderam na mesa, mas ganharam no acórdão. Aqueles que mandaram plantar blindados nos quintais dos seus oponentes. Não vou esquecer aqueles presidentes que não tiveram adversários. Aqueles cujos adversários foram antecipadamente derrotados pelos órgãos de gestão eleitoral e pelo poder judiciário, como aqueles meninos mimados que não sabem jogar, mas que devem jogar e ganhar a partida porque são os donos da bola. 



Tomaram posse presidentes de todos os tamanhos e feitios. O azar é que, quando estão juntos, é difícil distinguir uns dos outros. É difícil saber quem é quem. A sorte é que o povo sabe a quem votou e eles sabem que o povo sabe. Assim que entraram nos gabinetes já estão a tremer sozinhos. Não têm planos, porque nunca tiveram projectos. O que resta agora é fingir que estão a trabalhar, enquanto montam filósofos e sentinelas de plantão na imprensa e nas redes sociais para digitarem o "enter" e activarem o modo insulto, hossana e aleluia durante os cinco anos de mandato que se seguem. O que se segue é confundirem a opinião pública, as vezes, atribuindo obras do governo central a esses pseudo-edis. O que se segue é a exaltação de tudo no meio do nada. 



O povo sabe das coisas. Assim como o "ministro das dívidas ocultas", esses também são "presidentes das urnas ocultas". São gatunos também. Um dia desses vão tomar sumo de maracujá ali na vizinhança, felizmente, mas também infelizmente. 



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quarta-feira, 06 fevereiro 2019 08:58

A pessoalização do Eme-Dê-Eme

É preciso ficar claro para os irmãos Simango, o Daviz e o Lutero, que foram eles que mataram o partido Eme-Dê-Eme. Quando começaram as desavenças entre o falecido Mahamudo Amurane e o Eme-Dê-Eme, escrevi algures que era eminente a cisão naquele partido. Disse isso porque em nenhum momento houve um pronunciamento institucional do partido sobre o caso. Ou seja, o caso foi gerido pelos irmãos Simango como pessoal. Se se lembram, só se mandavam farpas na imprensa. Se chamavam cobras e lagartos na imprensa até o desaparecimento físico do edil. 



Depois do assassinato de Amurane, o que se seguiu foi o descalabro que todos vimos. Iniciou-se um processo de parcerias com a Frelimo que culminaram com um festival de perseguições sem cabimento. Ao invés de fazer uma introspecção, o Eme-Dê-Eme preferiu disparar para tudo quanto é canto, acabando, por vezes, em dar tiros no próprio pé. Depois disso, vimos o que vimos: membros influentes saindo a voar do Eme-Dê-Eme, com sensação de liberdade, como se estivessem numa gaiola, anemia nas fileiras e derrotas eleitorais de retumbâncias inimagináveis. 



Dizia eu, nessa altura, que o comportamento dos irmãos Simango fazia-nos acreditar na versão da história sobre o seu pai contada pela Frelimo. E parece que foi isso que Afonso Dhlakama descobriu no Daviz a ponto de lhe afastar como candidato da Renamo a edil da Beira. Provavelmente, Dhlakama descobriu essa forma pessoalista e casmurra de ser de Daviz. Pessoas como os Simangos não têm lugar na Frelimo, nem hoje nem ontem. 



Daviz pode ser um bom gestor público, mas temos de assumir que o homem tem problemas sérios de aceitar ideias diferentes. Definitivamente, Daviz não gosta de ser contrariado. Digere a crítica com bastante dificuldade. Ele leva tudo para o lado pessoal. E isso não é bom para um líder. Liderança é capacidade de engolir sapos; é aceitar a liberdade da diferença; é saber gerir expectativas. 



Esse complô contra o Manuel de Araújo era desnecessário. Não precisava descer tanto. Há coisas que só põem os outros mais fortes. A vingança mata o carácter. Eme-Dê-Eme já foi uma alternativa, mas hoje nem parece que algum dia existiu. 



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segunda-feira, 04 fevereiro 2019 10:21

Os heróis de hoje em dia

Se não fosse a Polícia, muita gente não saberia que o CIP estava a promover uma campanha denominada "Eu Não Pago Dívidas Ocultas" com direito a uma camisete mahala e um vídeo de bacela no "Feicibuki". Muito provavelmente, se o regime tivesse visto aquela campanha como um exercício de liberdade de expressão qualquer, consagrado na Constituição da República, a campanha nem teria a repercussão que teve. Se tivesse considerado como uma campanha de combate ao Aga-I-Vê, num primeiro de Dezembro qualquer, ou como uma campanha "lixo no chão, não" na praia da Costa do Sol, num desses domingos quentes, o CIP não estaria a granjear essa simpatia toda. É verdade isso! Muitas pessoas não conheceriam a Fátima Mimbire nem o Borges Nhamirre, que são nada mais do que pacatos cidadãos que estão a travar com jantes como milhares de moçambicanos, tirando aqueles da lista dos dezoito-apóstolos-da-Pé-Gê-Ere. Essa campanha nem teria ganho o estatuto de "manifestação" como ficou conhecida. A estas alturas já nem estaríamos a falar mais dela. Mas não, o governo quis escrever em parangonas transformando o assunto numa autêntica epopéia e colocando os seus protagonistas no standard honorífico nacional. 



Por exemplo, eu não sabia que o Parlamento Juvenil estava a organizar um "Combate Cultural dos Excluídos" sobre o julgamento do Chang e a sua esperada e merecida viagem para os É-U-Â. Mas, a nossa Polícia, boazinha que é, correu para me dizer que havia um sarau muito importante no quintal daquela agremiação, promovida por jovens audazes. Foi a Polícia que me informou, em primeira mão, que haviam heróis no Parlamento Juvenil. Graças a Pé-Ere-Eme, todo mundo ficou a saber dessa iniciativa e aqueles jovens protagonistas transformaram-se, em fração de segundos, em heróis e a autoridade repressiva do Estado, em vilã. 



O regime está a criar heróis sem se aperceber transformando anões em gigantes e magumbas em atuns. Quem era Amade Abubacar? Um jornalista "invisível" que, graças ao regime, virou herói. Quer queiramos quer não, os Salemas, os Macuanes, os Nhamirres, os Matiases, os Castel-Brancos, os Nuvungas, os Cortêses, as Fátimas, etecetera, desta vida - simples cidadãos usufruindo das suas liberdades constitucionais - hoje estão legitimamente nas "criptas" da opinião pública como os melhores filhos desta pátria. Não mataram nenhum colonialista, nem escreveram nenhum poema de combate, mas são mais heróis do povo do que certos "erróis" ainda viventes amigos de Mondlane. Até a senhora Elivera Dreyer, uma procuradora distrital desconhecida lá das bandas de Joannesburg, que, por causa do nosso aparelho de justiça lerdo, virou a nossa heroína-revelação. 



Na realidade, a acção do regime hodierno é um fermento de heróis anónimos. De cagada em cagada, a nossa Polícia e o nosso judiciário vão lapidando heróis. Produção de heróis em série, diria Henry Ford. O regime virou uma máquina de fazer heróis, assim como uma pipoqueira. Hoje para ser herói não custa: é só dizer que não vai pagar as dívidas ocultas ou que prefere que Chang seja extraditado para os "Estaites" ou que as decapitações em Cabo Delgado devem acabar, que prontos, num instante, a Polícia chega para te espancar e o povo te aclama herói. Para ser herói basta exercer o seu direito de cidadania. E, no fim das contas, os heróis de hoje em dia somos todos nós e homenageamo-nos todos os dias. 



A heroicidade da nossa Pátria A(r)mada está sendo mecanicamente vulgarizada e as criptas, massificadas. Essas criptas do povo são as mais legítimas do que aquelas das praças. Arrisco dizer que somos o país com mais heróis por metro quadrado da actualidade. A tentativa de hostilizar os actos e as pessoas, acaba-se promovendo involuntariamente. Infelizmente, é este o efeito perverso da repressão: a publicidade e a revelação de destemidos. Tradicionalmente, isso sucede quando o Estado não conhece os seus termos de referência: começa a ver fantasmas onde não tem; paranoia institucionalizada. 



- Co'licença!

Confesso que já estou a ficar preocupado com os gastos que o Manuel Chang está a fazer. Já começo a me perguntar se vai sobrar alguma coisa na conta quando o homem estiver a bazar para os "Esteites". Não sei quanto custa malta Rude Krause, mas os gastos desses trinta dias de prisão já começam a me preocupar. Fora os Krauses, que de certeza não são para bolsos humildes, existe uma casa alugada em Malelane, Mpumalanga, que também não deve ser barata. Numa pesquisa rápida que fiz pela net, a compra de uma casa do tipo que foi mencionada em tribunal, numa quinta naquelas bandas, pode variar entre 300 à 500 mil dólares. Estamos a falar de 20 à 30 bis. Arrendar também não é para qualquer vivente. Aquela zona é uma das mais caras do continente africano.



Então, isso já começa a me preocupar. Me preocupa porque, até prova em contrário, as coisas do Chang são nossas. Ou seja, por enquanto, aquilo que Chang adquiriu nos últimos quinze anos é do povo. É preciso recordar que Chang foi Ministro das Finanças por dez anos e que além do calote das dívidas ocultas, existe também a burla da Odebrecht no aeroporto de Nacala. E pode ainda existir muito mais dinheiro do povo nas balalaicas daquele "chinês" que precisa ser devolvido aos legítimos donos. Mas enquanto ele continuar a gastar desta maneira, não vai sobrar um tostão de metical para contar o filme. 



Parece paulada, mas não é. É preocupação mesmo. O descaso do Chang com os gastos pode ser uma sabotagem também. Não vejo a racionalidade dele querer aguardar pelo esperado e merecido embarque numa casa com jacuzzi, sauna, piscina, campo de golfe, vista para os riachos e montanhas, canto de passarinhos, etecetera. É que essa é vida de ricos, e ele acabou de dizer, na semana, em tribunal, que é um "Indivíduo" de saldos modestos. Por que é que ele quer gozar da boa vida sabendo que será ou extraditado ou resgatado daqui a pouco? 



Se, na primeira audição, o Chang tivesse começado logo com "olha, bradas, eu não quero vos dar muito job... nós levamos essa mola... malta indivíduo-G e companhia estão lá em Maputo... eu posso vos acompanhar para pegarem os gajos... desculpa lá, pessoal!...", as coisas estariam bem facilitadas. Hoje não estaríamos a falar de malta Krause, nem de diabetes, nem de vivendas arrendadas. Sei que Chang tem seus bens, mas atenção, deixemos que seja o tribunal a decidir o que é verdadeiramente dele e o que é nosso. E até lá, haja moderação, camarada prisioneiro ainda imune. 



- Co'licença!

quarta-feira, 30 janeiro 2019 06:49

Um Direito muito esquerdo

Quando tudo isso começou eu pensava que era brincadeira. Pensava que era só prenderem o Chang, empacotarem o gajo para os "Esteites", encontrar o juiz William de Nova Iorque, mandar chamboquear o gajo, o gajo falar quem são os bradas dele e depois arrumarem o homenzinho num quarto do quinto-dos-infernos "foreva". 



Pensava que depois de prenderem o Chang seria tudo moleza. Mas me enganei. A prisão do Chang baralhou o Estado todo. O Chang está mais poderoso dentro do que fora. Aumentou a sua cotação na bolsa. Valorizou muito. Quem não conhecia o Chang agora já conhece pelos piores motivos e ocasião. Chang parece El Chapo e o Estado parece os seus capangas tentando o resgatar da bófia. Se me disserem que a Pé-Gê-Ere ou o Tribunal Supremo ou a Comissão Permanente está a cavar um túnel clandestino de Ressano à cadeia de Modderbee, em Joannesburg, para roubar o Chang de lá, confesso que não me espantarei. 



Hoje, a Constituição da República é um livro poético e o Direito, patético. Devia-se transformar a Faculdade de Direito da Ú-É-Eme em ateliê de escovas e graxas. Acho que é esta a mensagem que vem da "Comissão dos Mercedes Benz da Dignidade" da Assembleia da República. Hoje a própria Comissão, que devia ser exímia entendedora da legislação, não consegue interpretar uma placa "não deitar lixo aqui". Infelizmente. 



Os recentes episódios da história deste país parecem contos de "stand up comedy" ou filmes de Pablo Escobar. Atingimos o píncaro da leviandade e da falta de carácter. O auge da cara-de-pau. Conseguimos colocar um biltre acima da lei. É o nosso Direito curvando torto para a esquerda - o apogeu da corrupção do Estado. E nós merecemos isto - o que é pior - infelizmente. 



Sobre este assunto fico por aqui. Nada mais tenho a acrescentar. Por falar em acrescentar, dizem que há gajos que já estão a bater suruma misturada com gonazololo. Alguém já experimentou? 


- Co'licença!

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