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Política

Os registos de venda de madeira moçambicana à China mostram disparidades entre os valores declarados à saída e os declarados à chegada do produto. Especialistas alertam para falta de transparência e possível subfacturação.

 

Entre 2016 e 2018, Moçambique não terá registado 793.526,92 mil USD de exportações de madeira para a China. No período considerado, a China declarou ter importado, de Moçambique, 895.796,21 mil USD em madeira, contra os 102.269,29 mil USD declarados por Maputo. A informação consta da base de dados do Banco Mundial (BM) sobre comércio internacional.

 

Por ano, em 2016, segundo o Banco Mundial, a China declarou ter importado 308.465,65 mil USD contra os 25.448,88 mil USD que Moçambique revelou ter exportado, uma diferença de 283.016,77 mil USD.

 

No ano de 2017, as importações chinesas fixaram-se nos 311.142,93 mil USD, ao passo que Moçambique apresentou exportações avaliadas em 51.143,83 mil USD, o que perfaz uma discrepância de 259.999,10 mil USD.

 

Já em 2018, a China apresentou um volume de entrada de madeira na casa dos 276.187,63 mil USD, enquanto Moçambique reportou 25.676,58 mil. A discrepância situou-se em 250.511,05 mil USD.

 

Os números do Instituto Nacional de Estatística (INE), relativos à exportação de madeira para a China, aproximam-se dos dados compilados pelo Banco Mundial. Diz o INE que, em 2017, foram exportados para a China 59,2 milhões de USD de madeira. Em 2018, esse valor fixou-se nos 31,5 milhões. Dados já disponíveis de 2019 colocam a exportação, nesse ano, na casa dos 35,5 milhões de USD.

 

A exportação de madeira é feita, fundamentalmente, pelos portos de Nacala e Beira. As disparidades deixam antever que Moçambique poderá ter perdido receitas fiscais.

 

Face às discrepâncias, o economista sénior da Global Financial Integrity (GFI), Rick Rowden, admite erros no processo de declaração, mas afirma que os números sugerem práticas ilícitas.

 

“Esses erros representam apenas uma parte das discrepâncias identificadas e a maioria das incompatibilidades [são], provavelmente, devido ao facturamento incorrecto da transacção – falsificação dos preços declarados nas facturas de importação ou exportações submetidas às autoridades aduaneiras, para fins ilícitos de transferência de fundos dentro ou fora de um país”, explica.

 

De acordo com Rick Rowden, “quando uma diferença de valor é identificada nos dados comerciais bilaterais entre dois países, conforme é feito, a diferença total é composta por centenas ou milhares de lacunas menores encontradas em transacções individuais entre vários importadores e exportadores de ambos os países”.

 

Para Rowden, é difícil perceber de que lado estão os eventuais erros que levam às discrepâncias. “A diferença de valor pode ser indicativa de facturamento incorrecto. É difícil saber de que lado [China ou Moçambique] está o facturamento comercial incorrecto ou em quanto”, complementa.

 

Opacidade

 

O contrabando também poderá estar a afectar o sector madeireiro em Moçambique. Dulce Brás, coordenadora de monitoria e avaliação da Associação de Apoio e Assistência Jurídica às Comunidades  (AAAJC), revela que na província de Tete foram reportados vários casos de contrabando de madeira da espécie Nkula para países vizinhos, como Zâmbia e Zimbabwe, onde a mesma era colocada em contentores, que voltavam a entrar em Moçambique, através de esquemas de facultação de certificados internacionais.

 

“Em Tete, existem vários estaleiros e serrações nas proximidades de áreas de conservação, uma situação que facilita o abate de espécies de madeira até protegidas por lei”, afirmou Dulce Brás.

 

Para Dulce Brás, a fiscalização precisa de suporte a todos os níveis, principalmente ao nível da fiscalização interna. Um dos grandes problemas da indústria extractiva de madeira é a corrupção, envolvendo fiscais e tomadores de decisão.

 

Soluções

 

Para tornar o sector madeireiro mais transparente, o engenheiro florestal Luís Nhamucho defende a aposta na informatização, a par da realização de inventários detalhados.

 

“O governo tem uma oportunidade de ser mais contundente, mas não houve uma entrega desejada. O governo deve definir quem é madeireiro e quem não é, mesmo que seja para refazer certas coisas que foram acordadas. O executivo moçambicano deve informatizar o sector, porque sem isso, mesmo que haja vontades e projectos, nada será feito”, defendeu Nhamucho.

 

Olinda Cuna, coordenadora de programas florestais na Livaningo considera fundamental digitalizar o sector e dar formação a fiscais e comunidades.

 

“É de vital importância que se digitalize o sector e adquira-se novas tecnologias e formação dos fiscais e das comunidades, para estancar o problema da fraca fiscalização”, entende Olinda Cuna.

 

Sobre este tema, procurámos ouvir a Autoridade Tributária (AT), a Embaixada da China em Moçambique, os Serviços Nacionais de Florestas e o Banco de Moçambique, mas até ao fecho desta edição não foi possível obter qualquer reacção destas entidades.

 

“Carta” procurou também ouvir Sérgio Chacate, presidente da Associação Moçambicana dos Madeireiros (AMOMA), tendo inclusive até marcado a entrevista e o explicado os objectivos da reportagem, mas chegada a hora, Chacate simplesmente não quis falar e nem remarcou a entrevista perante nossa insistência. 

 

Comércio de madeira entre Moçambique e China: 2016 – 2018

 

Em milhares USD

 

China

Moçambique

Diferenças

 
 

2016

 $  308 465,65

 $  25 448,88

 $  283 016,77

 
 

2017

 $  311 142,93

 $  51 143,83

 $  259 999,10

 
 

2018

 $  276 187,63

 $  25 676,58

 $  250 511,05

 
 

Total

 $  895 796,21

 $  102 269,29

 $  793 526,92

 

 

Esta reportagem foi produzida por “Carta de Moçambique”. Foi escrita no âmbito do programa Riqueza das Nações, uma iniciativa de desenvolvimento de capacidades dos media, implementado pela Fundação Thomson Reuters, em parceria com o MISA-Moçambique. Mais informações em www.wealth-of-nations.org. O conteúdo é da inteira responsabilidade do autor e da editora. Omardine Omar

Acusações, desmentidos e declarações contraditórias são as palavras que fielmente descrevem o segundo dia do julgamento do caso “LAM-Executive”, que tem no banco dos réus António Pinto, Hélder Fumo e Sheila Temporário. Três, dos cinco declarantes ouvidos pelo Tribunal, limitaram-se em acusar, desmentir e contradizer-se nos depoimentos prestados.

 

Esta quinta-feira, o juiz Rui Dauane ouviu Faizal Sacurgy (à data dos factos Administrador do pelouro Comercial e Sistemas de Informação), Adil Ginabay (actual chefe do departamento de Marketing), Norberto Mucopa (chefe do Gabinete de Comunicação Institucional), Alfredo Cossa (integrante do Gabinete de Comunicação Institucional) e Ivo Munguanhe (contabilista).

 

Faizal Sacurgy, a quem António Pinto acusou de ter inviabilizado a sua gestão, no período em que esteve à frente das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), foi primeiro a ser ouvido pelo Tribunal. E as declarações foram aterradoras e até com retoques de ajuste de contas antigas. Sacurgy começou por dizer que o reu António Pinto faltou com a verdade ao afirmar que não havia capacidade humana e técnica para desenvolver os serviços que mais tarde passaram a ser prestados pela Executive Moçambique Limitada.

 

Faizal Sacurgy disse que foi desde à primeira hora contra a entrada da Executive na área da Comunicação Institucional e no Marketing da companhia aérea de bandeira porque esta possuía quadros capazes e que faziam os trabalhos, ainda que não na perfeição que se pretendia.

 

Sacurgy anotou que também se opôs à entrada daquela firma para estes dois sectores (Comunicação e Marketing), precisamente porque os valores que a Executive cobrava pelos serviços prestados eram elevados e a LAM não dispunha de capacidade financeira para arcar com os custos. Sublinhou que os valores eram “demasiadamente altos” e que até as multinacionais não teriam capacidade para horar com as obrigações, quanto mais as Linhas Aéreas de Moçambique.

 

A LAM firmou, tal como referem os autos, dois contratos com a Executive Moçambique Limitada. O primeiro de quatro meses (em que a LAM pagava por mês 1.710.000.00 MT) e o segundo de 12 meses que, entretanto, não foi cumprido na íntegra, em que a companhia pagava por mês 2.340.000.00 MT.

 

Por ter entrado em “vaca fria” com o antigo PCE, no caso António Pinto, Sacurgy revelou que chegou mesmo a não assinar algumas actas de reuniões com Executive, num primeiro momento, e, tempo depois, optou mesmo por não tomar parte das mesmas.

 

Na última segunda (primeiro dia do julgamento do caso LAM-Executive), António Pinto contou que a ralação com Faizal Sacurgy (administrador comercial) azedou quando ele gorou a pretensão deste último de, em simultâneo, exercer as funções delegado da LAM na África do Sul. António Pinto disse, igualmente, que Faizal Sacurgy chegou mesmo a desautorizá-lo em reuniões com os trabalhadores da empresa.

 

Faizal Sacurgy é o administrador delegado da LAM que, em 2016, viveu no Hotel Cardoso, tal como escreveu à data um semanário da praça, numa suíte onde a empresa pagava 14 mil meticais por dia. Sobre estes factos, Sacurgy disse que a sua estadia lá foi suportada por um acordo de parceria que aquela estância hoteleira de luxo da praça firmara com a LAM e não envolvia pagamentos em dinheiro, mas sim uma troca de serviços, no quadro da revista Índico.

 

Por seu turno, Adil Ginabay deitou por terra argumentos de Faizal Sacurgy sobre o mérito e a oportunidade da parceria com a Executive Moçambique. Ginabay disse que a Executive ajudou a LAM com os trabalhos e que a companhia de bandeira, à data da entrada daquela empresa de comunicação, não tinha capacidade humana e nem técnica para desenvolver trabalhos que aquela empresa de Comunicação e Marketing fazia.

 

Adil Ginabay disse que o sector de Marketing, onde por sinal trabalha até hoje, várias vezes trabalhou com a Executive em alguns trabalhos (ajudou a fazer artes finais, serviços de publicidade, equipamentos de filmagens entre outros) e que este sector muitas vezes recebeu trabalhos da empresa retromencionada.

 

Ginabay chegou mesmo afirmar que não conhecia no país uma empresa do Grupo A com capacidade para desenvolver trabalhos de publicidade sem recorrer aos préstimos de uma agência de publicidade especializada. 

 

Sobre os contratos celebrados ente LAM e Executive, Adil Ginabay disse que pouco sabia sobre os mesmos e que só veio tomar ciência da sua existência muito mais tarde e no decurso de reunião, no entanto, na superficialidade. Nisto, disse ao juiz que muito pouco poderia elaborar à volta dos referidos.

 

Por outro lado, Norberto Mucopa, hoje chefe do departamento de Comunicação Institucional da LAM, disse que apenas sabia da existência do contrato que foi firmado para produção da revista de bordo, a Índico. Os restantes dois nunca souberam da sua existência até à entrada da nova direcção liderada por João Carlos Pó Jorge.

 

Norberto Mucopa, apesar de ter tecido rasgados elogios ao seu antigo PCE (António Pinto), disse que António Pinto nunca colocou a corrente os trabalhadores do departamento de Comunicação Institucional (direcção que responde ao PCE) da existência da relação com a Executive, no domínio da comunicação.

 

Contrariando a narrativa de António Pinto segundo a qual a Executive trabalhava directamente com o departamento de Comunicação Institucional, Mucopa disse que o gabinete (hoje departamento), à data dos factos, nunca chegou a encomendar qualquer trabalho junto daquela firma. Disse que a Executive não chegou a fazer qualquer trabalho para o gabinete.

 

Mucopa avançou ainda que o gabinete tinha a capacidade para cuidar da Comunicação Institucional da LAM, desmentindo, uma vez mais, António Pinto que no primeiro dia do julgamento afirmara categoricamente que não tinha capacidade humana e muito menos técnica.

 

Num outro momento, Norberto Mucopa afirmou que os únicos trabalhos que viu da Executive, isto tempo mais tarde, foram alguns cliping´s (recortes de notícias publicadas nos meios de comunicação social sobre LAM). Embora sem especificar os anos e muito menos a duração, Mucopa disse que a Intercapus Moçambique já prestou serviços na área da comunicação e embolsava 500 mil por mês.

 

Sobre os dois contratos firmados com a Executive, o actual chefe do departamento da Comunicação Institucional tomou ciência a 9 de Agosto de 2018, quando a direcção de João Carlos Pó Jorge foi confrontada com a existência de facturas em atraso na ordem dos 8 milhões de meticais, relativas aos serviços prestados por aquela agência de comunicação. A nova direcção, tal como disse Mucopa, chegou a acordo com a Executive, na pessoa de Sheila Temporário, que culminou com a redução do valor, tendo pago, ao todo, 1.200.000 meticais. (Ilódio Bata)

Os declarantes estrageiros vão mesmo ser ouvidos via videoconferência. Assim determinou, esta quarta-feira, o juiz Fernando Macamo que julga o “Caso Embraer”, que tem no banco dos réus Paulo Zucula, José Viegas e Mateus Zimba.

 

Fernando Macamo colocava, assim, um ponto final às divergências levantadas na última segunda-feira, quanto à materialização de tal modalidade, à luz do ordenamento jurídico moçambicano.

 

Apesar da decisão favorável do juiz da causa, os advogados Abdul Gani e Damião Cumbane pediram tempo para apreciar os argumentos que sustentam a decisão daquele magistrado judicial. Depois de apreciar e uma vez não concordando com os argumentos que vêm vertidos no despacho, anotaram os advogados, tempestivamente irão interpor um recurso. Abdul Gani e Damião Cumbane são defensores oficiosos de José Viegas e Paulo Zucula, respectivamente.

 

Entretanto, o Ministério Público (MP) concordou “à letra” com os argumentos e a decisão do juiz da causa, ressalvando que ouvir os declarantes estrangeiros ajudaria, invariavelmente, o tribunal a chegar à verdade material.

 

De acordo com o calendário tornado público, as audições via videoconferência devem, a princípio, arrancar no dia 19 do corrente mês. Entretanto, esta quarta-feira, o juiz Fernando Macamo, precisamente quando se inteirava sobre o estágio das convocatórias enviadas via correio electrónico para os declarantes estrageiros, foi informado que apenas “algumas pessoas” haviam respondido satisfatoriamente.

 

Ficou, igualmente, a saber que algumas convocatórias enviadas, semana passada, ainda permaneciam sem qualquer resposta. Ou seja, haviam já sido enviadas aos declarantes, mas estes, por sua vez, até ontem não tinham ainda acusado a recepção e muito menos manifestado a prontidão para prestar os depoimentos. O expediente convocatório está sendo tramitado pelo Tribunal Supremo (TS).

 

A lista dos declarantes estrangeiros é composta por executivos e ex-executivos da construtora brasileira de aeronaves, a Embraer, que negociaram as duas aeronaves E-190 com as Linhas Aéreas de Moçambique (LAM).

 

Para fazer vincar o seu argumento da ausência de qualquer ilegalidade com a operacionalização da audição via videoconferência, Fernando Macamo apoiou-se no Código do Processo Civil e na convenção jurídica internacional sobre matéria penal.

 

Macamo apontou estes dois instrumentos como sendo o suporte legal para que as audições via videoconferência tenham lugar. No que respeita à convenção jurídica internacional sobre matéria penal, Macamo disse que o instrumento (resolução) foi ratificado pela Assembleia da República.

 

A convenção sobre o auxílio judiciário internacional em matéria penal, que vincula a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), é outro sustentáculo apresentado por Fernando Macamo para fazer vincar a tese de que os declarantes estrangeiros vão definitivamente ser ouvidos pelo tribunal.

 

Entretanto, Macamo atirou que o ex-director de vendas para África da Embrear, Patrice Candaten, não poderá ser ouvido ao abrigo da Convenção sobre o Auxílio Judiciário Internacional em Matéria Penal, precisamente por possuir a nacionalidade francesa.

 

Esta quarta-feira, o Tribunal praticamente completou a audição dos cidadãos nacionais arrolados pelo MP. A primeira a ser ouvida foi a esposa de Paulo Zucula, Vitória da Silva Pereira, que, em termos práticos, não chegou a ser ouvida. Vitória Pereira disse ao Tribunal que não estava em condições de prestar o seu depoimento porque estava abalada emocionalmente com a situação por qual passa o seu cônjuge. Perante o pedido e depois de alguma insistência à mistura, Fernando Macamo dispensou a esposa do antigo ministro dos Transportes e Comunicações, que deixou a sala debulhando-se em lágrimas. Aliás, logo que se sentou no banco para prestar declarações, a esposa do ex-ministro desatou em lágrimas e piorou quando foi questionada se conhecia os três réus.

 

O outro dispensado foi Felisberto Navalha, administrador do Banco de Moçambique. Navalha foi dispensado porque será ouvido pelo Tribunal na qualidade de perito e, tal como preceitua a lei, nessa qualidade só pode ser ouvido despois de esgotadas as testemunhas ou os declarantes.

 

Ainda ontem, o tribunal ouviu António Pinto (ex-PCE da LAM); Manuel Ribeiro (antigo director de Serviços Jurídicos da GAPI), Guilherme Pereira Soares (antigo motorista da Sasol) e Fernanda Maria (coordenadora de operações com estrangeiro do Banco Comercial e de Investimentos). (I.Bata)

Mais mercenários russos (Wagner Group) chegaram a Cabo Delgado recentemente para se juntarem aos esforços do Governo no combate ao terrorismo, apurou “Carta” de fonte militar. “Os novos homens vão fazer mais do que usar tecnologia (drones). Eles vão ao terreno” disse a fonte. A ajuda militar russa tem sido uma aposta clara do Governo. Para além de homens para combate, equipamento militar tem chegado da Rússia. De acordo com o Africa Intelligence, no passado dia 23 de Fevereiro, um Antonov russo aterrou em Nacala trazendo uma carga militar, incluindo outro helicóptero para se juntar ao que foi trazido em Setembro passado.

 

O Antonov An-124 voou do Aeroporto Internacional Baikal, de Ulan-Ude, na Sibéria, perto da Fábrica de Aviação Ulan-Ude que monta helicópteros Mi-17. O voo foi operado pela unidade militar estatal russa 224 Flight Unit. (Carta)

Continua a preocupação dos cidadãos sobre uma provável propagação do coronavírus pelo território nacional, desde que a vizinha África do Sul confirmou, no passado dia 05 de Março, o primeiro caso de infecção por esta doença, surgida na China, em Dezembro passado. Até à tarde de ontem, o Ministério sul-africano da saúde tinha confirmado 13 casos de contaminação pelo Covid-19, todos importados (indivíduos que estiveram em países que já registaram infecções por esta doença).

 

A preocupação não é para menos! A África do Sul é o país africano com quem Moçambique regista maior fluxo migratório, por um lado, devido às elevadas trocas comerciais entre as duas nações – quase que o mercado moçambicano é abastecido pelas pharmas e indústrias sul-africanas, sobretudo para os produtos alimentares – e, por outro lado, devido ao turismo (destaque para entrada de sul-africanos durante o período pascal e a quadra festiva) e a existência de trabalhadores moçambicanos nas minas sul-africanas.

 

Moçambique e África do Sul partilham, entre si, seis fronteiras terrestres, sendo quatro na província de Maputo e duas na província de Gaza. De acordo com os dados fornecidos pelo Serviço Nacional de Migração (SENAMI), só nas quatro fronteiras existentes na província de Maputo, cerca de 4.000 pessoas saem e entram, diariamente, nos dois países.

 

A fronteira de Ressano Garcia, no distrito da Moamba, é a maior fronteira terrestre do país e regista, por dia, a entrada de uma média de 3.000 pessoas, enquanto a média de saída diária é fixada em 3.600. A fonteira da Ponta D’Ouro, no distrito de Matutuine, regista, por dia, uma média de 300 viajantes em ambos sentidos (entradas e saídas), enquanto a fronteira de Goba, no distrito da Namaacha, regista uma média diária de 150 viajantes. Já a fronteira de Namaacha regista uma média de 250 viajantes também nos dois sentidos.

 

A partir do dia 06 de Abril, as quatro fronteiras da província de Maputo poderão registar maior movimento migratório, com a aproximação do período pascal (a Páscoa será comemorada no dia 12 de Abril), facto que aumenta a preocupação dos cidadãos que, diariamente, vão se inteirando do perigo que a doença representa.

 

Em 2019, a fronteira de Ressano Garcia registou a entrada e saída de 96 mil viajantes, enquanto da fronteira da Ponta D’Ouro passaram 11.118 pessoas. Já em 2018, dos cerca de 167 mil viajantes que atravessaram as fronteiras nacionais durante a Páscoa, 115.500 passaram pela fronteira de Ressano Garcia.

 

Até ao momento, nenhum caso de coronavírus foi identificado, em todo o território nacional, apesar de o país já ter recebido 22 mil pessoas, provenientes de países que já detectaram pelo menos um caso desta doença, segundo o porta-voz do SENAMI, Celestino Matsinhe, falando esta terça-feira, num debate televisivo na STV.

 

Aliás, o Ministro da Saúde, Armindo Tiago, garantiu, semana finda, que o país tem uma equipa em prontidão para dar resposta a uma eventual eclosão do coronavírus no país, assim como tem material de protecção para atender os primeiros 100 casos.

 

O MISAU garante ainda não haver motivos de maior preocupação, pois, os casos até aqui reportados na vizinha África do Sul são importados. Sublinha estar a acompanhar a evolução da situação, sobretudo no que tange à infecção local, ou seja, a contaminação de indivíduos que nunca estiveram em países, onde a doença já foi detectada.

 

Entretanto, nem com as garantias do Governo, os cidadãos não deixam de manifestar a sua preocupação relativamente a este vírus, tendo em conta as fragilidades do nosso sistema de saúde, assim como devido ao precário sistema de transporte, sobretudo nas maiores cidades do país, onde as pessoas são transportadas em condições desumanas. Lembre-se que o período de incubação do coronavírus é estimado em 14 dias e o período de sobrevivência no ar é estimado em 30 minutos. O vírus pode ser transmitido a uma distância de até 4,5 metros.

 

Até esta quarta-feira, o continente africano já tinha reportado 112 casos de infecção pelo coronavírus, distribuídos em 12 países, nomeadamente, Costa do Marfim (um), África do Sul (13), República Democrática do Congo (um), Burkina Faso (dois), Nigéria (dois), Camarões (dois), Senegal (quatro), Togo (um), Egipto (59), Argélia (20), Tunísia (cinco) e Marrocos (um). Há também registo de dois óbitos, um em Marrocos e outro no Egipto.

 

Outro país com quem Moçambique regista um maior fluxo migratório é Portugal que até ao fecho desta edição, já tinha confirmado 59 casos do Covid-19. Aliás, o Presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, está em quarentena domiciliar, depois de as autoridades de saúde terem confirmado um caso de coronavírus num aluno de uma escola que visitou o Palácio Presidencial, semana finda.

 

De acordo com o SENAMI, a companhia aérea portuguesa, TAP, transporta, por semana, uma média de 900 passageiros vindos daquele país europeu e outras 900 pessoas embarcam para as “terras lusas”.

 

Referir que o coronavírus já afectou mais de 118 mil pessoas, em 14 países, e já matou, em todo o mundo, 4.369 pessoas, na sua maioria na China. A Organização Mundial da Saúde declarou, na tarde de ontem, a doença como uma pandemia. (A.M.)

É uma situação que, tal como os ataques – que vêm destruindo vidas, na província de Cabo Delgado, desde Outubro de 2017 – está a deixar as pessoas que trabalham e circulam pelas estradas que cruzam alguns distritos alvos da “barbárie” com um certo desconforto.

 

Em causa está uma suposta “rusga” levada a cabo pelas Forças de Defesa e Segurança (FDS) contra todos os cidadãos residentes nos nove distritos afectados pelos ataques (Macomia, Muidumbe, Quissanga, Palma, Mocímboa da Praia, Nangade, Mueda e Ibo e Meluco), assim como a todos os indivíduos que cruzam aqueles distritos.

 

Uma fonte das FDS confidenciou à “Carta” que a operação visa dificultar a circulação de informações sobre os ataques. Em concreto, garantiu a fonte, o objectivo é impedir que a imprensa e as pessoas saibam sobre a real situação que se vive naquela província do norte do país.

 

Conta a fonte que a “rusga” incidiu, principalmente, nos colaboradores de Organizações Não-Governamentais (ONG), que fazem trabalhos nos referidos distritos. Estes, assegura a fonte, são submetidos a uma vasculha minuciosa e, de seguida, são interrogados. Neste processo, caso se constate alguma mensagem, áudio, contacto “estranho”, grupos de WhatsApp, publicações no FacebookTwitter ou vídeos reportando algo sobre os ataques, o indivíduo é detido.

 

Na semana finda, um grupo de colaboradores de uma ONG viveu um autêntico terror, quando foi interpelado por elementos das FDS, no momento em que seguia viagem para mais um dia de trabalho. Segundo conta um colaborador da referida ONG, as FDS ordenaram que todos os ocupantes da viatura entregassem os telemóveis e os respectivos códigos de segurança.

 

“Ficamos a ser investigados por mais de quatro horas e a perguntarem qual era o nosso objectivo e o que íamos fazer naquela zona”, narrou a fonte, sublinhando estar a ser difícil trabalhar em Cabo Delgado, pois, “para além do medo de sermos atacados, o grande problema está em quem confiar, uma vez que as FDS nos tratam desta forma. Nós estamos a apoiar as comunidades recônditas em diferentes áreas e eles nos fazem isso”, desabafou.

 

A “rusga”, segundo a fonte militar, está em curso também nas fileiras das FDS, onde se desconfia que haja fuga de informação acerca do problema, que já causou mais de 350 óbitos e afectou aproximadamente 160 mil pessoas. Relata haver, inclusive, detenções de militares, devido à suposta fuga de informação.

 

A fonte acrescenta ainda haver problemas de rendição nas forças nacionais. Conta que há alguns meses que não se verifica a substituição de militares no teatro das operações, tal como acontecia no passado.

 

“O cenário não está bom. Triste é ver alguém ser enterrado sem consentimento da sua família. Quem informa a família, basta ser descoberto já era”, afirma a fonte.

 

Refira-se que esta situação surge numa altura em que a Polícia da República de Moçambique (PRM), em Nampula, apresentou 77 jovens, oriundos de diferentes pontos daquela província. Segundo o Secretário de Estado, na província mais populosa do país, Mety Gondola, os jovens eram “recrutas” das fileiras dos insurgentes. Aliás, o Presidente da Assembleia Provincial de Nampula, Amisse Mahando, disse, na semana finda, que “há jovens que saem de Moma para apoiar terroristas em Cabo Delgado”. (Carta)