Passavam poucos minutos das 17:00 horas, desta quarta-feira, quando, depois de várias tentativas, “Carta de Moçambique” conseguiu, finalmente, falar com o Presidente da auto-proclamada Junta-Militar da Renamo, Mariano Nhongo. Ao nosso jornal, na breve entrevista que concedeu, dissipou alguns equívocos: “Eu não posso atacar as bases da Renamo. Eles são meus colegas. Eu não posso atacar os meus colegas porque eles é que me abastecem”.
Mariano Nhongo respondia, assim, a Ossufo Momade, Presidente da Renamo e também Comandante-em-Chefe dos Homens Armados da Renamo, que numa entrevista recente, a um recém-criado canal de televisão da praça, afirmara categoricamente que o presidente da auto-proclamada Junta Militar não tinha capacidade militar para atacar as suas bases.
Para além de retorquir aos pronunciamentos do actual Presidente da Renamo, Nhongo acabou, igualmente, com as dúvidas que subsistiam em torno da logística (militar) de que dispunha o movimento dissidente, a que as forças governamentais atribuem ataques a alvos civis e militares na região centro do país.
Entretanto, a Renamo, liderada por Ossufo Momade, disse, em diversas ocasiões, que não reconhece a auto-proclamada Junta Militar de Mariano Nhongo e que a mesma era já um assunto do Estado.
Adiante, Mariano Nhongo disse que Ossufo Momade não dispunha de qualquer base, de militares e muito menos de material bélico. Tudo quanto existe hoje, anotou Nhongo, é herança deixada pelo falecido líder do partido, Afonso Dhlakama, aos verdadeiros membros da Renamo, grupo do qual não é parte Ossufo Momade.
“O Ossufo (Momade) não tem base. Pergunta a ele qual é a base dele. O Ossufo não tem base, não tem militares e não tem armas. Quem nos deixou as armas é o nosso presidente Afonso Dhlakama. Nós somos a Renamo e o Ossufo é um traidor”, disse Mariano Nhongo.
“Se o Governo não negociar com a Junta Militar haverá guerra”
Num outro desenvolvimento, o Presidente da auto-intitulada Junta Militar da Renamo abordou o controverso processo que deve culminar com o Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) do braço armado da Renamo.
A respeito desse dossier, Nhongo deixou a seguinte certeza: “Se o Governo não negociar com a Junta Militar haverá guerra”.
Mariano Nhongo reagia, assim, ao que chamou do “silêncio do Governo” sobre o documento por eles enviado, onde vêm vertidas as suas reivindicações em torno do processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração da “verdadeira força” da Renamo.
O Presidente da auto-proclamada Junta Militar disse que não há outra via para materialização efectiva do DDR do braço armado da Renamo senão negociar com o grupo por ele liderado, isto porque representavam a verdadeira Renamo e os respectivos anseios.
“Não há desarmamento, não há desmobilização, não há acantonamento sem negociar com a Junta Militar”, disse Mariano Nhongo, para depois ressalvar: “se o Governo experimentar desmobilizar uma base então abriu espaço para guerra. O país vai arder. É só o Governo experimentar desmobilizar uma base. Vai pegar fogo”.
Adiante, Mariano Nhongo negou a autoria dos ataques registados na passada segunda e terça-feira, na província de Sofala, região centro do país. Afirmou, aquele líder, que os ataques não têm “mão” da Junta-Militar e que os mesmos foram perpetrados por “oportunistas”. (Ilódio Bata)
Desde que foi detectado o primeiro caso de coronavírus na China e, recentemente, na vizinha África do Sul, com vários moçambicanos e estrageiros a se deslocarem e a regressarem de países cujo número de casos tem-se mostrado crescente a cada dia, vários departamentos tem estado em vigilância e tem adoptado medidas de protecção para evitar eventuais casos de contaminação.
Até esta quinta-feira, durante a ronda feita pela “Carta” no Aeroporto Internacional de Maputo e no Hospital Geral de Mavalane, embora se tenha verificado um ambiente calmo nos dois locais, era possível verificar os cuidados implementados principalmente no Aeroporto.
Por se tratar de um assunto que está a mexer com o mundo e havendo um perigo iminente de propagação do vírus, tendo em conta o fluxo migratório observado diariamente, “Carta” verificou que, dentre vários cuidados a serem tomados, grande parte dos trabalhadores do Aeroporto leva consigo máscaras e luvas, inclusive alguns passageiros. Em pouco tempo, foi possível também ver o pessoal da saúde trazendo alguns materiais para abastecer o sector, como álcool.
Em alguns pontos de venda era bem visível a comercialização de máscaras, álcool, gel para lavar as mãos. De entre várias inquietações, “Carta” procurou perceber sobre as medidas de quarentena aplicadas para os passageiros provenientes dos países com maior número de casos de coronavírus. Sem se identificar, um agente do Serviço Nacional de Migração explicou que no Aeroporto não existe um lugar específico para colocar as pessoas que devem ser submetidas a quarentena.
“Quando os passageiros desembarcam, são alvo de rastreio pelo pessoal da saúde e os que se suspeita estarem contaminados são encaminhados para o hospital para que sejam testados. Já para os casos de passageiros provenientes de países com grande nível de contaminação, são recomendados a se submeter em quarentena nos locais onde estarão hospedados”, explicou.
Entretanto, a fonte explicou que o rastreio é obrigatório, mas é difícil ter a certeza se as pessoas poderão cumprir com as recomendações do sector da saúde ou não.
“Carta” deslocou-se também ao Hospital Geral de Mavalane para inteirar-se das condições do centro de isolamento, caso ocorram casos de coronavírus no país. Existe uma área restrita onde inclusive parte dos funcionários do Hospital não pode ter acesso e fontes da “Carta” explicaram que o lugar está preparado e todas as salas têm camas para receber quaisquer eventuais casos.
O Centro de Isolamento preparado para receber eventuais casos de coronavírus é o mesmo que serve para responder a eventuais surtos de doenças infecto-contagiosas, como a cólera e o ébola. Com capacidade para 20 camas, neste momento, está equipado com 10 (dez) camas, as instalações estão vedadas e pouco distantes para isolar do recinto do resto do hospital.
Refira-se que, em todo o país, as autoridades da saúde garantem estar a preparar centros de isolamento do género, como medidas de prevenção. (Marta Afonso)
Em caso de agravamento das medidas para conter a propagação da pandemia do novo coronavírus (ou Covid-19), dentro e fora do país, a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) diz que poderá reprogramar a realização da Conferência Anual do Sector Privado, CASP 2020, previamente agendada para os dias 05, 06, 07, 08 e 09 de Maio próximo.
Entretanto, o Presidente da CTA, Agostinho Vuma, mostra-se optimista na realização do evento, que leva à montra uma carteira de diversos projectos avaliados em 25 biliões de USD, devido às recentes acções de desenvolvimento da vacina contra a doença.
“Estamos a analisar. Diz-se que a primeira testagem [da vacina contra Covid-19] irá acontecer até próxima semana, nos Estados Unidos da América. Enquanto vivos a esperança não morre. Assim, a nossa espectativa é de que, na próxima semana, a vacina que está a ser adoptada teste positivamente e, antes de a doença eclodir em Moçambique”, afirmou Vuma, na última terça-feira (17), em Maputo.
O optimismo da CTA na realização da conferência manifesta-se após a comunicação de medidas para conter o Covid-19, pelo Presidente da República, com destaque para a proibição de eventos que juntam mais de 300 pessoas. Ciente disso, Vuma afirmou que, caso até Maio as medidas prevaleçam, a congregação não irá realizar o evento que espera acolher dezenas de participantes vindos do estrangeiro.
“Todas as entidades internacionais congéneres da CTA com quem rubricamos memorandos, cada uma trazia, em média, uma delegação de 20 empresários estrangeiros. Entretanto, caso a recomendação [anunciada pelo Presidente da República] prevalecer não teremos como realizar a conferência”, disse dirigente da CTA.
No âmbito da prevenção do Covid-19, mesmo antes de qualquer caso confirmado em Moçambique, a CTA diz estar a preparar um folheto para partilhar com os seus membros e não só.
Além do folheto, Vuma, que falava à margem da visita ao Parque Nacional de Tecnologias em Maluana, no distrito da Manhiça, acrescentou que a congregação está a terminar um estudo que vai orientar medidas a adoptar, nomeadamente, aduaneiras, financeiras, laborais até recomendações que possam apontar incentivos a fim de minimizar o impacto económico da pandemia.
“Pensamos que esta semana já vai ser concluído. Será presente ao Governo por causa do conjunto de medidas fiscais, laborais, entre outras que devem ser adoptadas pelo Governo. No estudo, estamos a trazer várias ideias usando as amostras locais, como forma de apoiar essa nossa preocupação de melhorar o ambiente de negócios”, conclui Vuma. (Evaristo Chilingue)
Aliado à “luxuosa vida” que levavam ou levam os caçadores furtivos no distrito de Magude, na província de Maputo, estão os casamentos prematuros e gravidezes precoces em menores de idade. No trabalho jornalístico efectuado pela “Carta”, naquele distrito, em concreto nos Postos Administrativos de Panjane e Mapulanguene, raparigas de 16 e 17 anos de idade contaram à nossa reportagem que já estiveram ou estão no lar.
Aliás, dados oficiais, a nível do Governo distrital de Magude, indicam que, em 2018, foram registados 29 casos de uniões prematuras e, em 2019, registram-se 34, tendo as autoridades sensibilizado 13 raparigas que saíram do lar e voltaram à escola. Lázaro Mbambamba, Chefe do Governo do Distrito de Magude, defendeu a necessidade de ter paciência de educar as nossas filhas e não apressar para o lobolo.
Tomando como exemplo os membros do seu governo, do sexo feminino, Mbambamba disse que as famílias devem educar as suas filhas para que um dia possam ser um exemplo e servir a nação. Face ao problema das uniões prematuras, “Carta” conversou com duas adolescentes e uma jovem de 20 anos de idade, mas que contraiu o matrimónio com 15 anos de idade.
No povoado de Inunhuane, no Posto Administrativo de Panjane, pouco mais de 50 km da vila-sede, “Carta” conversou com Lina Chongo, uma rapariga de 17 anos e mãe de um menino de dois anos de idade.
Lina revelou à nossa reportagem que engravidou aos 14 anos de idade e frequentava, na altura, a 5ª classe na Escola Primária Completa de Panjane. À “Carta”, contou que já esteve no lar, mas não correu como o previsto, pelo que teve de voltar para casa dos pais. Entretanto, avança que não pensa em voltar para escola, dedicando-se, assim, à comercialização de bebidas tradicionais e à prática de agricultura de subsistência e pastorícia.
Quem ainda permanece no lar é Aida Samuel, de 20 anos de idade, que também terá contraído matrimónio aos 14 anos de idade, sendo agora mãe de dois filhos. Conta que se casou, devido às condições sócio-económicas da sua família, na altura.
As autoridades da educação, a nível do Posto Administrativo de Panjane, contam que os casamentos prematuros são uma realidade naquele local, tudo porque os jovens que se submetem à caça furtiva, logo que voltam demonstram uma pujança económica que as famílias das raparigas facilmente cedem.
Diferentes individualidades ouvidas pela nossa reportagem, em Magude, corroboram que a caça furtiva levou muitas raparigas a casarem-se cedo, devido à pobreza que as mesmas enfrentavam nas suas famílias, levando com que os pais fizessem as mesmas lobolarem.
Refira-se que um estudo recente, realizado pela Brotar Moçambique, tendo como amostra 222 pessoas do Posto Administrativo de Mutaze, em Magude, revelou que quase todos os entrevistados admitiram conhecer uma rapariga que está no lar. (Omardine Omar)
A Inspecção Nacional das Actividades Económicas (INAE) diz estar a registar a especulação de preços dos produtos de higienização para a prevenção do coronavírus, pandemia surgida na China, em Dezembro último e que já se espalhou em mais de 160 países, incluindo os nossos vizinhos (África do Sul, eSwatini e Tanzânia).
Falando esta terça-feira, no seu habitual briefing semanal com a imprensa, a porta-voz da INAE, Virgínia Muianga, afirmou que a sua equipa de trabalho notou, durante a semana, a especulação de preços, principalmente nos produtos de higienização das mãos (álcool) e materiais de protecção (luvas), cuja procura aumentou, desde que as autoridades alertaram a possibilidade da propagação da doença no território nacional. Aliás, Muianga avançou que os referidos produtos já começam a escassear no mercado.
Segundo a inspectora da INAE, o controlo da especulação de preços irá abranger também os produtos de primeira necessidade, tendo em conta estar-se a registar muita procura.
Muianga garantiu também estarem a trabalhar com os restaurantes, no sentido de fazê-los cumprir a higiene pessoal, para além de que se tiverem um trabalhador doente ou constipado, que seja dispensado. Referiu igualmente que ainda estão a desenvolver actividades junto dos supermercados para garantir que estes desinfectem, periodicamente, as carinhas de mão para evitar o vínculo de contaminação do coronavírus.
Porém, explicou a fonte, para os locais de trabalho, apela-se que os trabalhadores evitem trocar objectos, como telefones e outros equipamentos necessários para que sejam apenas de uso pessoal. Garantiu ainda que estão a desenvolver trabalhos com as creches para que observem a higiene, controlem as mantas e as camas, onde dormem as crianças.
Na sua comunicação à imprensa, Muianga disse ainda que durante o trabalho de fiscalização que tem sido levado a cabo pela INAE foi possível apreender, de Janeiro até Março, em todo o país, 345 livros de distribuição gratuita, encontrados a serem comercializados no circuito informal. (Marta Afonso)
A vacuidade das declarações de Filimão Suazi, o porta voz do Governo, ontem depois de uma mais uma sessão do Conselho de Ministros que se esperava profícua em medidas consistentes contra a pandemia do Covid-19, foi alarmante. Moçambique está à espera do que vai acontecer nos próximos dias, para aumentar suas medidas de contenção. A mesma ladainha de Armindo Tiago (Ministro da Saúde), na sua pobre entrevista à STV: Não se sabe o que vai acontecer, disse ele. Em suma, Moçambique está à espera que a tragédia bata à porta para encetar uma reacção tardia.
Mas uma reacção tardia implica o quê? Implica camas suficientes nos hospitais, os ventiladores que não temos (na Itália morre-se por essa ausência), enfim, um sistema de Saúde incapaz de dar resposta à avalanche de doentes com sintomas graves: os 8% que acabam nos hospitais, aqueles cujos sintomas envolvem a perda de ar. Os dados mostram que dentre estes, 3 acabam morrendo.
A espera por uma panaceia curativa nos hospitais é grave. Não temos capacidade nenhuma. Olhem para este número: o sistema nacional de Saúde tem apenas 2000 testes. Nem chega para todos os trabalhadores do HCM, onde a maioria actua sem máscaras.
O Governo está a ignorar uma coisa que devia saber: a janela de oportunidade para medidas de prevenção drásticas começa quando o Covid-19 chega ao país vizinho mais próximo. Desde lá tem-se apenas 15 dias para agir (foi como fizeram a Tailândia e o Macau, dois territórios com sucesso na contenção do vírus; o Macau obrigou ao uso de máscaras e isso funcionou, contra outras teorias).
Depois disso, é ir tapando o sol com a peneira, como está acontecendo com países como a Itália e Portugal (ou mesmo os Estados Unidos, onde Trump andou a minimizar a doença, no mesmo diapasão da espera que apaixona nossos governantes). Outro dado cruel: o facto de não ter ainda havido confirmação oficial de infeccões pelo Novo Coronavírus em Moçambique não é garantia de que a doença ainda não esteja entre nós: 80% dos infectados são assintomáticos.
A incapacidade do Governo de responder proactivamente à pandemia envolve coisas bizarras. Deixaram o Presidente Nyusi anunciar medidas para pôr na gaveta, como essa da “quarentena obrigatória” para quem chega de fora. Basta ir aos aeroportos para verificar sua ineficácia, por desleixo e negligência.
A espera do Governo tem contornos sinistros e revela uma profunda distração. O Ministro Armindo Tiago tem fama de bom clínico, mas ainda não mostrou cartas em matéria de saúde pública. Ele podia ter usado a oportunidade para passar a mensagem que o Governo teima em não fazer passar nestes dias. Afinal, o que é quarentena? (todos falam de quarentena, mas ninguém sabe o que é isso, como acontece na prática o auto-isolamento). E como é que os que estão de quarentena se devem portar em casa, perante outros membros da família? Como nos devemos portar no “my love” e nos comboios? Como lidarmos com nossos empregados? Como usar a “lixívia” como ferramenta de limpeza das maçanetas das portas e corrimões? Como usar o lenço de cabeça como substituto mais eficiente das máscaras que já não há no mercado?
Enfim, a janela de oportunidade que estamos a perder obrigaria a um enfoque de todos na comunicação, na sensibilização pública, na pedagogia contra o vírus. Não esperar de braços cruzados, como sugeriu o Porta-Voz do Governo...esperar que aconteça algo para reagir. Esperar que a tragédia bata à porta. Esperar que haja mortes. Terrível. O próprio Orçamento do Estado está à espera da tragédia.
O Governo devia estar todo ele empenhado em ensinar a sociedade como agir. Devia ter uma "Task Force" de comunicação e pedagogia sobre o assunto. E com base nas directivas do MISAU, ministros e deputados, partidos políticos (a Frelimo, a Renamo e o MDM) deviam estar no terreno a mobilizar seus militantes contra o inimigo comum. Nossas possibilidades como país de enfrentar o Covid-19 não estão no plano curativo; estão na prevenção, na comunicação de massas. O tempo está a esgotar, mas ainda se pode fazer qualquer coisa. Não precisamos de esperar nem mais um minuto.(Marcelo Mosse)