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Carta da Semana

Carta da Semana

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De acordo com o portal ''Conceito.de'', ''Deletério é um adjectivo que deriva de um vocábulo grego que se pode traduzir por “destrutor”. O termo refere-se àquilo que é venenoso ou mortífero (...) Posto isto, deletério diz-se daquilo que é prejudicial, insalubre, perigoso ou nocivo.''

 

Segundo o motor AI Overview da Google, de ajuda mais avançada que o básico ''pai grande'' Google de pesquisa geral, ''Efeito deletério é um efeito prejudicial ou nocivo à saúde, que pode ser causado por uma substância ou procedimento.''

 

Por sua vez, ''A inteligência artificial (IA) é a utilização de tecnologia para simular a inteligência humana em máquinas. A IA utiliza algoritmos, dados e poder computacional para executar tarefas que os humanos normalmente fazem, como aprender, raciocinar e resolver problemas''.

 

O que tem isto que ver com esta matéria cujos antetítulo e título denotam que o assunto deste texto é a medida executiva da Administração Trump 47, de escangalhar a USAID, sob os auspícios de seu aliado Elon Musk, o homem mais rico do mundo? Tudo a ver. Elon Musk é um dos pais-fundadores e promotores da IA, que pela profecia do historiador Yuval Noah Harari, em seu livro Homo Deus, pode até substituir muitos dos trabalhos humanos da máquina burocrática da USAID e de outros departamentos do Governo Americano. Imaginem um mundo dominado pelos Elon Musk desta vida e governado por IA e outras plataformas tecnofeudalistas - conceito do economista grego Yanis Varoufakis?

 

O ''recolher obrigatório'' da USAID

 

Todos os trabalhadores directamente contratados pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID, sigla em inglês) estão na já anunciada “licença administrativa”, desde a última sexta-feira, dia 07, mas o campo do partido democrata já brandiu que vai mover uma batalha épica contra a decisão da administração Trump de liquidar um dos principais braços da geopolítica norte-americana. 

 

“Trump/Musk não podem unilateralmente fechar a USAID. A USAID é regida pela Lei de Reestruturação e Reforma dos Assuntos Externos de 1992, aprovada pelo congresso”, afirmou o senador democrata Andy Kim, na rede social X, referindo-se à ordem executiva tomada por Donald Trump, no quadro das medidas propostas pelo bilionário Elon Musk, ao abrigo do designado Departamento de Eficiência do Governo (DOGE).

 

O senador Kim tem uma sensibilidade e relação especiais com aquela agência, uma vez que trabalhou no ramo africano da mesma.

 

Chris Van Hollen, também senador do partido democrata, afirmou que está a trabalhar com advogados para conseguir uma providência cautelar que possa impedir a execução de algumas ordens executivas tomadas pelo Presidente norte-americano, incluindo a suspensão das actividades da USAID e a colocação do seu “staff” em “administrative leave”.

 

A acção visa proteger trabalhadores do Estado federal, os países receptores da ajuda da USAID e as operações desta entidade, no geral, enfatizou Hollen.

 

Maputo em diálogo com Washington

 

Empossado a 15 de Janeiro de 2025 como quinto Presidente da República de Moçambique, cinco dias antes de Donald Trump ser investido o quadragésimo sétimo Presidente dos EUA, Daniel Chapo orientou o seu Governo a fazer de tudo para evitar o efeito deletério das Ordens Executivas do ''Potus'' (acrónimo de Presidente dos Estados Unidos, em inglês) em Moçambique.

 

Com uma doação anual de mais de mil milhões de dólares a Moçambique, a USAID é um actor de peso no apoio ao país, canalizando verbas e outro tipo de ajudas à saúde, educação, saneamento, agricultura e mudanças climáticas.

 

Face à preocupação causada pelo espectro de dissolução da agência norte-americana, o Governo moçambicano garante que está em diálogo com a embaixada dos EUA visando encontrar soluções que contornem o impacto da ordem executiva de Donald Trump.

 

Inocêncio Impissa, porta-voz do Conselho de Ministros – órgão que esta semana passou a ter duas sessões semanais, avançou que Maputo pretende, no mínimo, que Washington mantenha o apoio à área da saúde. 

 

“Os cortes no financiamento, por parte do governo norte-americano, poderão afectar a disponibilidade de medicamentos e de recursos humanos necessários para responder ao combate ao HIV-SIDA”, assinalou Impissa.

 

Avançou que Moçambique terá de garantir a manutenção dos serviços essenciais de saúde para a população, através de algumas medidas paliativas.

 

Os EUA dão 400 milhões de dólares à área da saúde em Moçambique, contribuindo, de forma decisiva, na luta contra o HIV/SIDA, através do Plano de Emergência do Presidente dos EUA para o Alívio do SIDA (PEPFAR).

 

Só no ano passado, a USAID disponibilizou, no total, 30 biliões de dólares em ajuda humanitária e para a área de segurança, para mais de 100 países.

 

Enquanto a administração Trump não toma uma decisão final, a USAID foi colocada sob jurisdição do Secretário de Estado, Marco Rubio, decisão vista como um forte sinal de que a agência vai acabar, pelos menos, na orgânica e autonomia com que vinha actuando ao longo de décadas.

 

“Apoiarei absolutamente o caminho que for decidido, como o de a USAID deixar de ser um departamento separado”, declarou o republicano Brian Mast, presidente do Comité das Relações Exteriores da Câmara dos Representantes dos EUA.

 

Uma “Fraude” e “ninho de vermes”

 

O Presidente norte-americano considera a USAID uma “fraude impressionante”, defendendo que tem poder para acabar com a instituição, sem ter de recorrer ao congresso.

 

Donald Trump fez a acusação, depois de a USAID ter anunciado que todos os funcionários da entidade vão entrar em “licença administrativa”, a partir do dia 07 de Fevereiro, no quadro da política de corte de ajuda externa defendida por Donald Trump e por um dos seus braços direitos, Elon Musk, bilionário norte-americano que nasceu na Africa do Sul.

 

Aliás, Musk classificou a USAID de “ninho de vermes”, dando mais uma machadada no futuro da organização.

 

Em mais um acto de hostilidade em relação à USAID, Trump qualificou mesmo de “lunáticos” os funcionários da agência, segundo Alex Gagintano e Laura Kelly, correspondentes do portal Hill, na Casa Branca.

 

Donald Trump defende que a suspensão das actividades da USAID não carece de nenhuma intervenção do congresso, sendo suficiente uma medida executiva.

 

Por seu turno, os democratas entendem que aquele órgão legislativo deve pronunciar-se sobre a matéria.

 

De acordo com o portal Hill, a USAID foi criada através de uma ordem executiva em 1961 pelo Presidente John F. Kennedy, mas uma lei aprovada em 1998 colocou a agência na esfera do congresso, o que torna ilegal a decisão de Donald Trump. (Carta da Semana)

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Chefe da Brigada Central do Partido Frelimo para as eleições gerais de 2024 e um dos mais fortes membros da Comissão Política do partido Filipe Paúnde é o verdadeiro “kingmaker” da “vez do Centro” do país ter um PR, depois da hegemonia do Sul com Samora Machel (1975 - 1986), Joaquim Chissano (1986 - 2004) e Armando Guebuza (2005 - 2014) e a estreia do Norte com Filipe Jacinto Nyusi (2015 - 2024).

 

 

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Os “homens” do Presidente Chapo

 

O perfil dos 12 novos ministros até agora anunciados e hoje empossados pelo Presidente da República, Daniel Francisco Chapo, pode denotar uma solução de compromisso com o seu antecessor Filipe Nyusi.

 

A transição para o novo executivo de quadros que integraram o elenco de Nyusi, como a nova primeira-ministra, Benvinda Levy, uma magistrada tecnocrata sem uma colagem apologética a nenhuma ala da Frelimo, é um sinal de que Nyusi propôs para o cargo uma figura que Daniel Chapo aceitaria sem resistências.

 

Discreta, Levy cairia facilmente no “goto” de Chapo, até por ser jurista e graduada pela Universidade Eduardo Mondlane (UEM), onde o novo chefe de Estado também fez Direito. Levy é uma espécie de guardiã e veia transmissora de uma uma memória institucional e repositório do ''disco duro'' de toda uma sorte de dossiers, legislação e políticas públicas tanto aprovadas como as discutidas e que ficaram na gaveta, do bastante promissor e no fim moribundo consulado de Guebuza (em que foi Ministra da Justiça) e do sinistro e desastroso regime de Nyusi (em que foi sua a principal assessora jurídica no super ministério da Presidência).

 

Com uma dilacerante guerra em Cabo Delgado e com a polarizante presença das tropas ruandesas no combate à insurgência, os dois dirigentes devem ter-se entendido com relativa facilidade para a necessidade de manter Cristóvão Chume no cargo de ministro da Defesa, cargo que vem ocupando desde a administração anterior.

 

A “juventude” de Daniel Chapo, o primeiro Presidente moçambicano nascido depois da independência do país – veio ao mundo em 06 de Janeiro de 1977 –, também terá favorecido a escolha de Basílio Zefanias Muhate, para ministro da nova pasta da Economia.

 

Muhate foi secretário-geral da Organização da Juventude Moçambicana (OJM), o braço juvenil da Frelimo, presumindo-se, por isso, que está “equipado” com uma maior sensibilidade para as causas da revolta dos jovens que “foram carne para canhão”, nas manifestações promovidas por Venâncio Mondlane contra os resultados das eleições gerais de 09 de Outubro.

 

Quadro apagado no Banco de Moçambique sob a égide do “Xerife” Rogério Zandamela, Muhate é um economista low key embora amante do debate político e económico, conciliador e bom gestor de networks e de bases de dados (fundou e moderou durante mais de uma década no furor da sua juventude a plataforma de debate e partilha de informação Moçambique Online nos fóruns Yahoo! Grupos). Foi um apparatchick do Guebuzismo, embora tenha tido um fallout com AEG quando este era o todo poderoso Presidente da Frelimo e da República e a “Jota” de Basílio ensaiou laivos de rebeldia, inspirada em ideias e indumentária “revú” das boinas vermelhas do Economic Freedom Fighters (EFF) de Julius Sello Malema, antigo líder da “Jota” e dissidente do ANC (ANCYL). Bloguista, no auge da blogosfera em Moçambique, coincidentemente no primeiro mandato de Guebuza ao leme do país, espera-se que implemente algumas das ideias progressistas e reformistas económicas, que discretamente foi veiculando no activismo bloguista.

 

Uma outra figura que, pelo percurso que até agora fez, não é foco de dissensos entre alas na Frelimo é a nova ministra das Finanças, Carla Louveira. Sem uma militância activa e conhecida, Louveira, Vice-Ministra das Finanças no recém findo consulado de Nyusi, escapa à inevitável associação a uma das cliques do partido no poder e é tida como competente com lisura e mesura na gestão do erário público. Sem golpes de asa filosóficos, é uma tecnocrata em crescendo.

 

Até por ser filha de Rosário Fernandes, antigo presidente da Autoridade Tributária (AT) e do Instituto Nacional de Estatísticas (INE), conhecido pela sua frontalidade e integridade.

 

Recordar que Fernandes foi afastado do INE por se ter distanciado do recenseamento eleitoral na província de Gaza, que dava como apto para votar nas eleições gerais de 2019 um número de eleitores que aquele ponto do país só terá em 2040.

 

Diplomata de carreira, a nova ministra dos Negócios Estrangeiros, Maria Lucas, também pode ter oferecido garantias de consenso, até porque não se lhe conhece uma ligação subserviente a nenhum dos “clãs” preval_ecentes na Frelimo. Antiga Embaixadora de Moçambique na União Europeia, em Bruxelas, é tida como uma excelente negociadora, mestre dos bastidores e broker na diplomacia internacional, alérgica ao protagonismo e abnegada exploradora de corredores.

 

''Resgate'' do veterano Pale e do ''crânio''

 

Muchanga perdido na aviação

 

Muito aplaudido pelos quadros da Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (PCA), quando saiu do cargo de PCA do braço empresarial do Estado nos projectos de hidrocarbonetos, a aura “low profile” de Estêvão Tomás Rafael Pale terá ajudado na convergência das partes sobre a escolha para novo ministro dos Recursos Minerais e Energia. Um conhecedor do sector, como gestor técnico carreirista no ministério, como representante e gestor de negócios de multinacionais exploradoras de minérios no país, bem assim como gestor sénior das empresas públicas e ou participadas pelo Estado no sector dos hidrocarbonetos. É um defensor acérrimo do conteúdo local e do imposto em espécie (royalties), a ser pago pelas petrolíferas concessionárias da “parte do leão” na exploração do gás na Bacia do Rovuma, para alavancar o sector industrial nacional ancorado ou não à exploração mineira e ao oil & gas.

 

Uma inovação que anunciou no seu discurso de tomada de posse, no dia 15, é crível que Daniel Chapo tenha sido decisivo na escolha de Américo Muchanga, para ministro das Comunicações e Transformação Digital. O novo ministro é um especialista do sector e estava perdido na aviação (primeiro na Aeroportos de Moçambique e até sexta-feira na LAM).

 

Até última quinta-feira igualmente um Administrador Não-Executivo Independente, no Standard Bank, S.A, e Assessor do Conselho de Administração da MCNet, Américo Muchanga é um executivo visionário com 29 anos de experiência de gestão em posições de liderança sénior. Doutorado (PhD) em Telecomunicações pelo The Royal Institute of Technology (2006) e Licenciado em Engenharia Electrónica pela Universidade Eduardo Mondlane (1992), foi PCA e Director-Geral da Autoridade Reguladora das Comunicações de Moçambique (ARECOM/INCM).  Foi igualmente Director-Geral do Instituto Nacional de Meteorologia (INAM) e ocupou cargos como Membro do Conselho de Administração do Instituto Nacional de Comunicações (INCM), Presidente do Comité Executivo da Associação de Reguladores de Comunicações da África Austral (CRASA) e Presidente da Comissão Nacional para a Migração da Televisão Digital.

 

Nestes cargos, desempenhou papéis fundamentais na transformação da entidade reguladora das comunicações numa autoridade autónoma, na coordenação de questões regulamentares em matéria de telecomunicações, serviços postais e digitais e na implementação de projectos de infra-estruturas digitais e de TIC em grande escala.

 

Tendo vincado o acento tónico na separação de competências entre os secretários de Estado e os governadores provinciais – até porque sentiu na pele as colisões de tarefas entre as duas figuras, por ter sido governador -, Chapo deve ter visto com simpatia a indicação de Inocêncio Impissa para novo ministro da Administração Estatal e Função Pública. Impissa é quadro da área, tendo ali exercido várias funções.

 

Há marcadamente caras que serão mais associadas ao séquito de Filipe Nyusi, como o novo ministro do Interior, Paulo Chachine, um aliado do actual comandante-geral da Polícia da República de Moçambique, Bernardino Rafael, apaniguado e membro da mesma etnia do antigo Presidente da República. Há indicações de que Nyusi não quer abrir mão de Rafael no cargo que ocupa.

 

Dessa “entourage” e como flagrante solução de compromisso, pode incluir-se o novo ministro para a Planificação e Desenvolvimento, Salim Cripton Valá, que antes de ir para presidente da Bolsa de Valores de Moçambique (BVM) foi conselheiro de Filipe Nyusi, no primeiro mandato deste na Presidência da República.

 

Da promessa eleitoral de Governo inclusivo...

 

A “exumação” do Ministério da Planificação e Desenvolvimento deve ter sido recebida de sorriso rasgado pelo sector afecto a Armando Guebuza, dado que foi no primeiro mandato do antigo Presidente da República que se instituiu este pelouro, ocupado por Aiuba Cuereneia.

 

A nomeação de caras pouco conhecidas na política activa e na hierarquia do Estado, como o novo ministro da Agricultura, Ambiente e Pescas, Roberto Mito Albino, ou João Matlombe, para o novo Ministério dos Transportes e Logística, pode igualmente ter sido uma táctica para mitigar a ideia de vencedores e vencidos nas novas escolhas, ficando cada uma das alas no partido com a sensação de “menos mal”.

 

As limitações do poder de Daniel Chapo e o peso que o “nyussismo” ainda conserva serão medidos quando a formação do novo elenco governamental for concluída, nomeadamente, através do perfil dos novos titulares das pastas que faltam preencher.

 

Tradicional e estatutariamente, a formação do governo na Frelimo resulta de intensas consultas entre o chefe do Governo, que foi sempre daquele partido desde a independência do país, há mais de 49 anos, e a Comissão Política, órgão que orienta e dirige a força política no poder no intervalo das sessões do Comité Central.

 

Durante o período de transição, a Comissão Política tem sido dirigida pelo chefe de Estado cessante, por força da acumulação desse posto com o de presidente da Frelimo, até que o novo “homem forte” assuma este posto.

 

Para já, está notoriamente adiada a satisfação de um governo inclusivo, com figuras fora da órbita do aparelho partidário da Frelimo e integração de personalidades independentes.

 

Esse seria visto por várias correntes como um passo para a diluição da grave crise política pós-eleitoral, marcada por manifestações pontuadas por violência, brutalidade policial, saques e destruição de bens públicos e privados. (Carta da Semana)

segunda-feira, 23 dezembro 2024 18:34

Moçambique, uma revolução sem revolucionários

 RevoProt

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Não seria caso para manchete de jornal, não fosse a suspeita generalizada nos últimos anos na opinião pública de que o actual Presidente, Filipe Nyusi, teria pretensões de se prolongar no poder. Nyusi está finalmente a conformar-se com a sua saída de cena. Há cerca de duas semanas, ele começou a “despedir-se” dos amigos. No seu inner circle, o Presidente anda a dizer que seu último dia na Presidência será 15 de Janeiro, quando passar o martelo ao novo incumbente saído das eleições de 09 de Outubro, cuja identidade ainda é desconhecida, pois o CC ainda não validou e nem proclamou os resultados anunciados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) que deram vitória ao candidato da Frelimo, Daniel Chapo.

 

Na passada quarta-feira, Filipe Nyusi manteve um encontro no seu gabinete com reitores de universidades públicas e privadas, alguns directores de institutos de educação e entidades afins. Estiveram também sete ministros do seu Governo, entre os quais o da Defesa e o do Interior. 

 

A tónica do encontro centrou-se nas possibilidades reais de um verdadeiro diálogo político com a oposição no quadro da actual tensão pós-eleitoral. Os reitores também sugeriram ao Presidente que um diálogo com Venâncio Mondlane seria incontornável para se apaziguar a tensão. 

 

De acordo com as nossas fontes, em resposta, Nyusi disse que dialogar, para ele, não era problema, tanto mais que no passado já o tinha feito. Mas ele não deixou claro se estava, de facto, disponível a ter esse encontro com VM7, virtualmente, como este teima em insistir.

 

E já quase no fim dessa reunião, o actual PR deu a informação que todo o mundo estava à espera de ouvir em Moçambique: ele vai entregar o martelo ao próximo incumbente justamente no dia que tiver de o fazer, de acordo com o calendário constitucional. Pela primeira vez, ele deixou claro, em ambiente extra-partidário, que vai mesmo deixar a presidência já, fazendo enterrar definitivamente os rumores sobre sua alegada apetência para um terceiro mandato.

 

Sob imensa pressão dentro da Frelimo

 

Na mesma reunião com os reitores na quarta-feira, Filipe Nyusi comunicou que vai também deixar a liderança da Frelimo no mesmo dia 15 de Janeiro. Esta declaração corrobora com relatos colhidos por este jornal, segundo os quais Nyusi tem dito aos amigos mais próximos que vai também deixar a presidência do partido no mesmo dia em que entregar o martelo de inquilino da Ponta Vermelha. 

 

“Ele diz que, nesse dia, enviará ao partido sua carta de renúncia”, disse uma das nossas fontes. Esta pretensão tem uma explicação. Ela responde a uma pressão cada vez mais acérrima dentro do partido, estando agora a correr um abaixo-assinado visando a convocação de uma sessão extraordinária do Comité Central, que uma reunião recente da Comissão Política (há duas semanas) não convocou, alegando motivos de “segurança”. 

 

O Comité Central extraordinário não convocado deveria promover a saída do actual Presidente (e a ascensão de Daniel Chapo, actual Secretário-Geral Interino), a indicação de um novo Secretário-Geral e de um novo Secretariado.

 

A “recusa” da Comissão Política (controlada por Nyusi) em convocar a referida sessão extraordinária caiu mal nas hostes mais “históricas” do partido, que apontam Nyusi como a "mãe" de todos os males que assolam Moçambique, incluindo a presente tensão eleitoral, que se alega ser fruto do excessivo “martelanço” com que Nyusi manipulou os resultados eleitorais. A reacção dessa corrente foi desafiar Nyusi com um "abaixo-assinado", para forçar uma cedência, obrigando a CP a convocar a sessão extraordinária do Comitê Central para já.

 

“Carta” apurou que esse “abaixo-assinado” foi despoletado há mais de uma semana pela célula partidária "8 de Março", onde fazem parte figuras sonantes como Joaquim Chissano, Graça Machel, Jacinto Veloso, Castigo Langa, José António Chichava, Alcinda de Abreu, entre outras. Consta que o documento está a ter uma adesão favorável. Os proponentes pretendem que o CC extraordinário se realize já em Dezembro, mesmo antes de o Conselho Constitucional proclamar os resultados do pleito de Outubro.

 

É no quadro deste ambiente de hostilidade interna que Nyusi vai deixar a chefia da Frelimo. Mas, contrariando a pressão, ele tem vindo a afirmar que não quer sair antes de 15 de Janeiro, data oficial da sua saída da Ponta Vermelha. 

 

Esta resistência esbarra com a percepção generalizada, segundo a qual, se Nyusi deixasse agora a liderança da Frelimo e também abdicasse da Presidência da República, a tensão pós-eleitoral no país reduziria bastante. 

 

Qualquer que seja o cenário, um facto parece já certeza definitiva: Nyusi vai mesmo deixar a Ponta Vermelha em Janeiro, e qualquer narrativa sobre um alegado terceiro mandato só pode ser por défice de informação. Ele já está a fazer as malas...a questão mais intrincada que se coloca é: onde é que Florindos e companhia guardarão sua extensa frota de viaturas de luxo?

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segunda-feira, 25 novembro 2024 09:41

Tensão pós-eleitoral: diálogo dos surdos e mudos

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domingo, 10 novembro 2024 13:37

Guerra e Paz na terra do Sol de Junho

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Um autêntico cenário de guerra, escaramuças, tumultos, pneus em chamas e barricadas, actos de vandalismo e destruição de infra-estruturas, assassinatos e violações grosseiras de direitos humanos pelas forças policiais. São algumas das inúmeras palavras-chave e caracterizações dissonantes que os anais da história associarão à Moçambique, nas páginas sobre a primeira semana de Novembro de 2024. A violência nas ruas de Maputo-cidade e província e de Inharrime em Inhambane marcaram as manifestações dominadas por uma geração que não viveu os horrores da guerra civil, enquanto grupos de intelectuais tentam promover iniciativas de diálogo e reconciliação para o alcance da Paz, a mesma Paz que já foi interrompida por uma mão cheia de ocasiões em 30 anos de democracia multipartidária. A Paz, aliás, que a dilacerada província de Cabo Delgado almeja.

 

Carros queimados, estabelecimentos comerciais vandalizados, vias bloqueadas por pedras, troncos, restos de pneus queimados  e contentores de lixo são alguns dos restos e resquícios da guerrilha urbana que assaltou Maputo a 7 de Novembro. Nos hospitais, contabilizam-se as mortes (ainda em número inferior a 10, oficialmente), tratam-se os feridos nas várias especialidades clínicas, e nos corredores da política, da sociedade civil e da academia envidam-se esforços para aproximar as partes... enquanto o país e o mundo aguardam ansiosamente que o Conselho Constitucional delibere e anuncie o veredicto sobre as mais contestadas e descredibilizadas eleições em 30 anos de pluralismo democrático.

 

Na contramão, o Presidente da República cessante se esmera em acrobacias de relações públicas, para ficar bem na memória fotográfica onde lhe falta discernimento para tomar decisões que garantam uma transição sem crises para uma nova administração na Ponta Vermelha depois de 10 anos de uma desastrosa governação.

 

Se na cidade de Maputo, a confrontação entre grupos de manifestantes e forças policiais, e a pilhagem de lojas e um supermercado são os recortes do impacto imediato interno dos protestos durante a semana que hoje finda, a destruição das instalações das Alfândegas no posto de fronteira em Ressano Garcia e encerramento por um dia da fronteira sul-africana de Lebombo no mesmo ponto constituem a imagem do efeito directo na economia da região.

 

O drama humano no Hospital Central

 

Três óbitos e 66 feridos é o número de vítimas reportado pelos Serviços de Urgência do Hospital Central de Maputo, que resultam das manifestações de quinta-feira (07) convocadas pelo candidato do partido Povo Optimista pelo Desenvolvimento de Moçambique (PODEMOS), Venâncio Mondlane.  

 

Segundo o porta voz do Serviços de Urgências do HCM, Dino Lopes, um paciente perdeu a vida no hospital e os restantes deram entrada como óbito e presume-se que tenham sido baleadas.

 

“Dos 66 pacientes, 57 foram vítimas de lesões, possivelmente por feridas, arma de fogo, tivemos quatro agressões físicas, um por queda e dois por arma branca, como é o caso de esfaqueamento e outros objectos, há um outro paciente que foi operado, mas está numa situação crítica”, Lopes.

 

Os feridos incluem 15 pacientes internados nos diferentes serviços do HCM, dos quais, quatro casos graves e dois pacientes beneficiaram de grande cirurgia, outro encontra -se na unidade dos cuidados intensivos.

 

Até quinta-feira o HCM notificou a entrada de 138 pacientes, sendo oito na urgência de pediatria, maternidade e ginecologia (29) e um cumulativo de 101 na urgência de adultos.

 

O Hospital Central de Maputo, recebeu igualmente quarenta (40), transferências provenientes de outras unidades sanitárias periféricas e outros que vinham por conta própria.

 

O porta-voz explica que é difícil apurar as causas dos dois óbitos ocorridos na Missão São Roque, pelo facto de os óbitos terem sido declarados na medicina legal, mas a fonte garante que os dados indicam estarem associados às manifestações.

 

O HCM afirma que conseguiu dar vazão a demanda, graças ao apoio de voluntários, estudantes da Faculdade de Medicina, médicos de clínica geral de algumas organizações não governamentais. 

 

Escritores pedem “encontro

 

urgente” entre Mondlane e Chapo

 

A Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO) pediu um “encontro urgente” entre os candidatos presidenciais Daniel Chapo e Venâncio Mondlane, para discutir a constituição de um Governo de “inclusão efectiva” e acabar com as manifestações. Os escritores pedem, na carta que a Lusa teve hoje acesso, que os dois candidatos presidenciais mais votados, segundo dados divulgados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), realizem um encontro visando o alcance de um acordo para “terminar” com o que consideram de clima de instabilidade e violência, perda de vidas e destruição de infra-estruturas.

 

Segundo os escritores, Venâncio Mondlane e Daniel Chapo devem encontrar-se para assumir um compromisso “sério e verdadeiro”, fazendo “cedências mútuas", sem se pautarem por “arrogância ou posições radicais”.

 

“Iniciar o processo negocial para a criação de uma plataforma de entendimento que inclua a constituição de um Governo de inclusão efectiva, com vista a abrir portas para um processo de reforma profunda do Estado, envolvendo e beneficiando toda a Sociedade, sem exclusão, com particular realce para a camada jovem”, lê-se no documento da AEMO.

 

O mesmo documento pede igualmente a aparição pública dos dois candidatos para um comprometimento com a paz, a estabilidade e o desenvolvimento do país, ultrapassando “expressões de ódio e outras que incitem à violência”.

 

O coletivo apela à “constituição de um Comité de Sábios, para desenhar a arquitectura do diálogo entre os dois candidatos presidenciais mais votados, fazer a moderação dos encontros entre ambos e comunicar ao povo sobre o seu progresso”, acrescenta-se no documento.

 

Nyusi em novas acrobacias  de relações públicas

 

Na sexta-feira, no que já virou sua imagem de marca, o chefe de Estado moçambicano, Filipe Nyusi, voltou a ensaiar suas acrobacias de relações públicas: visitou os feridos das manifestações de quinta-feira que se encontram internados no Hospital Central de Maputo (MCM).

 

“A minha grande preocupação imediata foi ir ver os feridos. Então fui ao Hospital Central onde estão jovens feridos que estiveram envolvidos na manifestação, considerada violenta”, disse Nyusi.

 

Disse que num contacto estabelecido com os jovens feridos apurou que alguns são vendedores, pedreiros ou desempregados. ''Conversei com eles pois ia lá mais para me solidarizar. Na mesma enfermaria de Ortopedia encontrei também um membro da polícia. Ele sofreu muito com alguma gravidade no pé. Fez a primeira cirurgia de resolução e depois vai fazer a segunda de destabilização”, acrescentou.

 

Nyusi insistiu que se deslocou ao hospital para manifestar a sua solidariedade com os jovens feridos e não para fazer um julgamento porque esse é um papel que cabe as autoridades.

 

Depois do HCM, o chefe de Estado deslocou-se ao centro comercial Shoprite para se inteirar da destruição causada por actos de vandalismo.

 

“É aqui onde a mensagem da violência se reflecte”, disse Nyusi, explicando que mesmo que alguém queira distorcer os acontecimentos as imagens falam por si.

 

Para ficar bem na fotografia, Filipe Nyusi manteve ontem um encontro de cortesia com o dono da Igreja Ministério Divina Esperança, Apóstolo Luís Fole, considerado líder do espiritual do candidato presidencial do PODEMOS, Venâncio Mondlane.

 

O encontro, que teve lugar no seu gabinete de trabalho foi divulgado pelo Chefe do Estado, na sua página oficial da rede social Facebook. Referiu que serviu para a troca de impressões sobre a actual situação política em Moçambique marcada por tensão pós-eleitoral.

 

A Igreja Ministério Divina Esperança, liderada por Fole, tem vindo a ganhar expressão a nível da cidade de Maputo. Aliás, foi o próprio apóstolo Luís Fole que colocou Venâncio Mondlane como pastor da sua congregação religiosa. Também apadrinhou os seus primeiros passos como servo de Deus.

 

Mondlane remete para 2.ª feira 

 

anúncio de "medidas dolorosas"

 

O candidato presidencial moçambicano Venâncio Mondlane, que não reconhece os resultados anunciados das eleições gerais de 09 de outubro em Moçambique, disse ontem que na próxima segunda-feira revelará a 4.ª fase de contestação que, garantiu, “será extremamente dolorosa”.

 

“A quarta fase vai ser extremamente dolorosa, porque notamos que o regime está a querer fazer um braço de ferro com o povo. O regime quer usar a força das armas contra o povo. Usar a força policial e balas verdadeiras”, afirmou Venâncio Mondlane, que disse que são já 40 o número de mortos em consequência da reação do poder às manifestações por si convocadas.

 

Venâncio Mondlane anunciou na quinta-feira que as manifestações de protesto são para manter até que seja reposta a verdade eleitoral. Ontem Mondlane, que falava numa ‘live’ na rede social Facebook - “a partir de parte incerta”, como destacou -, disse que os moçambicanos se devem preparar “porque a economia [moçambicana] vai ser apanhada de forma severa”.

 

“Vai haver danos muito severos na economia de Moçambique. Tenho que ser sincero, porque as medidas vão ser pesadas e duras”, limitou-se a dizer e agendando para segunda-feira, dia 11 de novembro, o anúncio de quais serão essas medidas e, sobretudo, quando é que começarão a ser postas em prática.

 

Venâncio Mondlane garantiu que a 4.ª fase “será a última das manifestações em Moçambique”. “Não vamos vacilar”, garantiu.

 

Relativamente aos protestos ocorridos quinta-feira em Maputo, Venâncio Mondlane assegurou que estiveram nas ruas da capital 1,5 milhões de pessoas. Até segunda-feira, pediu que continuem apenas os chamados “panelaços”, ruidosas pancadas em objectos metálicos que ecoam durante a noite.

 

“Temos pessoas que têm de ter tratamento médico, pessoas que têm de ser enterradas. Sexta-feira, sábado e domingo a única coisa que vamos fazer nesses dias é continuar com a manifestação das panelas”, defendeu.

 

“Ontem (quinta-feira) foi o dia da libertação de Moçambique, que seria o dia que encerraria a 3.ª etapa das manifestações para reposição da verdade eleitoral, para salvar a nossa democracia e acabar com a ditadura em Moçambique”, salientou.

 

(Carta da Semana/AIM/Lusa)

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 Ao segundo segundo dia de paralisação geral, manifestações e confrontos entre populares e as unidades de Intervenção Rápida (UIR) e de protecção da Polícia da República de Moçambique - Maputo, Matola e outras cidades capitais do país sofreram um apagão no serviço de internet móvel. O apagão ocorreu ao princípio da tarde de ontem, sexta-feira (25), e prevaleceu para além das primeiras horas de hoje, sábado, no fecho desta edição. O serviço foi restabelecido ao nascer de um tímido sol desta esta manhã. Subitamente. Tal qual foi desligado, por ordem política.

 

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