O Ministério da Saúde (MISAU) afirma ter testado os 210 cidadãos que chegaram ao país, este domingo, vindos de Portugal, num voo privado da companhia área portuguesa TAP e que os resultados serão conhecidos nos próximos dias. A garantia foi dada esta segunda-feira, pela Directora Nacional de Saúde Pública, Rosa Marlene, durante a conferência de imprensa de actualização dos dados sobre o novo coronavírus, em Moçambique e no mundo.
Segundo Rosa Marlene, dos 210 cidadãos que seguiam abordo naquele avião, 155 são moçambicanos, 41 portugueses, dois turcos, um brasileiro, um britânico e mais 10 tripulantes, cujas nacionalidades não foram reveladas. Todos, disse a fonte, foram submetidos ao teste de Covid-19 e, neste momento, estão todos sob vigilância das autoridades sanitárias, encontrando-se nos respectivos locais de acomodação.
No que tange ao estágio epidemiológico, Marlene referiu que o país continua com os 80 casos positivos anunciados até o último domingo, sendo que 19 já se encontram recuperados. Porém, de domingo para segunda-feira, o Instituto Nacional de Saúde (INS) testou 132 amostras e todas se revelaram negativas. “Destas amostras, 77 são provenientes de Cabo Delgado, um de Nampula, oito de Sofala, sete de Gaza, oito da província de Maputo e 31 da cidade de Maputo. (Marta Afonso)
Paulik Ucacha, Comandante Provincial da Polícia da República de Moçambique (PRM), em Sofala, não descarta a possibilidade de os supostos pescadores paquistaneses, encontrados à deriva nas proximidades da cidade da Beira, província de Sofala, na semana passada, serem “colaboradores” dos terroristas, que semeiam terror em alguns distritos da província de Cabo Delgado, há mais de dois anos.
Esta segunda-feira, Ucacha explicou que, desde que o grupo foi encontrado à deriva, a cerca de 20 milhas da cidade da Beira, na noite do dia 30 de Abril, a Polícia e outras instituições, como o sector de pesca, tem estado a investigar a origem dos tripulantes e da embarcação.
Lembre-se que, aquando da sua detenção, os supostos pescadores avançaram que a embarcação estava avariada e que terão solicitado combustível aos ocupantes de um barco de pesca nacional, que estava próximo, por volta das 13:00 horas do mesmo dia.
Na ocasião, refira-se, os supostos pescadores, primeiro, recusaram ser socorridos para a cidade da Beira e pediram combustível, mas o armador nacional recusou satisfazer o seu pedido, tendo-lhes convencido a seguir rebocados até ao Porto de Pesca da Beira, onde se encontram atracados e cercados pelas Forças de Defesa e Segurança (FDS).
“Os 10 ocupantes da embarcação estão a ser investigados. Queremos apurar as verdadeiras causas que contribuíram para eles pararem na costa moçambicana. Queremos saber se, efectivamente, eles são pescadores que foram vítimas de um vendaval, como justificam, ou se têm algo a ver com os insurgentes de Cabo Delgado ou se ainda são traficantes", disse Ucacha.
Referir que esta tese foi defendida durante a reunião de balanço mensal do Comité de Emergência, criado para fazer face à Covid-19, em que o Governador de Sofala pretendia saber quais foram as medidas tomadas face à doença. Refira-se que todos os paquistaneses foram rastreados e, neste momento, o barco está isolado para evitar contactos com outras pessoas. (Carta)
Assinalou-se este domingo (3 de Maio) o segundo aniversário após o desaparecimento físico de Afonso Dhlakama, líder carismático do maior partido da oposição no xadrez político nacional, a Renamo.
E como em qualquer “família”, mesmo que passem anos após a partida de um ente-querido, na data, cada um à sua maneira reserva algumas horas, um dia ou mesmo vários para honrar a sua memória. A família Dhlakama e a Renamo não fizeram diferente. Usaram a data para imortalizar aquele que consideram de “herói” e que nem a sua partida “prematura” irá apagar as suas obras.
Afonso Macacho Marceta Dhlakama faleceu a 03 de Maio de 2018, na Serra da Gorongosa (o chamado santuário da Renamo), província de Sofala. Os seus restos mortais repousam na sua terra natal em Mangunde (regulado), distrito de Chibabava, interior da província de Sofala.
O partido, do qual era dirigente máximo, hoje liderado por Ossufo Momade, que assumiu as funções imediatamente a seguir à morte de Afonso Dhlakama, organizou uma série de eventos à escala nacional (delegações provinciais), tendo as cerimónias centrais se realizado na Sede Nacional, em Maputo, um evento que contou com a presença da nata do partido.
Ossufo Momade foi quem dirigiu as comemorações na Sede Nacional. Naquilo que chamou de comunicação à Nação, Ossufo Momade deixou a garantia de que tudo faria para honrar a memória do falecido presidente da Renamo, para quem a sua história, invariavelmente, se confunde com a de Moçambique. Momade disse que vai continuar a negociar com o Governo liderado por Filipe Nyusi de modo que, a breve trecho, seja concluído com êxito o processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) do braço armado do partido.
E por consensual que seja que o seu contributo, nacionalismo e patriotismo elevaram o país no concerto das nações no que ao nível de democracia e Estado de Direito como apanágio de governação diz respeito, Momade disse que Afonso Dhlakama devia ser reconhecido como herói nacional.
Entretanto, desde o desaparecimento físico de Afonso Dhlakama, o maior partido da oposição continua sombra de si mesmo, sendo a conturbada liderança de Ossufo Momade o rosto mais visível.
Ossufo Momade tem dedicado boa parte do seu tempo a gerir crises internas. A calamitosa performance nas eleições de 15 de Outubro último, ganhas folgadamente pelo partido Frelimo e o seu candidato presidencial, marca indubitavelmente a fase que o partido atravessa, depois que viu partir o seu “líder”.
Apesar de ter assumido a liderança, após a morte do líder “mor” e ter sido sufragado em sede do Congresso realizado em Janeiro de 2019, Ossufo Momade luta incansavelmente pela sua afirmação como o novo timoneiro da Renamo.
Tal pretensão tem sido liminarmente frustrada pela auto-proclamada Junta Militar liderada por Mariano Nhongo, que teima em gritar aos “quatro ventos”’ que Ossufo Momade não é e nunca foi presidente dos genuínos membros e simpatizantes da Renamo.
Mariano Nhongo e seus apaniguados, pelo menos nas mais variadas aparições, têm, de peito aberto, desafiado o actual Presidente da Renamo para quem, tal como tem dito, não tem apoio dos militares que se encontram aquartelados na Serra da Gorongosa.
Porque não concordam com o novo líder e muito menos com a forma como tem conduzido o partido, a auto-proclamada Junta Militar inúmeras vezes apareceu publicamente a assumir a autoria dos ataques armados na região centro do país, concretamente nas províncias de Manica e Sofala. Aliás, a Junta Militar tem defendido que os ataques a alvos civis e militares só vão cessar, quando o Presidente da República afastar Ossufo Momade do tabuleiro negocial e tomar as reivindicações do grupo com a seriedade que merece.
A lentidão, no que ao processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração do braço armado da Renamo diz respeito, tem sido o mote para o esfriamento de relações entre ambos, com Mariano Nhongo a acusar Ossufo Momade de estar a trair os acordos alcançados entre Afonso Dhlakama e Filipe Nyusi.
No campo político, Ossufo Momade parece ter conseguido finalmente assentar as bases, depois de um período conturbado decorrente das mexidas que operou no “xadrez”, logo que assumiu formalmente a direcção máxima do partido.
E porque qualquer remodelação sempre deixa fissuras (queda de alguns e ascensão de outros), na “Perdiz” não foi diferente. Momade mudou o figurino na Assembleia da República (AR), um processo rotulado como sendo mais de ajuste de contas que fundamentos a olhos desarmados comprováveis. Mas antes promoveu uma série de mexidas nos órgãos internos do partido, a começar da Comissão Política Nacional, onde fez ascender quadros inteiramente da sua confiança.
Para além da Comissão Política Nacional, Ossufo Momade mexeu na Secretaria Geral do partido onde fez cair Manuel Bissopo, que virou um opositor confesso à sua liderança e, para o seu lugar, fez subir André Magibire. Ao nível da AR, Momade mudou, por exemplo, a chefia da bancada, a Comissão Permanente (entradas e saídas), porta-voz e relator.
Aliás, falando em chefia da bancada, a antiga timoneira da Renamo na AR, Ivone Soares, em entrevista a um canal de televisão privado da praça, embora sem citar nomes, deixou escapar que continua uma miragem a ideia de um partido verdadeiramente unido e coeso para quem há quadros que juraram lealdade ao antigo líder e hoje estão desavergonhadamente a destruir o seu legado. Soares concedeu a entrevista a propósito do segundo aniversário da morte de Afonso Dhlakama.
Foi, igualmente, recorde-se, na era Ossufo Momade que os homens afectos à segurança da Renamo (boa parte leal ao antigo líder) lotou a Sede Nacional para protestar o atraso no desembolso de subsídios a que tinham direito. (Carta)
Desde que o Governo decretou, no passado dia 8 de Abril, o uso obrigatório das máscaras nos transportes públicos e espaços aglomerados, cresceu o número de alfaiates que se dedicam à produção massiva e exclusiva de máscaras, de modo a responder à crescente procura deste material de protecção, devido à sua escassez e elevado custo nas farmácias – há farmácias que vendem uma máscara a 300 Mts.
Sem nenhuma orientação e/ou incentivo por parte do Governo, os alfaiates viraram as suas atenções à produção de máscaras, na base da capulana. Anísio Mulungo, de 39 anos de idade, que costura roupa no Mercado Xiquelene, na cidade de Maputo, revela que, desde que o Governo decretou o uso obrigatório das máscaras, abdicou de fazer o que sabe fazer há muitos anos (costurar roupas) para se dedicar especialmente à produção de máscaras, sobretudo pelo facto de desenvolver a sua actividade num espaço de maior aglomeração de pessoas.
“Por dia consigo fazer mais de 100 máscaras. Numa capulana, consigo produzir 50 a 60 máscaras, dependendo do tamanho da capulana”, disse a fonte, em conversa com “Carta”, explicando que vende cada máscara a 50 Mts.
“Compro a capulana a 250 Mts e vendo cada máscara a 50 Mts. O preço tem em conta a aquisição de todos os materiais, os elásticos, o foro e algodão”, explicou Mulungo, garantindo que costura as máscaras, obedecendo às recomendações do sector da saúde: o uso de três camadas.
Para entender como tem sido a vida dos alfaiates, neste momento, a “Carta” conversou com Isaura Macamo, de 53 anos de idade, que contou que, com a suspensão de festas de casamento, baptismo, entre outros eventos, não lhe resta outra actividade, além de produzir máscaras.
“Depois que o Governo decidiu sobre o uso obrigatório das máscaras, passei a ter solicitações de grande volume, sobretudo porque tenho recebido encomendas de empresas que necessitam de máscaras para seus trabalhadores”, contou Macamo, sublinhando que vende cada máscara a 75 Mts.
“É desta forma como consigo sobreviver à crise do coronavírus”, rematou a alfaiate, que costura roupas, a partir da sua casa no bairro de Hulene B, arredores da capital do país.
Sobre o mesmo negócio, Alfredo Nhassengo, de 36 anos de idade, que costura roupa no Mercado do Xipamanine, disse: “desde a eclosão deste vírus, no nosso país, em algum momento veio-me o desespero do que podia fazer para continuar a sobreviver. Daí que surgiu a ideia de produzir máscaras”.
Nhassengo diz vender as máscaras a 35 Mts, de modo a acelerar a sua venda, tomando em conta o momento de crise que o país vive.
Por sua vez, Gabriel de Abreu, um alfaiate do mercado Vulcano, arredores da cidade de Maputo, explicou à nossa reportagem que, nos últimos dias, está a tentar ganhar a vida, vendendo máscaras, porém, não tem sido fácil porque “já passaram dois grupos de activistas, fazendo a distribuição de máscaras de forma gratuita e, apesar de vender por 25 Mts, não consigo clientes”.
Já Gabriel Afonso, de 39 anos, também vendedor do mercado Vulcano contou à “Carta” que, por haver pouca procura, naquele mercado, optou em usar pedaços de capulanas para fazer roupas de capulana.
“Eu uso restos de capulanas para produzir as máscaras que vendo, porque não tenho dinheiro para comprar capulanas. Num dia consigo vender duas a três máscaras, só para conseguir dinheiro para o caril, por isso, penso que o governo devia pensar numa forma de nos ajudar”, afirmou.
Inês Caetano, de 54 anos de idade, viúva e mãe de cinco filhos, residente no bairro Luís Cabral, disse à “Carta” que, para conquistar clientes, optou por produzir máscaras em grande quantidade e circular pelos bairros da capital do país. Os passageiros desprevenidos são os seus principais clientes.
“Nas paragens, há sempre pessoas que esquecem máscaras em casa ou nem têm. Então, são essas pessoas que acabam comprando ao preço de 20 Mts para conseguir apanhar chapa. Ninguém se preocupa em lavar, as pessoas compram e colocam a máscara imediatamente”, narrou, revelando que consegue vender 10 máscaras por dia.
Questionado pela “Carta”, se o Governo tinha algum plano de distribuição de máscaras, tal como acontece nos outros países do mundo, o Director-adjunto do Instituto Nacional da Saúde (INS), Eduardo Samo Gudo, respondeu que não é da responsabilidade do Ministério da Saúde (MISAU) distribuir máscaras aos cidadãos.
Ao Governo, explicou ele, cabe desenhar estratégias para apoiar a população e cabe também a cada um dos moçambicanos solidarizar-se com outro, produzindo este material de protecção em grandes quantidades para oferecer seus vizinhos e familiares. (Marta Afonso)
Dom Manuel Viera Pinto foi alguém que nos habitou às múltiplas despedidas, tantas foram as vezes que partiu e regressou. Quando recebi a notícia do final da sua missão, ainda consternado, tratei de ligar ao Padre Filipe Couto e, acto continuo, conversamos sobre um sem número de facetas e episódios.
Uma trilogia de memórias me vem à cabeça, sempre que falamos no Bispo Dom Manuel Viera Pinto, que nos deixa uma saudade e o sentido de que a sua missão está distante do final.
Primeiro, quando foi expulso de Nampula, ali no aeroporto, bem próximo de sua residência, em 1974, afirmando para os microfones da rádio “…saiu pela porta grande e com as minhas malas, todavia, quem me expulsou, sairia pela janela e sem nada em suas mãos…”. Não foi apenas uma saga, pois, meses depois se confirmava o que antes parecia sonho.
A minha geração ainda teve o privilégio de escutar muitas das homilias. Falava com sentido de oportunidade e de forma convincente. Repetia, bem alto e em bom tom, que gostaria de morrer em Nampula e de ser sepultado à entrada da Sé Catedral, para continuar próximo de seus fiéis.
Em segundo lugar, me recordo da famosa carta dele e dos sacerdotes da sua diocese, sob o título "Imperativo de Consciência", que eu nunca cheguei a ler, aparentemente redigida pelos padres Combonianos, um documento demasiado famoso para ser ignorado, em contexto moçambicano. Aliás, essa carta não agradou ao Governo de Marcelo Caetano, ao exigir uma resposta corajosa aos problemas graves do povo moçambicano.
Finalmente, a carta que Dom Manuel Viera Pinto escreveu a Samora Machel, em Setembro de 1986, um mês antes do factício acidente que o roubou do nosso convívio. Está carta, aliás, merece uma releitura. Samora e Vieira Pinto conversavam e debatiam este país com profundidade e respeito. Assim, com a devida vénia, transcrevo à carta. Oxalá, um dia o seu maior desejo em vida, seja satisfeito e regresse à sua cidade de coração, Nampula.
O povo não sabe onde pôr o coração
A confiança que Vossa Excelência nos merece, como Presidente da Frelimo e da República Popular de Moçambique, leva-nos a falar, mais uma vez, das violências que não cessam de humilhar e destruir o nosso povo. A guerra continua e com ela a violência, a humilhação, os abusos, os excessos, as atrocidades e os crimes. Permita-nos, Senhor Presidente, que falemos, concretamente, das violências que, neste momento, mais humilham e esmagam o nosso Povo, mais destroem o país e o encobrem de vergonha e de sangue: os massacres, as execuções sumárias, os assassinatos, as n.... e as torturas.
Massacres:
As informações de que dispomos dizem-nos que os massacres, cometidos por uns e por outros, não são um boato ou uma pura invenção, mas sim uma triste e dolorosa realidade. Sabemos que, ao longo destes anos de guerra, os massacres de pessoas e de populações inocentes e indefesas foram muitos, contando-se por milhares, o número de vítimas: homens, mulheres, velhos e crianças, jovens e adolescentes, mães lactantes e mães grávidas. O povo pergunta pelas razões destes crimes, destes actos executados e pergunta, igualmente, por quem os comete ou manda cometer. Julgamos que não basta responder com a desculpa de que a guerra é guerra ou de que na guerra não há lei, nem há moral.
O povo entende que, na guerra, há uma inelutável irracionalidade congénita, o que necessariamente dá origem a abusos e a violências arbitrárias. O povo entende que a irresponsabilidade, a indisciplina, o descontrolo, o espírito de represália e de vingança podem tornar, num dado momento, os homens armados em homens ferozes, homens sem lei e sem um mínimo de respeito pela vida, pela dignidade da pessoa humana e pela segurança a que as populações têm inegável direito. Mas, bastarão estas razões para explicar os numerosos massacres, cometidos contra pessoas inocentes, populações indefesas e contra o próprio Povo? Não haverá outras causas, além da lógica diabólica da guerra e da irresponsabilidade de quem os comete, permite ou manda cometer?
Perguntas fundamentais:
O povo pergunta se, na origem destes actos brutais, não estará uma ideologia de violência e de desprezo pela vida e direito da pessoa humana, não estará uma estratégia de liquidação e de extermínio, não estará uma política de posições obstinadas e irredutíveis. O povo pergunta se, na base destas atrocidades, não estará o princípio imoral de que os fins justificam os meios, de que na guerra não há lei e de que a necessidade extrema tudo desculpa, se, na origem destes abusos, não estará a desagregação, a corrupção dos valores mais elementares da ética, da moral, do direito e da própria cultura. O povo pergunta se, os massacres e outros actos abomináveis, são apenas um atentado contra a vida das pessoas e das populações ou, igualmente, um atentado contra a vida e a alma da própria Nação.
Crueldades:
Estas perguntas tornam-se mais insistentes quando tais atrocidades são cometidas com requintes de crueldade e de cinismo. Muitos, com efeito, têm sido os massacres perpetrados, com um desprezo absoluto pela dignidade e direitos fundamentais da pessoa humana e também com requintes de terrorismo e de extrema crueldade. Basta pensar nos massacres de pessoas frágeis e inteiramente indefesas, como são as crianças, os velhos, as mães lactantes ou grávidas, nos massacres de populações, convocadas e reunidas ao engano e, em seguida, encurraladas pelas armas e, barbaramente, destroçadas e assassinadas. Basta pensar nas centenas de pessoas retalhadas ou liquidadas à golpe de catana, de baioneta ou de punhal, torturadas ou degoladas, ou então queimadas vivas.
Estas, e outras, vergonhosas crueldades põem, de facto, em causa a civilização e a cultura e levam-nos, necessariamente, a concluir que tais crimes não seriam possíveis se, a par da irracionalidade e brutalidade da guerra, não houvesse um processo de degradação e de corrupção dos valores éticos, morais e espirituais do homem e do povo moçambicano. O povo preocupa-se e, diante destas vergonhosas e infames manifestações de violência, não deixa de perguntar se, a par das armas que massacram as pessoas, não há outras armas que tentam liquidar e destruir a alma e a vida do País.
Execuções:
As execuções sumárias constituem uma outra violência degradante e criminosa. Estas execuções sumárias, tenham a justificação que tiverem, são sempre um crime, um atentado à legalidade, uma injúria grave à dignidade e aos direitos de todo o ser humano, bem como ao direito de todo o homem a que, uma vez acusado, a sua causa seja examinada, com equidade e publicamente, por um tribunal independente e imparcial. Muitas foram as execuções sumárias, ocorridas nestes anos, por sentença de tribunais improvisados e presididos pelas Forças de Defesa e Segurança. Alguns destes julgamentos e execuções, mercê da crueldade que os caracterizou e acompanhou, transformaram-se num horroroso espectáculo de sangue. Seria longa e chocante a enumeração destes lamentáveis espectáculos de sangue.
Limitamo-nos a lembrar, como exemplo, as execuções à baioneta, à catanada e à facada, as execuções com torturas e humilhações dos acusados e condenados, as execuções por espancamento, por estrangulamento ou por esmagamento do crânio, as execuções por esquartejamento, abrindo, por vezes, a barriga aos executados, arrancando-lhes as vísceras e expondo-as ao público, as execuções com a participação das populações, manipuladas para o efeito e, por vezes, obrigadas a injuriar e a esbofetear os cadáveres deixados, por fim, insepultos à mercê dos abutres e das feras. Estas horríveis e vergonhosas execuções denunciam, tal como a violência dos massacres, a lógica impiedosa da liquidação do inimigo, a todo o custo, a lógica da represália e de vingança, não olhando a meios nem a imperativos de ordem moral ou mesmo legal.
Sentimo-nos, por isso, obrigados a lembrar às Forças em presença que tais execuções corrompem a cultura e a civilização do País, põem em causa a personalidade e a alma da Nação, abrem caminhos ao crime e ao abuso contra a vida e contra a dignidade, seja de quem for.
Assassinatos:
Os assassinatos, a partir, sobretudo das áreas afectadas ou simplesmente suspeitas, aumentam sempre mais, tornando-se, por isso, na consciência de quem os pratica ou manda praticar, num acontecimento sem qualquer responsabilidade moral. Matar não é nada: assim se exprime quem comete tais crimes. Parece, com efeito, que a vida das pessoas não é mais um valor que mereça respeito, não é mais um direito que mereça defesa. O assassinato torna-se vulgar. A vida, o valor, o sentido da vida estão postos em causa. As pessoas sentem-se inseguras e, mais ainda, quando vêem pela frente homens armados.
Como diz o Povo, chorando amargamente esta humilhação “os homens da Renamo desprezam e matam”, “os homens da Frelimo desprezam e matam”, uns e outros não têm pejo em assassinar homens ou mulheres, velhos ou crianças. Uns e outros não sabem mais o que é o respeito pela vida humana e pela intangível dignidade de todo o ser humano. Por isso, cometem assassinatos a frio, usando, muitas vezes, métodos cruéis. Há assassinatos a golpe de baioneta, de faca ou de catana, a golpe de martelos, de machados e de chicote. Há assassinatos por decapitação, por espancamento, por mutilação, por esquartejamento, por sevícias ou torturas até à morte. Há assassinatos por fogo ou por outros métodos cruéis e desumanos, tais como enterrar as vítimas, ainda vivas, obrigando-as, previamente, a abrir a própria cova. Mas todos sabemos que os assassinatos são um crime de delito comum e constituem a face da história e da consciência do Povo, uma pesada hipoteca de sangue. Estes crimes, tal como o crime das execuções sumárias e dos massacres, abrem caminho à violência generalizada, à degradação dos valores que defendem a vida e a dignidade do próprio povo.
Maus tratos e castigos desumanos:
O clima de violência engendra e autoriza mais violência. Os maus tratos, os castigos humilhantes, são actos de violência degradante e, como tais, não deveriam ter lugar em Moçambique. A Constituição do País, a própria cultura do nosso País, não deveriam dar lugar a práticas desumanas e primitivas, como são os maus tratos e os castigos humilhantes. Infelizmente, estas práticas estão presentes no dia a dia das populações. Há maus tratos, há medidas político-militares e administrativas que magoam e humilham o povo. Os castigos desumanos e os maus tratos são crimes à face da ética mais elementar. São graves atentados contra o melhor da consciência universal dos povos, tão clara e corajosamente manifestada na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na Convenção Contra a Tortura e Contra Tratamentos e Castigos cruéis, desumanos e degradantes, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de Novembro de 1948.
Hoje, não falta quem, por sua conta, mande aplicar o chicote ou determine o castigo que muito bem entender. O chamboco tornou-se frequente e irresponsável e, igualmente, o castigo pela aplicação da pena capital. Qualquer comandante a pode decretar, qualquer cidadão pode ser executado, não contando para nada a Legalidade ou as Instâncias competentes. Há mesmo quem diga que, em tempo de guerra, não há Tribunais. Há a lei da guerra, a lei da repressão e da liquidação de possíveis ou reais inimigos.
Torturas:
As torturas são actos imorais e criminosos. São graves atentados contra os Direitos do Homem, contra a honra e a dignidade da Nação. Nada, absolutamente nada, justifica a tortura. Uma causa que pretendesse defender ou consolidar o seu direito e a sua justiça, um Regime que tentasse assegurar a sua continuidade ou estabilidade, usando tais medidas, estaria a provocar a sua própria degradação e ruína. A tortura, os maus tratos, o desprezo sistemático pelo homem, não consolidam o poder constituído, antes o corrompem e o põe em grave perigo. Tais abusos e crimes, também não concorrem para a unidade, a reconciliação e a paz nacional, antes as destroem e dificultam.
Aspirações do povo:
Continua.
Fonte: (O Jornal. 16-09-1986), Transcrição de Eusébio A. P. Gwembe
Há um dia para o fim da testagem massiva, que está sendo realizada no acampamento da Total, na Península de Afungi, distrito de Palma, província de Cabo Delgado, o número de casos positivos provenientes daquele ponto do país continua a progredir. Neste domingo, o Ministério da Saúde (MISAU) voltou a anunciar mais um caso, proveniente da Península de Afungi, tendo subido para 80, o número total de casos identificados no país.
De acordo com a Directora Nacional de Saúde Pública, Rosa Marlene, o caso foi identificado no conjunto de 129 testes, realizados de sábado para domingo. Marlene explicou ainda que o novo caso está ligado aos contactos de Afungi, em Cabo Delgado, e, neste momento, encontra-se em isolamento no Acampamento da Total. Trata-se de um indivíduo do sexo masculino, cuja idade está entre 25 e 34 anos.
Segundo o Director do Instituto Nacional de Saúde (INS), Ilesh Jani, a testagem massiva aos trabalhadores da Total, que se encontram no Acampamento de Afungi, termina amanhã, quando forem testados os últimos 320 trabalhadores. De seguida, seguir-se-á fase da descontaminação.
Entretanto, o número de recuperados também continua a subir. De sábado para domingo, o país registou mais um recuperado, tendo subido para 19, o número total de recuperados. Referir que, neste momento, o continente africano apresenta uma tendência crescente do número de infecções, com a vizinha África do Sul a ser a nação africana com maior número de casos: mais de 6000. (Marta Afonso)