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Política

No feriado longo do Primeiro de Maio, em pleno confinamento social motivado pelo Covid 19, Faisal Ambasse “desconfinou” dos seus aposentos uma jiboa e pô-la brincando no “parquinho”, o famoso nome do Parque dos Cronistas, no coração da Sommerschield, o bairro mais elitista de Maputo.

 

A jiboia rolou-se no relvado e enrolou-se num poste de iluminação, para gáudio de Faisal. Ele exultava, manejando o réptil. À ilharga, alguns mirones com sentimentos mistos: curiosidade e medo. Faisal tirou lá umas fotos e partilhou-as nas redes sociais. Junto à jiboa, mostrou outra colecção de cobras exóticas.

 

“Carta” recebeu as relíquias fotografadas e partilhou-as entre seus contactos, onde estão atentos gurus da conservação. A questão imediata, por nós colocada, foi: é legal? A reação imediata foi a da surpresa e desconfiança. Uma investigação preliminar tinha de ser feita para apurar a espécie da cobra (se era proibida) e a identidade do proprietário.

 

O trabalho foi feito. E na segunda-feira, a Administração Nacional das Áreas de Conservação (ANAC) meteu uma denúncia junto da Procuradoria da República da cidade de Maputo. A denúncia é baseada no art. 62 alínea C (posse de espécie proibida) constante do anexo II do CITES (Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies de Fauna e Flora Silvestres Ameaçadas de Extinção) e, portanto, coberta pela nossa legislação (Lei 5/2017, de 11 de Maio). A espécie em causa é a "Phytonidae": jiboia.

 

Cabe agora ao Ministério Público considerar a robustez do argumento e determinar os passos seguintes. “Carta” sabe que o Conselho Municipal de Maputo, sem informar a ANAC, tentou meter-se (justamente a coberto de posturas urbanas) no caso mas Faisal Ambasse terá “escorraçado arrogantemente” os mandatários de Eneas Comiche.

 

Faisal Ambasse agora vai enfrentar a justiça. Ele deverá provar, sob pena de prisão, se detém os animais com permissão legal. Mas o caso tem outras nuances que envolvem a salubridade urbana. Animais selvagens são portadores de doenças e, portanto, um risco para a saúde pública. A edilidade de  Maputo tem também uma palavra a dizer. (M.M.)

Até semana finda, a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) contabilizava 756 empresas do sector de Hotelaria e Turismo que fecharam as portas em todo o país, afectando cinco mil trabalhadores. Esse número, que não pára de crescer, com o evoluir da crise provocada pela Covi-19 no país, esconde rostos de gigantes e renomados, bem como pequenos empreendimentos hoteleiros e turísticos no país, em geral, e, neste caso particular, ao nível da cidade de Maputo.

 

Trata-se de empreendimentos que, como é sobejamente sabido, fecharam por um tempo por falta de condições para fazer negócio numa altura em que a Covid-19 proíbe a circulação interna e internacional de pessoas e, por conseguinte, matando o turismo.

 

Sem condições para fazer negócio, pior está também a ausência de alternativa para rentabilizar os empreendimentos. É uma situação delicada e nunca experimentada, relatam todos os operadores do sector.

 

Como consequência da falta de opções, parte considerável dos empresários tem vindo a fechar os empreendimentos, enquanto clama ao Governo por medidas específicas para salvar não só os negócios, mas também postos de trabalho afectados, que irão agravar o índice de desemprego no país.

 

De tantos que fecharam na Cidade de Maputo, estão os gigantes Hotel Cardoso. Há quase 100 anos, o hotel de quatro estrelas é um dos tesouros nacionais de Moçambique. “Empoleirado no topo da falésia com vista para a cidade velha de Maputo”, o majestoso empreendimento “desfruta de um local maravilhoso – um dos melhores lugares para ver o sol se pôr no final do dia”, assim se descreve na sua página de internet. E a todos aqueles que desejam desfrutar de alguns dos seus serviços, o Cardoso acrescenta: “Venha se juntar a nós para um coquetel!”.

 

Em verdade, “venha” é um chamamento que, neste momento, o hotel não faz, por estar completamente encerrado. E, para o conhecimento do público, deixou um comunicado: “Devido ao anúncio do Presidente da República – Estado de Emergência, relacionado com a pandemia Covid-19, gostaríamos de informar que, a partir do dia 16/04/2020 até ao dia 15/07/2020, o Hotel Cardoso encerrará as suas actividades”.

 

Suspendeu o estabelecimento. Deixou, temporariamente, sem emprego, dezenas de trabalhadores e, por consequência, mais outras dezenas de agregados familiares afectados, num contexto em que o Governo, através do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), não subsidia salários dos afectados.

 

Contrariamente ao Cardoso, que reabre em Julho próximo, o Hotel VIP, ao longo da Av. 25 de Setembro, na baixa da Cidade das Acácias, não tem data. VIP é outro empreendimento de cinco estrelas de renome que fechou há quase 40 dias.

 

Conforme “Carta” reportou recentemente, VIP também deixou a seguinte informação, numa das portas frontais: “Devido à pandemia Covid-19 que, infelizmente, chegou ao nosso país, informamos que vamos encerrar as nossas instalações temporariamente, a partir do dia 28 de Março, contando voltar a servi-lo assim que a situação estiver controlada”.

 

Radisson Blue & Residence é outro hotel situado à beira-mar, ao longo da Avenida Marginal. Até princípios de Abril passado, o hotel encontrava-se fechado tendo transferido os clientes afectados para a secção residencial. Todavia, para evitar transtornos por parte dos potenciais clientes, na página oficial de internet do hotel consta que “devido ao coronavírus (Covid-19), este alojamento está a tomar precauções adicionais para proteger os seus hóspedes e funcionários. Consequentemente, serviços de spa e ginásio estão indisponíveis”.

 

Após encerramento, o Montebelo Girassol Maputo Hotel, ao longo da Av. Patrice Lumumba, convida os seus clientes a dirigirem-se ao Montebelo Indy, localizado no Bairro Sommerschield. A lista é deveras longa. Mas, dos relativamente menos vulgares e/ou pequenos, estão também fechados, na Cidade de Maputo, Resotel (ao longo da Av. Eduardo Mondlane, esquina com Karl Max), Satay Ease na Av. Marginal, Terminus (Av. Francisco Orlando Magumbwe), Onomo Hotel Maputo (Av. 25 de Setembro), Royal (Av. Filipe Samuel Magaia, esquina com 24 de Julho), City Logde (ao longo da Av. Julius Nyerere).

 

Enquanto uns fecham, há os que desafiam

 

Mesmo com a crise, há alguns hotéis que continuam a operar, mas a enfrentar dezenas de desafios que concorrem para a redução da actividade em 75% e queda da taxa de ocupação para menos de 4%. É o caso do Hotel Avenida, Polana Serena, Maputo Affecc Gloria Hotel e Hotel Maputo, onde “Carta” interagiu com o Director, Tasslim Sidat.

 

“Estamos a tentar aguentar para ver até onde a crise vai”, mas “devido à situação verificamos que a taxa de ocupação, nas últimas cinco semanas, reduziu para 2% de 54 quartos. Estamos a falar entre um a três quartos. Com esse nível de ocupação, é impossível pagar, pelo menos serviços básicos, como energia, água e comunicação. Como consequência, estamos a antecipar férias de alguns trabalhadores, dos 50 que temos. Com certeza vamos ter tantas dificuldades para pagar salários. Tentamos junto ao INSS, mas eles dizem que subsidiar os salários não é da responsabilidade deles. Dum modo geral, a situação é delicada”, queixou-se Sidat que, por isso, apelou apoio por parte do Governo.

 

O jornal também chegou à fala com Florival Mucave, investidor no sector e gestor do resort White Pearl, localizado na Ponta Mamoli, distrito de Matutuine, província de Maputo. O White Pearl faz, porém, parte dos 756 empreendimentos hoteleiros/turísticos que fecharam. A estância aguentou o primeiro mês do Estado de Emergência, mas no dia 31 de Abril passado, decidiu pelo encerramento, facto que afectou 129 trabalhadores, maioritariamente mulheres, dos quais 119 em casa. O White Pearl também não tem precisão data de reabertura.

 

“De acordo com a Lei de Trabalho, no primeiro mês tem de pagar 75% do salário, segundo 50% e, por fim, 25%. Sem facturação, onde poderemos achar esse dinheiro? Ademais, quanto é 25% de salário mínimo (três mil Meticais) para um trabalhador e ainda por cima mulheres?”, interrogou-se Mucave, demonstrando que realmente a situação é dramática.

 

Soluções

 

Perante a crise provocada pela Covid-19, os empresários desses sectores e não só são unânimes em afirmar que o Governo deve adoptar medidas que apoiem a classe para, por um lado, salvar os  negócios e, por outro, evitar o desemprego massivo e, por consequência, miséria nas famílias, para além da criminalidade.

 

De entre várias medidas, clamam pelo relaxamento de alguns custos operacionais, nomeadamente, a redução em 50% das facturas de água e energia e o adiamento do pagamento de impostos, bem como contribuições para a segurança social. Defendem ainda a criação de uma linha de financiamento com taxas de juros bonificadas, período de carência de um a dois anos para empresas com redução drástica do volume de actividade devido à Covid-19. (Evaristo Chilingue)

O voo humanitário da Transportadora Aérea Portuguesa (TAP), que aterrou no Aeroporto Internacional de Maputo, no último domingo, trazendo consigo 210 ou 215 pessoas (não há clareza do número de pessoas que estiveram a bordo da aeronave) de Lisboa, capital portuguesa, continua a criar embaraço às autoridades moçambicanas da saúde, havendo já indícios de haver um suposto aproveitamento da situação pelos “malfeitores”.

 

Depois de denúncias de haver passageiros do referido voo que não estavam a cumprir a quarentena, o Coordenador da Redacção da “Carta de Moçambique” foi, nesta quarta-feira, surpreendido com uma chamada telefónica, efectuada supostamente por uma técnica da saúde, que pretendia conhecer a morada deste, pois, conforme disse, tinha recebido uma denúncia de que o Coordenador da “Carta de Moçambique” tinha violado a quarentena obrigatória aplicada aos cidadãos que estiveram a bordo da aeronave daquela companhia aérea.

 

O facto causou estranheza ao Coordenador da “Carta de Moçambique”, primeiro porque não faz parte dos indivíduos que estiveram a bordo do referido avião, assim como não efectuou nenhuma viagem para o estrangeiro desde que o ano de 2020 começou. Por outro lado, causou estranheza o facto de, supostamente, o sector da saúde não ter endereços dos referidos viajantes e muito menos contactos telefónicos verdadeiros destes e/ou de seus familiares até ao ponto de contactar um cidadão que não embarcou nesse voo e muito menos um familiar seu.

 

Eis o teor da conversa:

 

Suposta técnica da saúde: Bom dia.

 

Coordenador da Carta: Bom dia.

 

Suposta técnica da saúde: Como está?

 

Coordenador da Carta: Estou bem. E desse lado?

 

Suposta técnica da saúde: Aqui estás a falar com Vânia da Saúde. Gostava de saber como está.

 

Coordenador da Carta: Estou bem.

 

Suposta técnica da saúde: Ok. Eu… desculpa… gostaria de saber qual é a sua morada.

 

Coordenador da Carta: Desculpe-me a pergunta, mas gostava de saber com quem a senhora deseja falar.

 

Suposta técnica da saúde: É assim, tenho de pedir desculpas mesmo pela pergunta que fiz. Recebemos uma denúncia a dizer que alguns dos viajantes que chegaram no domingo não estavam a cumprir com a quarentena e me deram este número.

 

Coordenador da Carta: Não efectuei nenhuma viagem. Nunca estive na Europa.

 

Suposta técnica da saúde: Hum… mas tem um familiar que voltou… no voo de domingo?

 

Coordenador da Carta: Nenhum familiar meu esteve no referido voo e nenhum familiar meu esteve no estrangeiro nos últimos meses. Eu sou jornalista da Carta de Moçambique e não efectuei nenhuma viagem para o estrangeiro este ano.

 

Suposta técnica da saúde: Ok. Muito obrigado pela atenção.

 

Devido à gravidade da situação, “Carta” questionou à Directora Nacional de Saúde Pública, Rosa Marlene, sobre os procedimentos observados pelos técnicos da saúde, quando contactam as pessoas que possam ter mantido contacto com o caso infectado ou que tenham de cumprir a quarentena, ao que respondeu que estes contactam o indivíduo tendo em conta os dados sobre este (incluindo a sua morada).

 

“Eles apresentam-se e introduzem o assunto. Se a pessoa regressou de uma viagem, eles questionam se a pessoa esteve ou não fora do país e apresentam os motivos da sua ligação”, explicou Rosa Marlene.

 

“Mas há casos em que pode haver aproveitamento porque as pessoas sabem que nós temos contactado [os pacientes] pelo telefone. Pedimos a todos para sermos vigilantes e a qualquer suspeita de que não seja o pessoal da saúde e para uma pessoa que não viajou, pedimos para não continuar a conversa, comunicar-nos para podermos informar as autoridades que zelam pela nossa segurança”, disse Marlene, garantindo haver uma grande colaboração dos contactos, pois, “grande parte das pessoas tem dado informações verídicas e importantes para sabermos o seu estado de saúde”.

 

A Directora Nacional de Saúde Pública acrescentou ainda que os técnicos de saúde usam os seus contactos privados, facto que, quanto a nós, pode propiciar oportunismo por parte de pessoas de “má-fé”. (Carta)

Apesar do Estado ter praticamente fechado as portas à realização de pesquisas científicas e reportagens no teatro das operações, o conflito que se verifica na província de Cabo Delgado continua a merecer diversas análises, em particular do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), uma organização de pesquisa independente, criada em 2007.

 

Em mais um número do Boletim IDEIAS (Informação sobre Desenvolvimento, Instituições e Análise Social), publicado no último domingo, os pesquisadores Salvador Forquilha e João Pereira defendem que o avanço da insurgência, naquele ponto do país, “é alimentado pelas múltiplas clivagens, nomeadamente étnicas, históricas, sociais e políticas”.

 

Citando um trabalho recente de Luís de Brito, sobre geografia eleitoral e a insurgência em Cabo Delgado, a análise refere: “a insurgência parece desenvolver-se em áreas e no seio de populações marginalizadas pelo Estado, mobilizando sobretudo jovens em ruptura com o Estado, mas também com a sociedade «tradicional», na medida em que adoptam uma prática fundamentalista do Islão”.

 

De acordo com a análise, que visa entender as dinâmicas da insurgência em Cabo Delgado e estabelecer comparações com a guerra civil, que afectou o país entre 1976 e 1992, a Renamo também mobilizou as clivagens locais em seu favor durante a guerra civil. Aliás, os pesquisadores referem que, apesar das diferenças entre a guerra civil e a insurgência, em Cabo Delgado – no que tange aos actores e mensagem – existem aspectos semelhantes do ponto de vista das dinâmicas do conflito e a estruturação da resposta do Estado.

 

“Parece estarmos perante o mesmo tipo de dinâmica que caracterizou a guerra conduzida pela Renamo: a chegada de um grupo armado, portador de um discurso de contestação da ordem estabelecida, age como acelerador do descontentamento social e radicaliza as clivagens sociopolíticas, por vezes históricas, que pré-existem localmente”, diz a análise, citando o trabalho de Luís de Brito.

 

“Isso permitiu aos Al-Shabaab encontrar um certo apoio por parte de sectores mais marginalizados, particularmente os jovens, que, em alguns casos, venderam o pouco que tinham e foram juntar-se ao grupo”, acrescenta, sublinhando que o referido apoio permitiu que o grupo montasse uma “eficiente rede de suporte logístico e de recolha de informação”, constituída por jovens repartidos em pequenos grupos, inseridos nas comunidades, localmente conhecidos por “olhos do mato”.

 

“De acordo com as nossas entrevistas, além do suporte logístico, esses jovens efectuam vigilância e mantêm os insurgentes informados sobre as movimentações das Forças de Defesa e Segurança (FDS) na zona, facto que joga um papel importante no lançamento das operações militares do grupo e no seu avanço no terreno. Neste sentido, tal como aconteceu com a Renamo durante a guerra civil, pode-se dizer que os Al-Shabaab conseguiram, de alguma forma, penetrar no tecido social das comunidades locais, facto que permite ao grupo uma maior mobilidade no terreno e eficiência nas operações militares”, explica a fonte.

 

Para além da exploração das clivagens étnicas, históricas, sociais e políticas, os pesquisadores apontam ainda a “desvalorização” do fenómeno pelas autoridades governamentais, sobretudo das denúncias feitas pelas lideranças religiosas muçulmanas locais, bem antes do primeiro ataque à vila de Mocímboa da Praia a 05 de Outubro de 2017.

 

“O «ultimato» surrealista dado pela polícia moçambicana aos insurgentes para entregarem as armas num prazo de uma semana (O Pais, 2017), a insistência sistemática no discurso, segundo o qual a insurgência em Cabo Delgado «não tem rosto nem mensagem», quando a realidade no terreno apontava para a existência de jovens radicalizados no grupo dos atacantes, sugerem que as autoridades governamentais encaravam os ataques como um simples banditismo”, considera a fonte.

 

“Isso, no nosso entender, contribuiu para que a resposta do Estado fosse pouco ajustada às exigências da real ameaça do fenómeno da radicalização, privilegiando, muitas vezes, a tese da conspiração externa, em detrimento de factores internos que alimentam a insurgência. Aliás, quando o Estado moçambicano decidiu, publicamente, posicionar-se sobre o conflito em Cabo Delgado, através do Conselho Nacional de Defesa e Segurança (CNDS), atribuiu a autoria dos ataques ao Estado Islâmico e, por isso mesmo, considerou que o país está em presença de «uma agressão externa»”, acrescenta a fonte, sublinhando ter sido a mesma atitude tomada pelo Estado, aquando da eclosão da guerra civil, em que a Renamo era vista como uma mera criação dos regimes racistas minoritários brancos da região (Rodésia e mais tarde a África do Sul) com a única finalidade de desestabilizar o Estado moçambicano, pelo que “a guerra não era mais do que «uma agressão externa»”.

 

Para os pesquisadores, seria perigoso, em termos de resposta do Estado relativamente ao conflito, negar que a insurgência se tem alimentado consideravelmente de factores internos. “Na verdade, seria um erro pensar que os Al-Shabaab em Cabo Delgado são uma criação do Estado Islâmico”, defende, avançando que a arqueologia e a etnografia da insurgência sugerem que as origens do grupo são locais, embora se possa falar de elementos estrangeiros no seu seio.

 

“Por conseguinte, é importante que a resposta do Estado moçambicano relativamente ao conflito em Cabo Delgado não se estruture unicamente em função da dimensão externa, nomeadamente «a agressão externa» protagonizada pelo Estado Islâmico. É preciso que a resposta do Estado aborde e dê o devido lugar aos factores internos da violência armada, cristalizados nas múltiplas tensões étnicas, sociais, políticas e económicas que existem a nível local, para evitar que o conflito não só se intensifique, como também, eventualmente, se alastre para outras zonas do Norte de Moçambique”, conclui a fonte.

 

Entretanto, apesar das semelhanças existentes entre a guerra civil e o conflito que se verifica na província de Cabo Delgado, os pesquisadores avançam duas diferenças: os actores e a mensagem. De acordo com a análise, enquanto na guerra civil envolveu (directa/indirectamente) “actores estatais externos”, o conflito que se observa em Cabo Delgado, pelo menos no início, “não existem evidências do envolvimento de actores estatais externos e o grupo doméstico, que corporiza a violência armada, com pretensões claramente religiosas, possui origens locais, embora com contactos fora de Moçambique e a participação de estrangeiros radicais que se instalaram localmente via alianças de casamentos”.

 

A segunda diferença entre os dois conflitos relaciona-se à mensagem, pois, na guerra civil, a Renamo não punha em causa os fundamentos do Estado moçambicano (por exemplo, a laicidade do Estado), enquanto os insurgentes, desde o início, “defendem a necessidade da instauração de um Estado com fundamentos religiosos, nomeadamente a Sharia”.

 

Referir que recorreu ao material produzido no âmbito do programa de pesquisa, intitulado “Estado, violência e desafios de desenvolvimento no Norte de Moçambique”, em curso no IESE desde Agosto de 2019, que pretende responder às seguintes questões: “que factores estão na origem do avanço da insurgência no terreno? Que tipo de relação se vai desenvolvendo entre os insurgentes e as populações locais? Existe algum potencial para que a insurgência se alastre para o Sul, em direcção à zona costeira de Nampula? Como o Estado tem vindo a responder à insurgência?” (A.M.)

Contra as expectativas de agentes económicos e famílias que têm crédito na banca, a taxa única de referência do sistema financeiro nacional para as operações de crédito de taxa de juro variável (ou `Prime Rate´), a vigorar durante o mês de Maio corrente, foi calculada em 17,90%, uma redução de 05 pontos, se comparada com os 18.40%, taxa que vigorou durante o mês passado.

 

Divulgada na última segunda-feira (04), em comunicado elaborado pelo Banco de Moçambique e Associação Moçambicana de Bancos, a actual `Prime Rate´, em 17,90% mostra-se elevada, principalmente do ponto de vista dos agentes económicos que, afectados pela crise provocada pela Covid-19, clamam por taxas de juros mais baixas em instituições de crédito.

 

Face à crise, a classe empresarial, concretamente a Associação de Comércio, Indústria e Serviços (ACIS), que é parte da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), defende a redução da `Prime Rate´, uma taxa que se aplica às operações de crédito contratualizadas (novas, renovações e renegociações) entre as instituições de crédito, sociedades financeiras (ICSF) e seus clientes, em 6.25%, situando-se em 11.64%.

 

Com a desaceleração da `Prime Rate´, acreditam que a Taxa de Juro de Política Monetária (ou Taxa MIMO) também pode baixar 6.25%, saindo dos actuais 11.25% para 5.62%. O sector privado acredita ainda que essas reduções são sustentáveis (e podem em grande medida aliviar o sufoco de várias empresas), olhando para a actual taxa de inflação que se situa em 3.5%.

 

Depois de estabelecida pelo Banco Central e Associação Moçambicana de Bancos, a `Prime Rate´ é acrescida de uma margem (ou `spread´), que é variável para cada ICSF, mediante a análise de risco de cada categoria de crédito ou operação em concreto.

 

No crédito a particulares e consoante os `spreads´ de 17 ICSF, anexas ao comunicado, a margem varia de nulo a 6%. Ainda a particulares, a margem para o crédito de consumo varia de nulo a 42.00%.

 

Quanto ao crédito às empresas, a margem parte de 0.00% aos 24.00% para empréstimos até um ano, ou variar entre 1.00% a 24.00% para prazos maiores. De acordo ainda com o comunicado, os `spreads´ das 17 ICSF em operações de `leasing´ mobiliário e imobiliário, as margens partem de nulo a 7.75%. (Evaristo Chilingue)

Em todo o mundo, os preços dos combustíveis baixaram consideravelmente. Com a baixa do crude, os governos são flexíveis na revisão dos preços, em baixa. Com a crise afectando os negócios, fazer isso é uma decisão de gestão automática. Governos empenhados em ajudar as empresas e o consumidor, não hesitam.

 

Em Moçambique é o contrário. O Governo não anda nem desanda. Inflexível, não mexe nos combustíveis alegando a desvalorização da moeda. Mas isso é um “bluff”. Na África do Sul, o Rand também tem perdido valor, mas o Governo local não encontrou aí motivos para não tomar as decisões acertadas.

 

Se esta inércia do Governo vai afectando os consumidores nacionais, sobretudo nos transportes, internamente, imaginem por que passam os transportadores do comércio internacional. Vivem um inferno! Completamente arrasados na sua capacidade de competir, por exemplo, com a concorrência sul-africana.

 

Lá na terra do rand, o preço do gasóleo vai ainda para baixar para 11.08 randes/litro. Multiplicando R11.08 por 3.65 Mts que é o cambio Mzm/Zar temos que cada litro de gasóleo custa, na África do Sul, 40.44 Meticais. Em Moçambique são 63.42 Meticais. A diferença é abismal. São 23 Meticais. É frustrante para os operadores nacionais que competem com os sul-africanos no transporte para Moçambique de carga geral, minérios e géneros alimentares.

 

O Governo tem fingindo que está a responder à crise nas medidas do seu efeito sobre as empresas. Mas a classe empresarial já demonstrou que não. E o exemplo dos combustíveis é uma amostra de falta de coragem, ou da presença de interesses escondidos, que impedem uma tomada de decisão que beneficiaria o grosso da sociedade.