O governador do banco central moçambicano defendeu, quarta-feira, que o país deve celebrar a indemnização que espera receber da Privinvest, como resultado da sentença, na segunda-feira, no processo das dívidas ocultas em Londres.
“Este é o momento de celebração. Temos de desejar que tudo corra bem (…) Vamos acreditar que este dinheiro vai entrar no país”, declarou Rogério Zandamela, durante uma conferência de imprensa em Maputo.
O Tribunal Comercial de Londres decidiu, na segunda-feira, a favor de Moçambique no processo das chamadas 'dívidas ocultas' e determinou que o grupo naval Privinvest deve pagar compensação por corrupção do antigo ministro das Finanças Manuel Chang.
"Estou convencido de que o senhor Safa e o Grupo Privinvest estavam dispostos a prometer ou a pagar a quem quer que fosse, e especificamente ao ministro Chang (...). E foi isso que fizeram", disse o juiz Robin Knowles, citado na sentença.
Segundo a Procuradoria-Geral moçambicana, representante do Estado no processo, no total, o grupo Privinvest foi condenado a pagar 2,3 mil milhões de dólares (2,1 mil milhões de euros) de indemnização, mas o valor líquido ficou estipulado em 1,9 mil milhões de dólares (1,8 mil milhões de euros), já que as autoridades tinham penhorado diversos ativos de pessoas envolvidas no caso.
Para o governador do banco central, os moçambicanos devem se orgulhar da decisão tomada, que, segundo o responsável, é resultado de “esforço e sacrifício”. “Temos de estar orgulhosos daquilo que conquistámos e temos de parar com essa história de que as boas coisas acontecem por sorte e as más acontecem porque somos incompetentes”, declarou o governador do banco central.
Num comunicado emitido depois da sentença, a Privinvest afirmou que pretende recorrer por considerar que a conclusão de que Manuel Chang foi corrompido é "baseada em grande parte em suposições e não sustentada por uma análise credível".
A Privinvest manifesta também a intenção de lançar procedimentos judiciais "de forma vigorosa" contra o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, quando este perder a imunidade diplomática, em janeiro. Nyusi era ministro da Defesa na altura dos acontecimentos e a Privinvest alega que o atual chefe de Estado deve ser responsabilizado.
O escândalo das dívidas ocultas remonta a 2013 e 2014, quando o então ministro das Finanças, Manuel Chang, detido agora nos Estados Unidos, aprovou, à revelia do parlamento, garantias estatais sobre os empréstimos da Proinducus, Ematum e MAM aos bancos Credit Suisse e VTB.
Descobertas em 2016, as dívidas foram estimadas em cerca de 2,7 mil milhões de dólares (cerca de 2,55 mil milhões de euros), de acordo com valores apresentados pelo Ministério Público moçambicano.
O julgamento foi o culminar de quase quatro anos de litígio na justiça britânica, à qual o país africano recorreu alegando corrupção, conspiração para lesar por meios ilícitos e assistência desonesta para anular dívidas e reclamar compensação financeira no valor de milhões de dólares. (Lusa)
O endividamento público interno, excluindo os contratos de mútuo e de locação e as responsabilidades em mora, situa-se em 377.9 mil milhões de Meticais, o que representa um aumento de 65,6 mil milhões em relação a Dezembro de 2023. Os dados foram revelados esta quarta-feira (31), pelo Governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, em briefing a jornalistas após o Comité de Política Monetária (CPMO) da instituição.
A dívida pública tem vindo a aumentar para fazer face à despesa pública, principalmente, o pagamento de salários de mais de 400 mil funcionários e agentes do Estado. Na última sessão bimensal, o CPMO decidiu reduzir a taxa de juro de política monetária, taxa MIMO, de 15,00% para 14,25%, depois de avaliar os riscos e incertezas associados às projecções da inflação e concluir que se mantêm favoráveis.
Destacam-se como possíveis factores de contenção da inflação, no médio prazo, a estabilidade do Metical e dos preços das mercadorias no mercado internacional, apesar da contínua pressão sobre o endividamento interno, das incertezas quanto ao impacto dos choques climáticos e da prevalência dos conflitos geopolíticos.
“As perspectivas de inflação mantêm-se em um dígito no médio prazo. Em Junho de 2024, a inflação anual manteve-se estável, ao fixar-se em 3,0%, após 3,1% em Maio. A inflação subjacente, que exclui as frutas e vegetais e bens com preços administrados, também permaneceu estável. Para o médio prazo, mantêm-se as perspectivas de uma inflação em um dígito, reflectindo essencialmente, a estabilidade do Metical e o impacto das medidas tomadas pelo CPMO”, explicou Zandamela.
No que toca ao crescimento económico, a reunião do Banco Central constatou que poderá continuar a crescer moderadamente, apesar da prevalência de incertezas quanto aos impactos dos choques climáticos na produção agrícola e infra-estruturas diversas.
O Governador do Banco Central lembrou que os dados preliminares do Instituto Nacional de Estatística indicam que, no primeiro trimestre de 2024, excluindo o gás natural liquefeito (GNL), o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 2,3% e antevê-se que se mantenha modesto até ao fim de 2024. Quando incluído o GNL, o PIB apresenta um crescimento de 3,2%.
O Banco de Moçambique perspectiva a manutenção do ciclo de redução da taxa MIMO, com vista à sua normalização no médio prazo. Entretanto, sublinha que o ritmo e a magnitude dos ajustamentos dependerão das perspectivas da inflação, bem como da avaliação dos riscos e incertezas subjacentes às projecções do médio prazo. (E.Ch.)
Já são conhecidos os nomes dos nove membros do Comité de Supervisão do Fundo Soberano de Moçambique – a entidade pública que será responsável pela gestão das receitas provenientes da exploração do gás natural da bacia do Rovuma, na província de Cabo Delgado – eleitos na tarde de hoje pela Assembleia da República.
De acordo com os resultados anunciados pela Presidente da Assembleia da República, o Comité de Supervisão do Fundo Soberano será composto, na sua estreia, pelas activistas sociais Benilde Nhalivilo (antiga presidente do FORCOM) e Estrela Charles (do CIP); pelo empresário Inocêncio Paulino (ex-Presidente da Associação das PME); pelos académicos Emanuel Chaves (antigo PCA da empresa Aeroportos de Moçambique) e Alcides Nobela (Director dos Recursos Humanos da Universidade Eduardo Mondlane); pelo advogado Celestino Sitoe; o auditor Altino Mavile; e os religiosos António Juliasse (Bispo de Pemba) e Mussa Suefe.
Os nove membros do Comité de Supervisão do Fundo Soberano foram eleitos, através de uma votação directa e secreta, envolvendo 38 candidatos seleccionados pela Comissão Ad Hoc criada para o efeito, dos 76 cidadãos que submeteram os seus processos para o crivo do grupo liderado por Vitória Diogo.
Os nomes hoje eleitos pelo Parlamento coincidem com os candidatos propostos pela Comissão Ad Hoc, excepto o de Celestino Sitoe, ex-PCA da Empresa Moçambicana de Exploração Mineira, que ocupava a segunda posição na lista dos candidatos pela Ordem dos Advogados.
Em seu Relatório, a Comissão Ad Hoc diz ter recorrido a uma avaliação curricular dos candidatos apurados, com base na atribuição de uma valoração (de 0 a 20 valores) “para distinguir os candidatos mais qualificados e preparados para desempenhar as funções exigidas” pelo órgão.
De acordo com o Relatório da Comissão Ad Hoc, consultado pela “Carta”, concorreram àquele órgão do Fundo Soberano um total de 76 cidadãos, sendo 15 provenientes da sociedade civil, cinco do sector empresarial, 26 das universidades, sete da Ordem dos Advogados, sete da Ordem dos Contabilistas e Auditores e 16 de associações religiosas.
Dos 76 candidatos, 38 foram rejeitados por insuficiência de requisitos, com destaque para a candidatura de Carlos Jeque, antigo PCA da empresa Linhas Aéreas de Moçambique, que se candidatou ao Comité de Supervisão pela Ordem dos Advogados, a nível da Cidade de Maputo.
Das candidaturas aceites e submetidas à avaliação, Benilde Nhalivilo e Estrela Charles ocuparam as primeiras posições, entre os candidatos vindos das organizações da sociedade civil, com 18,3 e 17,3 valores, respectivamente. Inocêncio Paulino obteve 18,8 valores, tendo sido o único candidato aceite a nível da classe empresarial.
Entre os candidatos propostos pelas instituições de ensino superior, Emanuel Chaves teve maior pontuação, com 19,4 valores, seguido por Alcides Nobela, com 17,9 valores. Leonel Mulando foi o mais qualificado entre os candidatos da Ordem dos Advogados, com 18,2 valores, enquanto Altino Mavile obteve 19,4 valores entre os contabilistas e auditores.
Dom António Juliasse Sandrano e Sheik Mussa Suefe saíram empatados entre os religiosos, com 19,4 valores cada. Refira-se que Leonel Mulando foi o único rejeitado pelo Parlamento entre os primeiros classificados de cada grupo.
O n.º 2 do artigo 14 do Regulamento do Fundo Soberano, que estabelece que aquele órgão é composto por dois representantes da sociedade civil; um representante da comunidade empresarial; dois representantes da academia; um representante da Ordem dos Advogados; um representante da Ordem dos Contabilistas e Auditores; e dois representantes das associações religiosas de reconhecido mérito e abrangência nacional.
Tomás Vieira Mário e Ângelo Macuácua entre os “rejeitados”
Já entre as candidaturas “rejeitadas” após avaliação curricular, o destaque vai para o jornalista Tomás Vieira Mário (pela sociedade civil), que obteve 16,6 valores; o advogado Filipe Sitoe (pela academia), com 14,2 valores; e o antigo PCA do Fundo de Estradas Ângelo Macuácua (pela Ordem dos Contabilistas e Auditores), que obteve 16,6 valores. Também foi rejeitada a candidatura do Bispo Auxiliar de Maputo, Osório Citora Afonso (pelas associações religiosas), que conseguiu 17,8 valores.
A Comissão Ad Hoc, liderada por Vitória Diogo e que tinha até ao dia 30 de Junho a data para apresentar o relatório, explica que pediu a prorrogação do mandato devido às inconsistências verificadas no acto da triagem das candidaturas. “A triagem consistiu na verificação minuciosa e detalhada da conformidade das candidaturas com base nos requisitos estabelecidos no Anúncio Público e nos Termos de Referência”, refere, sublinhando que o trabalho iniciou no dia 24 de Maio e terminou no dia 18 de Julho, tendo durado 56 dias.
Entretanto, a valoração feita pela Comissão Ad Hoc aos candidatos foi colocada em causa pela Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade da Assembleia da República. Em seu Parecer, a Primeira Comissão do Parlamento afirma que a competência da Comissão Ad Hoc se limitava apenas à verificação de requisitos gerais e selecção de candidatos elegíveis a Membro do Comité de Supervisão do Fundo Soberano.
“Considerando a competência especial da Assembleia da República para a eleição dos membros do Comité de Supervisão do Fundo Soberano (…), a Comissão entende que tal só procede em sede do Plenário, através de um processo de eleição, dentre vários candidatos elegíveis, seleccionados pela Comissão Ad Hoc”, defendeu o grupo liderado pelo deputado António Boene, sugerindo uma eleição com todos os 38 candidatos. A votação durou pouco mais três horas.
O Comité de Supervisão é um órgão independente do Fundo Soberano, com competência para controlar e acompanhar as matérias referentes às receitas da entidade; os depósitos na conta transitória; a alocação das receitas ao orçamento do Estado e ao Fundo; e supervisionar a gestão do Fundo. O órgão reporta à Assembleia da República todas as suas actividades, através de um Relatório trimestral, sendo que as suas conclusões são de domínio público.
Os membros do Comité de Supervisão terão um mandato de três anos, renovável uma única vez, sendo que o Presidente será eleito dentre os seus pares. A sua remuneração basear-se-ia em senhas de presença, por cada sessão, nos termos a definir pelo Ministro que superintende a área de Finanças. (A. Maolela)
O Governo aprovou esta terça-feira (30), em Conselho de Ministros, o Decreto que cria a Área de Protecção Ambiental de Palma-Quirimbas, localizada na província de Cabo Delgado, com o objectivo de preservar e proteger as espécies marinhas, terrestres e costeiras e seus habitats.
De acordo com o comunicado do Secretariado do Conselho de Ministros, o referido Decreto visa contribuir para a restauração dos processos ecológicos, renovação dos recursos naturais e para a manutenção da diversidade biológica de Palma-Quirimbas.
O Decreto é criado duas semanas depois de a Ministra da Terra e Ambiente ter revelado que a Reserva de Biosfera das Quirimbas, localizada na província de Cabo Delgado, necessita de cerca de 33 milhões de USD para colocar em prática as acções previstas no seu Plano de Gestão e Negócios para o período 2023 a 2032.
Conservação, negócios e comunicação são as três componentes que integram o plano, uma ferramenta estratégica para coordenar e orientar as acções de conservação e de desenvolvimento local, capitalizando as oportunidades baseadas na economia da vida selvagem e nos aspectos sociais e culturais.
Falando em Cabo Delgado, durante uma Reunião de Mobilização de Fundos junto dos parceiros de cooperação, Maibaze disse que a Reserva de Biosfera das Quirimbas possui um valor incalculável para o desenvolvimento social e económico das comunidades locais, por isso deve-se pautar por uma gestão sustentável que permita não só preservar a biodiversidade existente naquela área, mas também a prática das actividades eco-turísticas.
Na última Sessão (23ª), o Conselho de Ministros aprovou também o Decreto que aprova o Regulamento que estabelece as funções, organização e regime de funcionamento do Centro de Coordenação de Operações de Fiscalização Marinha (CEFMAR). O Regulamento visa permitir uma eficiente e eficaz fiscalização do espaço marítimo, incluindo as águas navegáveis, lacustres e fluviais e o exercício da autoridade do Estado no mar e em águas interiores.
Na reunião semanal, o Executivo aprovou ainda a proposta de Lei que estabelece o Regime Jurídico do Sistema Nacional de Saúde, a submeter à Assembleia da República.
A proposta de lei visa adequar o Sistema Nacional de Saúde à complexidade e dimensão dos desafios de saúde, aliados à conjuntura sócio-económica e às transições demográficas e epidemiológicas no país e aplica-se às instituições públicas, comunitárias e privadas, às pessoas singulares e às comunidades que exercem actividades no sector da saúde. (Carta)
O Primeiro-Ministro, Adriano Maleiane, disse esta segunda-feira (29), em Maputo, que as autoridades sanitárias vacinaram 5,2 milhões de pessoas contra a cólera, nos distritos mais afectados, nos últimos três anos.
O executivo defende que as campanhas de vacinação, quando combinadas com outras medidas, têm um impacto positivo na prevenção e controlo da cólera.
“Por isso, tomamos esta ocasião para encorajar e sensibilizar os parceiros de cooperação e demais intervenientes a garantir o aumento, provisão e disponibilização de vacinas contra cólera”, disse Maleiane na abertura da primeira Conferência Científica sobre Transdisciplinaridade para Eliminação da Cólera.
Entre os vários factores que influenciam a existência de casos de cólera, destaca-se a frequência dos eventos climáticos extremos, deficiente saneamento do meio, acesso limitado à água potável e a desinformação sobre as reais causas da cólera.
Segundo o governante, dados oficiais revelam que entre os meses de Janeiro a Março de 2024 foram registados 94 mil casos de cólera em todo o mundo, dos quais, mais de metade na África Austral.
“A título ilustrativo, no continente africano há registo de pouco mais de 250 mil casos de cólera entre 2023 até ao momento, resultando em mais de 4 mil óbitos, o que corresponde a uma taxa de letalidade de 1,6%”, disse o governante.
Moçambique, República Democrática do Congo, Malawi, Zimbabwe e Zâmbia, ao nível da África Austral, constam na lista dos países mais afectados pela cólera.
Informações das autoridades sanitárias indicam que no período compreendido entre 1 de Outubro de 2023 até ao mês de Julho corrente, foram notificados 16 mil casos de cólera e 38 óbitos em todo o país, o correspondente a uma taxa de mortalidade de 0,2%.
O Primeiro-Ministro assegurou que no quadro das acções de prevenção e controlo da cólera o país tem estado a implementar a vigilância a nível interno e nas fronteiras.
Por outro lado, as autoridades moçambicanas têm vindo a incrementar a capacidade de testagem laboratorial com estabelecimento de uma rede de laboratórios provinciais de saúde pública e gestão diferenciada dos casos de cólera combinando centros de tratamento hospitalar, bem como estações de hidratação comunitários entre outras realizações.
O ministro da Saúde, Armindo Tiago, sublinhou que o evento ocorre numa altura em que o mundo enfrenta o recrudescimento de casos de cólera ao longo dos últimos três anos.
“Ao nível da África Austral, Moçambique é um dos países mais afectadas pela doença, por isso entendemos que é fundamental a mobilização de conhecimento científico para promoção de uma resposta multissectorial com vista numa primeira fase o controlo e depois a eliminação da doença “, disse Tiago.
A Coordenadora da Organização Médicos Sem-Fronteiras (MSF), em Moçambique, Daniela Garone, informou que a estratégia global da iniciativa sobre eliminação da cólera visa para além interromper a transmissão e reduzir a mortalidade, eliminar a cólera como um problema de saúde pública.
“Gostaria de expressar meu profundo agradecimento ao governo de Moçambique e a todos os parceiros por se unirem. Estou confiante de que a nossa experiência colectiva levará a um progresso significativo na nossa luta contra cólera em Moçambique “, disse Garone.
Já o representante da OMS em Moçambique, Severin Von Xylander, referiu que os conflitos, a urbanização não planeada e as alterações climáticas aumentam o risco de cólera. “Os investigadores estimaram que todos os anos se registam 1,3 a 4,0 milhões de casos de cólera e 21.000 a 143.000 mortes em todo o mundo devido à cólera “, disse Xylander.
Manifestou a sua satisfação pelo facto de Moçambique estar a concluir o seu plano multissectorial sobre eliminação da cólera, como problema de saúde pública até 2030. Durante o evento, os participantes vão abordar as melhores estratégias de eliminação da cólera até 2030.
Refira-se que o evento, organizado pelo Instituto Nacional da Saúde (INS) em parceria com CDC-África, junta em Maputo,quadros do MISAU, Organização Mundial da Saúde (OMS), Médicos Sem-Fronteiras, ministros das Obras Públicas e Habitação de Moçambique e de outros Estados da região Austral. (AIM)
Nos últimos anos tem-se verificado em Moçambique o tratamento privilegiado do concorrente estrangeiro em empreitadas de obras públicas, fornecimento de bens e prestação de serviços ao Estado, actividades reguladas pelo Decreto n.º 79/2022, de 30 de Dezembro e no âmbito da fiscalização prévia dos contratos no tribunal administrativo.
A queixa foi apresentada há dias pela Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), durante uma conferência de imprensa em Maputo. De acordo com o Presidente da Federação de Empreiteiros, Bento Machaila, o favorecimento deve-se ao facto de o referido Decreto não obrigar o Estado a exigir os concorrentes estrangeiros para confirmar a veracidade do conteúdo dos documentos.
“O n.º 3 do artigo 31 estabelece que “A Entidade Contratante poderá, sempre que julgar necessário, confirmar a veracidade do conteúdo dos documentos” de qualificação jurídica, económico-financeira, técnica e regularidade fiscal no país de origem e a inexistência de pedidos de falência e insolvência.
Para Machaila, esta formulação confere à entidade contratante uma faculdade – e não o dever – de confirmar se o conteúdo dos documentos apresentados pelo concorrente estrangeiro corresponde à verdade. Além disso, não está claro no Regulamento que procedimento deve seguir a entidade contratante caso entenda necessário e queira confirmar a veracidade do conteúdo dos referidos documentos.
Como consequência, o empreiteiro explicou que o resultado é que o Estado acaba contratando empresas que podem não estar qualificadas, com todas as consequências negativas que daí podem surgir. Além disso, estas regras prejudicam o concorrente nacional em relação ao qual a regra é a de confirmação da veracidade das declarações contidas nos documentos de qualificação.
Para o Presidente dos Empreiteiros, a solução do problema passa por indicar clara e integralmente os documentos a exigir ao contratante estrangeiro, de forma a fazer prova das suas qualificações perante as autoridades competentes moçambicanas e por incumbir à entidade contratante do dever de verificar em todos os casos a veracidade do conteúdo dos documentos apresentados pelo concorrente.
Ainda no âmbito do favorecimento do estrangeiro, os empreiteiros também não estão satisfeitos com o afastamento “da fiscalização prévia dos contratos celebrados ao abrigo de projectos e programas financiados com recursos provenientes de agências de cooperação estrangeira ou de organismos financeiros multilaterais”, após a revisão da Lei n.º 13/2024 de 19 de Janeiro atinente à revisão da Lei n.º 14/2014, de 14 de Agosto que aprova a Organização, Funcionamento e Processo da Secção de Contas Públicas do Tribunal Administrativo.
Para o membro do Conselho Executivo da CTA, esta lei é revista numa altura em que é praticamente nula a possibilidade de adjudicação a empresas nacionais de contratos financiados por agências de cooperação estrangeira ou organismos financeiros multilaterais.
A referida norma tem o sentido prático de não sujeitar à fiscalização prévia os contratos celebrados com empresas estrangeiras sempre que tenham por objecto projectos e programas financiados por essas entidades.
“Portanto, com esta medida a lei confere larga vantagem aos concorrentes estrangeiros que, além de os respectivos processos de contratação não se sujeitarem ao procedimento da obtenção do “Visto” do Tribunal Administrativo, ficam isentos do peso dos emolumentos pela submissão de contratos à jurisdição administrativa. Esta medida, associada à falta de verificação, por parte da entidade contratante, da veracidade do conteúdo dos documentos apresentados no processo de contratação, prejudica o Estado e os concorrentes nacionais”, disse o empresário.
Por fim, Machaila disse não ser compreensível o fundamento que está na origem do alargamento desta excepção de isenção da fiscalização prévia aos processos de contrato financiados por agências de cooperação estrangeira e organismos financeiros multilaterais. (Evaristo Chilingue)