Tomás Vieira Mário
O dicionário Universal da Língua Portuguesa, da Moçambique Editora, define fé como “crença religiosa; crença, convicção em alguém ou alguma coisa; convicção…
Com efeito, na maioria das vezes, a ideia de fé convoca-nos para a crença religiosa. Não sendo estudioso de teologia, o meu sonho de infância, de um dia me tornar bispo (sim, bispo!) motivou-me, nalgum período da minha vida, a obter alguns conhecimentos básicos sobre a religião. Pelo menos para algumas divagações em torno de determinadas significações que dão corpo a fé, enquanto crença religiosa.
Aprendi, por exemplo, que a base de todas as religiões é a crença na existência de uma outra vida, para além desta, que vivemos na terra. E, a partir da crença nessa vida no “além”, emerge a ideia de um ser superior, que ai impera; é o Deus. Assim, fé é uma virtude daqueles que aceitam como verdade absoluta os princípios difundidos por sua religião. Ter fé em Deus – um só! - e acreditar na sua existência e na sua onisciência.
Para as religiões judaico-cristãs e islâmica, tratar-se-á do Deus que se anunciou ao Abrão, o patriarca, aquele a quem tanto o Judaísmo como o Cristianismo e o Islão referem como seu Pai. Assim, o fiel deve crer, em pelo menos, duas proposições: existe a vida eterna e Deus.
Fora do mundo religioso, “fé" surge também em algumas expressões populares e no mundo jurídico. Por exemplo, “fazer fé” significa acreditar em alguém ou em algum acto; ter esperança; “fazer fé em juízo” significa um dado ou prova aceites como verdadeiros ou legítimos em sede de foro judicial.
Ao longo de milénios, as diferentes religiões foram cimentando ideias, princípios em proposições em cuja crença deve sustentar-se a vida dos fiéis. As épicas batalhas dos Hebreus em busca da Terra Prometida, sob a liderança de Moises, só podem ser imaginadas, consentidas e sustentadas pela fé em Deus, que lhes prometera tal terra, desde os tempos do patriarca fundador, Abrão.
Com base na fé, homens e mulheres de extraordinária qualidade emergiram ao longo da Historia da Humanidade, quer como líderes espirituais ou destemidos guerreiros, lideres de movimentos de massas, reis ou ambos. Moisés, Salomão, Jesus Cristo, o Profeta Maomé…Martin Luther King, Madre Teresa de Calcutá… Como é que estas extraordinárias criaturas humanas lograram arrastar atrás de si, e muito para além do seu tempo, multidões e nações, pelo mundo fora? Não foi incutindo fé nas pessoas? Convencê-las e persuadi-las a seguir uma certa missão ou objectivo?
Ora vejamos: com o seu bastão, não dividira Moises o mar vermelho em dois pedaços, permitindo passagem ao seu povo, ante a estupefação do Rei dos Egípcios? E Jesus Cristo: não vencera ele a morte, ressuscitando ao terceiro dia da sua morte? E o Profeta Maomé? Não recebera ele a mensagem de Deus, nos montes Sinai, através do Anjo São Gabriel? E a Maria, mãe de Jesus: não concebera ela sem pecado?
O verdadeiro crente deve tomar conhecimento destes “factos”, proposições ou princípios, e acreditar profundamente neles, sem os questionar; sem pretender prova da sua ocorrência; sem os debater. E deve estar disponível para os divulgar e defender, incluindo com o próprio sangue, se necessário for. Assim estas crenças são designadas por dogmas. O dicionário acima citado descreve dogma como “ponto fundamental e indiscutível de uma crença religiosa; proposição apresentada e aceite como incontestável e indiscutível”.
Porém, todas estas complexíssimas construções metafisicas, enunciadas em lendas, parábolas e crónicas literalizadas, aliás escritas com muita beleza, não são senão criação da mente humana, ao longo de seculos revisitada, reformulada e aprimorada, quantas vezes com derramamento de muito sangue! Não tivemos aí a Santa Inquisição? Não tivemos aí as Cruzadas? Não temos aí diferentes cruzadas violentíssimas, associadas ao Islamismo: a Jihad, o Al Qaeda, o Estado Islâmico…? Não temos aí as tempestuosas igrejas evangélicas, hoje em dia com tendência para controlar o poder político de muitas nações? Tudo na base ou a pretexto da fé!
Na vida real, de acordo com o nosso próprio contexto, temos, todos, desenvolvido nossa fé em determinados “factos”, “ideias” ou proposições, cristalizadas em pessoas que, de uma forma ou outra, tenham marcado as nossas vidas. Podemos criar tais crenças com as nossas mentes fertilizadas por circunstâncias ou experiências diversas, de natureza particularmente extraordinária. Podem ser nossos pais. Ou um professor (geralmente do ensino primário). Um carismático líder religioso. Ou um líder político.
Em consequência de um volume de certezas que fomos criando, dentro de nós, sobre as virtudes que apreendemos (ou que nos foram vigorosa e intensamente apregoadas ao longo de um tempo significativo) das ideias e da conduta desta pessoa, criamos fé nela. Portanto dogmas em torno dele ou dela. E com estes dogmas nos protegemos de dúvidas, de perguntas, de incertezas. As nossas crenças são a única verdade!
Assim, não tenho qualquer dúvida – nem me vou surpreender - se um dia, for provado, em juízo, que um alto dirigente do nosso Estado, em funções ou não, participou e beneficiou pessoalmente, das odiosas dívidas ilegais. Muitos moçambicanos, gente de boa-fé, não vão acreditar! Vão, até ao fim dos seus dias, dizer que tal decisão judicial terá sido fabricada, na base de calúnias e conluios de gente sem autoestima, mancomunada com mão externa!
Temo que eu próprio venha a ser um deles.
Pois só assim poderei encontrar algum alívio à insuportável dor de ter sido traído, tão vilmente, na minha fé!
Passam 44 anos desde que jovens de ontem libertaram o povo e a terra deste meu país da humilhação e desprezo do colonialismo. Depois disso ninguém esperaria que esses mesmos libertadores pudessem vender este país a um preço de banana! Os libertadores de ontem “esqueceram-se” que apesar de a meta que se pretendia com a luta armada fosse a independência política, o principal objectivo era económico. Acreditava-se que a riqueza natural de Moçambique mudaria a realidade e serviria para nos libertar economicamente da dependência dos países Ocidentais e outros. Acreditava-se que a força e mística do povo trariam o desenvolvimento de Moçambique. Acreditava-se que a independência nos faria esquecer a escravidão e desgraça da colonização. Os jovens libertadores de ontem desejavam um futuro melhor para todos, mas a ambição excessiva e amor exacerbado pelo dinheiro que foram ganhando com o tempo condenou o povo que ontem libertaram.
Os políticos venderam a minha pátria! Levaram os nossos sonhos e trocaram-nos pelos deles. Confundiram os interesses de todos com os deles. Sacrificaram crianças, jovens e velhos, porque queriam casas em Miami ou/em Dubai. Transformaram os nossos hospitais em locais de morte, escolas em centros onde muitas vezes os bons valores, a ciência como instrumento de competência, são preteridos. Os políticos condenaram o meu povo à desgraça, fome e doenças, priorizando o que só beneficia a eles e seus parentes. Aprovam leis alheias aos interesses do povo, implementaram a votocracia que não respeita a vontade da maioria.
Os políticos venderam a minha pátria! Quando viram que poderiam enriquecer com o suor do povo. Quando perceberam que polícias e militares podem trabalhar em seu benefício,intimidando o povo e disparando indiscriminadamente contra os que pretendam enfrentâ-los. Os políticos enganaram o povo quando descobriram que “o cabrito come onde está amarrado”!
Afinal quem são os políticos que venderam a minha pátria?
Os políticos que venderam a minha pátria são aqueles que nos governam desde a independência. Enquadram-se naqueles que ontem usurparam as propriedades dos outros, apoiando-se na lei das nacionalizações ou recorrendo a outras artimanhas.São os mesmos que se apoderaram das pensões dos “madjermanes”,deixando-os na miséria a que até hoje estão votados. São os que extorquiram as riquezas do povo em benefício próprio, que nos governam desde há cinco décadas à custa do roubo de votos nos processos eleitorais.
Os políticos que venderam a minha pátria são aqueles que contraíram dívidas ilegais acreditando que conseguiriam enganar o povo e os investidores. Criaram o G40 e esquadrões da morte para sequestrar, agredir e até matar. São os que venderam a minha pátria aqueles que hoje respondem pelo maior escândalo de que há memória na história recente de Moçambique e da África! (Omardine Omar)
A mineradora britânica de rubi, Gemfields, acordou em pagar 8.3 milhões de dólares americanos para fechar um caso de 273 queixas de assassinatos, espancamentos e incêndio de habitações, em torno das minas de rubi de Montepuez, na Província de Cabo Delgado.
A empresa acordou ainda na constituição de um painel independente sobre disputas que poderá decidir sobre quaisquer reclamações no futuro. A empresa anunciou estes acordos em Londres, através de uma declaração de imprensa, com a data de 29 de Janeiro corrente.
O caso de violações grosseiras de direitos humanos na região da extração de rubi, na localidade de Namanhumbir, foi levado a um tribunal superior de Londres em Abril de 2018 por uma sociedade britânica de advogados denominada Leigh Day, a qual alegou “sérios abusos de direitos humanos na ou em redor da empresa Montepuez Ruby Mining”, (MRN), subsidiaria da Gemfields.
As 273 queixas incluem 18 pessoas supostamente mortas por forças de segurança privada da MRM e por agentes da polícia moçambicana, através de disparos, espancamento até a morte e soterramento de pessoas vivas. Há perto de 200 acusações de espancamento, tortura e abuso sexual - muitas delas provocando ferimentos tão graves que causaram diminuição da capacidade de trabalho das vítimas As queixas incluem ainda 95 reclamações de propriedade perdida na sequência de repetidos incêndios criminosos na aldeia de Namucho-Ntoro.
Todos os incidentes objeto da queixa terão ocorrido entre 2011 e 2018. O caso foi resolvido através de mediação, o que significa que um acordo na base do principio de “não-admissão- de – responsabilidade” pelos crimes alegados. Contudo, e sintomaticamente, a Gemfields concordou em atender a todas as reivindicações – o que, na pratica, se traduz em “confissão” implícita de culpa!
Como parte do esforço para melhorar as suas relações e imagem junto das comunidades locais, a Gemfields anuncia também o estabelecimento de um fundo de, “pelo menos”, USD655,000 para projectos sustentáveis de longo termo, nas áreas da agricultura e criação de habilidades para promover actividades económicas e oportunidades de trabalho.
As indeminizações ora acordadas, no valor de USD8,3 milhões podem, aos olhos de incautos, parecer um acordo extremamente oneroso para a Gelmfields e a sua subsidiária moçambicana, a Montepuez Rubi Mining. Contudo, tal quantia é efectivamente irrisória: segundo a própria empresa, dos primeiros 11 leilões de rubi até agora realizados, ela já rendeu USD463 milhões em receita total, significando que o valor das indeminizações e compensações à comunidade prejudicada corresponde a menos de 2% do valor daquelas vendas.
Este acordo tem duas características muito interessantes: Primeiro, resulta de uma acção judicial de uma entidade estrangeira, contra uma empresa estrangeira, que viola direitos humanos de moçambicanos, em território moçambicano, aonde explora valiosos recursos naturais, sob concessão do Estado Moçambicano.
Segundo: É a própria empresa que, mesmo negando “responsabilidade” pelas práticas criminosas constantes na acusação, determina, no seu livre arbítrio, o valor com o qual decide indemnizar ou compensar as vitimas, em Moçambique. O Estado moçambicano não é, aqui, nem tido nem achado!
Há, neste “arranjo”, duas leituras imediatas: em primeiro lugar, são entidades estrangeiras que, entre si, discutem e acordam sobre formas de “fechar” as suas diferenças em relação a crimes praticados em Moçambique e contra cidadãos moçambicanos! Em segundo lugar, no quadro deste acordo, ficam de fora, senão mesmo ilibados, os autores destas práticas criminais, o que eles podem interpretar como anuência ou aprovação implícita à sua conduta.
Ora, o que sobressai, como sendo a principal causa do estranho quadro, é a inércia cúmplice das autoridades estatais moçambicanas, administrativas e judiciais, perante comprovados casos de grosseiras violações de direitos humanos por parte de empresas extractivas, resultando em que a defesa dos direitos humanos de cidadãos nacionais seja, sistematicamente, feita por organizações internacionais.
Em Julho de 2017 foram divulgados vídeos, mostrando ações de extrema violência, com actos degradantes e brutais de agentes uniformizados e armadas da PRM, e falando em Português, enquanto espancavam homens com roupas rotas e muito sujos.
Na altura, a Comissão Nacional dos Direitos Humanos, uma instituição do Estado, emitiu um comunicado, informando que havia sido constituída uma comissão conjunta de investigação, em que ela mesma era parte, e envolvendo a Procuradoria-Geral da Republica e a Policia da Republica de Moçambique. O objetivo da comissão era investigar estas denúncias e identificar os responsáveis, para os responsabilizar criminalmente.
Contudo, realizada a investigação, jamais o respectivo relatório foi tornado público – nem mesmo pela própria CNDH – muito menos sobre a identificação dos autores de tais actos, e
seu encaminhamento às instâncias da justiça.
Porquê?
TV Mario
Não é nova a ideia de venda de estrelas. Promotores turísticos colocam estrelas e constelações, como produto ao alcance de seus clientes. Assim, os pacotes turísticos ganham novos atractivos. Ponta Mamoli e alguns outros resorts, coincidentemente, já fazem uso e recurso destas técnicas promocionais. Não vendem estrelas, mas potenciam o paz, sossego e calmaria, como antídoto de qualquer stress. Tudo, obviamente, associado ao prazer de contemplar o potencial turístico, a culinária e a beleza exótica de ecossistemas especiais. No meio do turbilhão que sacode títulos e manchetes jornalísticas, Naomi Campbel, a célebre modelo, negra, britânica, passou alguns dias no sul de Moçambique. Mais exactamente, na Ponta Mamoli. Esse "lodge" encalhado no majestoso ecossistema Maputaland-Pondaland que, faz algum tempo, despertou os apetites e curiosidades de cientistas e ambientalistas, de todas as partes do mundo.
O "hotspot" de biodiversidade da Maputaland-Pondaland, que se estende por mais de 275.000 kms quadrados, através de Moçambique, Suazilândia e África do Sul, faz parte das 34 áreas de conservação de biodiversidade consideradas das mais biologicamente ricas e diversificadas do planeta. Porém, e infelizmente, são regiões ameaçadas e com algumas espécies endémicas em risco. Portanto, têm, por conseguinte, potencial para serem economicamente exploradas e viabilizadas, e possuem características sui géneris. Aliás, como diz a própria Naomi Campbel, o céu nunca foi o limite, pois nós próprios somos o limite que pretendermos.
Mas não foi apenas a Naomi Campbel que visitou o complexo White Pearl, neste 2019 que agora inicia. A modelo croata Nina Vagic, igualmente de enorme reputação mundial e colega de longa data da outra, veio junto. Luciano Huck, do Brasil, famoso e aclamado apresentador de televisão da Globo, e a sua esposa Angélica também estiveram no país, desta feita em Inhambane. Até o Presidente do Botswana escolheu este canto para repousar. Nada acontece por simples coincidência. O mais importante segredo do turismo é sempre um bom plano de marketing. O marketing quando estabelecido de forma estratégica e, com alvos definidos, tem a condição de atingir alvo certos e, depois, os resultados aparecem! Verdade que a estabilidade que o país vive, os sinais externos que emite, contribuem e mobilizam. As estâncias precisam de fazer a sua parte, assegurando que as estadias sejam serenas, tranquilas e, acima de tudo, proveitosas.
Estas presenças servem para ajudar e publicitam o emergente turismo moçambicano. Colocam o país na rota dos circuitos de turismo de baixa intensidade e alto rendimento. Deste modo, as instâncias turísticas ganham seus espaços de eleição e competitividade. As vantagens comparativas despontam e os padrões de qualidade criam seus segmentos de mercado. Assim funciona a indústria turística pelo mundo.
Mas, não basta potencial. Tão-pouco o marketing por si só faz milagres. Os contornos vão muito para além destes elementos. Temos de ser competitivos e propiciar as condições atractivas para os visitantes. Ao longo de anos, o maior diferenciador de incentivo foi o turismo cibernético. Para o interior das coutadas desaguavam caçadores desportivos que, a troco de troféus, a preço de banana, alimentaram as coutadas e comunidades vizinhas. A instabilidade militar reduziu consideravelmente a apetência pela fauna nacional!
Os furtivos, então, encontraram espaço para os desmandos. As praias, podem agora substituir estes segmentos e despontar como os novos delfins do turismo nacional. Convenhamos, desta forma, que estas e outras visitas não têm aparecido por acaso!
As estâncias ainda apresentam preços pouco competitivos e a promoção tem sido feita extras-muros. Próximo das constelações. As primeiras visitas do Prince Harry, seguidas depois do Dolce & Gabbana, abriram os caminhos para que estas novas visitas aconteçam. Poderemos esperar por mais, principalmente, se a mobilização boca a boca continuar. Porém, as exigências vão aumentar e o nível de preparação terá de ser outro.
Na recente visita da dupla Naomi e Nina ficou evidente o nível de exigência. Chegaram com volume de bagagem anormal e acomodar esses volumes exigiu perícia. Apenas bebiam, por força de seus contratos profissionais, água da Evian. Isso, porém, só foi alertado, com as visitantes já no terreno. Não adiantaria pensar em fazer compensações. Mesmo estando em locais remotos foi necessário encontrar soluções, bem como equacionar outras questões tão exigentes como sendo o cuidar do cabelo, das unhas e etc. Ter os mesmos funcionários, para o atendimento personalizado, também, foi uma experiência desafiante. Estes requintes e confortos, têm de ser associados a momentos de rara qualidade, educativas descobertas, pura diversão e relaxamento.
Obviamente, tudo isto serve e serviu de aprendizado para a gestão do White Pearl, como de toda a cadeia que esteve envolvida. A primeira impressão, como diz um adágio popular, é a que mais conta. Então, para começo de jornada, elas ficaram impressionadas, como têm ficado os restantes visitantes. Moçambique tem, por natureza, o dom da hospitalidade, por conseguinte, beneficia desse factor de forma proveitosa. Este teste foi muito mais que um investimento, foi o reafirmar de uma vontade de todos nós, de fazer do país um destino privilegiado.
Naomi, assim que terminou a visita, fez um "post" na sua página onde agradece ao White Pearl e a Moçambique por a ter acolhido, pelas experiências e hospitalidade. Oxalá, está exclusiva menção chegue aos olhos e banhe os ouvidos de outros tantos candidatos visitantes. Como promotora da Channel e outras marcas, abrem-se perspectivas de novas visitas e outras estrelas e constelações.
A evolução das sociedades demonstrou ao longo do tempo que nem todas elas dependem de si mesmas. Há momentos em que claramente se conclui que alguém (estranho) manda nalgumas sociedades e determina o que deve ser feito e como deve ser feito. Isto acontece em sociedades onde o poder político é fraco ou depende dos outros, ou quando está comprometido com outras agendas que o povo desconhece. São outros que, geralmente, determinam as regras de jogo político-económico e que acabam influenciando o ser e estar da sociedade no seu todo. Se a soberania de um Estado reside no seu povo, conforme se tem defendido nas ciências políticas e sociais, verdade é que esse mesmo povo nalgum momento deixa de ter o poder de exercer e decidir sobre matérias que lhe dizem respeito. Não se pode compreender um Estado que se deixa amordaçar por interesses alheios ao seu povo que é a razão da sua existência. Da mesma forma que não se pode deixar de criticar uma actuação passiva em relação a matérias de grande interesse e impacto social como é a das dívidas contraídas sem legitimidade e muito menos obedecer o que a Constituição da República preconiza.
O mais grave é o facto de todo o poder instituído parecer desconhecer (!) que era necessário que a Assembleia da República se pronunciasse e autorizasse previamente a realização de tais dívidas. Valeu a pressão popular para clarificar o mal cometido e exigir a responsabilização, que, infelizmente, ainda não aconteceu.
O arranjo político protagonizado pela Assembleia da República para que as dívidas ocultas fosses inscritas na Conta do Estado, peca por não ter aguardado pela clarificação de todo o processo relacionado com as mesmas, razão pela qual o questionamento popular. Não se pretende com isso dizer que não se podia votar a favor, o que se pretende dizer é que a votação deveria ter obedecido os princípios da prudência e certeza. Ora, se já está claro que as dívidas foram contraídas sem o consentimento da Assembleia da República e se elas estão a causar um mal-estar maior ao povo, então, no mínimo, o que o poder político deveria fazer é pedir desculpas e reconhecer o erro cometido, recuar na sua decisão e exigir que se clarifique a situação antes de se carimbar o voto de aceitação parlamentar. Para além disso, é necessário que se mostre ao povo que há vontade política de se responsabilizar os autores da referida dívida e não deixar que qualquer pessoa especule sobre matérias tão sensíveis de que não possui conhecimento. Tudo quanto se tem dito não mostra clareza absoluta sobre o que aconteceu ou está a acontecer, colocando ainda mais confusão na mente das pessoas.
Não se fala doutra coisa senão das dívidas ocultas. Vive-se um ambiente de especulação e desconfiança que não é benéfica para o País. Uma coisa é certa: Contraiu-se uma dívida que não se sabe ao certo quanto é como é que foi gasto o dinheiro. Ora, os últimos pronunciamentos e desenvolvimentos em face da detenção do ex-Ministro das Finanças, Manuel Chang, sugerem que fomos mesmo enganados. Aliás, considerando o que alguns membros do Governo tem dito, também não sabem ao certo o que aconteceu, senão de que há uma dívida por pagar, resultante de um empréstimo feito a favor das empresas Ematum, Proindicus e Mam. Então, se o Governo não sabia ao certo o que estava a acontecer com as referidas dívidas, porque é que remeteu à Assembleia da República para o seu reconhecimento? Quer parecer que a Assembleia da República ao votar a favor de inscrição das dívidas ocultas fê-lo na plena consciência de que o Executivo estava consciente de que as mesmas eram reais.
Partindo do princípio de que os Bancos emprestaram o dinheiro àquelas empresas tuteladas pelo Estado e este avalizou tais empréstimos através das garantias que prestou, certamente que alguém do Governo esteve envolvido nesta operação. Além disso, e ao que se sabe, a empresa promotora da operação foi a Privinvest que montou todo o negócio juntamente com alguns dirigentes moçambicanos. Quanto é que cobrou pelo trabalho? A actual tese de que o Governo não tem conhecimento exaustivo do dossier não é aceitável, embora se compreenda que se trata de membros do novo Executivo, contudo, um dossier que vale 1 bilião de dólares não passa despercebido. Aliás, um dos grandes problemas que ainda não foi esclarecido é se todo o dinheiro foi usado ou ainda existe algum por usar?! Se porventura ainda existe, onde está depositado tal dinheiro e quem foi que depositou? Será que todos os equipamentos foram fornecidos? Se as empresas que beneficiaram de tal montante são do Estado, significa que pertencem ao povo, por isso, o mais certo seria que os seus responsáveis convocassem uma conferência de imprensa e informassem ao povo sobre o que aconteceu em relação aos projectos que ditaram a contracção das tais dívidas e o estágio das empresas em causa!
Se o Governador do Banco de Moçambique apareceu em público (embora pressionado) para explicar sobre o apagão das ATM’s, os tais responsáveis deveriam, também, dar a cara. Da mesma forma que seria bom, senão mesmo imprescindível, que um representante da Privinvest viesse a público informar o que aconteceu, pois, quer parecer que em relação ao seu trabalho, se pode aferir um cumprimento defeituoso do contrato, que lhe sujeita a ressarcir o Estado moçambicano pelos danos causados. O mesmo em relação aos bancos que concederam o empréstimo sabendo de antemão que tais projectos não eram viáveis. Depois de o povo conhecer a história, o resto seria deixado a cargo da justiça. A propósito, o Governo moçambicano até poderia (e ainda vai a tempo) intentar uma acção judicial contra todos os que orquestraram as dívidas ocultas, ou seja a Privinvest, os bancos, membros do Executivo moçambicano, funcionários, beneficiários das comissões, etc. e vasculhar o envolvimento de tais empresas americanas que se diz terem sido lesadas e que levaram com que a justiça americana emitisse o mandato de captura internacional contra o ex-Ministro das Finanças moçambicano, os trabalhadores dos bancos mutantes e funcionários da Privinvest.
A não ser isto feito, nada mais resta senão dizer que fomos de facto enganados, e de que maneira! A detenção do antigo Ministro das Finanças é um filme para desviar as nossas atenções, pois, não visa discutir o cerne da questão, mas sim, as comissões recebidas. Isto é assunto dos outros. O que interessa aos moçambicanos é saber dos meandros da dívida no seu todo. Já agora importa dizer que a nossa justiça brincou em serviço e propiciou um espectáculo barato ao não avançar com os processos na base dos factos em seu poder. Ela tinha tudo para iniciar um ou vários processos judiciais sobre a matéria e mostrar interesse em desvendar este caso. A questão de fundo não são as comissões, mas sim, o grosso do dinheiro que constitui a dívida que pelos vistos foi contraída com o apoio dos bancos que concederam o dinheiro e que os seus responsáveis deveriam ser chamados a esclarecer. Como se pode ver, ao invés de nos atermos ao caso do ex-Ministro das Finanças, devemos prestar maior atenção ao assunto principal que é de facto a dívida no seu todo e que afecta todo o povo moçambicano. Finalmente, o que pagar e como pagar, só é possível dizer depois de tudo estar devidamente esclarecido. Enquanto isso, está mais que claro que a dívida não deve ser paga.
*Docente da Faculdade de Economia - UEM
O Centro de Integridade Pública (CIP) está sob ataque. Este começou nas redes sociais com acusações que sugeriam que o CIP que estava a fazer uma campanha política para derrubar o Governo da Frelimo a mando da habitual “mão externa”, donde seguiu-se uma intervenção do Governo, através da Polícia da República de Moçambique, que passou a impedir que os cidadãos interessados se dirigissem à sede do CIP para obter as camisetas da campanha ou, então, para esbulhar violentamente aqueles que já as tivessem conseguido.
Quem aterrasse hoje (dia 21 de Janeiro) no Aeroporto de Mavalane e se apercebesse dos actos públicos preparatórios e executórios desse ataque organizado contra o CIP pensaria que esta organização estaria eventualmente a organizar uma sublevação armada, manifestações violentas ou a fazer apelos ilícitos de desobediência civil – mas de facto nada disso está a acontecer.
O que na verdade está a fazer o CIP? No âmbito das suas atribuições, o CIP organizou uma campanha pública contra o pagamento das famigeradas dívidas ocultas. Não sendo a primeira campanha do género que apoia, a novidade é que o CIP estampou camisetas nas quais na parte da frente escreveu “Eu Não Pago as Dívidas Ocultas” e por trás colocou o montante total dessa dívida contraída ilegalmente. Seguidamente, convidou os cidadãos interessados a, querendo, irem buscar à sede do CIP uma camiseta dessas ou então a mandar estampar uma com dizeres semelhantes para com o seu uso manifestarem contra o pagamento das dívidas ilícitas.
Objetivamente este foi “o crime lesa-pátria” cometido pelo CIP. Promover uma campanha para mobilizar os cidadãos interessados a dessa forma pressionarem ou persuadirem o Estado moçambicano a não pagar as fatídicas dívidas ilícitas – em bom rigor, deveria ser para pressionar a não continuarmos a pagá-la; pois há muito que já as pagamos directa e indirectamente e com graves repercussões negativas a nível político, económico e social.
A primeira perplexidade que se me coloca é a seguinte: porque se considera ilícito uma que uma ONG cujo objectivo – contido no seu Estatuto aprovado pelo Governo – é a promoção e defesa da integridade pública, esteja a cumprir com o propósito para o qual foi criada? Conquanto, goste-se ou não se goste da campanha do CIP, ela traduz uma acção de cumprimento dos objectivos para o qual esta organização foi criada e autorizada a exercer actividade no nosso País. Mobilizar os cidadãos para se manifestarem a fim de pressionarem o Poder Político a não continuar a pagar uma dívida ilegal, odiosa e altamente danosa; contraída criminosamente contra os interesses e prioridades do povo moçambicano não é nada mais e nada menos do que uma actuação dentro da esfera da promoção e defesa da integridade pública. Ninguém em sã consciência pode acusar o CIP de neste caso não estar a cumprir as funções para os quais foi criado – note que o CIP existe porque o Governo aprovou os seus Estatutos, considerou os seus objectivos lícitos e socialmente relevantes e, por isso, deu-lhe existência jurídica e autorizou a sua entrada em funcionamento.
O segundo motivo de espanto é o de não saber ter a capacidade de antever que teoria jurídica foi desenvolvida – certamente por uma mente brilhante – para considerar esta campanha do CIP um acto de Polícia e contra ela se mobilizar uma força policial expressiva para impedir que esta organização cumpra com a sua missão e que os cidadãos e interessados em dar expressão à campanha do CIP possam livremente manifestar-se contra a continuidade de pagamento das mal-afamadas dívidas ocultas.
Há alguma dúvida que tais são ilegais? Não há! Nem o Parlamento se atreveu a tanto. Lembremo-nos que Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (constituída maioritariamente por deputados da Bancada da Frelimo e um deputado do MDM) sobre as referidas dívidas também as considerou ilegais, embora recomendasse que o Estado moçambicano assumisse o seu pagamento. Não existe nenhum órgão de soberania deste País que tenha considerado que tais dívidas, sobretudo que a emissão de garantias soberanas para cobri-la, eram legais. Nem mesmo a Resolução da Assembleia da República que mandou inscrever a referida dívida na Orçamento Geral do Estado (cuja constitucionalidade ainda está por apreciar há mais de um ano no Conselho constitucional) considerou tal dívida legal. A justificação dada na altura era que se Moçambique tivesse que pagar, tais montantes deveriam estar preventivamente inscritos no orçamento. O que sempre foi o pomo da discórdia era discutir se neste circunstancialismo ilícito em que a dívida foi contraída, se o Estado moçambicano deveria assumi-las, por força das garantias ilegalmente emitidas, ou repudia-las. O Poder político instituído defendia a assunção, a oposição, várias organizações da sociedade civil e seguramente milhares de cidadãos moçambicanos defendiam o repúdio.
Não foi o CIP que inventou a tese de que os moçambicanos não deveriam pagar esta dívida. Esta tese nem sequer é nova. Uma das primeiras vozes, que eu me lembre, que se fez ouvir e escreveu fundamentadamente contra o pagamento da mesma, há pelo menos mais de 2 anos, foi o Professor Carlos Nuno Castelo Branco. A eles seguiram-se vários outros renomados e anónimos cidadãos, grupos de cidadãos, ONG’s, etc. Actualmente, o CIP apenas tenta dar expressão material – através esta campanha - à indignação colectiva de um numero elevados cidadãos moçambicanos que acham que não devemos continuar a pagar essa dívida ilícita.
Creio que ninguém ignora que esta intervenção policial contra as actividades do CIP e contra os cidadãos que através dela se querem manifestar contra o pagamento das dívidas ocultas é uma afronta à Constituição e aos direitos, liberdades e garantias nela formalmente assegurados. Desde logo, contra o direito à liberdade de expressão e de pensamento. Seguidamente, contra a liberdade do CIP informar os cidadãos moçambicanos, no contexto dos fins para os quais foi criado, e o consequente direito destes cidadãos serem informados. Há igualmente uma clara agressão ao direito fundamental à manifestação, porquanto o uso da camiseta com a inscrição “Eu Não Pago as Dívidas Ocultas” é uma forma lícita, pacífica e ordeira de um cidadão ou um grupo de cidadãos manifestar-se contra aquilo que entende ser a violação dos seus direitos e legítimos interesses.
Portanto, o uso de força estatal contra a campanha do CIP não é apenas um ataque contra esta organização, mas também e sobretudo, contra a Constituição e contra a cidadania activa ... no fundo uma agressão -mais uma - contra o Estado de Direito democrático que insistimos em dizer que somos, mas materialmente recusamo-nos a sê-lo. Que ninguém se engane a pensar que esta manifestação autoritária e autoritarista do Estado têm que ver apenas contra a campanha do CIP ou contra a distribuição de camisetas estampadas. Não é o medo da campanha do CIP que levou os nossos dirigentes a enviarem força policial para tentarem contê-la à nascença.
É o medo das consequências desta perante o circunstancialismo interno e externo altamente desfavorável que presidiu à reacção despótica. Os nossos governantes não temem um mero apelo popular contra o não pagamento das dívidas ocultas, tanto mais que se percebe que este tipo de campanhas poderia de alguma forma ajudar à posição do Governo na negociação da dívida com os “credores”. O temor é que o descontentamento revelado a partir desta campanha se alastre para algo maior e se torne incontrolável. Receia-se que o CIP possa estar involuntariamente ou voluntariamente – depende dos pontos de vista - a acender um palito de fósforos muito perto de um barril de pólvora.
Portanto, o autoritarismo hoje exibido contra a campanha do CIP funda-se, por paradoxal que pareça, no medo. Seguramente por causa de uma série de circunstâncias internas e externas politicamente adversas que enumeraremos a título meramente exemplificativo: (i) a prisão de Manuel Chang; (ii) o conhecimento público da matéria indiciaria criminosa contida na acusação formulada pela Justiça norte-americana contra Manuel Chang e mais 2 moçambicanos; (iii) As tentativa feitas pelo Estado moçambicano de impedir a extradição de Chang para os EUA para ser julgados pelos crimes de que foi acusado; (iv) o exemplo do movimento dos coletes amarelos em França que resilientemente se manifestam contra o Governo de Emmanuel Macron e pedem a sua queda há mais de 4 semanas; (v) as manifestações populares no Sudão que duram há cerca de 1 mês e clamam pela queda do Presidente Omar Al Bashir e (vi) bem mais próximo, as manifestações contra o aumento do preço do combustível no vizinho Zimbabwe, as quais duram há mais de uma semana e inclusivamente já obrigaram ao regresso antecipado do Presidente Emerson Mnangagwa, que se encontrava na Rússia, ao País.
Repito, não se teme a campanha do CIP em si, temem-se eventuais efeitos de contágio dessa campanha por causa de um contexto político interno e internacional altamente desfavorável. Receia-se um eventual efeito dominó que este movimento de cidadania pelo não pagamento das dívidas ocultas possa provocar. E é em nome desse medo maior que o CIP está ser atacado. O CIP está a ser uma vítima ocasional do seu “timing”, das circunstâncias políticas interna e externas e do recurso ao autoritarismo para combater o medo.
Por isso, não adianta o CIP declarar que a sua campanha não tem fins políticos, pois isso é sabido. Mas, o medo de eventuais derivações políticas desta campanha, atentas as circunstâncias já referidas, não irá favorecer a compreensão neste sentido. O ataque continuará, pois o medo dirá que esta campanha do CIP não deve acontecer: não porque ela é política, mas porque é entendida nos meios do Poder como “politicamente inoportuna”. E no nosso País, como sabemos, a regra é a da “Política no Comando”. Na verdade, tudo isto aparenta ser um ataque do "Receio de Integridade Pública" (RIP) contra o Centro de Integridade Pública (CIP).