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quarta-feira, 18 março 2020 05:59

Análise: O Corona-Vírus em Moçambique e um Governo à espera da tragédia

A vacuidade das declarações de Filimão Suazi, o porta voz do Governo, ontem depois de uma mais uma sessão do Conselho de Ministros que se esperava profícua em medidas consistentes contra a pandemia do Covid-19, foi alarmante. Moçambique está à espera do que vai acontecer nos próximos dias, para aumentar suas medidas de contenção. A mesma ladainha de Armindo Tiago (Ministro da Saúde), na sua pobre entrevista à STV: Não se sabe o que vai acontecer, disse ele. Em suma, Moçambique está à espera que a tragédia bata à porta para encetar uma reacção tardia.

 

Mas uma reacção tardia implica o quê? Implica camas suficientes nos hospitais, os ventiladores que não temos (na Itália morre-se por essa ausência), enfim, um sistema de Saúde incapaz de dar resposta à avalanche de doentes com sintomas graves: os 8% que acabam nos hospitais, aqueles cujos sintomas envolvem a perda de ar. Os dados mostram que dentre estes, 3 acabam morrendo.

 

A espera por uma panaceia curativa nos hospitais é grave. Não temos capacidade nenhuma. Olhem para este número: o sistema nacional de Saúde tem apenas 2000 testes. Nem chega para todos os trabalhadores do HCM, onde a maioria actua sem máscaras.

 

O Governo está a ignorar uma coisa que devia saber: a janela de oportunidade para medidas de prevenção drásticas começa quando o Covid-19 chega ao país vizinho mais próximo. Desde lá tem-se apenas 15 dias para agir (foi como fizeram a Tailândia e o Macau, dois territórios com sucesso na contenção do vírus; o Macau obrigou ao uso de máscaras e isso funcionou, contra outras teorias).

 

Depois disso, é ir tapando o sol com a peneira, como está acontecendo com países como a Itália e Portugal (ou mesmo os Estados Unidos, onde Trump andou a minimizar a doença, no mesmo diapasão da espera que apaixona nossos governantes). Outro dado cruel: o facto de não ter ainda havido confirmação oficial de infeccões pelo Novo Coronavírus em Moçambique não é garantia de que a doença ainda não esteja entre nós: 80% dos infectados são assintomáticos.

 

A incapacidade do Governo de responder proactivamente à pandemia envolve coisas bizarras. Deixaram o Presidente Nyusi anunciar medidas para pôr na gaveta, como essa da “quarentena obrigatória” para quem chega de fora. Basta ir aos aeroportos para verificar sua ineficácia, por desleixo e negligência.

 

A espera do Governo tem contornos sinistros e revela uma profunda distração. O Ministro Armindo Tiago tem fama de bom clínico, mas ainda não mostrou cartas em matéria de saúde pública. Ele podia ter usado a oportunidade para passar a mensagem que o Governo teima em não fazer passar nestes dias. Afinal, o que é quarentena? (todos falam de quarentena, mas ninguém sabe o que é isso, como acontece na prática o auto-isolamento). E como é que os que estão de quarentena se devem portar em casa, perante outros membros da família? Como nos devemos portar no “my love” e nos comboios? Como lidarmos com nossos empregados? Como usar a “lixívia” como ferramenta de limpeza das maçanetas das portas e corrimões? Como usar o lenço de cabeça como substituto mais eficiente das máscaras que já não há no mercado?

 

Enfim, a janela de oportunidade que estamos a perder obrigaria a um enfoque de todos na comunicação, na sensibilização pública, na pedagogia contra o vírus. Não esperar de braços cruzados, como sugeriu o Porta-Voz do Governo...esperar que aconteça algo para reagir. Esperar que a tragédia bata à porta. Esperar que haja mortes. Terrível. O próprio Orçamento do Estado está à espera da tragédia.

 

O Governo devia estar todo ele empenhado em ensinar a sociedade como agir. Devia ter uma "Task Force" de comunicação e pedagogia sobre o assunto. E com base nas directivas do MISAU, ministros e deputados, partidos políticos (a Frelimo, a Renamo e o MDM) deviam estar no terreno a mobilizar seus militantes contra o inimigo comum. Nossas possibilidades como país de enfrentar o Covid-19 não estão no plano curativo; estão na prevenção, na comunicação de massas. O tempo está a esgotar, mas ainda se pode fazer qualquer coisa. Não precisamos de esperar nem mais um minuto.(Marcelo Mosse)

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