Desde a hora zero de ontem, o país está em Estado de Emergência decretado pelo Presidente da República (PR) no contexto do combate à pandemia da Covid-19, cujo formalismo legal (Ratificação pela Assembleia da República, promulgação e publicação no Boletim da República-BR) foi feito em cima do joelho.
E porque foi feito tudo às pressas e de forma atabalhoada, a emenda saiu mesmo pior que o soneto. Logo nas primeiras horas, os inúmeros Boletins da República (onde vinham publicados o Decreto Presidencial no 11/2020/ de 30 de Março) foram postos a circular, sendo o destaque as datas trocadas e ainda o facto de apresentarem menos artigos que a proposta saída da AR. A ideia da circulação madrugadora dos BR’s em vários grupos de WhatsApp tinha um único objectivo: passar a ideia de que o Estado de Emergência já estava a vigorar e que os formalismos legais haviam sido tempestivamente observados, tal como demanda a Constituição da República.
Mas a ginástica não conseguiu evitar o fracasso há muito anunciado, tomando em consideração a data da declaração do Estado de Emergência pelo PR, a ratificação do decreto presidencial pela AR (quase às 23:00h), a promulgação e publicação no BR pelo chefe de Estado e ainda a entrada em vigor. A desarticulação foi de níveis assombrosos, que até a Polícia da República Moçambique (PRM) outorgou-se a si o direito de encerrar restaurantes, cafés e lojas, sob alegação de estarem cobertos pelo decreto sobre o Estado de Emergência.
Quando eram sensivelmente 12:43 horas, do Gabinete de Imprensa do Presidente da República, chegava a informação oficial da promulgação e publicação do decreto presidencial sobre o Estado de Emergência no BR. A nota de imprensa vincava que, depois de verificar que não contrariava a lei fundamental, o chefe de Estado promulgou e mandou publicar no jornal oficial, depois de ter sido aprovado pela AR a 31 de Março último (que ainda no mesmo dia submeteu ao gabinete do PR). Importa realçar que a Assembleia da República ratificou o Decreto Presidencial poucos minutos antes das 23:00 horas, depois de sucessivos adiamentos e momentos de tensão entre os deputados.
Mas o facto é mesmo que o dia de 1 de Abril começou não de forma diferente do último dia de Março findo, na cidade de Maputo. Apesar do agravamento das medidas restritivas assistiu-se a um total e completo relaxamento, seja dos que deviam seguir à risca as novas instruções bem como dos que deviam garantir o cumprimento escrupuloso das mesmas.
“Carta” efectuou, na tarde e princípio da noite de ontem, uma ronda por alguns bairros e artérias da capital do país, Maputo, (bairros do Aeroporto, Mafalala, Alto-Maé, Jardim e Inhagoia “A”) e ainda a mal-afamada “baixa da cidade”. “Normalidade” é palavra que fielmente descreve o cenário, fora os sinais referidos de repressão policial contra o comércio.
Longe do habitual frenesim, mas muito mais distante da acalmia que se pretendia ou que normalmente caracteriza a vigência de um regime extraordinário, tal é o caso do Estado de Emergência, no contexto de uma pandemia que põe em causa a soberania de vários Estados, não sendo o nosso país uma excepção.
No bairro do Aeroporto “A”, crianças, jovens e adultos circulavam esbanjando um total à-vontade. O pequeno comércio (contentores de venda de géneros alimentícios, peças de viaturas e barracas de venda de bebidas alcoólicas) não só estava aberto como seus clientes, em número considerável, deleitavam-se à moda fim-de-semana. À entrada de cada barraca era possível ver um balde contendo água e, do lado, sabão, para higienizar as mãos. A distância mínima recomendada pelas autoridades de saúde perdeu lugar para as tradicionais rodas de copos.
Similar situação foi possível observar durante uma ronda rápida ao Bairro da Mafalala. O clima assemelhava-se ao de férias colectivas. Os petizes corriam de um lado para outro e as barracas ao longo da Av. Acordos de Lusaka funcionavam na maior normalidade. Até por volta das 18:00 horas, altura em que terminamos com a ronda pela capital do país, as barracas funcionavam em pleno. No bairro de Inhagoia “A”, sobretudo no mercado e na rua que nele dá acesso não havia uma nesga de espaço. Havia água e sabão, sim, isto à entrada de cada barraca, mas também cidadãos que impunham a sua própria lei com as suas altamente potentes aparelhagens.
Na zona cimento de Maputo, pelo menos ao longo da Av. Eduardo Mondlane, boa parte das lojas encontrava-se aberta, mas o movimento assemelhava-se ao dos domingos. Nas poucas (lojas) em que conseguimos vislumbrar alguns clientes era possível contar a dedo.
O mercado informal do Estrela espelhava uma outra face da moeda. Num rápido golpe de vista, constatamos que estavam concentrados naquele que é um dos mais afamados epicentro comercial da capital (muito pela disponibilidade e diversidade da oferta e a todo o tipo de preço) muito acima de 50 pessoas. Estavam os vendedores das bancas, da roupa dos passeios, dos concertos rápidos e das bebidas alcoólicas. Só não registou a habitual enchente, precisamente porque uma e outra barraca ou loja não abriu.
A baixa da cidade de Maputo continuava sombra de si mesma. Longe de acolher o tradicional aglomerado desde a guerra que a edilidade está a travar com os vendedores informais. A Polícia Municipal, para além de frustrar toda e qualquer tentativa da ocupação dos passeios, ontem deu-se ao luxo de mandar encerrar algumas lojas. Aliás, é de salientar que as paragens ao cair da tarde de ontem não estiveram longe das tradicionais enchentes. Apesar do álcool para desinfectar as mãos, os autocarros continuavam a levar passageiros acima do recomendado, condição essencial para rápida propagação desta doença conhecida pelo seu elevado grau de contágio. (I. Bata)
Um sismo de magnitude 4.8 ML na escala de Ritcher, a uma profundidade de 10km, ocorreu nesta madrugada (01h:18min:13s), com epicentro no Canal de Moçambique, a 60 km da Cidade de Pemba em Cabo Delgado. O evento foi registado pelo Instituto Nacional de Minas. Não há ainda indicação de danos a bens ou pessoas. (Carta)
O número de pessoas infectadas com o novo coronavírus (Covid-19) registou mais uma subida. Nesta quarta-feira, o Ministério da Saúde (MISAU) anunciou a existência de mais dois cidadãos infectados pela pandemia, elevando, desta forma, para 10 o número total de casos confirmados, no país.
Os dados foram actualizados pela Directora Nacional de Saúde Pública, Rosa Marlene, durante o seu habitual briefing diário com a imprensa, no qual afirmou que os dois novos casos foram testados nas unidades sanitárias privadas, sendo que os resultados foram confirmados por um laboratório sul-africano.
“Um dos casos é de um jovem do sexo masculino com mais de 18 anos, moçambicano, estudante em Portugal. O outro caso registou-se num indivíduo de nacionalidade sul-africana, com mais de 60 anos de idade. Um deles é da cidade de Maputo e o outro aguardamos informações do laboratório para esclarecer sobre sua localização”, explicou Rosa Marlene.
Segundo a Directora Nacional de Saúde Pública, de terça-feira para quarta-feira, o Instituto Nacional de Saúde testou mais 17 suspeitos, porém, os seus resultados deram negativos para o novo coronavírus. No total, a instituição credenciada para fazer a testagem dos casos suspeitos de Covid-19 já diagnosticou 284 casos suspeitos.
Na sua explanação, Marlene afirmou que os novos casos foram confirmados no princípio da tarde, pelo que as equipas de vigilância estavam no terreno a recolher mais detalhes em torno dos mesmos.
De acordo com Rosa Marlene, até esta quarta-feira, as autoridades de saúde tinham identificado um total de 124 contactos com primeiros oito casos confirmados de Covid-19 e que estão em acompanhamento. Porém, ressalvou que o cenário poderá mudar, tendo em conta os dois novos casos.
Questionada sobre o estado clínico dos pacientes que padecem de Covid-19 há mais de 10 dias, Marlene respondeu: “Da informação que temos, até ao momento, é que os casos estão a evoluir bem e não temos nenhuma informação de agravamento da sintomatologia”.
Refira-se que os novos casos foram confirmados no primeiro dia de observância do Estado de Emergência, em Moçambique, decretado pelo Presidente da República, como forma de conter a propagação do vírus que já infectou perto de 900 mil pessoas e que já causou cerca de 45 mil óbitos, em todo o mundo. (Marta Afonso)
A Assembleia da República (AR) ratificou quando faltavam poucos minutos para às 23 horas, desta terça-feira, o Decreto Presidencial que declara o Estado de Emergência no contexto do combate ao novo coronavírus (Covid-19). Um total de 208 deputados (dos 250 que compõem o órgão) votou pela ratificação daquele dispositivo legal que determina o Estado de Emergência por um período de 30 dias que começaram a contar a partir das 00 horas hoje (quarta-feira).
Esta é, desde a sua constituição, a primeira vez que Assembleia da República ratifica um Decreto Presidencial sobre o Estadodo de Emergência.
Entretanto, a ratificação do Decreto Presidencial no 11/2020/de 30 de Março foi marcada por sucessivos adiamentos e por momentos de exacerbação de ânimos entre os principais actores (deputados). A sessão estava inicialmente prevista para iniciar as 16 horas. Este horário fora definido pela Comissão Permanente da AR, que esteve reunida em sessão extraordinária durante a manhã e princípio da tarde de ontem. Debalde! A sessão só veio a arrancar quando já passava das 18 horas, ou seja, duas horas depois.
Concertações a nível da Comissão Permanente, entre as três bancadas, nomeadamente a Frelimo, Renamo e a do Movimento Democrático de Moçambique, respectivamente, foram o mote para atraso no arranque dos trabalhos. Mas as concertações de nada valeram, isto porque no decurso do debate e no período da votação, as divergências vieram ao de cima de tal forma que a Presidente da AR, Esperança Bias, teve de, novamente, interromper a sessão para nova busca de consensos. Esperança Bias interrompeu quando eram 20: 17 h. A nova interrupção era por 1 hora, estando o regresso previsto para às 21: 17 h.
No centro da discórdia estavam os reparos apresentados pela Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e Legalidade (primeira Comissão) e pelas duas bancadas que perfazem a oposição no órgão (Renamo e MDM), durante o debate. Essencialmente, a mais importante comissão da AR e as bancadas retromenciondas exigiram a clarificação das circunstâncias e condições em que as limitações e imposições previstas no artigo 4 (Execução Administrativa) do decreto presidencial seriam aplicadas.
Mas a gota de água que fez com que o copo transbordasse foi quando a Esperança Bias propôs que se passasse à votação do decreto presidencial sem antes fossem corrigidas as imprecisões e incorporadas as sugestões emergidas do debate. A oposição mostrou-se relutante em votar o documento, por entender que queria ver as alternações introduzidas e a versão final impressa e previamente disponibilizada aos deputados no plenário da AR para que estes pudessem ter ciência do que estavam a votar.
Do outro lado da barricada estavam os deputados da Frelimo, com entendimento oposto, que defendiam com “unhas” e “dentes” que dever-se-ia passar imediatamente a votação, sob o argumento de que as correcções seriam feitas a posterior.
Aliás, o posicionamento da oposição ganhou força quando a ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Helena Kida, na qualidade de representante do proponente, quando chamada a tecer as considerações finais, considerou meritórios os reparos e que era, à letra e no espírito, a favor da alteração.
Entretanto, depois de quase duas horas de espera, a sessão só retomou quando passavam poucos minutos das 22 horas. O clima pesado de outrora cedeu lugar a risos e alguns apertos de mão, embora que tímidos. A oposição esfregava a mão de contente, pois, vira as suas exigências satisfeitas.
E porque as correcções já haviam sido feitas e, consequentemente, ultrapassados os pontos da discórdia passou-se a votação.
Tal como demanda o regimento da AR a votação foi nominal e por ordem alfabética. Cada deputado (pelo nome), à chamada da Presidente do Parlamento, disse se era favor ou contra a ratificação do decreto presidencial. No final, os 208 deputados presentes no plenário da AR votaram a favor. Ou seja, nenhum deputado votou contra.
Dentre as medidas constantes do decreto presidencial destaca-se quarentena obrigatória a todos os viajantes e pessoas com contacto directo com pacientes infectados; a proibição de eventos públicos e privados, excepto questões inadiáveis do Estado e sociais; a limitação da circulação interna de pessoas em qualquer parte do território nacional; a limitação da entrada de pessoas nas fronteiras terrestres, aeroportos e portos, excepto para razões do interesse do Estado, transporte de bens e mercadorias por operadores devidamente credenciadas e situações relacionados com a saúde.
Perfilam, igualmente, o encerramento de estabelecimentos comerciais de diversão ou equiparados ou, quando aplicável, reduzir a sua actividade; a fiscalização dos preços dos bens essenciais para a população incluindo os necessários para o combate à pandemia; reorientar o sector industrial para a produção de insumos necessários ao combate da pandemia; adopção de medidas para apoiar o sector privado a enfrentar o impacto económico da pandemia; introduzir a rotatividade do trabalho ou outras modalidades em função das especificidades do sector público e privado e garantir a implementação de medidas do MISAU para conter o COVID-19 em todas as instituições públicas e privadas. (Ilódio Bata)
Rogério Zandamela, Governador do Banco de Moçambique, o “xerife”do sector financeiro nacional como foi apelidado logo que assumiu o cargo, em 2016, com ares de impiedoso justiceiro, acaba de dar um tiro pela culatra. Ele tencionava aparecer na “town” como um dos decisores mais empenhados em tomar medidas que facilitem a vida dos cidadãos no contexto da crise do Covid 19, mas acaba de fazer um monumental deslize legal.
No passado dia 30 de Março de 2020, o Banco de Moçambique (BM) emitiu um Comunicado sem referência, com o assunto “Medidas extraordinárias para a mitigação dos efeitos da covid-19”
O comunicado abordava os seguintes pontos:
O primeiro afecta os direitos das instituições de moeda electrónica (Mpesa, Mkesh E-Mola) e de crédito de livremente estabelecerem o seu respectivo preçário dentro dos limites legais, conforme previsto no Regime de Comissões e Encargos Relativos a Serviços Financeiros e Respectiva Nomenclatura, previsto no Aviso 13/GBM/2017, alterado pelo Aviso 19/GBM/2017. O segundo ponto afasta uma obrigação legal prevista no art. 18 do Aviso 16/GBM/2013, que estabelece o regime de provisões regulamentares mínimas.
O Governador do Banco de Moçambique, ao tomar tais medidas, estava de boas intensões, mas...cometeu uma gaffe monumental de ordem legal, a qual torna praticamente ineficazes as duas decisões. Porquê? Porque os Avisos do Governador do Banco de Moçambique são um acto normativo, nos termos do art. 142 da Constituição da República, só podendo ser alterados por acto normativo de igual ou superior valor.
Eis um parecer abalizado obtido por “Carta”:”Ainda que se trate de uma situação de emergência, com data específica de início e fim das medidas previstas no Comunicado, este não tem força legal e carece de eficácia jurídica, não sendo juridicamente admissível que por simples Comunicado se altere o previsto nos Avisos supra referidos. O BM deveria, além do Comunicado, ter emitido os respectivos avisos para alterar, ainda que de forma provisória, o regime estatuído, pois só os Avisos em vigor têm eficácia jurídica, nos termos do art. 143 da Constituição da República”.
É esperado que Rogério Zandamela corrija o erro. Mas isso não eliminará uma percepção negativa que as praças têm a seu respeito: ele pode cometer os maiores e mais inimaginados erros e ninguém lhe vai cair em cima. Em contrapartida, se uma instituição por si supervisionada cometesse uma ilegalidade similar, isso daria lugar a contravenções e eventual inibição dos seus dirigentes para continuarem a exercer funções de gestão.
Há quem não compreenda como é que o banco central comete uma “enormidade legal” deste tamanho, quando a instituição tem juristas com salários fabulosos. Uma fonte do BM disse à “Carta” que Zandamela tem vindo a ignorar ostensivamente o aconselhamento jurídico interno. Recentemente, ele lançou um concurso para a contratação de assessoria legal externa. “Carta” não sabe se essa intenção foi concretizada. (M.M.)
A taxa de juro de referência de Moçambique vai subir de 18% para 18,4% em abril, anunciaram hoje a associação de bancos e o banco central, quando os patrões pediam uma descida para enfrentar o abrandamento provocado pela covid-19.
É a primeira vez que se regista uma subida na taxa desde que foi criada em junho de 2017 com um valor de 27,75%. A taxa estava estável há cinco meses e a última descida tinha acontecido em outubro, quando recuou de 18,3% para 18%. O comunicado não esclarece as razões da subida, numa altura de forte abrandamento económico devido às restrições globais impostas pela prevenção da pandemia provocada pelo novo coronavírus.
A subida de 0,4 pontos percentuais surge numa altura em que a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), principal associação patronal do país, tinha pedido que a 'prime rate', que define o custo do dinheiro, descesse para valores ainda mais baixos.
O pedido faz parte de um conjunto de medidas reclamado para enfrentar o impacto causado pelo novo coronavírus.
Os patrões defendem, num estudo sobre o impacto da pandemia da covid-19 na economia, um corte da taxa de juro da Política Monetária (MIMO) em 6.20 pontos percentuais, considerando que "poderá ser imediatamente repassado, na sua totalidade, para a 'prime rate' do sistema financeiro" conduzindo-a a uma "redução 'dos atuais 18% para 11.80%".
A criação da 'prime rate' foi acordada entre o banco central e a Associação Moçambicana de Bancos (AMB) para eliminar a proliferação de taxas de referência no custo do dinheiro e entrou em vigor em 01 de junho de 2017. (Lusa)