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Política

A ADIN é a segunda instituição pública com foco no desenvolvimento integrado que passa para a tutela de Celso Correia. No presente mandato, o Presidente da República retirou a tutela do Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável (FNDS) do Ministro que superintende a área da Terra e Ambiente e passou-a para o Ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural. Ou seja, Celso Correia saiu do sector da Terra e Ambiente e levou consigo o FNDS, instituição criada em 2016 pelo Conselho de Ministros. 

 

Tal como a ADIN, o FNDS tem uma visão integrada de desenvolvimento e uma actuação transversal: é responsável pela Energia rural; Finanças rurais; Água rural; Estradas rurais; Tecnologia rural; Conservação; Aterros (sanitários e industriais); Novas centralidades; Ordenamento do território; Mudanças climáticas; Terras; Florestas e Ambiente. No último mandato, Celso Correia usou o FNDS para reforçar a sua influência política no Governo, promovendo e financiando projectos fora do extinto Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural, onde era titular. 

 

São disso exemplos os seguintes projectos: “Um Distrito, um Banco”, cujo objectivo é acelerar o processo de bancarização das zonas rurais, com vista a garantir total cobertura da rede bancária no país; “Um Distrito, Um Hospital Distrital” – que visa acelerar a implantação e apetrechamento de infra-estruturas para o funcionamento de hospitais de nível distrital; e “Sustenta” – que visa promover e facilitar, através da gestão integrada de agricultura e recursos naturais, o desenvolvimento rural integrado, com vista a contribuir para a melhoria das condições de vida das famílias rurais. 

 

Trata-se de projectos que deverão continuar no presente mandato sob a alçada do FNDS, fazendo com que Celso Correia seja o primeiro ministro responsável pelo sector agrário e de desenvolvimento rural a responder pela construção de hospitais distritais e agências de bancos comerciais. A constante mudança de tutela de instituições, incluindo a concentração de projectos de desenvolvimento integrado num único ministério, é uma prática que vai na contramão dos objectivos que nortearam a reforma do sector público, nomeadamente a consolidação institucional através do princípio de que as pessoas passam, mas as instituições ficam.

 

 A ideia é evitar que as instituições sejam construídas à imagem do “chefe” e fiquem desestruturadas com a sua saída. Por exemplo, o CDD sabe que há uma proposta promovida por Celso Correia de retirada do sector da Agricultura do Serviço Distrital de Actividades Económicas para criar um novo Serviço distrital. Na verdade, o Decreto 6/2006, de 12 de Abril, que aprova o Estatuto Orgânico do Governo Distrital, fixa quatro serviços distritais, mas abre espaço para o Governo Distrital propor a criação de outros serviços e secções fundamentada na necessidade de prestação de serviços ao cidadão com maior qualidade e eficácia. 

 

Ainda assim, o processo de criação de novos serviços distritais deve ser informado de debate público e ter motivos plausíveis para não parecer uma mera satisfação de capricho do Governo do dia. Aliás, não é por acaso que a lei exige que a proposta seja fundamentada na necessidade de melhoria dos serviços prestados ao cidadão, além de que o proponente de novos serviços deve ouvir o Governo Provincial e o Ministro que superintende a área da Função Pública e Administração Local do Estado. (Extraído do jornal Política Moçambicana, do CDD)

O país “parou”, esta quinta-feira, para comemorar a passagem do 45º aniversário da Independência Nacional. As cerimónias centrais, longe da habitual azáfama que lhe são características, devido à pandemia da Covid-19, tiveram lugar na capital do país, a cidade de Maputo, concretamente na Praça dos Heróis, tendo sido orientadas pelo Presidente da República (PR), Filipe Nyusi.

 

Na sua intervenção alusiva à data, Filipe Nyusi desenhou a radiografia do país, desde a proclamação da Independência a 25 de Junho de 1975 até aos dias que correm, apontando os principais ganhos e desafios. Mas foi precisamente nos desafios que o Chefe de Estado centrou a sua abordagem, destacando a paz e a reconciliação nacional como o imperativo nacional.

 

Os ataques terroristas em Cabo Delgado, os ataques armados nas províncias de Sofala e Manica e a conclusão do processo que deve culminar com o Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) dos homens armados da Renamo são, segundo o PR, desafios prioritários, configurando um nó de estrangulamento para o tão almejado desenvolvimento da Nação.

 

Foi, precisamente, no capítulo sobre o DDR que veio a boa nova. O Chefe do Estado anunciou que o processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração dos cinco mil guerrilheiros do maior partido da oposição será concluído em Junho de 2021.

 

O veredicto do Presidente da República vem semanas depois da Comunidade Internacional, que assiste o processo de pacificação, ter anunciando o encerramento da primeira base da Renamo, arredores em Dondo, província da Sofala.

 

O Chefe do Estado fez saber ainda que pouco mais de 300 guerrilheiros da Renamo já foram desmobilizados, desde que o DDR foi retomado. Os guerrilheiros entregaram as suas respectivas armas e receberam roupa, material de construção e valores monetários que variam de acordo com a patente de cada um.

 

“É esperança de todos os moçambicanos que o processo decorra num ambiente de muita honestidade, confiança, seriedade e celeridade”, anotou o Chefe de Estado moçambicano.

 

O DDR retomou, recorde-se, no início de Junho prestes a findar, acto tido lugar no Posto Administrativo de Savane, que dista a cerca de 50 Km da cidade da Beira, província de Sofala, em cerimónia que contou com a presença de Filipe Nyusi, do Líder da Renamo (Ossufo Momade) e da Comunidade Internacional.

 

A retomada do DDR está inserida no âmbito da materialização dos acordos celebrados entre Filipe Nyusi e Ossufo Momade em Agosto de 2019, cuja essência é a devolução da paz perene aos moçambicanos.

 

O DDR arrancou, oficialmente, a 29 de Julho de 2019, tendo permanecido em “banho-maria” quase um ano, devido, entre outros, a constrangimentos de ordem logística, com particular destaque para disponibilidade de fundos

 

Entretanto, o processo vem sendo ensobrado pela falta de colaboração de Mariano Nhongo, líder da auto-denominada Junta Militar da Renamo, a quem se imputa a autoria moral e material dos ataques nas províncias de Sofala e Manica, região centro do país. Na semana passada, Mirko Manzoni, enviado especial do Secretário-Geral das Nações Unidas e Presidente do Grupo de Contacto, lamentou o facto de aquele líder dissidente não estar a colaborar no processo da busca da paz perene.

 

Sobre a instabilidade na região centro e na província de Cabo Delgado, Filipe Nyusi avançou que estes fenómenos continuam a ameaçar a paz no país. Entretanto, o Presidente da República destacou o engajamento das Forças de Defesa e Segurança (FDS) na resposta aos ataques terroristas em Cabo de Delgado e em Manica e Sofala, perpetrados pela auto-proclamada Junta Militar.

 

Ainda no decurso das cerimónias do 25 de Junho de 1975, o Presidente da República condecorou 10 personalidades nacionais que fazem parte de um grupo de 175 condecorados. Os restantes condecorados receberam as suas insígnias em cerimónias que tiveram lugar a nível das capitais provinciais. (I. Bata)

Num golpe contra todas as mulheres moçambicanas ameaçadas por maridos ou namorados abusivos, o Tribunal Superior de Recurso (TSR) anulou a condenação do homem acusado de espancar Josina Machel, filha do primeiro presidente do país, Samora Machel. Desse ataque,  ela perdeu a visão no olho direito. A violência ocorreu em Outubro de 2015, e o homem acusado do assalto, o empresário Rufino Licuco, mantinha um relacionamento com Josina há três anos.

 

O caso foi julgado em Fevereiro de 2017 e o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo considerou Licuco culpado de agressão e de violência doméstica e psicológica. O Tribunal condenou Licuco a uma pena de prisão de três anos e quatro meses. A sentença foi suspensa por cinco anos - sob a condição de Licuco pagar danos à vítima de mais de 200,6 milhões de meticais (cerca de 2,9 milhões de dólares americanos às taxas de câmbio de hoje). Em vez de pagar, Licuco recorreu, e o veredito do Tribunal Superior de Recurso ficou conhecido na quarta-feira.

 

Os juízes de apelação anularam a sentença da primeira instância, o que significa que Licuco não terá que pagar a Josina Machel nenhum dano. Para chumbar o veredicto, o TSR alegou que "não há provas de que o acusado tenha ferido a vítima porque o evento teria ocorrido quando o acusado e a vítima estavam sozinhos e não havia testemunhas desse crime". Claro que não houve testemunhas! Homens abusivos não agridem suas vítimas na frente de salas cheias de curiosos. Mas o facto inegável é que Josina Machel perdeu um dos olhos.

 

A família Machel emitiu uma breve declaração apontando que a decisão do Tribunal Superior de Recurso significa que "a justiça foi negada, com implicações muito graves para milhares de vítimas de violência doméstica que ainda acreditam e buscam apoio de nosso sistema para a administração da justiça".

 

“Entramos neste caso em defesa da honra, dignidade e direitos”, disse a família, “e estamos saindo com as mãos limpas e a cabeça desajeitada. Uma coisa é certa: o sangue de Josina não está em nossas mãos”. Há uma outra avenida de apelo aberta à família Machel. Eles podem apelar sobre questões de direito (mas não sobre fatos) ao Tribunal Supremo de Moçambique. Ainda não se sabe se a família adotará essa abordagem. (P.F.)

A agência de notação financeira Fitch Ratings considerou hoje que o alívio financeiro prometido pela China, na semana passada, a países como Angola e Moçambique, vai aliviar a pressão de liquidez, mas deverá variar consoante o país.

 

"Os esforços de alívio da dívida à China têm o potencial de aumentar o apoio a vários países emergentes pressionados pelo choque da pandemia da covid-19", lê-se num comentário às declarações do Presidente da China, na semana passada, durante o encontro com dirigentes africanos.

 

"O alívio da dívida pode aliviar as pressões de liquidez de curto prazo, particularmente para os países que têm um dívida substancial ligada a entidades chinesas e para as quais há pagamentos este ano", lê-se na nota a que a Lusa teve acesso, na qual se alerta que "os termos e o impacto do alívio da dívida pela China deverão variar consoante os países".

 

Na segunda-feira, o jornal económico angolano Expansão noticiou que Angola tinha já acordado com a China um diferimento nos pagamentos de dívida no valor de 21,7 mil milhões de dólares (19,3 mil milhões de euros), mas não há confirmação oficial por parte do Governo liderado por João Lourenço.

 

"Em linha com a Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI), o presidente chinês, Xi Jinping, num discurso no Fórum de Cooperação China-África (FOCAC), indicou que as instituições financeiras chinesas devem reunir-se com os países africanos para delinear acordos sobre empréstimos com garantias soberanas, que a Fitch vê como dívida oficial bilateral", acrescenta-se no comentário.

 

A China, nota a Fitch, "participa pela primeira vez numa ação de alívio da dívida feita de forma coordenada, multilateral e global", e detém 25% da dívida externa dos países elegíveis para a DSSI, de acordo com os números apresentados em maio pelo Instituto Financeiro Internacional, que tem liderado as negociações para o alívio da dívida do lado dos credores privados.

 

Entre os países que têm uma parte significativa de dívida externa à China e são elegíveis para a DSSI, a Fitch elenca os lusófonos Angola e Moçambique, além de outros como Quénia, Maldivas, Etiópia, Camarões, Paquistão, Laos e Zâmbia, e salienta que os termos e as condições podem ser melhores do que as apresentadas ao abrigo da DSSI do G20.

 

No comentário ao anúncio do Presidente chinês, a Fitch Ratings lembra que a China já renegociou a dívida de alguns países, como Moçambique em 2017.

 

Na nota, a Fitch diz que vai "levar em conta as perspetivas e o impacto do alívio da dívida por parte dos credores oficiais bilaterais, incluindo a China, quando avalia as pressões de liquidez e a sustentabilidade da dívida dos países soberanos" e esclarece que o impacto no rating não é imediato.

 

"Os ratings dos países soberanos pela Fitch aplicam-se a empréstimos feitos pelo setor privado, por isso o alívio da dívida por parte de credores oficiais bilaterais não constitui um incumprimento financeiro ('default') para os países que aproveitem a iniciativa", explicam os analistas, concluindo que "se os credores privados seguirem o apelo do G20 e disponibilizarem também um alívio da dívida, isso pode qualificar-se como ‘default’”, mas atualmente isso não é visto “como suficientemente provável para afetar os ratings soberanos".

 

O relatório da Fitch Ratings surge na mesma altura em que a Comissão Económica para África das Nações Unidas (UNECA) tem mantido reuniões com os ministros das Finanças africanos, na sequência da discussão pública que tem existido nos sobre como os governos podem honrar os compromissos e, ao mesmo tempo, investir na despesa necessária para conter a pandemia da covid-19.

 

A assunção do problema da dívida como uma questão central para os governos africanos ficou bem espelhada na preocupação que o FMI e o Banco Mundial dedicaram a esta questão durante os Encontros Anuais, que decorrem em abril em Washington, na quais disponibilizaram fundos e acordaram uma moratória no pagamento das dívidas dos países mais vulneráveis a estas instituições.

 

Em 15 de abril, também o G20, o grupo das 20 nações mais industrializadas, acertou uma suspensão de 20 mil milhões de dólares, cerca de 18,2 milhões de euros, em dívida bilateral para os países mais pobres, muitos dos quais africanos, até final do ano, desafiando os credores privados a juntarem-se à iniciativa.

 

Os credores privados apresentaram já em junho os termos de referência para a adesão dos países a um alívio nos pagamentos da dívida, que poderiam ser suspensos, mas não perdoados, e acumulavam juros, mas vários governos mostraram-se reticentes em aderir à iniciativa por medo de descidas nos ratings, que os afastariam dos mercados internacionais, necessários para financiar a reconstrução das economias depois da pandemia.

 

A Moody's é a única das três maiores agências de notação financeira que considera que a adesão ao alívio da dívida bilateral aos países do G20 é motivo suficiente para colocar o rating desse país em revisão para uma descida, o que levou a secretária-geral da UNECA, Vera Swonge, a dizer que "nenhum país africano" vai falhar os pagamentos da dívida a credores comerciais e privados.

 

A UNECA, entre outras instituições, está a desenhar um plano que visa trocar a dívida soberana dos países por novos títulos concessionais que possam evitar que as verbas necessárias para combater a covid-19 sejam usadas para pagar aos credores.

 

Este mecanismo financeiro seria garantido por um banco multilateral com 'rating' de triplo A, o mais elevado, ou por um banco central, que converteria a dívida atual em títulos com maturidade mais alargada, beneficiando de cinco anos de isenção de pagamentos e cupões (pagamentos de juros) mais baixos, segundo a UNECA. (Lusa)

Dados sobre a dívida pública, em 2019, divulgados recentemente pelo Ministério da Economia e Finanças (MEF), indicam que o Banco Comercial e de Investimento (BCI) destacou-se, no referido ano económico, como maior credor interno de empresas públicas ou participadas pelo Estado. Dos credores externos, destacaram-se as Concessionárias das Áreas 1 e 4 dos projectos de exploração de hidrocarbonetos.

 

O relatório revela que, em 2019, o stock da dívida interna do Sector Empresarial do Estado (SEE) cifrou-se em 22.609 milhões de Meticais, o que representa 2.4% do Produto Interno Bruto (PIB). O valor representa uma redução em 19%, comparativamente aos 27.936 milhões de Meticais, registados em 2018.

 

“Esta redução verificou-se tanto a nível das empresas públicas, como das participadas em 12.5% e 22%, respectivamente, as empresas participadas representando aproximadamente 66.8% da dívida interna”, lê-se no Relatório Anual da Dívida Pública de 2019.

 

Do total do stock da dívida interna expressa em Meticais, o MEF explica que quatro instituições financeiras é que detinham, em 2019, mais de 90% da dívida do sector empresarial do Estado, com destaque para o BCI com 44.3%, Millennium BIM (18.5%), Standard Bank (16.2%) e Moza Banco (8.3%).

 

“Em termos de beneficiários, cerca 80% da dívida concentrou-se em três empresas, a seguir destacadas: PETROMOC (38.5%), Linhas Aéreas de Moçambique (21.6%) e Aeroportos de Moçambique (17.3%)”, explica a fonte.

 

Maior credor de 1.7 milhão de USD de dívida externa

 

Antes de falar do maior credor externo, importa sublinhar que, em 2019, o stock de dívida contraída no SEE fora de Moçambique (e expresso em Dólar) aumentou em 23.5%, quando comparado com o observado em 2018, passando de 1,431.7 milhão de USD para 1,768.6 milhão de USD, o que representa 12% do PIB.

 

De acordo com o relatório do MEF, 91% destas dívidas estão maioritariamente associadas às operações da Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (ENH) para a sua participação nos projectos de GNL na Bacia do Rovuma e o valor foi emprestado pelas Concessionárias das Áreas 1 e 4 dos projectos de exploração de hidrocarbonetos em instalação na Bacia do Rovuma, província de Cabo Delgado.

 

Para além das Concessionárias das Áreas 1 e 4, o relatório diz que figuram como os maiores credores externos do SEE, em 2019, o Banco Nacional de Desenvolvimento do Brasil (BNDES), Exim Bank da Índia, Banco Europeu de Investimento (BEI) e o Banco de Desenvolvimento da África Austral (DBSA).

 

“Em termos de peso, depois da ENH que compõe cerca de 91% da dívida externa, seguem-se como os maiores beneficiários do financiamento externo: os Aeroportos de Moçambique com uma dívida avaliada em 102.9 milhões de USD (5.8% do total da dívida externa), a PETROMOC, S.A. com 26.4 milhões de USD (1.5%) e a Electricidade de Moçambique com 14.3 milhões de USD (0.8%)”, explicita o MEF. (Evaristo Chilingue)

Um dos fundadores da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e o seu primeiro presidente, Eduardo Mondlane (1920-1969), barbaramente assassinado pelo colonialismo português, é hoje um símbolo maior da unidade nacional do povo moçambicano.

 

No começo dos anos 60 do século XX, no quadro do amplo movimento independentista que alastrava, sobretudo desde o final da II Guerra Mundial, na Ásia, na América Latina e em África, e que tinha chegado também às colônias portuguesas, Eduardo Mondlane empenha-se na construção da unidade entre algumas organizações nacionalistas recentes, formadas por moçambicanos imigrados em territórios vizinhos.

 

Nesses esforços unitários é apoiado por outros combatentes da liberdade, como o seu compatriota Marcelino dos Santos, os angolanos Agostinho Neto e Mário de Andrade, do MPLA, e o guineense-cabo-verdiano Amílcar Cabral, do PAIGC, com os quais convivera em Lisboa em 1950/1951.

 

Para denunciar o colonialismo português a nível internacional e ajudar a dinamizar e coordenar as lutas independentistas nos territórios sob ocupação colonial portuguesa, em abril de 1961 teve lugar em Marrocos a I Conferência das Organizações Nacionalistas das Colônias Portuguesas (CONCP). Dali resultou a criação de um secretariado permanente da frente unitária, que cumpriu a sua missão histórica e se manteve em atividade até finais de 1975, depois de conquistadas, proclamadas e reconhecidas as independências de Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe.

 

Nos seus esforços unitários, nessa altura, Mondlane foi também encorajado por outros destacados líderes africanos da época, como Kwame Nkrumah, presidente do já então independente Gana, ou Julius Nyerere, futuro presidente do Tanganica, depois Tanzânia, após a fusão com Zanzibar. 

 

Assim, sob impulso de Mondlane, de Marcelino dos Santos e de outros patriotas, é criada em Dar-es-Salam, em 25 de junho 1962, a FRELIMO, aglutinando a União Democrática Nacional de Moçambique (UDENAMO) e a União Nacional Africana de Moçambique (MANU) e, mais tarde, a União Nacional Africana de Moçambique Independente (UNAMI).

 

Estavam assim criadas as condições para o desencadear da última etapa da luta de libertação nacional dos moçambicanos, na continuação da resistência à dominação estrangeira e num contexto internacional favorável às aspirações dos povos colonizados à sua emancipação, acentuado após a II Guerra Mundial com a derrota do nazi-fascismo e a consolidação do prestígio da URSS e demais países socialistas.

 

Entre 23 e 28 de setembro de 1962, também em Dar-es-Salam, realiza-se o I Congresso da FRELIMO e Mondlane é eleito seu presidente por ampla maioria.

 

Logo ali ficam definidos os grandes objetivos da luta de libertação nacional do povo moçambicano, depois consagrados nos estatutos e programa da nova organização: a liquidação total da dominação colonial portuguesa e de todos os vestígios do colonialismo e do imperialismo; a conquista da independência total de Moçambique; e a realização das aspirações de todos os moçambicanos explorados e oprimidos pelo regime colonial (“construir um Moçambique independente, desenvolvido e próspero, onde o poder pertença ao povo”). Houve também desde o início uma preocupação grande com o forjar da unidade nacional (“eliminar todas as causas de divisão entre os diferentes grupos étnicos moçambicanos: construir a nação moçambicana, na base da igualdade de todos os moçambicanos e do respeito pelas particularidades regionais”).

 

À semelhança do que já acontecia em Angola e na Guiné, a luta armada foi a via emancipadora escolhida pela FRELIMO, dada a recusa intransigente do colonial-fascismo português em reconhecer e aceitar o direito dos povos africanos à autodeterminação e à independência. A ditadura salazarista já antes tinha recusado as propostas dos líderes do PAIGC e do MPLA para uma solução pacífica visando a independência dos territórios sob ocupação colonial portuguesa.

 

Inicia-se então a mobilização do povo moçambicano para a luta e, em 1963, os primeiros grupos de guerrilheiros são treinados na Argélia recém-independente. Desses primeiros combatentes faz parte Samora Machel, que depois seria líder da FRELIMO e mais tarde o primeiro presidente do Moçambique independente.

 

 

O desencadear da guerra libertadora moçambicana tem lugar em 25 de Setembro de 1964, na província nortenha de Cabo Delgado, abrindo uma terceira frente militar contra o colonialismo português, uma vez que movimentos como o MPLA, em Angola, desde 1961, e o PAIGC, na Guiné-Bissau, a partir de 1963, já lutavam de armas na mão pela independência e libertação nacional dos seus povos.

 

É Mondlane quem lê na rádio o comunicado da FRELIMO proclamando a “insurreição geral armada” contra o regime colonial português, dirigindo-se a “moçambicanas e moçambicanos, operários e camponeses, trabalhadores das plantações, das serrações (…), trabalhadores das minas e das estradas de ferro, dos portos e das fábricas, intelectuais, funcionários, estudantes, soldados moçambicanos no exército português, homens, mulheres e jovens, patriotas.” E promete que a luta para “a conquista da independência total e completa de Moçambique” só cessará com “a liquidação total e completa do colonialismo português.

 

A luta política e armada conduzida pela FRELIMO avança rapidamente. São criadas zonas libertadas no Norte de Moçambique que escapam à administração colonial e constituem o embrião do futuro Estado moçambicano.

 

Com o desenvolvimento da luta armada independentista, tem lugar de 20 a 25 de julho de 1968 o II Congresso da FRELIMO, em Matchedje, no Niassa, numa zona libertada. Participam 170 delegados de “todas as camadas do povo moçambicano, operários, camponeses, intelectuais e chefes tradicionais” e assistem observadores da Organização de Solidariedade Afro-Asiática e convidados do MPLA (Angola), ANC (África do Sul) e ZAPU (Zimbabwé), além do jornalista e escritor britânico Basil Davidson.

 

A declaração final do encontro é clara quanto aos objetivos estabelecidos e à natureza do combate libertador: “Unido, do Rovuma ao Maputo, gozando do apoio das forças populares do mundo inteiro, o povo moçambicano, sob a direção da FRELIMO, continua a desenvolver a guerra popular de libertação nacional, pela erradicação definitiva do colonialismo português, do imperialismo e da exploração do homem pelo homem, pela conquista da independência nacional e a instauração de uma ordem social popular em Moçambique”.

 

O caminho do socialismo

 

Em fevereiro de 1969, pouco antes de ter sido assassinado, numa declaração à rádio da oposição democrática portuguesa em Argel, feita no final da Conferência Internacional de Solidariedade com as Colônias Portuguesas e da África Austral, em Cartum, Mondlane falou sobre o II Congresso da FRELIMO.

 

Explicou por que razão a reunião teve lugar só cinco anos depois do I Congresso: “Dadas as dificuldades que surgiram, e também por causa do desenvolvimento da luta armada, não foi possível realizá-lo antes”. Nesse período, muitos problemas surgiram e desenvolveram-se na estrutura política interna da FRELIMO, no trabalho de organização das populações, na preparação das ações militares e na própria luta armada, desde 1964. Por isso, “era necessário reunir as massas, os representantes do povo, para discutir os problemas e ver qual seria a linha mais correta no desenvolvimento do trabalho”. E assim, “quando nos reunimos em junho, o povo estava preparado para compreender os objetivos dos dirigentes da FRELIMO, assim como estava preparado para perceber os problemas da própria luta armada”.

 

Segundo Mondlane, um dos problemas colocados ao povo era saber se a luta em curso seria “uma luta de longa duração, uma guerra prolongada ou uma luta a curto prazo”. Por isso, “foi necessário discutir que tipo de guerra, o tipo de luta que estamos a travar”, optando-se pela estratégia da guerra prolongada.

 

Também mereceram atenção os problemas econômicos e sociais que preocupavam quer a população das regiões libertadas e semi-libertadas, quer as populações que, por causa da luta, estavam em contato com o inimigo. Tais como o abastecimento de artigos de largo consumo, a falta de hospitais e escolas, o alojamento das pessoas, a participação das mulheres na luta.

 

A posição da FRELIMO em relação a outros países africanos foi igualmente debatida no II Congresso, contou Mondlane: “Nós estamos cara a cara com a Tanzânia, um país amigo e revolucionário. Por outro lado, temos o Malawi, cuja política é reacionária e colonialista, onde um homem como Banda, que foi militante africano no passado e do qual muita coisa esperávamos, está hoje do lado do imperialismo. Há aqueles que assumem posições intermédias, como é o caso da Zâmbia. Consequentemente, era necessário explicar: o que é a África libertada? Que sistemas políticos a dominam? Porque existem homens como Tchombé? Qual é a razão dos sucessivos golpes de Estado? Dado o papel que o imperialismo joga em todas estas situações, era necessário definir a orientação política a seguir e o que se pode esperar de países progressistas da Europa, da Ásia ou da América Latina. O povo que luta, especialmente no Norte, tem necessidade de saber quem é que nos ajuda. O seu contato diário com materiais, armas, medicamentos, equipamentos e alimentos obriga-nos, como é nosso dever, a explicar-lhe quais são as nações nossas amigas e quais são as razões políticas porque países tão distantes se interessam pelos problemas do nosso povo e dão-nos ajuda desinteressada”.

 

 

Sobre as relações entre os povos moçambicano e português, Mondlane era claro: “O povo português tem um papel importante a desempenhar na solução do problema comum aos povos das colônias e de Portugal. Nós, povos de Moçambique, Angola e Guiné, estamos unidos ao povo de Portugal pela identidade da nossa luta contra o fascismo português”. Mais: “Nós confiamos nas posições de luta do povo português contra o fascismo e esta confiança aumenta pelo fato de conhecermos os dirigentes do povo português”. Pelo que “o povo português deve compreender que o povo moçambicano é um povo irmão. Nós, moçambicanos, não temos nada contra o povo português, nem contra a cultura portuguesa. Pelo contrário, o português é a língua falada em todas as nossas escolas do Norte, nas regiões libertadas, e é também o português que é ensinado nas nossas escolas no estrangeiro”. E quanto ao futuro: “Nós queremos cooperar com os democratas portugueses no âmbito da libertação de Moçambique e de Portugal. Queremos colaborar com eles na construção de um novo Mundo, manter com eles um intercâmbio de experiência e de cultura”.

 

A seguir ao II Congresso da FRELIMO, em 1968, Mondlane precisa o seu pensamento sobre a natureza do movimento e os objetivos da luta de libertação nacional, numa entrevista ao jornalista Aquino de Bragança, que participara na fundação da CONCP e acompanhava de perto a luta de libertação nacional moçambicana.

 

(…) Uma base comum que todos tínhamos quando formámos a FRELIMO era o ódio ao colonialismo, a necessidade de destruir a estrutura colonial e impor uma nova estrutura social… Mas que tipo de estrutura social ninguém sabia. Alguns (…) tinham ideias teóricas, mas mesmo esses foram transformados pela luta. Há uma evolução no pensamento que se operou durante os últimos seis anos, que me pode autorizar (…) a concluir que a FRELIMO é, agora, realmente, muito mais socialista, revolucionária e progressista… E a tendência agora é mais e mais em direção ao socialismo de tipo marxista-leninista. Porque as condições de vida em Moçambique, o tipo de inimigo que nós temos, não admite qualquer outra alternativa (…) Eu acho que a FRELIMO, sem comprometer o Partido, que ainda não fez uma declaração oficial dizendo que era marxista-leninista, se está inclinando mais e mais nessa direção, porque as condições em que nós lutamos e trabalhamos assim o exigem”, afirmou Mondlane a Bragança.

 

Já em 1967, o líder da FRELIMO declarara a um jornal tunisiano que as mais importantes ajudas ao movimento provinham da União Soviética, China, Checoslováquia, Bulgária e Iugoslávia e que Moçambique, após a libertação, trilharia o caminho do socialismo.

 

Eduardo Mondlane nasce em 1924 numa aldeia do distrito de Manjacaze, na província do Xai-Xai, no Sul de Moçambique.

 

Faz o ensino primário em missões protestantes e, aos 13 anos, vai para a capital da colônia, Lourenço Marques, onde trabalha e estuda.

 

Apoiado pelos protestantes, recebe um bolsa para fazer o secundário na África do Sul. Em 1949 ingressa na Universidade de Witwatersrand, na Faculdade de Sociologia e Antropologia, em Joanesburgo, mas pouco depois é expulso pelas autoridades racistas sul-africanas.

 

Hoje, sabe-se que, nessa sua estada na África do Sul, Eduardo Mondlane e outros jovens, futuros dirigentes e movimentos anti-colonialistas da África Austral, tiveram contatos com Nelson Mandela, então dirigente do Congresso Nacional Africano (CNA), mais tarde o primeiro presidente eleito democraticamente no seu país.

 

Numa carta escrita da prisão de Robben Island, datada de 1 de dezembro de 1970, dirigida a Sanna Tysie, proprietário do café-restaurante Blue Lagoon, em Joanesburgo, Mandela conta que ali se reunia, após a II Guerra Mundial, com outros jovens patriotas africanos de diferentes países. Além de Mondlane, participaram desses encontros Seretse Khama, que seria o primeiro presidente do Botswana, Oliver Tambo, que foi presidente do CNA e Joshua Nkomo, fundador e líder da União Popular Africana do Zimbabwe (ZAPU).

 

Mondlane regressa então, em 1949, a Lourenço Marques, onde funda com outros jovens patriotas o Núcleo de Estudantes Secundários Africanos de Moçambique (NESAM), ligado ao Centro Associativo dos Negros de Moçambique.

 

Em outubro de 1950 segue para Portugal, para frequentar a Faculdade de Letras, em Lisboa, com uma bolsa de estudos da Phelps Stokes Found, uma organização privada de Nova Iorque que apoiava jovens africanos e negros norte-americanos.

 

Na capital portuguesa, Mondlane convive de perto com outros futuros destacados dirigentes das lutas de libertação nacional das então colônias africanas portuguesas – Agostinho Neto, Mário de Andrade, Amílcar Cabral, Marcelino dos Santos –, frequenta a Casa dos Estudantes do Império e participa em atividades do Centro de Estudos Africanos, conhece de perto a luta dos democratas portugueses contra o fascismo.

 

Em 1951, face à “constante perseguição que a maior parte dos estudantes africanos sofria em Lisboa”, segue para os Estados Unidos, com nova bolsa de estudos, patrocinada por religiosos protestantes.

 

Licencia-se e doutora-se em Sociologia e Antropologia, em 1957 começa a trabalhar para as Nações Unidas, em 1961 lecciona na Syracuse University de Nova Iorque.

 

Nesse ano ainda visita Moçambique e decide regressar a África e dedicar-se à luta pela independência do seu país.

 

Em princípios de 1969, face aos avanços do combate emancipador, Eduardo Mondlane é assassinado em Dar-es-Salam, vítima da explosão de uma encomenda armadilhada, enviada por agentes do colonialismo português. O dia 3 de fevereiro, data da sua morte, é hoje celebrado no seu país como Dia dos Heróis Moçambicanos.

 

Apesar do hediondo crime, entre muitos outros – que o colonial-fascismo português repetiu em janeiro de 1973, assassinando em Conakry o líder do PAIGC, Amílcar Cabral –, já não foi possível impedir a luta emancipadora dos povos dos territórios africanos ocupados por Portugal.

 

A Guiné-Bissau, em 1973, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Moçambique e Angola, em 1975, conquistaram a independência e estabeleceram relações de amizade e cooperação com o Portugal democrático saído da Revolução de Abril, construindo desde então o seu próprio futuro, apesar das dificuldades e contradições e dos problemas criados ou agravados pelas pressões, ingerências e guerras provocadas pelo imperialismo, ontem como hoje o grande inimigo dos povos.

 

(*Carlos Alberto Pereira)