O Estado moçambicano terceirizou a defesa do território nacional aos mercenários russos do Grupo Wagner. Podia ter sido aos americanos da Blackwater ou aos sul-africanos da Hawks, mas o governo quedou-se no Grupo Wagner.
Por que o Grupo Wagner? Apenas podemos especular a razão. Há alguns candidatos mas os favoritos de muitos são o preço; a ligação histórica militar entre Moçambique e Rússia; e a necessidade de se ter um actor militar não vindo de um país Ocidental.
Analistas apontam ao facto de que geralmente os russos cobram entre $360.000 a $940.000 por mês para 200 soldados de fortuna. Mas há que se considerar que o preço está mais próximo dos $360.000 porque há mais ex-militares rasos do que oficiais.
Do outro lado da escala, os Black Hawks cobram aos governos entre $750.000 a $1.250.000 por mês para 50 ex-soldados. Mesmo assim a factura deve se aproximar ao primeiro valor por conta do facto de que há mais soldados rasos que oficiais, que estão no topo da escala.
Um outro factor sobre o que poderá ter pesado para que Moçambique se decidisse sobre a escolha de mercenários russos é um passado histórico militar e económico comum no auge da Guerra Fria. Esse passado envolveu uma dívida militar à Rússia (então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) que rondou os $2.4 milhões em termos nominais. Essa dívida só foi parcialmente cancelada com a entrada da Rússia no Clube de Páris, no âmbito dos Países Pobres Altamente Endividados (HIPC).
O relacionamento entre Moçambique e Rússia ficou em banho-maria durante 32 anos até à visita do Presidente Filipe Nyusi à Moscovo, em Agosto, onde manteve conversações com o seu homólogo russo, Vladmir Putin. Provavelmente o impulsionador do reatamento do relacionamento é o facto de Nyusi ter se se licenciado em Engenharia Mecánica na antiga Checoslováquia.
Seguiu-se uma interacção entre os ministros dos negócios estrangeiros moçambicano e russo em 2018, em Maputo, que abriu caminho para uma maior cooperação na segurança e contra-terrorismo, bem como a assinatura de vários acordos de cooperação económica. E finalmente, Nyusi retornou à Rússia em finais de Agosto, tendo assinado uma série de acordos de energia e segurança – entretanto, poucos viram os textos desses acordos, sendo que, não se sabe o que cada parte deu a outra.
Mas possivelmente o que pode ter interessado mais a Moçambique foi evitar colocar todos os ovos na mesma cesta. É que os maiores actores nos projectos de petróleo e gás em Cabo Delgado são empresas ocidentais. E o país tem séries problemas em controlar a quantidade de recursos que saem para o exterior, dependendo dos números que recebe dos próprios investidores.
Sendo que, se quiser monitorar o que entra e sai, provavelmente faça mais sentido buscar ajuda de um antigo parceiro com interesses de também voltar a flexionar os seus músculos na arena internacional, em busca de um passado glorioso.
Um outro factor é o facto do país não ter ao momento dinheiro para fazer o pagamento de vários serviços, e muito menos ter mais espaço de manobra para solicitar empréstimos nos mercados financeiros, sabido é que a escandaleira do calote das dívidas ocultas dificulta a mobilização de recursos financeiros nos mercados financeiros internacionais, agravado ao facto de que os doadores têm condicionado as suas contribuições ao Orçamento do Estado. Sendo que, fazer um negócio em troca de futuros rendimentos ou exploração de recursos minerais ou energéticos parece ser mais apetecível a curto e médio prazos.
Todavia, independentemente do tipo de negócio que Moçambique fez com a Rússia, terceirizar a guerra contra os insurgentes custa uma pipa de massa. Daí que, se perguntar não ofende, quanto é que custa a nossa factura de segurança?
Mais: como é que vamos pagá-la? Se por via dos recursos, que recursos são esses? Petróleo? Gás? Diamantes? Pedras preciosas? Camarão? Atum? E quais são os termos de pagamento? Que implicações terá isso no nosso peso da dívida? Quando é que isso reflictir-se-á no Orçamento do Estado? Ou será que vai ser também uma dívida oculta?