Ocorreram, na semana que ora termina, dois factos que me motivam a escrever este texto, que são os seguintes:
Na Quarta-feira foi assinalado o dia mundial da rádio e, na Sexta-feira o escritor Ungulani Ba Ka Khosa publicou uma belíssima crónica na sua conta do Facebook, na qual lembra a data em que eu e ele chegamos a Lichinga: Fevereiro de 1978.
Bem jovens, na Casa dos 18 anos, cada um para lá enviado pela sua entidade empregadora, íamos ambos em missões mais patrióticas que meramente profissionais, chamados a participar na preparação das primeiras machambas do Estado que estava a nascer.
Se o Ungulani ia integrado no primeiro grupo de professores secundários, da agora chamada 'Geração 8 de Março", eu ia na condição de repórter júnior da Rádio Moçambique (RM), igualmente como primeira "leva" para a planatica cidade.
Digo missões mais patrióticas que meramente profissionais porque, dadas as condições precárias em que elas ocorriam - sem alojamento no destino nem qualquer forma de integração ou compensação - pelo menos no meu caso - estas missões eram verdadeiras "provas de fogo" juvenil, de forma alguma imagináveis hoje.
Comigo vai a Lichinga o Ricardo Dimande, amigo desde a Escola Secundária Josina Machel, após um estágio de preparação político-ideológica e alguns prolegomenos em jornalismo, na sede da RM.
Quando ingresso nos quadros editoriais da RM,em Outubro de 1977, através de concurso público, quase todos os profissionais de comunicação social eram, se não membros com cartão, pelo menos militantes e defensores públicos da FRELIMO. Bastará referir que no seu primeiro seminário nacional, de 1977, os membros desta classe, dirigidos pelo partido único, tinham atribuído ao sector a missão de "Fazer da Informação um Destacamento Avançado da Luta de Classes e na Revolução". Uma missão pesadíssima, diga-se de passagem.
Em Maputo, quando eu e o Ricardo Dimande comunicavamos a familiares e amigos que tínhamos sido colocados em Niassa...havia sempre alguma reacção de incredulidade, se não mesmo de alguma comoção, em que em silêncio as pessoas nos perguntavam: "por que estão a ser castigados?" Porque era essa a conotação geral de Niassa: uma terra sinistra, para onde eram desterrados aqueles em conflito com a Revolução, fossem "reacionários", fossem "corruptos" de variada estirpe.
Mas vai ser em Lichinga, e neste calor de revolução e temor, onde, iniciando-me em jornalismo, vou tomar contacto com a rádio, à altura um verdadeiro fenómeno comunicacional, simultaneamente prestigiante e poderosíssimo, enquanto principal instrumento de indução politico-ideológica do Partido-Estado.
Mas como tudo nessa altura, a nossa missão, nós os dois repórteres, guiados pelo Delegado,o recém-falexido Tiago Viegas, era efectivamente iniciar um emissor provincial...a partir de equipamento absolutamente precário e obsoleto, herdado de uma pequena emissora colonial local, ora integrada da RM.
Nos três anos em que lá permaneci, (1978-1981) nunca tivemos uma única viatura para trabalhar. Nem casa para viver. Trabalhavamos a pé. Ou em boleias de viaturas de direcções provinciais do governo: educação, saúde, agricultura, comissão provincial das aldeias comunais.
Outras alternativas eram o velho comboio para Cuamba, tão lento que fazia você preferir descer e continuar a viagem a pé! Ou os desconjuntados machimbombos da ROMON (Rodoviária Moçambique Norte).
Aprendemos, à força, a pernoitar em aldeias recônditas, acolhidos calorosamente em casas de camponeses, que nos ofereciam camas de paus pregados ao chão e bases feitas de cordas entrelaçadas. Dores nas costas? Você só vai sentir no primeiro dia seguinte.
Para explorar ao máximo o material noticioso que recolhia nos distritos, preparava reportagens paralelas para a lendária revista "Tempo", pedindo a sua publicação a custo zero: a mim bastava saber que um texto da minha autoria seria publicado numa revista com nomes como: Albino Magaia, Aerosa Pena, Filipe Ribas , Alves Gomes...E ficava verdadeiramente empolgado de cada vez que recebia uma cópia da "Tempo" com um texto em que em baixo vinha: 'Tomás Vieira Mário'. Assim aprendi também a líder com o jornalismo de imprensa.
A partir de Lichinga enviavamos as notícias para a sede em Maputo, lendo-as ao telefone , a meio da tarde. Para tanto, era preciso pedir chamada telefónica ao PBX da delegacia da empresa Correios,Telégrafos e Telefones(CTT), - ja extinta - para uma determinada hora. E como a linha telefônica tinha sempre muito ruído, era preciso saber ler bem em voz alta, para a Central Técnica da sede gravar as notícias em bobinas.
Sendo poucos, no emissor provincial fazíamos todos um pouco de tudo: desde reportagens, montagem de peças e de programas em fitas magnéticas,realização de emissões, etc. Esta circunstância, de graves carências de técnicos, dava-nos, em contrapartida,uma enorme recompensa: a oportunidade de conhecer o fenómeno da radiodifusão em toda a linha de produção de conteúdos.
Além daqueles gravadores de cassetes, a que chamávamos de tijolos, ainda tínhamos um enorme gravador de bobinas, muito pesado, que carregavamos, para reportagens mais longas.
Um dia, levando este pesado gravador às costas, a gravar um longo comício popular ,dirigido pelo Governador da Província, Aurélio Manave, na história localidade de Matchedje,depois de horas em pé, senti-me de repente sem ar e cai, zonzo. Era muita fome acumulada. E sede.
Ocorreram, na semana que ora termina, dois factos que me motivam a escrever este texto, que são os seguintes:
Na Quarta-feira foi assinalado o dia mundial da rádio e, na Sexta-feira o escritor Ungulani Ba Ka Khosa publicou uma belíssima crónica na sua conta do Facebook, na qual lembra a data em que eu e ele chegamos a Lichinga: Fevereiro de 1978.
Bem jovens, na Casa dos 18 anos, cada um para lá enviado pela sua entidade empregadora, íamos ambos em missões mais patrióticas que meramente profissionais, chamados a participar na preparação das primeiras machambas do Estado que estava a nascer.
Se o Ungulani ia integrado no primeiro grupo de professores secundários, da agora chamada 'Geração 8 de Março", eu ia na condição de repórter júnior da Rádio Moçambique (RM), igualmente como primeira "leva" para a planatica cidade.
Digo missões mais patrióticas que meramente profissionais porque, dadas as condições precárias em que elas ocorriam - sem alojamento no destino nem qualquer forma de integração ou compensação - pelo menos no meu caso - estas missões eram verdadeiras "provas de fogo" juvenil, de forma alguma imagináveis hoje.
Comigo vai a Lichinga o Ricardo Dimande, amigo desde a Escola Secundária Josina Machel, após um estágio de preparação político-ideológica e alguns prolegomenos em jornalismo, na sede da RM.
Quando ingresso nos quadros editoriais da RM,em Outubro de 1977, através de concurso público, quase todos os profissionais de comunicação social eram, se não membros com cartão, pelo menos militantes e defensores públicos da FRELIMO. Bastará referir que no seu primeiro seminário nacional, de 1977, os membros desta classe, dirigidos pelo partido único, tinham atribuído ao sector a missão de "Fazer da Informação um Destacamento Avançado da Luta de Classes e na Revolução". Uma missão pesadíssima, diga-se de passagem.
Em Maputo, quando eu e o Ricardo Dimande comunicavamos a familiares e amigos que tínhamos sido colocados em Niassa...havia sempre alguma reacção de incredulidade, se não mesmo de alguma comoção, em que em silêncio as pessoas nos perguntavam: "por que estão a ser castigados?" Porque era essa a conotação geral de Niassa: uma terra sinistra, para onde eram desterrados aqueles em conflito com a Revolução, fossem "reacionários", fossem "corruptos" de variada estirpe.
Mas vai ser em Lichinga, e neste calor de revolução e temor, onde, iniciando-me em jornalismo, vou tomar contacto com a rádio, à altura um verdadeiro fenómeno comunicacional, simultaneamente prestigiante e poderosíssimo, enquanto principal instrumento de indução politico-ideológica do Partido-Estado.
Mas como tudo nessa altura, a nossa missão, nós os dois repórteres, guiados pelo Delegado,o recém-falexido Tiago Viegas, era efectivamente iniciar um emissor provincial...a partir de equipamento absolutamente precário e obsoleto, herdado de uma pequena emissora colonial local, ora integrada da RM.
Nos três anos em que lá permaneci, (1978-1981) nunca tivemos uma única viatura para trabalhar. Nem casa para viver. Trabalhavamos a pé. Ou em boleias de viaturas de direcções provinciais do governo: educação, saúde, agricultura, comissão provincial das aldeias comunais.
Outras alternativas eram o velho comboio para Cuamba, tão lento que fazia você preferir descer e continuar a viagem a pé! Ou os desconjuntados machimbombos da ROMON (Rodoviária Moçambique Norte).
Aprendemos, à força, a pernoitar em aldeias recônditas, acolhidos calorosamente em casas de camponeses, que nos ofereciam camas de paus pregados ao chão e bases feitas de cordas entrelaçadas. Dores nas costas? Você só vai sentir no primeiro dia seguinte.
Para explorar ao máximo o material noticioso que recolhia nos distritos, preparava reportagens paralelas para a lendária revista "Tempo", pedindo a sua publicação a custo zero: a mim bastava saber que um texto da minha autoria seria publicado numa revista com nomes como: Albino Magaia, Aerosa Pena, Filipe Ribas , Alves Gomes...E ficava verdadeiramente empolgado de cada vez que recebia uma cópia da "Tempo" com um texto em que em baixo vinha: 'Tomás Vieira Mário'. Assim aprendi também a líder com o jornalismo de imprensa.
A partir de Lichinga enviavamos as notícias para a sede em Maputo, lendo-as ao telefone , a meio da tarde. Para tanto, era preciso pedir chamada telefónica ao PBX da delegacia da empresa Correios,Telégrafos e Telefones(CTT), - ja extinta - para uma determinada hora. E como a linha telefônica tinha sempre muito ruído, era preciso saber ler bem em voz alta, para a Central Técnica da sede gravar as notícias em bobinas.
Sendo poucos, no emissor provincial fazíamos todos um pouco de tudo: desde reportagens, montagem de peças e de programas em fitas magnéticas,realização de emissões, etc. Esta circunstância, de graves carências de técnicos, dava-nos, em contrapartida,uma enorme recompensa: a oportunidade de conhecer o fenómeno da radiodifusão em toda a linha de produção de conteúdos.
Além daqueles gravadores de cassetes, a que chamávamos de tijolos, ainda tínhamos um enorme gravador de bobinas, muito pesado, que carregavamos, para reportagens mais longas.
Um dia, levando este pesado gravador às costas, a gravar um longo comício popular ,dirigido pelo Governador da Província, Aurélio Manave, na história localidade de Matchedje,depois de horas em pé, senti-me de repente sem ar e cai, zonzo. Era muita fome acumulada. E sede.
Os artistas, muitas vezes, dizem, em
poucas palavras, o que nós, filósofos,
não conseguimos expressar em
volumes de textos. Entre esses artistas
visionários, houve aquele que compôs
a canção "Vinde, Vinde,
Moçambicanos, Exaltemos Mondlane."
Com uma capacidade rara de ler as
dinâmicas do momento e de antever o
que nos aguardava, ele escreveu
versos profundos que marcaram a
Primeira Republica moçambicana.
Na última estrofe dessa canção,
salmodiava:
"Os frutos já vamos colhendo:
liberdade, pão e paz."
Essas palavras, entoadas com fervor
por gerações, eram mais do que
versos; um pacto, uma
promessa, um ideal pelo qual
Mondlane viveu e morreu. Hoje,
volvidos cinquenta e seis anos após o seu sacrifício,
olhamos para trás e nos perguntamos:
colhemos, de fato, esses frutos?
Liberdade: Uma Promessa Ameaçada
As liberdades que Mondlane sonhou e
que tantos outros deram a vida para alcançar
hoje ja não estão ameaçadas
por potências coloniais, mas pelas nossas
próprias incongruências e divisões internas.
Pela nossa incapacidade de criar consensos, de
dialogar, de construir juntos, o que corrói a
liberdade como cupins em madeira
antiga. Mas a liberdade não é apenas a
ausência de opressão: é também
responsabilidade. Não há liberdade
plena sem que sejamos senhores
das nossas vidas, sem que possamos
produzir o suficiente para atender às
necessidades básicas de cada moçambicano.
Dependemos ainda, em demasia, da
boa vontade externa, da ajuda que
chega com condições ou que é
retirada conforme interesses alheios.
Como podemos ser livres quando
nossas mesas dependem de um “sim”
vindo de fora? Não há liberdade
quando não conseguimos garantir o
pão com nosso próprio suor, nosso
trabalho e nossa criatividade coletiva.
Pão: O direito ao Necessário
O pão, metáfora do sustento e da
dignidade, continua sendo um
privilégio para poucos. Em muitas mesas
moçambicanas, ele falta. Em
algumas, sobra em excesso,
perpetuando uma oligarquia insensível
às necessidades da maioria. Mas o pão
só será suficiente quando deixarmos
de esperar por milagres e assumirmos,
como povo, a tarefa de garantir a nossa subsistência.
O sacrifício de Mondlane e de tantos
outros heróis nos ensinou que
independência política sem
auto suficiência económica é uma
liberdade incompleta. Trabalhar pelo
pão para todos não é apenas uma
questão de justiça, mas de
sobrevivência nacional. É um chamamento
à solidariedade, à construção de uma
economia capaz de responder às
necessidades reais do povo.
Paz: O Maior Anseio
Por fim, a paz, o maior dos frutos,
continua a nos escapar. Conflitos
velados e abertos nos dividem,
ameaçando não apenas a nossa
estabilidade, mas nossa própria
identidade como nação. Esses
conflitos, alimentados por ambições
pessoais, disputas políticas e
desigualdades estruturais, impedem
que nos sentamos à mesa como
irmãos.
A paz verdadeira não é apenas o
silêncio das armas, mas a construção
de uma convivência harmoniosa,
baseada na justiça e na igualdade.
Sem paz, nenhuma liberdade é segura,
e nenhum pão pode ser
compartilhado.
O legado de Mondlane: Um Apelo a Ação
Lutar por Moçambique hoje é mais do
que recordar os heróis do passado. É
continuar a luta pela liberdade, pelo pão e
pela paz. É assumir a responsabilidade,
como cidadãos, intelectuais, políticos
e jovens, de transformar sonhos em
realidade.
É garantir que a liberdade seja
sustentada pela nossa capacidade de
sermos auto suficientes. Que o pão
seja fruto do trabalho coletivo e esteja
na mesa de todos. E que a paz seja
conquistada pelo diálogo, pela justiça
e pela reconciliação.
Celebrar Eduardo Mondlane e os
heróis moçambicanos não é apenas
lembrar os nomes deles, mas honrar os seus
ideais. É continuar a luta, custe o que
custar, para que Moçambique seja,
enfim, um país onde a liberdade seja
plena, o pão seja suficiente e a paz
seja duradoura.
Lutemos, então, com coragem e
unidade, pois o sonho de Mondlane
não pode morrer. A luta continua.
Severino Ngoenha
As Conservatórias de Registo Predial estão neste momento com o sistema em baixo há três meses. Esta situação é geral (todo o país) e não existe previsão de retoma dos serviços. Não há lugar para actos de registo nem a emissão das respectivas certidões de registo predial.
São muitos os milhões de dólares parados em volume de negócio por causa desta situação e são milhares as operações em “stand by” por impossibilidade de concretização de vendas, aquisições, constituição de garantias e até prática de actos associados à administração da justiça (penhoras, arrestos etc.).
Nos últimos anos, o Governo avançou para a digitalização dos serviços de registo predial, mas não criou sistemas de redundância eficazes para fazer face a situações de quebra do sistema - e nem se pode sequer recorrer aos registos manuais, pois estes foram completamente descontinuados.
“Carta” sabe que os servidores do Centro Tecnológico da Maluana - onde esse registo deve estar - foram vandalizados nas recentes manifestações pós-eleitorais, mas não era suposto existir um sistema de “disaster recovery”, que permitisse assegurar a continuidade do serviço?
E dado que o Governo continua a esconder os contratos que o Estado mantém com as entidades fornecedoras de bens e serviços, desembocamos num rol de alegações ou suspeitas, como esta de que tudo está emperrado porque há facturas avultadas por pagar ao provedor do serviço (seria interessante saber que valores estão em causa e o que diz o contrato sobre isso).
Este facto levanta questões sobre a qualidade do sistema adquirido para o efeito, sobre a idoneidade do provedor do serviço e, sobretudo, sobre a lisura do procurement que esteve na base desta contratação.
Este é apenas um de entre dezenas de casos similares de reformas feitas ao sabor de interesses alheios do Estado, interesses privados cujo objectivo é apenas sacar, sacar e sacar na teta estatal.
Outra vez, a reforma do procurement público vem à colação. Daniel Chapo propõe a centralização do sistema de aquisições. Sua proposta ainda continua em regime de “sound byte”; ela precisa de ser detalhada como tantas outras propostas que o novo Presidente lançou numa cerimónia de investidura revestida de actos de campanha eleitoral.
É preciso detalhar para discutirmos o que é melhor e eficiente para Moçambique: a centralização efectiva, com todos os seus riscos de congestionar os processos, ou uma medida intermédia, que correspondesse a uma centralização provincial – para todas as contratações locais – deixando os ministérios com o escopo de procederem ao nível nacional.
Uma centralização intermédia seria uma saída conveniente nesta altura, evitando uma centralização tão radical como parece ser a proposta corrente. E a ideia de que o Presidente quer controlar tudo.
Seja como for, qualquer que seja a reforma do procurement que se pretende, nada terá o efeito desejado da transparência a não ser que o Governo avance para a medida mais estruturante deste ponto de vista: a publicação dos contratos.
Não basta centralizar e colocar “gente de reconhecida idoneidade” no leme da embarcação. Isso não resolve todos os problemas. A última maneira de conferir transparência na contratação pública é a publicação de todos os contratos decorrentes das compras de bens e serviços do Estado. Aí estaremos em condições de verificar se essa gente idônea comandando o processo decisório das aquisições públicas é mesmo gente idônea. Ponto final.
Sobre um imposto mineiro
“Reestruturação do Sector Mineiro! O INAMI será transformado numa Agência de Promoção Mineira, focada no financiamento, formação e modernização de PME e associações mineiras nacionais. Esta nova abordagem criará um ecossistema forte e inclusivo no sector mineiro, garantindo que mais moçambicanos se beneficiem das riquezas do nosso solo. Além disso, transferiremos as atribuições regulatórias para um novo órgão regulador especializado, garantindo mais transparência e eficiência. Apoio às Pequenas e Médias Empresas (PME)!”
Eis as palavras de Daniel Chapo na tomada de posse. Bem ditas!
Mas a questão central na mineração não é a transparência na concessão dos títulos de pesquisa. É a eficiência no uso da terra. Chapo fala em eficiência, mas não explicita. É certo que a concessão dos títulos pelos serviços de Cadastro Mineiro não é transparente. Mas a situação mais gravosa é que não temos em Moçambique um imposto que incida sobre quem tenha título.
Resultado: muita gente com títulos não faz nada porque está à espera de um parceiro com dinheiro; e há muita gente acumulando dezenas de títulos só para si... e enquanto não iniciar com pesquisa ou exploração a terra torna-se ociosa. Ou seja, os títulos estão empatando, deveriam ser taxados pela ocupação de terra sem exploração, pois assim como estamos hoje esses títulos acabam roubando espaço para a Agricultura, por exemplo.
Estamos em tempo de balanço da nossa longa travessia martirizada, a que se convencionou designar por crise pós-eleitoral. De todas as fontes temos recebido, todos os dias, números e qualificações dos danos materiais causados por manifestantes contestando o que entendem terem sido eleições extremamente problemáticas. E um largo número de infraestruturas destruídas. Avultados prejuízos econômicos. Temos ouvido disto tudo, todos os dias, de diferentes fontes.
Mas parece que tem faltado a outra face da mesma crise. A face social, a face humana.
Esta crise destruiu penosamente a confiança dos cidadãos sobre qualquer instituição do poder de Estado. Ela roeu de uma vez aquele resto, ainda que tênue, do contrato social que unia os cidadãos ao Estado. E nesta crise foi destruída uma parte significativa do maior patrimônio do Estado: vidas humanas!
Nas suas contas, o recem-exonerado comandante geral da Polícia, Bernardino Rafael, diz que (apenas) 96 pessoas foram mortas durante as manifestações; porém diferentes organizações da sociedade civil ("Decide", CDD...) contabilizam mais de 350 vidas humanas, fulminadas por balas da Polícia.
Estas vítimas têm nomes; viveram em bairros conhecidos; alguns eram chefes de família que deixaram viúvas e filhos sem recursos para a sua subsistência; outros ainda eram jovens na flor da idade. Com eles foram enterrados sonhos; seus próprios sonhos; sonhos de seus pais, namoradas ou de namorados.
Alguns ainda, de famílias extremamente pobres,não puderam, sequer, ter enterro digno, podendo ter sido sepultados em vala comum.
E aqueles reclusos mortos na chamada cadeia de máxima segurança, cujas cabeças sem vida vimos sendo pisoteadas por desalmados agentes da Polícia? Os seus familiares receberam os seus corpos, para ao menos dar-lhes enterro digno? Qual é a responsabilidade do Estado ante esta cruel matança em calabouços?
E já que todo o mundo está a lançar-nos à cara valores monetários de prejuizos derivados desta crise, digam-nos, por favor: quanto vale a vida de um cidadão morto injustificadamente por um agente do Estado?
É esta a outra face dos "danos" derivados das manifestações violentas, que a nossa comunicação social tem se "esquecido" de reportar.
Porque faltam porta-vozes dos mortos e daqueles a quem a sua morte deixou em eterno luto.
Então estas notícias sobre "danos" estão enviesadas; podem traduzir-se em colossal manipulação de opinião pública. Por serem demasiadamente parciais!
Ninguém se despede do mundo a 25 de Dezembro. Essa é data de chegadas; recomeços. Nem as consciências humanas aceitam concorrências desavindas com o Redentor. Os humanos evitam as disputas com os celestiais. Procuram e seleccionam suas próprias datas, espaços e tempos. Assim, podem eternizar os seus feitos e glórias.
Nampula, essa capital de tantas conexões e emoções, se vestiu de lilás e xadrez, bandeiras quadriculadas, para apagar as últimas velas da consoada. Desconcertaram os abraços de alegria, para cruzarem com as lágrimas da compaixão.
O final de um ciclo, de um pujante e proeminente editor e jornalista, Pai e Mentor, que já exausto, decidiu ir escrever novas matérias nas alturas, num desporto sem trapaça e nem dribles ousados. Tudo no dia da maior festa da humanidade.
Irreverente e perspicaz, Vasco Fenita, regressou, pois, às origens, ao espaço das estrelas, de um espaço onde nunca soube sair. O ser humano descende dos céus. Aqueles que vivem 90 anos, então, regressam de forma triunfal como lendas. Reencontram a razão de terem passado pela terra.
Vasco Fenita, natural de Tete, nasceu estrela, porém, soube estruturar motivos para viver como constelação. Mais de 20 anos de futebol activo e privou com o Pai do Carlos Queiroz e o próprio Queiroz. Foram 60 anos dedicados ao jornalismo e 90 oferecidos para o mundo, seus amigos e familiares. Ele foi o mais antigo e activo jornalista que este país alguma vez conheceu.
Exímio na arte do drible, no futebol, com os seus pés encantou estádios, emocionou adeptos e levou a loucura os simpatizantes do verde e branco, suas cores predilectas. As cores de um leão que rugiu em Quelimane, Nampula, Lourenço Marques e, lá para a metrópole, que ofereceu seus palcos aos nossos mais finos e nobres artistas da bola. Do furor dos estádios para o jornalismo desportivo foi consequência. A arte de costurar redes e bolas de futebol traduzidas para Os Lusíadas, através de nomes sonantes como José Craveirinha e Fernando Pessoa. Estes eram os seus predilectos. Ele próprio um Vasco da Gama da palavra e dos descobrimentos. Coleccionou vários escritores, porém, estes eram os poetas e cronistas que mais o enfeitiçaram.
Assim, como os deuses sempre foram alfaiates, Vasco Fenita interpretou e costurou os cânones do esmero e aprumo da escrita nos seus requintados textos. Criou uma ligação afectuosa, testemunhada e assertiva, com seus leitores, servindo das suas matérias para enviar recados, de toda ordem e natureza, palavras de desacordo, opiniões enviesadas e os elogios e apreço para quem estrelava.
Lutou por um país digno, honesto e ordenado; uma república. Sabia que nem todos os fins são legítimos, e que nem todos os métodos são apropriados. É necessário guiar a escolha respeitando as escolhas de cada um.
Me confessou, uma vez, que não imaginava que estivesse seguro para colocar suas crónicas a disposição dos leitores. Por essas alturas, já levava mais de 40 anos de carreira. Humildade exagerada. Mas, ele sabia que era detentor de uma combinação harmónica impressionante, de linguagem ajustada, identidade própria e ideias muito peculiares. Suas palavras suavizavam derrotas e faziam parecer que vitórias e derrotas eram, apenas, desporto. Relativizava o sofrimento e evitava disputas extra campos e muros.
Era um dos jornalistas mais discretos que, mesmo assinando seus textos, eles permaneciam impecáveis, cheios de pudor, mistérios, uma espécie de quem estende a mão, mas tem medo que lhe roubem os dedos. Com este carácter, formou dezenas de novos jornalistas e transmitiu os segredos e a arte de bem comunicar.
Nos recordaremos dele como essa bússola que apenas indicava o Norte, com total precisão, porém, sem nunca mencionar os obstáculos até ao destino final. Um homem que viveu unindo margens, sem, necessariamente, mostrar as pontes.
Foi homenageado algumas vezes, porém, muito poucas, para a sua dimensão e grandiosidade. Merecia outro reconhecimento e essas medalhas nacionais que, muitas vezes, se escapam, aos cidadãos de mérito e servidores de causas.
Passou por diversas redacções, incluindo o Notícias, Revista Tempo, Diário de Moçambique, A Bola, e muitos outros, porém, ter criado o primeiro jornal independente no Norte de Moçambique, o deixou lisonjeado e glorificou seu nome na eternidade da história do jornalismo do nacional. Seu jornal virou uma grata referência ao jornalismo moçambicano e lusófono, como bandeira fundamental no enriquecimento da língua, convenhamos, na defesa da verdade, rigor e integridade, bem como dos valores da cultura moçambicana. Foi um cultor de uma crónica rabiscada e um editor atento, de luxo e mérito.
Neste Natal, de sentido invertido, pouco celebrado, com doses de gás lacrimogéneo, balas e saques desproporcionais, quando as nossas cidades se vestiram de cadáveres e irracionalidade, também quisemos pensar no Velho Vasco Fenita. Uma espécie de exercício de remissão e indulto desse iconoclasta do jornalismo desportivo moçambicano.
Minha sentida homenagem à sua família, mais próxima e distante, aos amigos e admiradores, que se prostram diante desse decanato jornalístico, exemplo de longevidade, dos chutes na bola que geraram genialidade nos seus textos, e das frases enigmáticas que só ele conhecia o sentido e a profundidade.
Ao Eleutério, a Florbela, ao Aurélio, ao Arsénio, ao Sérgio e Flora Fenita, um abraço condoído de amizade e compaixão.
Ninguém se despede do mundo a 25 de Dezembro. Essa é data de chegadas; recomeços. Nem as consciências humanas aceitam concorrências desavindas com o Redentor. Os humanos evitam as disputas com os celestiais. Procuram e seleccionam suas próprias datas, espaços e tempos. Assim, podem eternizar os seus feitos e glórias.
Nampula, essa capital de tantas conexões e emoções, se vestiu de lilás e xadrez, bandeiras quadriculadas, para apagar as últimas velas da consoada. Desconcertaram os abraços de alegria, para cruzarem com as lágrimas da compaixão.
O final de um ciclo, de um pujante e proeminente editor e jornalista, Pai e Mentor, que já exausto, decidiu ir escrever novas matérias nas alturas, num desporto sem trapaça e nem dribles ousados. Tudo no dia da maior festa da humanidade.
Irreverente e perspicaz, Vasco Fenita, regressou, pois, às origens, ao espaço das estrelas, de um espaço onde nunca soube sair. O ser humano descende dos céus. Aqueles que vivem 90 anos, então, regressam de forma triunfal como lendas. Reencontram a razão de terem passado pela terra.
Vasco Fenita, natural de Tete, nasceu estrela, porém, soube estruturar motivos para viver como constelação. Mais de 20 anos de futebol activo e privou com o Pai do Carlos Queiroz e o próprio Queiroz. Foram 60 anos dedicados ao jornalismo e 90 oferecidos para o mundo, seus amigos e familiares. Ele foi o mais antigo e activo jornalista que este país alguma vez conheceu.
Exímio na arte do drible, no futebol, com os seus pés encantou estádios, emocionou adeptos e levou a loucura os simpatizantes do verde e branco, suas cores predilectas. As cores de um leão que rugiu em Quelimane, Nampula, Lourenço Marques e, lá para a metrópole, que ofereceu seus palcos aos nossos mais finos e nobres artistas da bola. Do furor dos estádios para o jornalismo desportivo foi consequência. A arte de costurar redes e bolas de futebol traduzidas para Os Lusíadas, através de nomes sonantes como José Craveirinha e Fernando Pessoa. Estes eram os seus predilectos. Ele próprio um Vasco da Gama da palavra e dos descobrimentos. Coleccionou vários escritores, porém, estes eram os poetas e cronistas que mais o enfeitiçaram.
Assim, como os deuses sempre foram alfaiates, Vasco Fenita interpretou e costurou os cânones do esmero e aprumo da escrita nos seus requintados textos. Criou uma ligação afectuosa, testemunhada e assertiva, com seus leitores, servindo das suas matérias para enviar recados, de toda ordem e natureza, palavras de desacordo, opiniões enviesadas e os elogios e apreço para quem estrelava.
Lutou por um país digno, honesto e ordenado; uma república. Sabia que nem todos os fins são legítimos, e que nem todos os métodos são apropriados. É necessário guiar a escolha respeitando as escolhas de cada um.
Me confessou, uma vez, que não imaginava que estivesse seguro para colocar suas crónicas a disposição dos leitores. Por essas alturas, já levava mais de 40 anos de carreira. Humildade exagerada. Mas, ele sabia que era detentor de uma combinação harmónica impressionante, de linguagem ajustada, identidade própria e ideias muito peculiares. Suas palavras suavizavam derrotas e faziam parecer que vitórias e derrotas eram, apenas, desporto. Relativizava o sofrimento e evitava disputas extra campos e muros.
Era um dos jornalistas mais discretos que, mesmo assinando seus textos, eles permaneciam impecáveis, cheios de pudor, mistérios, uma espécie de quem estende a mão, mas tem medo que lhe roubem os dedos. Com este carácter, formou dezenas de novos jornalistas e transmitiu os segredos e a arte de bem comunicar.
Nos recordaremos dele como essa bússola que apenas indicava o Norte, com total precisão, porém, sem nunca mencionar os obstáculos até ao destino final. Um homem que viveu unindo margens, sem, necessariamente, mostrar as pontes.
Foi homenageado algumas vezes, porém, muito poucas, para a sua dimensão e grandiosidade. Merecia outro reconhecimento e essas medalhas nacionais que, muitas vezes, se escapam, aos cidadãos de mérito e servidores de causas.
Passou por diversas redacções, incluindo o Notícias, Revista Tempo, Diário de Moçambique, A Bola, e muitos outros, porém, ter criado o primeiro jornal independente no Norte de Moçambique, o deixou lisonjeado e glorificou seu nome na eternidade da história do jornalismo do nacional. Seu jornal virou uma grata referência ao jornalismo moçambicano e lusófono, como bandeira fundamental no enriquecimento da língua, convenhamos, na defesa da verdade, rigor e integridade, bem como dos valores da cultura moçambicana. Foi um cultor de uma crónica rabiscada e um editor atento, de luxo e mérito.
Neste Natal, de sentido invertido, pouco celebrado, com doses de gás lacrimogéneo, balas e saques desproporcionais, quando as nossas cidades se vestiram de cadáveres e irracionalidade, também quisemos pensar no Velho Vasco Fenita. Uma espécie de exercício de remissão e indulto desse iconoclasta do jornalismo desportivo moçambicano.
Minha sentida homenagem à sua família, mais próxima e distante, aos amigos e admiradores, que se prostram diante desse decanato jornalístico, exemplo de longevidade, dos chutes na bola que geraram genialidade nos seus textos, e das frases enigmáticas que só ele conhecia o sentido e a profundidade.
Ao Eleutério, a Florbela, ao Aurélio, ao Arsénio, ao Sérgio e Flora Fenita, um abraço condoído de amizade e compaixão.