O título é a propósito da “Carta aberta ao Senhor COVID-19” que a escrevi na semana passada. Pelos vistos, o Sr. COVID-19, o Vidinho, como o trato na carta, é igualzinho a uma riquíssima característica da Pérola do Índico, quiçá a do leitor: detém o péssimo hábito de não ouvir instruções ou o conselho de outros. E com o Vidinho entre nós, sem convite, o que está à mão, como prevenção - fora a lavagem - é permanecer imóvel no seu imóvel. Algo que não se está a levar a sério por estas bandas da varanda do Índico.
E por falar em banda, vêem-me à memória a malta de infância da zona e das brincadeiras ou jogos desse tempo. E uma vez que o Vidinho é natural da China, quis a coincidência que a prevenção – ficar no seu imóvel – lembrasse uma das brincadeiras de infância cuja origem é chinesa, que o obriga a ficar imóvel. Estou a falar do jogo “um, dois, três, macaquinho chinês”. Quem não se lembre – e pelo que se assisti, está todo o mundo com uma catedrática amnésia - que “google”.
Contudo, em respeito a urgência sanitária nacional e mundial, vai - à título de puxão de orelha - um trecho dos benefícios desse jogo infantil: “(O jogo) trabalha de forma divertida o conceito de respeitar as regras e da importância de as cumprir”. Certamente, uma boa e recomendável brincadeira didáctica para os tempos difíceis que correm e que se seguem
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Em caso de movimento contrário, não sobrará uma outra alternativa se não o outro jogo infantil - cuja origem possa ser portuguesa, fincando o pé no tom - de nome “Lá vai o alho”. Neste jogo, um grupo de meninos - denominados burros – fica em fila e curvados com a cabeça em direcção a uma parede ou árvore. O outro grupo, e um de cada vez, em corrida, pulam e aterram, o mais distante possível, nas costas de um dos curvados. A corrida e o salto são acompanhados pelo grito de guerra “Lá vai o alho”. E o que acontece no desenrolar do jogo?
Depois do salto de todos, o grupo curvado (o país) terá que suportar – às guerrinhas como na tourada - o peso do outro grupo, o de cima ( o Vidinho). Por um lado, o país a tentar sacudir o Vidinho e este, por outro lado, envidando esforços para se manter firme. A briga termina depois que se conte até 10, na verdade, 10 fatais segundos. Perde o jogo quem não cumpre as regras ou quando a equipe curvada, o país/os burros, não consiga aguentar a equipa de cima, os que (as)saltam/o Vidinho, e vice-versa.
A minha memória (e trágica), sobre as vezes em que tomei parte do “Lá vai o alho”, assevera que os curvados nem sempre respeitam as regras e muito menos aguentam o peso dos que saltam e se acomodam nas suas costas. Das raras vezes em que foi o contrário - aguentar o peso - os curvados mal se aguentavam para a troca de posição. E assim, fica o recado: Fique em casa ou “Lá vai o Vidinho”!
Fernando Manuel, cronista moçambicano vivendo nos cumes da paródia, dizia-me nos seus devaneios, estimulados pela cegueira, que “agora vivo de sons”, e a partir do dia que ouvi isso, ganhei outros pensamentos. Foi uma facada no peito, e jamais me cansarei de repetir esta crueldade sem fim à vista. É como se eu fosse ele, impedido da liberdade, depois de todas as cores contempladas numa vida ritmada ao compasso das palavras, muitas delas buriladas no burburinho dos bares, onde o crâneo dilatava e logo a seguir esvaziava-se na língua.
Eu vivo do silêncio, como se a minha respiração fosse o contraponto do Fernando. Desdenho as ruas, as praças, os delírios dos campos de futebol, a saga dos cobradores de “chapa”. Rompi os tratados com as sinagogas, e agora o meu mundo circunscreve-se à mastigação dos livros que aprendi a ler em momentos de pura levitação. Sou a própria fragilidade, pois já nada me inspira neste tédio que me atordoa.
Agora estou aqui, boiando sem capacidade de orientação. Sem leme. Perseguindo-me nos caminhos atrofiados que eu próprio inventei, para gáudio do diabo. Levo nas mãos trémulas as alfazemas trazidas da Etiópia. Rumino na solidão do meu quarto, nas manhãs e tardes e noites, essas canções que o tempo ensinou-me a ouvir em dias intermináveis de pândega, e muitas outras que eu escutava e tocava, recolhido nas cabines de locução de Rádio onde me sentia, na minha ilusão, o arauto da juventude, e tudo isso faz-me bem lembrar. É isso que fazia bater meu coração.
Hoje estou sentado na varanda, pensando na minha empregada que não veio, uma mulher rara, leve de tal forma que mete medo. Ela na verdade é a minha fortaleza, uma muralha que entretanto pode entrar em derrocada por causa das minhas eventuais palavras desprovidas de sabedoria. E como alguém já me disse que o silêncio é uma das manifestações da sabedoria, melhor é eu continuar assim, como actor de cinema mudo. Em respeito à esta grandiosidade.
Quando ela está aqui, a minha casa, toda ela, é uma harpa. Khudzi move-se em todos os cantos dos meus modestos aposentos, como as mãos que dominam esse instrumento Divino. A cozinha ganha odores de poesia. A minha casa brilha na sua pobreza. E a vida ressurge na plenitude. Mas ela hoje não veio. Há um vazio. É como se eu próprio não existisse. O silêncio que venero perde sentido. Nem o chilrear dos pássaros compensa. Nem as boas lembranças de quando eu estava no auge. Nem nada. Khudzi é o alambique do meu espírito. Embebeda-me. E quando estou bêbado de Khudzi, esqueço tudo.
O PM Carlos Agostinho do Rosário mais o Ministro da Saúde, Armindo Tiago, disseram hoje aos doadores que Moçambique precisa de 700 milhões de USD para prevenir e combater o Covid 19.
Bastou ser confirmado 1 caso de Covid 19, o governo já está de mãos estendidas pedindo 700 milhões de USD?
Será que vamos ter uma crise assim drástica? Como é que chegaram a essa cifra? Na semana passada, a Saúde falava de um plano de contingência de 23 milhões de USD, essencialmente para medicamentos e material de proteção para os trabalhadores do sector. Curiosamente, esse valor quase coincide com os 20 milhões de USD que a Saúde deve a fornecedores diversos, que estão agora relutantes em fornecer máscaras, luvas e dispensadores de álcool e gel, até que a dívida seja paga.
Hoje, no pedido de esmola, Adriano Maleiane disse que dos 700 milhões de USD, 90 seriam para um tal pacote económico mas ele quer que esse dinheiro seja dado na forma de apoio orçamental. Apoio orçamental? Mas o que é que mudou em termos de transparência na gestão das finanças públicas?
Filimone Meigos e Samito Machel partilham suas vivências em auto-isolamento devido ao Covid 19. Gostei do que li. O Filimone reflete sobre o existencialismo sartreano, sem falar de Sartre, dos temores da morte e da teatralidade da vida. Disseca o pânico geral. Filosofa sobre o sentido da vida no contexto do Novo Corona. Ele conversa com o Elisio, escrevendo para todos nós.
Samora Machel é mais intimista mas também pedagógico sobre o que significa o auto-isolamento, o tédio necessário em face de uma hipótese cruel: o receio da infecção e do contágio de quem amamos. É como que uma romaria de desamor para proteger o amor. Ele conversa com todos nós, amando sua família.
Adorei seus testemunhos. O exemplo do poeta e seus devaneios de antropologia e sociologia e a exposição de Samora e seu tom de contributo cívico, em tempos de politica errática.
Covid-19 começou como uma epidemia na China e passou a pandemia na sua dimensão mundial, tornando, até então, Moçambique numa ilha geográfica positiva, visto que, até à data, não temos nem um caso do vírus e muito menos um paciente zero.
Que assim continue, mas atenção! Enquanto existirem pessoas a circular, a entrar e a sair, a probabilidade de ocorrência do vírus aumenta, infelizmente. Nestes casos, o tempo é ouro, é urgente antecipar os eventos e os acontecimentos, vamos agir para não reagir. Para o nosso contexto moçambicano o mais sustentável seria mesmo robustez nas medidas de prevenção no lugar da mitigação (a partir do momento em que surgiu a epidemia).
A pandemia Covid-19 e as Instituições de Ensino Superior (IES)
Permitam-me frisar, primeiro, que esta pandemia precisa de uma resposta holística, prática, e sobretudo flexível, sem salamaleques. Pois é tempo de agir de forma coordenada e dinâmica. A burocracia podemos guardá-la na gaveta, ela não se sentirá ofendida. O tempo requer de forma imperativa sabedoria e liderança.
O país tem um número redondo de 50 IES, é óbvio que elas têm um papel relevante na resposta moçambicana a pandemia do Covid-19, assim como já tiveram noutras pandemias, como foi no caso de VIH-SIDA. Acredito que as faculdades de medicinas existentes no país, assim como outras faculdades que podem dar um apoio maior nas questões comportamentais, já estão em movimento, ou melhor, 'já fazem parte' de forma holística do grupo técnico multissectorial nesta resposta. Mesmo perante os factos que as Nações Unidas em Moçambique têm estado a partilhar na sua página do Twitter, onde "80% dos funcionários da OMS estão a dedicar-se em apoiar o Ministério de Saúde em finalizar o Plano de Preparação e Resposta para o COVID19", acredito soberanamente não estamos no reboque, e que nesta resposta as IES não estão inertes.
Atitude Inter Universidades
Um dos valores que as universidades mais defendem é a sua 'autonomia'. Em contexto de pandemia a maneira e a forma como as universidades comunicam dentro e fora servirá para reforçar esta 'autonomia'.
As universidades moçambicanas são tuteladas pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Técnico Profissional, e ainda, o Conselho de Reitores. Acredito que uma forma que pode flexibilizar a resposta entre universidades à pandemia sem beliscar a 'autonomia' das mesmas, é ter uma comunicação muito flexível e dinâmica entre estes atores. É importante que exista uma resposta flexível, mas coordenada, se agirem juntos, sentir-se-ão mais fortes e capazes.
Através das redes sociais é possível verificar que de forma isolada e tímida, as universidades têm estado a emitir sinais de resposta à pandemia (Despachos e 'comunicações), mas fazem-no de forma opaca e dentro do ovo, ou seja, de forma isolada, como se o importante fosse uma comunicação interna, o que as transforma em pequenas ilhas criando resposta para o mesmo problema.
Para as universidades, acredito que este é um momento de comunicação flexível e desburocratizada, sem deixar de lado o papel e o posicionamento do ministério de tutela e do Conselho de Reitores (o silêncio é um dos maiores inimigos desta pandemia). Ou seja, não devem assoviar de forma isolada, mas sim de forma conjunta e coordenada.
Atitude Intra Universidades
A pandemia é 'antissocial', ou seja, uma das melhores formas de preveni-la é através de social distancing. Na eventual hipótese de encerramento das IES, como irão agir com vista a não prejudicar o semestre que mal teve o seu início?
Pois a mensagem chave perante esta hipótese seria a seguinte: não estão de férias, as aulas continuam, mas na modalidade à distância.
Mas pronto, até então tratasse de uma hipótese. O pássaro que temos nas mãos são algumas aulas inaugurais a serem canceladas, e muito bem, e comunicações internas nas universidades, visto que o país elevou o estado de alerta face ao Covid-19. Mesmo perante o cenário de comunicações internas, não deixa de ser importante a maneira como comunicamos, a maneira como as comunicações têm impacto na percepção no processo de recepção da mensagem.
Não existe mal algum nesta fase de comunicação interna, as universidades manterem as pontes de comunicações com outras universidades e, se necessário, com outras realidades. Não precisamos de ser uma ilha em momento de pandemia, se não iremos transformar a pandemia em um pandemónio.
Atitude para os Estudantes na Diáspora
O país no geral, tem estudantes a estudarem e a viverem na diáspora. As universidades moçambicanas e de outros países têm desde o início da epidemia, de forma factual, estudantes em países de pico do Covid-19. No caso da China foi possível verificar cenários de estudantes a partilharem, infelizmente, as situações que estavam a viver no eclodir desta epidemia.
Acredito que as respostas que os vários países têm face à pandemia hoje, tem sempre a China na fração, onde ela ocupa o lugar de numerador. O que os estudantes na diáspora passaram no início da epidemia não precisa de categoricamente repetir-se agora na fase de pandemia, até porque todas estas situações tem um lado pedagógico, ou melhor, podemos sempre aprender delas. Mas como se diz na andragogia, "o adulto só aprende se o quiser". Mas precisamos de desaprender esta forma de trabalhar com 'chamboco'.
Para o bem-estar dos estudantes na diáspora, é importante que as suas instituições de origem, as suas universidades não tenham uma mentalidade orçamental, ou seja, perante este cenário de pandemia não orçamentem as atitudes, até porque as atitudes mais básicas não precisam de orçamento, mas sim de respeito, consideração e solidariedade. Aliás, existe muita diferença entre valores e orçamento.
É muito importante que as universidades divulguem comunicações internas ligadas ao quotidiano das mesmas no contexto das suas respostas à pandemia em Moçambique. Mas não deixa de ser curioso e surreal a ausência de comunicações para os estudantes na diáspora. E mais, o Ministério de Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Técnico Profissional; o Conselho de Reitores; o Ministério de Educação e Desenvolvimento Humano (Circular N° 02), ou melhor, todas as instituições moçambicanas que tem funcionários a estudar (ou por outro motivo), na diáspora não é momento de assoviar, e muito menos é momento para praticar o silêncio.
Pior que a quarentena, pior que o estado de alerta, pior que o estado de crise, pior que o estado de calamidade, só mesmo a ausência de empatia e de alteridade.
Este seria um péssimo momento para assoviar para o céu ou de ficar pendurado no muro.
Nota: É importante ter a capacidade de percepção sobre o significado de social distancing, pois social distancing não significa abandono, isolamento ou esquecimento social das pessoas. Significa distanciamento físico, distanciamento este que não deve substituir a preocupação, a solidariedade, não deve funcionar como bode expiatório, não deve funcionar como desculpa para não desempenharmos como zelo e brio as obrigações que temos, ou seja, não deve silenciar o lado humano.