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O sumiço de cerca de uma centena de contentores de madeira no Porto de Pemba é uma demonstração de crime organizado para a nossa qualificação para os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020. Com esta última performance do Porto de Pemba garantimos o nosso lugar na modalidade desportiva de Crime Organizado, na categoria de Cara-de-Pau.
Somos bons nesta modalidade olímpica. E o povo também tem ajudado bastante com textos de indignação. Cada vez que um cidadão escreve um post do tipo 'é possível 82 contentores de madeira desaparecerem do porto sem que alguém tenha notado?' são mais pontos para Moçambique. A nossa indignação ajuda muito. Tem de parecer que estamos muito surpreendidos. O Comité Olímpico Internacional está a ver tudo. Por isso, temos de continuar a fingir que estamos admirados.
Nunca deixamos os nossos créditos em mãos alheias nesta modalidade. E não será desta vez. Tudo, menos perder a nossa cara-de-pau num certame internacional! Não podemos permitir! A nossa bandeira tem de estar ali, no píncaro do mastro mais comprido. Por isso, nas próximas revelações de corrupção temos de melhorar as nossas emoções!
De resto, a cada dia, o governo tem estado a trabalhar seriamente para melhorar o nosso crime organizado. O que vejo é que falta um pouco de criatividade da nossa parte como adeptos. Vê-se que estamos a publicar mesmas coisas e não estamos a caprichar nos comentários. Ora, em muitos posts é possível notar que a indignação não é autêntica. Vê-se que a pessoa só escreveu para estar na onda. Outra cena também preocupante é a falta de organização. O ideal seria uns escreverem 'como é possível sumirem contentores apreendidos?' e outros dizerem 'este país é uma merda!'. Ou uns dizerem 'país do pandza' e outros responderem com 'onde está a porta deste país, quero descer!', etecetera. Ou seja, as indignações devem estar sincronizadas umas às outras. Os insultos ao governo devem ser poéticos. Não pode insultar o governo como se estivesse na paragem de chapa. Isso pode baixar a nossa pontuação.
Um apelo importante que faço ao governo é no sentido de divulgar o calendário das próximas descobertas de corrupção para que o povo veja em directo na SuperSportMaxímo. Isso iria nos ajudar a opinião pública a ficar indignada em tempo real.
Agora, minhas irmãs e meus irmãos, se formos desqualificados precocemente a culpa não será do governo nem da Pê-Gê-Ere. Que fique claro! Estes estão muito engajados em manter a cara de Moçambique cada vez mais de pau possível. Se formos eliminados, a responsabilidade será inteiramente vossa - vocês que não se indignam nas redes sociais. A vossa indiferença tem nos prejudicado muito. Até nem parecem moçambicanos. Se não estão satisfeitos com a qualidade da nossa equipa olímpica de crime organizado, então, que se mudem para Guiné! É que o objectivo desta seleção é fazer desaparecer Moçambique do Mapa Mundo e, nessa altura, todos seremos chamados a nos surpreendermos massivamente. Quando esse dia chegar, temos de sair às ruas do 'feici' aos prantos tipo não sabíamos. Temos de fingir surpresa. São as regras do jogo.
Pois é! Faça a sua parte! Contribua com a sua lamentação patriótica e ajude o governo a melhorar a nossa sem-vergonha! Não precisa ser de verdade... aqui quase nada é de verdade.
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Cansei de esconder. A minha figura do ano 2020 é aquele senhor que escreve aqueles discursos que o Presidente Nyusi lê no Parlamento a cada fim do ano. Prontos! Já falei! Aquele senhor que diz 'portanto, moçambicanas e moçambicanos, o estado da nação é isto, aquilo, assado, frito, cozido'. É a minha figura.
Simplesmente o gajo é f*dido. O gajo está há seis anos a inventar adjectivos para alcunhar o país. Assim, que estamos aqui a beber e a comer, tipo estamos a festejar, o gajo já deve estar com o dedo do manguito mergulhado no meio do dicionário a procurar um molho de palavras para nos dar no próximo ano. Aquele senhor trabalha muito, vocês!
Sinceramente! Se fôssemos um povo organizado e que sabe o que quer estaríamos, neste momento, a homenagear o gajo. É verdade! Um povo que sabe agradecer estaria a fazer uma festa surpresa de fim do ano para ele. Rotular um país a cada ano não é fácil. Marrou maningue.
O gajo é bom. Não reconhecer isso também é inveja. Quando começou, usava apenas uma palavra: bom, próspero, resiliente, firme, etecetera. Mas, quando as coisas começaram a amargar, começou a usar muitas palavras de uma só vez, muitas delas sinónimas: desafiante, mas encorajador (2017); estável e que nos inspira confiança (2018); de esperança e de um horizonte promissor (2019). Então, este ano ele me ganhou de vez: resposta inovadora e renovada esperança. Caí de vez!
Desta vez, já não tenho como evitar. O gajo é mesmo a minha figura do ano. O gajo me ganhou. Conseguiu colocar o país numa igreja: Igreja Evangélica da Renovada Esperança. O país está a orar... está de cócoras. Nesse andar, não esteremos espantados se no próximo ano o estado da nação for 'Allahu Akbar!' ou 'Aleluia Jeová!'. Não será de estranhar que até ao fim do mandato cheguemos ao estado da nação 'Deus nos acuda!'.
Dizia, esse poeta da Ponta Vermelha é a minha figura deste ano. O gajo está a acompanhar bem o país. Ele consegue descrever fielmente a nossa evolução decrescente rumo ao fundo do poço. Assim que ele colocou o país na igreja vai acabar por levar à sepultura. Não falta muito para ouvirmos que o estado da nação é 'que a sua alma descanse em paz, Moçambique!'.
Nessa cena de figura do ano, cada um com a sua.
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