Os arguidos do processo (1/PGR/2015) relativo às dívidas ocultas, que até agora tem apenas um detido no estrangeiro na sequência de um mandado de captura internacional (o ex-Ministro das Finanças, Manuel Chang) deverão ser encarcerados na ”Guantánamo 1”, nome por que é conhecida a nova penitenciária de alta segurança erguida dentro das instalações da BO, no vasto recinto prisional localizado na Machava, nos arredores de Maputo. “Carta de Moçambique” apurou que a prisão de parte dos arguidos, como medida de coação, deverá acontecer dentro de poucos dias. Eventualmente, serão igualmente detidos arguidos doutros processos relacionados com grande corrupção.
Entretanto, este famoso processo das dívidas ocultas já ultrapassou a fasquia dos 18 arguidos. Outras figuras beneficiárias directas dos subornos da Privinvest foram também arroladas nos últimos dias. “Carta” sabe que as próximas semanas serão cruciais para o processo de responsabilização, em Moçambique, dos implicados no calote. Nesta sexta feira, falando à margem da abertura do ano judicial, o porta-voz do Tribunal Supremo, Pedro Nhatitima, confirmou uma notícia avançada por este jornal. A de que o pedido de extradição moçambicano já tinha sido expedido para a África do Sul. Assim sendo, no dia 5 de Fevereiro, a justiça sul africana começará a avaliar para onde vai extraditar Manuel Chang, se para Maputo ou para Nova Iorque.
As autoridades judiciais moçambicanas alimentam a esperança de a decisão recair para Maputo. Apesar de haver uma grande probabilidade nesse sentido, há uma nova questão sensível que está a ser levantada pelas autoridades judiciais sul africanas, de acordo com fontes seguras de “Carta”: na eventualidade de a decisão determinar a extradição de Manuel Chang para Moçambique, Pretória vai exigir que com o deputado sejam enviados para cá cerca de 6 mil moçambicanos condenados a penas altas de prisão, os quais constituem um enorme fardo para o orçamento dos serviços correcionais locais. Os 6 mil são criminosos de alto calibre que Pretória gostaria que fossem enviados para cumprirem a sua pena em Moçambique, no âmbito de um acordo que prevê a transferência de prisioneiros (na base do qual Maputo enviara para Pretória, no passado dia 10 de Janeiro, um pedido de transferência de Manuel Chang, que não teve resposta).
Nos corredores do Ministério da Justiça e Assuntos Religiosos em Maputo essa perspectiva de remissão de cadastrados perigosos da África do Sul para cá é vista com muita apreensão. O nosso sistema penitenciário não está preparado para receber tão grande número de prisioneiros. A infraestrutura prisional local continua obsoleta. “Guantánamo 1” que, já tem alguns “residentes de luxo", ainda não é suficiente para tão grande demanda. A cadeia é assim referida em círculos restritos do sector penitenciário em virtude de seus alegados grandes padrões de segurança, recordando a prisão americana de memória triste implantada na Ilha de Guantámo, em Cuba. A nova prisão continua a receber os últimos retoques. Ela, a par da “Guantámo 2”, localizada em Nampula, e com a capacidade para 200 prisioneiros de alto risco, corporizam o mais recente esforço do Governo para dotar o sector penitenciário de instalações de reclusão de alta segurança. (M.M.)
O Presidente russo, Vladimir Putin, anunciou hoje a suspensão da participação da Rússia no tratado de desarmamento nuclear (INF), em resposta à medida similar adotada pelos EUA. "Vamos dar uma resposta simétrica [aos EUA]. Os nossos parceiros norte-americanos anunciaram que suspendem a sua participação no tratado. Pois nós também o fazemos", disse o líder da Rússia, citado pelas agências noticiosas russas, numa reunião com os ministros russos dos Negócios Estrangeiros, Sergey Lavrov, e da Defesa, Sergei Shoigu.
Putin disse que os EUA estão, há anos, a ignorar as iniciativas russas de desarmamento e "o tempo todo à procura de pretextos para desmantelar o sistema de segurança existente". O presidente russo pediu também aos responsáveis dos Negócios Estrangeiros e da Defesa que não iniciassem novas negociações com os EUA até que "os parceiros norte-americanos amadureçam para acompanhar um diálogo consistente e igual" sobre uma questão que é "muito importante” para a Rússia e para todos os seus “parceiros e o resto do mundo". Ao mesmo tempo, negou que a Rússia pretenda agora participar numa nova corrida armamentista com Washington.
“Não devemos nem vamos deixar-nos arrastar para uma cara corrida armamentista", disse. Pelo seu lado, Lavrov disse que Moscovo "tentou fazer todo o possível para salvar o tratado INF [Intermediate-Range Nuclear Forces Treaty, em inglês], tendo em conta a sua importância para a segurança estratégica na Europa e no mundo".
Enquanto isso, o chefe da Defesa disse que os EUA "anda há anos a infringir o tratado" de desarmamento acordado durante a Guerra Fria e propôs que a Rússia desenvolva um míssil terrestre hipersónico de médio alcance, uma iniciativa que foi aprovada.
Os EUA deram à Rússia até hoje para cumprir o INF de maneira "verificável", um ultimato que foi rejeitado pelas autoridades deste país, que acusou Washington de aumentar o risco de uma guerra nuclear no mundo ao abandonar os principais tratados de desarmamento para a segurança internacional.
O secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, confirmou na sexta-feira que os EUA vão retirar-se do tratado de armas nucleares de médio alcance e o Presidente, Donald Trump, responsabilizou a Rússia, por violar esse acordo.
Mike Pompeo confirmou que os EUA suspendem a partir de domingo as suas obrigações com o tratado, assinado em 1987, depois de, em comunicado, o Presidente dos EUA, Donald Trump, ter acusado a Rússia de o ter violado “por tempo demais (...) com impunidade, desenvolvendo secretamente e colocando em campo um sistema de mísseis proibidos, que representa uma ameaça direta aos nossos aliados e aos nossos militares no estrangeiro”.
Donald Trump afirmou que os EUA “aderiram totalmente” ao pacto por mais de 30 anos, mas que não podem continuar limitados aos seus termos enquanto a Rússia deturpa os seus termos.
O chefe da diplomacia norte-americana assegurou, contudo, que Washington estava "pronto" para continuar a discutir com a Rússia "o assunto do desarmamento". No início de Dezembro, com o apoio da Nato, Mike Pompeo tinha dado à Rússia 60 dias para desmantelar os seus novos mísseis de longo alcance, violando o tratado aos olhos dos norte-americanos e da Aliança Atlântica. Caso a Rússia recusasse, Pompeo tinha ameaçado iniciar a retirada dos EUA do tratado, procedimento que se estende por seis meses.(Lusa)
A decisão da soltura de Manuel Chang, em liberdade provisória sob caução, foi adiada para o próximo dia 15 de Fevereiro. A juíza Sagra Sobrayen disse que precisa de tempo suficiente para tomar uma decisão sem pressões. O anúncio do adiamento foi feito poucos minutos após o inicio da sessão, que seria dedicada para a defesa e a Procuradora esgrimirem as derradeiras notas de suas alegações finais, que ocuparam todo o dia de ontem num despique de titãs. Rudi Krause e Elivera Dreyer nem sequer tiveram a chance de abrir a boca. As sessões de tribunal na África do Sul são gravadas. Quando Krause estava a iniciar seu momento de argumentação, houve um corte luz. O gerador tinha ficado sem diesel.
Então, o que é que vai acontecer?
Pois, no dia 5 de Fevereiro, terça feira, este tribunal vai recolher as notas finais de Krause e de Dreyer. Depois, numa outra sala (chamada de “extradition court”), dar-se-á início ao processo de extradição, que seguirá de forma independente. Ou seja, a decisão sobre o pedido de liberdade provisória será tomada depois de iniciar a discussão sobre a extradição. Isto não estava nos planos da defesa, que continua a alimentar esperança pela soltura do seu cliente.
Hoje, a Procuradora Elivera Dreyer revelou que o pacote com a papelada americana solicitando a extradição de Manuel Chang já chegou a África do Sul. Deu entrada no Ministério dos Negócios Estrangeiros e Relações Internacionais local na segunda feira e depois foi enviado para o Ministério da Justiça e Assuntos Constitucionais.
“Carta” sabe que o pedido de extradição de Moçambique foi apreciado ontem pelo Tribunal Supremo e já deve estar a caminho de Pretória. Este é um caso que vai ainda arrastar-se por longas semanas. (Marcelo Mosse)
Desde que Manuel Chang foi detido na RSA, a pedido dos EUA, generalizou-se a crença de que seria fácil a sua extradição para aquele país, em virtude do tratado de extradição entre a RSA e os EUA. E desenvolveu-se sobre essa putativa extradição um tacanho exercício jurídico nas redes sociais e nos media. De imediato, espalhou-se a convicção de que o mais provável seria mesmo a extradição para lá. Essa convicção assentava, entre outros, no facto de Manuel Chang não ser havido como suspeito por crimes praticados na RSA, nem interessar ao Estado Sul-africano proceder criminalmente contra ele.
E também se achava que, não havendo acordo de extradição da RSA com Moçambique, nem estando ainda em vigor o Protocolo da SADC, estava descartada liminarmente a possibilidade de ele ser enviado para Maputo.
Nada mais errado. A convicção de que não poderia ser “extraditado” para Moçambique resultou mais de um desejo generalizado de que fosse extraditado para os EUA (por não se confiar no Ministério Público e nos tribunais de cá) do que propriamente de uma análise da questão feita de forma cuidadosa, objectiva e despida de emoções.
Só para dar um exemplo. Devia ter-se considerado, em primeiro lugar, o facto de a RSA possuir uma Lei de Extradição (o Extradition Act 67 de 1962). Nessa Lei, logo no nº 2 do artigo 3, prevê-se expressamente a possibilidade de extraditar para um Estado com o qual a RSA não tenha um acordo de extradição. Sob certas condições, é certo, mas essa possibilidade legal existe. A maioria dos juristas e comentadores opinou no sentido de que era impossível. Para deixar as coisas mais claras, e ao contrário do que é a crença (e grande desejo) da generalidade das pessoas, a probabilidade de Chang ser extraditado para os EUA sempre foi “menor” do que a probabilidade de ele ser enviado para Moçambique. Porquê?
Pelas seguintes razões: o detido é cidadão moçambicano; os actos imputados foram alegadamente praticados em comparticipação criminosa com vários outros moçambicanos; tais comparticipantes residem em Moçambique, tal como o Manuel Chang; os actos materiais ocorreram em Moçambique; o indictment_ do Grand Jury do Tribunal New York “é limitado” a 3 tipos legais de crimes, a 200 milhões de USD e a uma dúzia de arguidos e cúmplices; ora, a fraude envolveu 2.1bilhões de USD, muito mais do que 3 tipos legais de crimes e bem mais do que uma dúzia de autores, cúmplices e beneficiários; os frutos da acção, em grande parte, foram colhidos em Moçambique; um grande volume de activos a recuperar está em Moçambique (prédios, viaturas, dinheiro, valores); há entidades moçambicanas que foram directamente lesadas (bancos, bondholders) que têm domicílio em Moçambique e que disputarão com as americanas os activos que vierem a ser recuperados; foi formulado pedido de entrega a Moçambique *ainda que por via política, diplomática, consular e administrativa*, mas não judicial.
Com todas estas circunstâncias em cima da mesa, o mais difícil para a justiça sul-africana é, foi sempre, decidir-se pela extradição para os EUA. Aliás, o tribunal de Londres extraditou Andrew Pearce? Não. Dir-se-á que os EUA não solicitaram. Responder-se-á: sabiam que seria difícil obtê-la? Ora, num quadro de maior probabilidade de Manuel Chang vir a ser extraditado para a Maputo, o que é que iria acontecer? Ao chegar ao território nacional, e não havendo mandado judicial, deveria ser deixado em paz e em liberdade. Se fosse detido fora de flagrante delito, sem mandado judicial (de juiz), a prisão seria ilegal. Se, ainda assim, a prisão ilegal fosse mantida, os seus advogados fariam um pedido de “habeas corpus”, que seria obviamente deferido!
É isto que os juristas, os comentadores, os cidadãos (e a oposição que votou contra a autorização para prender) desejam? Ou seja, se o Ministério Público, o Tribunal Supremo, e a Assembleia da República tivessem ficado quietos e, entretanto, Chang fosse entregue a Moçambique por decisão da RSA, o que se diria, se ele seguisse circulando pelas ruas da cidade? Seriam veementemente criticadas por não terem previsto essa possibilidade e se terem deixado convencer que a extradição para os EUA era um dado adquirido, só por existir um acordo de extradição RSA/EUA e, sobretudo, por não haver um acordo semelhante Moçambique/RSA. Seriam apodados de negligência, preguiça, ignorância, falta de estudo, quiçá compadrio! Chega a exasperar o atrevimento de ilustres sapateiros da praça que, neste caso, como noutros, teimam em ir além do chinelo! (Carta)
As alegações finais à volta da decisão do Kempton Park Magistrate Court sobre o pedido de liberdade provisória do deputado Manuel Chang terminaram ontem quando eram 16 horas, no meio de uma luta hercúlea entre o advogado da defesa Rudi Krause e a procuradora Elivera Dreyer. Krause dominou boa parte da sessão desde o seu início às 11.30 horas até pouco antes das 15h, quando finalmente Dreyer tomou conta do ringue.
Nas suas alegações para convencer o tribunal a soltar Chang sob caução, Krause optou por desvalorizar a acusação americana contra o antigo Ministro das Finanças, considerando-a de inócua e vazia de fundamento. Disse que a justiça americana não tinha apresentado uma única evidência de que Chang cometeu os crimes de que é acusado. Fez um argumento surpreendente: Chang era acusado apenas de "conspiração" e não propriamente de "fraude ou lavagem de dinheiro".
Sendo assim, um estrangeiro que tenha “conspirado” fora da África do Sul não pode permanecer na prisão no país. Krause, movendo-se entre um discurso vigoroso e momentos de fúria nos gestos e na língua, atacou a perspectiva de que Chang devia permanecer em liberdade porque ele foi detido para ser extraditado. O advogado disse que essa era uma "assumpção arrogante” dos americanos, nomeadamente a ideia de "venderem" a extradição como uma inevitabilidade.
A discussão ainda não era sobre essa matéria, mas Krause antecipou os seus argumentos. A juíza Sagra Sagrayen até estranhou a atitude do causídico. Mas Krause tinha a sua lição preparada. Primeiro desafiou o tribunal a mostrar a papelada da extradição para os EUA, que afinal, soube-se, ainda não foi devida e cabalmente submetida. Depois insistiu na ausência de elementos de prova que justificassem que Chang cometeu um crime com enquadramento no tratado de extradição entre a RAS e os EUA.
O advogado, que mostrou hoje uma faceta mais aguerrida que nas sessões anteriores mas também menos acessível aos jornalistas, pintou Chang de roupagem quase imaculada. Que era uma pessoa de parcos recursos e disposta a colaborar com a justiça até ao fim e que, ao contrário do que alega a justiça americana, não tem nem
conta bancária e nem interesses empresariais em Espanha. E fez antever a sua estratégia, ao evocar, como jurisprudência politizada, um anterior pedido de liberdade sob caução que foi dirimido durante longos meses, numa disputa entre uma ordem judicial favorável e decisão política (do anterior Ministro da Justiça e Assuntos Constitucionais) contrária.
Isso, como escrevemos, levou meses. Ou seja, se amanhã o tribunal recusar o pedido de libertação provisória de Chang sob uma caução de valores baixos, Krause deverá recorrer, cultivando sua esperança nessa intervenção do poder político.
A magistrada Sagra Sagrayen não deixou vislumbrar para onde se inclinaria o pêndulo do seu juízo, entre a soltura ou a continuada reclusão de Chang. Nalgum momento ela até parecia rendida a Krause, quando insistiu em saber se o passaporte normal do deputado estava sob custódia daquele tribunal (o passaporte diplomático está retido nas instalações da Interpol em Pretória) e também sobre se Chang fazia viagens frequentes para os Emirados Árabes Unidos e para Portugal (depois de conferenciar com Chang, Krause disse que o seu cliente viajou três vezes para Lisboa, por razões médicas, em 2018, e passou o ano novo no Dubai em 2017).
Mas depois veio a vez de Elivera Dreyer. A procuradora foi incisiva em atiçar mais o fogo... contra Chang, insistindo no risco de fuga, nas posses monumentais do antigo governante, mas, sobretudo, no facto de que se estava perante um crime de proporções alarmantes, “bilhões de USD roubados e que afectaram negativamente a economia de Moçambique”.
A procuradora fincou o pé numa alegação: Chang foi detido para ser extraditado e que isso não se compadecia com a perspectiva de ser solto, tanto mais que, asseverou, a Constituição de Moçambique impede a extradição de um nacional. Hoje saber-se-á a sina do ex-Ministro das Finanças no que diz respeito à soltura provisória como pretendido. Será o fim do primeiro “round”. A decisão da juíza vai determinar se esta dimensão do combate prosseguirá noutros ringues da justiça sul-africana, eventualmente com a intervenção de juízes esgrimindo regras doutros palcos. O "gong" volta, no entanto, a soar na próxima terça-feira, no mesmo tribunal, mas noutra sala e com outro juiz, para se discutir dois pedidos de extradição, o americano e o moçambicano, num combate que poderá levar semanas. (Marcelo Mosse, em Kempton Park)
O antigo Governador do Banco de Moçambique (BM), Ernesto Gove, aparece numa lista, publicada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), de 16 gestores públicos envolvidos no processo de contratação das dívidas ocultas entre 2013 e 2014, pelas empresas PROINDICUS, EMATUM e MAM com garantias do Estado moçambicano.
Ontem, quando questionada, durante um encontro com jornalistas no quadro do comité de Política Monetária do Banco de Moçambique, se Ernesto Gove estará envolvido no escândalo das dívidas ilegais, a nova directora de comunicação daquela instituição, Silvina de Abreu, respondeu que o BM não está a par desse assunto. Quanto a uma eventual recuperação dos valores das dívidas pelo BM, disse que essa era uma matéria dos tribunais, cabendo à PGR um relevante papel.
O BM distancia-se de um possível envolvimento de Gove no caso das dívidas ilegais. Na lista (divulgada pela PGR) onde constam 16 gestores, incluindo Gove, este aparece como o autor da autorização e emissão de avais sem qualquer critério legal, para a Proindicus, Ematum e MAM. “A economia está imune às revelações sobre as dívidas ocultas”, disse Silvina, destacando a investigação da justiça dos EUA na esfera económica nacional. (S.R.)