Logo depois que a juíza Sagra Sagrayen desferiu o golpe final, decidindo que o deputado Manuel Chang devia retomar aos calabouços da prisão de Moderbee (argumentando que ele enfrenta uma acusação muito séria nos EUA, com risco de condenação; e uma libertação comportava um tremendo risco de fuga para Moçambique, onde a extradição é letra morta), o advogado Rudi Krause, abalado e carrancudo, resmungou em surdina e, no corredor, à saída, disse-nos que iria recorrer ao Supreme Court. Alegou que a manutenção de Chang em reclusão era uma decisão completamente sem fundamentos.
Krause esperava que convencera o Tribunal aquando das suas alegações finais, a 5 de Fevereiro, nas quais minimizou o “indictment” do grande júri americano e o pedido de extradição assinado por Mike Pompeu (Departamento de Estado) recebido em Pretória a 4 de Fevereiro. Mas, a juíza Sagra surgiu hoje demolidora. Descascou os argumentos de Krause, corroborando em grande medida com os fundamentos da magistrada Elivera Dreyer, que se batera ferreamente contra a libertação provisória do ex-Ministro das Finanças, e traçou um perfil psicológico de Manuel Chang mais a roçar para o tipo manhoso, desonesto e não disposto a abrir o jogo, numa táctica de defesa que afasta quaisquer chances de cooperação, quando cooperar parece ser um grande trunfo. “He plays his cards against his chest”, disse Sagra de Chang, reforçando nas entrelinhas que as omissões e contradições do deputado mostram não se estar perante uma pessoa confiável, apesar do seu intelecto e uma posição anterior de Ministro das Finanças.
Dois aspectos foram chamados para dar corpo a essa caracterização. O facto de Chang ter pintando de si uma pessoa de parcos rendimentos, contrastando com suas viagens ao estrangeiro e um estilo de vida mais para o “lavish”, de acordo com um rastreio aos seus passaportes, deslocações e estadias que não eram suportados pelo seu cartão de crédito, mas por contas que nunca foram mostradas ao tribunal e, por isso, fruto de dinheiro suspeito.
Era também manhoso o facto de Manuel Chang ter comprovadamente recebido subornos da Privinvest (de acordo com a acusação americana, na ordem de 15 milhões de USD) e aberto contas no estrangeiro, mas continuar a fingir que tinha um património completamente modesto. E pior, a oferta de uma fiança altamente modesta, de 200 mil randes, que seus advogados propuseram no requerimento de libertada provisória, o que era “peanuts” para a gravidade da acusação americana e para o património acumulado de subornos. A juíza Sagra foi cáustica: se Manuel Chang ganhava apenas uma pensão de reforma e o salário de deputado e pouco mais, como declarou, então porquê despender 200 mil randes numa caução se esse dinheiro sê-lo-ia útil?
A leitura do veredicto durou duas horas. A juíza falava pausado, assertiva e instrutiva. Por diversas vezes fez apelos a jurisprudência para afirmar suas convicções. O alvo não era condenar Chang de qualquer crime, mas para desconstruir as alegações da defesa ela teve que mostrar que Manuel Chang estava em maus lençóis e que, se for extraditado e condenado na América, ele corre o risco passar longos anos na prisão. Mostrou que, ao contrário do que a defesa argumentou a dias, todas as acusações que pesam sobre Chang tinham enquadramento na legislação penal sul-africana, todas sem excepção, mesmo que “conspirar” em sentido lato seja era um crime.
“Conceder a liberdade a Manual Chang seria contra o interesse da justiça. Já no passado várias pessoas fugiram, estando sob liberdade provisória. E no caso de Chang, ele pode atravessar a fronteira para Moçambique sem que ninguém lhe questione. E de lá nunca poderá ser extraditado”, rematou ela, nesse golpe final que gelou a sala e colocou os nervos do advogado à flor da pele. O desfecho não era esperado nem pela família do deputado, que compareceu hoje em peso, nem pela defesa. No próximo dia 26, no mesmo Kempton Park Magistrate Court, mas noutra sala, inicia a grande discussão do pedido de extradição americano, numa nova contenta que se espera longa. Até que ponto Chang começará a cooperar? Eis questão. Ele já deve ter percebido que o caso não é nada elementar e que está a lidar com uma justiça que faz.…justiça e nenhuma política. Por enquanto... (Marcelo Mosse, Kempton Park)
Logo que seu nome foi revelado ontem como sendo um dos detidos no caso das “dívidas ocultas”, todas as referências sobre sua história convergiam para uma alegação: Bruno Tandane, também conhecido por “Nonó”, era um associado do filho do antigo Presidente Armando Guebuza, um frequentador assíduo das hostes da então família presidencial. A alegação tornou-se verdadeira quando foi circulado nas redes sociais um recorte de uma edição do Boletim da República (BR), mostrando o anúncio da constituição de uma empresa, a Mobimóveis Limitada, em Março de 2011, onde os dois são sócios únicos. Aconteceu dois anos antes do início da orquestração do calote. Bruno Evans Tandane Langa tornou-se sócio de Armando Ndambi Guebuza nessa altura, mas eles já eram amigos de longa data, de acordo com fontes de “Carta”.
No BR (segundo suplemento, III Série, número 10, de 11 de Março de 2011) consta que a Mobimóveis foi criada como uma empresa de prestação de serviços de consignação, agenciamento, mediação e intermediação comercial de material de escritórios e residências; elaboração de projectos e consultoria para elaboração de projectos mobiliários; design e decoração de interiores e exteriores; importação e exportação de bens em geral e serviços.
Bruno Tandane (na verdade Bruno Langa) é filho de Jorge Langa e Artemisa Tandane. Quem lhe conhece diz que cresceu no coração da Polana, em Maputo, na zona da Vila Algarve. Era um rapaz de hábitos modestos. Também passou parte da infância e adolescência na Matola. No registo da Mobimóveis em 2011, Bruno era ainda solteiro. Mas, recentemente casou-se, com grande pompa e desmedida circunstância, tendo como padrinho Teófilo Nhangumele.
Ainda não é claro qual foi o seu papel no calote. Apresentava-se como membro do SISE, mas há quem diga que isso era apenas uma capa de protecção. De há uns tempos para cá, sobretudo entre 2013/14/15, seu estilo de vida mudou radicalmente. Passou a ser um endinheirado, tendo comprado gado de raça e uma viatura Ferrari. Nessa altura, sua amizade com Ndambi estava em alta. É descrito como tendo participado dalgumas viagens para França, no quadro do “procurement” dos barcos da Ematum, acompanhando os filhos de Armando Guebuza, nomeadamente Ndambi e Mussumbuluko.
Desde essa altura, dizem as nossas fontes, Nonó começou a ostentar riqueza a valer. Tal como muitos jovens próximos dos filhos de Guebuza, Bruno Tandane também adquiriu seu Range Rover mas, de acordo com um amigo próximo, ele preferiu “investir” na África do Sul, onde vivia como um “lord”.
Com Ndambi, em 2016 terá estado desavindo. Tiveram algumas altercações e Ndambi lhe terá dados costas, numa altura em que parte do seu gado de raça foi confiscado na fronteira de Ressano (e depois roubado), alegadamente por importação irregular. Sua irmã Cátia Langa surgiu na altura nas câmeras da TV barafustando contra tudo e todos.
Os dois acabaram fazendo as pazes. Afinal, eram amigos de gema. Quando Ndambi saiu do Mathew Phosa Collegue, em Mpumalanga, em 2002, para estudar em Durban, Bruno seguiu-lhe as peugadas. Eram como unha e dedo. Aliás, essa amizade deve ter tido antecedentes numa relação entre Armando Guebuza e o empresário Júlio Tandane, tio de Bruno, cujo nome virou parangonas num caso polémico de desfalque do antigo BPB (Banco Popular de Desenvolvimento). Júlio Tandane geria alguns interesses empresariais de Guebuza.
“O melhor amigo de Ndambi”, como lhe descrevem, acabou agora nas malhas da justiça. Quem lhe conhece diz que é apenas um “pobre inocente” que se beneficiou do calote. Porquê ele?, questiona-se. A chave para a compreensão do papel de Bruno na trama do endividamento oculto parece residir na sua relação de amizade com Ndambi. Seu depoimento em Tribunal vai ser revelador. Será que ele está disposto assumir a culpa? Ou arrastará o amigo?(Marcelo Mosse)
Moçambique está actualmente definido como sendo um “regime autoritário”, com uma classificação de menos de quatro em dez pontos possíveis, segundo o Índice de Democracia da Economist Intelligence Unit (EIU). Dizendo que a mesma classificação aplica-se aos vizinhos Zimbabué e eSwatini (Suazilândia), a EIU informa ter-se o índice relativo a Moçambique agravado, ao ter passado de 4,02 pontos em 2016 e 2017, “regime híbrido”, para 3,85 pontos em 2018, obtendo assim a classificação de “regime autoritário.”
O mais recente relatório sobre Moçambique informa terem quatro indicadores deste índice permanecido sem alteração, havendo no entanto uma quebra no que se refere ao processo eleitoral, devido às irregularidades e violência exercida sobre membros da oposição, durante e depois das eleições municipais realizadas em Outubro de 2018. Em termos económicos, o relatório da EIU mantém, “grosso modo”, as previsões do anterior, com um taxa de crescimento fraca de 3,4% em 2019, antes de aumentar para uma média de 5,3% ao ano no período de 2020/2023. O documento volta a referir, à semelhança de anteriores, que a economia deverá começar a beneficiar dos preparativos para a exploração dos depósitos de gás natural em dois blocos da bacia do Rovuma, estando previsto pelas partes envolvidas que essa actividade deverá iniciar-se em 2023/2024.
Mas afirma igualmente que havendo um excesso de oferta no mercado mundial de gás natural é que muito provável que as grandes obras de construção em terra, nomeadamente as centrais de processamento, tenham início apenas depois de 2020. A EIU adianta que o crédito bancário tem-se estado a contrair para alguns sectores-chave, caso da agricultura, telecomunicações e construção, devido a uma política monetária mais rígida, o que sugere que o desempenho destes sectores será fraco ao longo de 2019.
O consumo privado, que deverá crescer este ano à taxa de 3,7%, tenderá a resvalar para valores negativos até 2023, no que é compensado pela despesa pública, que registará taxas de crescimento entre 4,0% em 2019 e 5,9% em 2023.A formação bruta de capital fixo ou investimento, que em 2018 registou uma queda de 12,5%, deverá crescer este ano para 8,2%, antes de literalmente explodir para taxas entre 55,0% em 2020 e 30% em 2023. (Macauhub)
Dos 14.6 mil milhões de Meticais que a Comissão Nacional de Eleições (CNE) necessita para custear as despesas do pleito (presidenciais, legislativas e das assembleias províncias) agendado para 15 de Outubro próximo, o Governo desembolsou 6.5 mil milhões, ficando os remanescentes 8.1 mil milhões dependente da caridade dos parceiros internacionais de Moçambique. Este cenário foi dado a conhecer aos jornalistas numa conferência de imprensa esta quinta-feira (14) em Maputo, concedida pelo porta-voz da CNE, Paulo Cuinica. Destacando os contactos que o Presidente da República, Filipe Nyusi, vem estabelecendo com a comunidade internacional no sentido de sensibilizá-la para o financiamento global das eleições de Outubro próximo, Cuinica disse terem já sido criadas 110 comissões de trabalho da CNE e do STAE (Secretariado Técnico de Administração Estatal). Neste momento, acrescentou, decorre o processo de indicação dos presidentes, vice-presidentes e os respectivos mandatários provinciais. As 110 comissões de trabalho foram instaladas em 44 distritos (o equivalente a quatro distritos em cada uma das 11 províncias). O funcionamento das comissões está dependente do financiamento, na totalidade, do processo eleitoral. Segundo Paulo Cuinica, a instalação das direcções distritais de eleições pela CNE e STAE deveria ocorrer até 28 deste Fevereiro, mas devido à escassez de fundos aquele prazo poderá ser prorrogado.
Necessidade de aprovação atempada de legislação
O porta-voz da CNE apelou também à Assembleia da República (AR) para que aprove atempadamente a legislação eleitoral relativa à eleição dos governadores. Uma vez aprovada com antecedência, a referida legislação poderia ser divulgada sem pressão, o que irá permitir um melhor entendimento do seu conteúdo pelo eleitorado, uma das condições para minimizar os conflitos eleitorais. Sobre a insurgência em Cabo Delgado, Paulo Cuinica reconheceu tratar-se de uma situação preocupante, aliada às chuvas que têm estado a cair um pouco por todo o país, mas garantiu que tudo está a ser feito para que o processo eleitoral se realize sem grandes sobressaltos em todas as províncias. Cuinica anunciou que foram identificados 7.500 locais para o processo de votação, estimando-se em 16 mil o número de brigadistas necessários. Assegurou que já estão abertas inscrições para observadores nacionais e estrangeiros. (Omardine Omar)
Para além de Teófilo Nhangumele, há mais quatro indivíduos detidos hoje no quadro do processo 1/PGR/2018, que investiga judicialmente a contratação das chamadas dívidas ocultas, que lesaram o Estado em mais de 2 mil milhões de USD. Os detidos foram concentrados esta tarde na Décima Oitava Esquadra da PRM, localizada no Lhanguene. Ainda não apuramos a identidade dos restantes. As equipas da PGR que efectuaram as diligências de prisão e arresto preventivo de bens já recolheram. A qualquer momento, a identidade de todos os integrantes da primeira leva de detidos vai ser conhecida.
Um repórter de “Carta” esteve toda a tarde plantado defronte da referida esquadra e observou uma movimentação desusada. Os detidos chegavam em seus carros de luxo, como se estivessem a entregar-se. No fim da tarde circulou a informação de que os cinco haviam sido levados para a prisão da Zorba, um novo (em velhas instalações do Ministério do Interior) estabelecimento penitenciário preventivo da província de Maputo, localizado na estrada velha para a Matola. Mas uma fonte segura disse que os detidos deverão aguardar naquela Esquadra até que sejam presentes a um juiz de instrução, para legalização ou não das suas prisões. (Carta)
Da ‘herança’ que o anterior edil de Nacala-Porto, Rui Chong Saw, deixou ao seu sucessor Raúl Novinte, empossado no passado dia 07 do mês em curso, destaque vai para funcionários-fantasma e avultadas dívidas, soube “Carta” de pessoas que viveram de perto os problemas daquele município costeiro da província de Nampula.
De acordo com uma das nossas fontes, o gabinete de Saw era constituído por 27 funcionários, mas desde que o novo Presidente do município tomou posse apenas seis apresentam-se nos respectivos locais de trabalho.
Face a esta situação, avolumam-se as suspeitas de que no elenco do anterior edil havia 21 ‘fantasmas’! Na vereação da Agricultura só dois funcionários é que efectivamente prestam serviço, num total de oito registados. Alega-se que dois deles, cujos nomes não foram revelados, estão doentes e são de idade já avançada. Na mesma vereação quatro trabalhadores foram transferidos para sectores que também não foram especificados. Ainda de acordo com a fonte de “Carta”, o edifício do Conselho Autárquico de Nacala-Porto está praticamente às escuras, pois das 60 lâmpadas que lá existem apenas vinte acendem. Em quase todos os gabinetes não há casas de banho, e só uma, pertencente ao gabinete do Presidente, é que tem “condições mínimas”.
Dos bens patrimoniais do município de Nacala-Porto herdados por Raúl Novinte incluem-se meios de transporte que neste momento estão quase todos eles paralisados, na sequência da vandalização de que foram alvo! O relatório (com a data de 31 de Dezembro de 2018) que Novinte recebeu no dia 08 deste Fevereiro (um dia após a sua tomada de posse) sobre as actividades da anterior administração de Rui Chong Saw, não espelha a realidade actual da coisa pública de Nacala-Porto.
Uma lista de dívidas confirmadas
Raúl Novinte está na posse de uma lista de dívidas confirmadas pelo elenco anterior, mas há outras não declaradas, como a contraída por duas rádios comunitárias, no valor de 36 mil Mts. “A residência do presidente jorra água do tecto”, contou a nossa fonte, acrescentando que, quando o elenco da lista liderada por Rui Chong Saw (cabeça-de-lista) perdeu as eleições autárquicas de Outubro do ano passado, contratou 53 jovens da OJM para ‘sufocar’ as contas da autarquia.
Daquele número foram selecionados 10 para trabalhar na residência do Presidente. Quando Chong Saw foi derrotado nas eleições de Outubro do ano passado ele colocou à disposição do administrador de Nacala a melhor residência do município, com objectivo de distanciá-la do novo edil, proveniente da Renamo. Mas no relatório em poder de Novinte não há qualquer registo dessa residência, cuja reabilitação custou ao município mais de 3 milhões de Mts. Ainda segundo a nossa fonte, logo no primeiro dia do exercício das suas funções, o novo presidente do Conselho Autárquico de Nacala-Porto viveu uma situação estranha, a do sumiço da viatura protocolar. O carro desapareceu das oficinas do município, onde tinha ido parar a fim de ser reparado. Há suspeitas de ter sido o Chefe das Oficinas quem protagonizou tal sumiço.
Posição da nova cúpula directiva municipal
Uma carta contendo todo o historial sobre a governação de Rui Chong Saw e seu elenco no município de Nacala-Porto foi endereçada à Direcção Provincial de Administração Estatal e Função Pública de Nampula pelo advogado da nova equipa liderada por Raúl Novinte. A missiva em causa, a que o nosso jornal teve acesso, refere numa das passagens que “solicitamos todos os contratos, com os seus respectivos vistos do Tribunal Administrativo, sob pena de nulidade e de nenhum efeito jurídico, alguns contratos ou actos anteriormente celebrados ou praticados”.
Numa outra passagem, a carta diz que o novo elenco directivo no município de Nacala-Porto pretende um governo autárquico inclusivo, sem discriminação racial, político-partidária, religiosa e outras. Novinte e sua equipa prometem, em sede própria, convidar o Governo Autárquico cessante a justificar ou esclarecer um e outro aspecto da sua gestão, num acto de transparências e boa governação. (S.R.)