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sexta-feira, 19 fevereiro 2021 10:13

Um mês de autêntico calvário!

Caros concidadãos, o SARS-CoV-2, ou simplesmente COVID-19, é uma dura realidade. O vírus é voraz, os efeitos devastadores e pode levar à morte. O vírus existe e é invisível. Uma das perguntas que me foi feita e nunca terá resposta é: onde é que apanhou a COVID? Logo eu, cultor da máscara, do álcool em gel e um indivíduo que ganhou consciência da lavagem das mãos, várias vezes ao dia. Entretanto, a COVID-19 afectou-me.

 

Os primeiros sintomas (gripe) foram a 18 de Janeiro de 2021. O país registava um aumento exponencial de casos da doença, levando-me psicologicamente a pensar na possibilidade de estar infectado pela COVID-19. Tal como é comum, por estes dias, nas redes sociais, circulam inúmeras receitas caseiras. Eu optei por um xarope “tiro e queda” feito à base de gengibre, cebola, alho, limão, canela e mel – a única coisa doce no cocktail. Duas colheradas ao dia! Bem, não se trata de uma prescrição para ninguém, pois, nem sequer conheço o nível de toxidade ou de eficácia desse xarope caseiro. O certo é que acreditei na cura e lá fui tomando o xarope e a gripe passou. Escusado será dizer que experimentei os mais variados chás, xaropes e bafos! Depois vieram outros sintomas: fortes dores de cabeça e articulações, sintomas que sugeriam tratar-se de malária.

 

No dia 25 de Janeiro submeti-me a testes de COVID-19. Logo depois do teste, prescreveram-me azitromicina, predniselona, omeprazol, cefiximina, paracetamol, sulfato de zinco, vitaminas C e D. Os resultados só chegaram a 29 de Janeiro, no mesmo dia que decidi testar à malária. O teste revelou-se negativo. O hemograma e o HTZ eram normais. Ao principio da tarde, finalmente a confirmação do que mais temia: o teste positivo à terrível COVID-19. Vieram os meus medos, os meus receios e, mais tarde, o conformismo e a aceitação.

 

Na noite do dia 30, o quadro clínico agravou-se: começaram as dificuldades respiratórias. Literalmente faltava-me ar para respirar. À madrugada fui parar às urgências do Hospital Central de Maputo. A minha mente começou a desenhar um quadro sombrio. Pairava a morte. Por outro lado, a mente apaziguava com atenuantes como a idade e a ausência de comorbidade (qualquer patologia independente e adicional a uma outra existente num paciente), para além de existir uma taxa elevada de indivíduos que recuperam da doença.

 

A espera para um tratamento mais cuidoso era longa. O ponteiro do meu relógio estava parado! Só por volta das 10 horas eu e os outros doentes demos entrada à enfermaria de Cardio-pneumologia, transformada em enfermaria de trânsito para os doentes de COVID-19, no HCM. Ter uma cama naquela enfermaria não foi fácil. Foi preciso esperar toda a madrugada para que alguns doentes a desocupassem ou por alta ou por óbito. Terrível! O ambiente hospitalar era simplesmente aterrador. Conviver com dores, choros, gritos e mortes não foi fácil. Passou-se a primeira noite e eu sem sono.

 

Insuflado o oxigénio, “voltei à vida.” Ao fim do dia recebi alta hospitalar. Entretanto os episódios do dia anterior não me deixaram tranquilo. Os dias que se seguiram foram de insónias, devaneios, sustos e medo. Dois dias depois, voltei a ter falta de ar, consequentemente, nova baixa hospitalar. Ao princípio do dia 2 de Fevereiro estava novamente prostrado na sala de urgências do HCM. Quando finalmente as camas ficaram disponíveis fomos levados para a mesma enfermaria. Nem quero me lembrar do processo de transferência!  A minha mente voltou a vislumbrar vários cenários: aquela sala transmitia medo, mas também tranquilidade. Medo porque o quadro clínico poderia se agravar e “evoluir para óbito”, como dizem os médicos; tranquilidade porque poderia receber oxigénio e cuidados médicos que me levassem a nova alta. À tarde, durante a medicação, um episódio voltaria marcar-me: repentinamente um doente piorou chegando a precisar de oxigénio. O pessoal em trabalho teve que recorrer, abruptamente, ao “meu oxigénio”, dai uma movimentação brusca da minha cama, em troca com a do doente grave. Assustei-me, a minha pulsação disparou em flecha. Passei a hipertenso. Naqueles dois dias, a minha tensão chegou a 184 de sistólica e 114 de diastólica! Por pouco não desenvolvi uma AVC ou mesmo um ataque cardíaco. Só Deus é quem sabe. E por falar em ajuda divida, a família toda e os amigos estavam em vigília. As correntes religiosas multiplicavam-se.

 

No dia 4, finalmente a alta hospitalar. Os médicos tinham uma certeza, “eu era hipertenso”, mas com sinais vitais estáveis, por isso, mesmo nada justificava que eu permanecesse no leito hospitalar e a ocupar um bem precioso: uma cama!

 

E como tinha que continuar a medicação em casa, para um “hipertenso”, o tratamento tinha que contemplar Amilodipina e Amilorido composto. Fiz o tratamento por um dia apenas, pois, a minha tensão voltou aos níveis considerados normais. Em casa, tinha que ficar em isolamento por 10 dias, ou seja, até 14 de Fevereiro. Durante o confinamento, as noites eram de insónia, resultante dos tristes episódios passados no hospital. Tive que passar por um tratamento psicológico (obrigado Psicóloga Adelina) até que o quadro voltasse à normalidade. Durante as sessões terapêuticas, a psicóloga chegou a recomendar que eu evitasse ter o telemóvel ligado e com razão. Algumas pessoas simplesmente teimavam em bombardear-me com notícias funestas ou fake news sobre a morte deste ou daquele. Há quem tem o enorme prazer de comunicar a morte do outro. Algumas chamadas eram mesmo para fazer perguntas ou comentários sobre onde e como terá sido contaminado, enfim…

 

A 15 de Fevereiro passei por novo teste e o resultado positivo chegou-me hoje, seguido do aconselhamento do pessoal da Direcção de Saúde da Cidade de Maputo – DSCM. Contada a minha história, e porque não apresento sintomatologia alguma, a DSCM recomenda que regresse à vida normal. E eu, por zelo e teimosia, estou na dúvida: será que estou livre da COVID-19? Afinal, que protoloco o MISAU segue para considerar um infectado pela COVID-19 livre da doença?

 

Antes de terminar as terríveis memórias passadas no leito hospitalar, quero elogiar o trabalho zeloso e abnegado dos profissionais da saúde. Mesmo com medo de contraírem a doença, os médicos não regateiam esforços para salvar a vida de quem está em apuros. Um aceno especial ao Dr. Stélio Nhavotso, um antigo aluno meu no ensino primário. Em poucos dias retribuiu o que eu lhe transmiti durante três ou quatro anos de convivência. Mesmo atarefado esteve sempre atento ao evoluir da minha situação, com visitas e chamadas constantes.

 

E porque não existe “nariz sem ranho”, há aqueles profissionais com medo até de ajudar aos enfermos, tratando-os com desdém. 

 

A fechar mesmo, não estou aqui para amedrontar quem quer que seja, até porque a teoria do medo em pouco ajuda a “achatar a curva de contaminações por COVID-19.” Acredito que as pessoas só tem medo daquilo que vêem. Neste caso o vírus e invisível. O meu apelo é para que todos possamos assumir uma postura mais responsável na abordagem da doença, ou seja, para alem da adopção das habituais medidas de higienização, sair de casa se for absolutamente necessário, pois, quanto maior for o grau de exposição, maior e o risco de contágio!

 

Obrigado a todos pelas mensagens de conforto e pelas vossas orações. À família, o meu maior suporte, não há palavras para exprimir o que sinto!

 

Adão Matimbe (Jornalista Desportivo da Rádio Moçambique e docente na Escola de Comunicação e Artes, da Universidade Eduardo Mondlane)

terça-feira, 16 fevereiro 2021 10:03

As quimeras do General Mutupi

O país do General Mutupi estava em guerra. Os jovens morriam inocentemente nos campos de batalha. A cada combate, almas jovens eram paridas para o além. Os malfeitores eram seguidores fiéis das seitas satânicas. Durante três anos, o General Mutupi teve que gerir, no seu escritório, várias histórias e sonhos de jovens que tombaram nos campos de batalha. A dor era tanta. O coração e a consciência já não suportavam, pelo que tinha que se fazer alguma coisa. 

 

Usando das suas competências plenas, o General Mutupi decide colocar um plano em curso, uma vez que as causas da guerra não faziam nenhum sentido. Nas fileiras chefiadas pelo General Mutupi, um Coronel havia sido rebaixado e atirado para o avesso. O Coronel estava tão furioso porque algumas crianças estavam a chefiá-lo, mesmo com mais de 40 anos nas fileiras e vários combates e guerras travadas. A situação não estava boa. Informações de que o inimigo era alimentado pela logística das fileiras do General Mutupi corroía, cada vez mais, o manso coração do patriota e defensor da soberania. Algo tinha de ser feito!

 

A guerra tinha outras facetas. A outra parte do exército havia assumido o controlo de tudo no combate contra o alegado inimigo. Os resultados e abates eram anunciados semanalmente, com contradições que faziam manchetes diárias nos jornais, rádios e televisões. As redes sociais vibravam com os comunicados que traziam números e nunca fotografias, vídeos ou mesmo apresentação dos cabecilhas capturados em combate. A fábula e a falsidade eram tantas que acabaram por criar uma doença crónica a General Mutupi. O homem decidiu apresentar a sua demissão, mas o chefe máximo não aceitou.

 

A gestão da guerra demonstrava que o papel do General Mutupi e dos seus pupilos já não faziam sentido. Ensaiou-se um plano conjunto, uma vez que todos estavam no campo de batalha. “Combatemos juntos, mas os outros é que aparecem em tudo. Melhor é que nos retiremos e deixarmos que eles continuem a combater, porque não fazemos falta alguma”, resmungavam os aliados do General Mutupi.

 

Em meio a tanta tensão e raiva, desenhou-se um plano de retirada de todos os elementos dirigidos directamente pelo General Mutupi. (In)felizmente como em qualquer grupo extenso há sempre um Mavura (traidor), eis que o plano chegou a um comissário político que responde por um sector militar e defesa que, sem analisar, rapidamente apresentou o plano a quem o nomeou. A informação não agradou ao chefe! 

 
 
 
terça-feira, 16 fevereiro 2021 06:05

'Sua Excelência Indivíduo-Quê'

Gostaríamos que o SERNIC, de acordo com os seus novos termos de referência, fosse prender a Procuradora-Geral da República, a doutora Bia. Esta senhora tem estado a insultar o Chefe de Estado há 5 anos. Eu até diria que o pior insulto que Filipe Nyusi recebeu na sua vida veio desta senhora. Não só como Presidente da República, mas também como pessoa, nado vivo, cidadão comum. 

 

Prendam a senhora Procuradora! Tem muito abuso esta senhora. Como é que ela ousa chamar o Presidente da República de 'Indivíduo-Quê'?! Como se atreve?! Como é que ela teve tamanho atrevimento de reduzir o nome de uma pessoa de bem numa simples letra do alfabeto?! Quanta petulância!!!

 

Arri!!! Mas você vai mesmo chamar um pessoa de 'Quê'?! Você vai chamar um político eleito esmagadora e retumbantemente Presidente da República de 'Indivíduo'?! Pooossas!!! Aprendeu aonde esse abuso?! 'Indivíduo'?!? Um Presidente?! Não se deve tratar o nosso Presidente da República com essa leviandade. 'Indivíduo-Quê' não devia sequer ser nome de um cachorro vira-lata. Chamar alguém de 'indivíduo' já é muita falta de consideração, quanto mais uma letra do abecedário!

 

Nós 'povos' não vamos tolerar esse abuso! Queremos que o nosso Presidente seja tratado com a máxima dignidade! Não vamos admitir esse tipo de desprezo! Se a senhora é malcriada, que não manifeste aqui. Tenha modos, senhora! Um Presidente da República merece respeito. Devia ser tratado por 'Sua Excelência Indivíduo-Quê'. Com os devidos salamaleques.

 

Prendam a doutora e rectifiquem o relatório da Kroll! Sublinhe-se: 'Sua Excelência Indivíduo-Quê'. Mais formalismos, se faz favor! Mais respeito! 

 

- Co'licença

 

Este espaço é oferecido pela:  

   

No entanto, seu conteúdo não vincula a empresa.

terça-feira, 16 fevereiro 2021 06:03

Pedir ou não ajuda

“A ajuda não é caridade” disse certa vez um ex-Primeiro-Ministro do Canadá  a propósito da ajuda (externa) concedida pelos países desenvolvidos aos menos desenvolvidos. Lembro-me da citação  sempre que ocorrem animosidades nas relações entre Moçambique-Tanzânia e Moçambique-África do Sul e na (provável) hesitação de Moçambique em pedir/receber a ajuda do exterior para combater o terrorismo.

 

Acontece que nas relações entre Moçambique e a Tanzânia e sempre que Moçambique toma uma medida  que não seja do agrado da Tanzânia, como foi a  da expulsão de garimpeiros tanzanianos ilegais, os tanzanianos lembram aos moçambicanos  de que estão a ser ingratos, isto tomando em conta a ajuda dada por eles na libertação de Moçambique. E Moçambique, já independente, e por ter ajudado o ANC,  hoje o partido no poder na África do Sul, na sua luta contra o Apartheid, aviva a memória dos sul-africanos sempre que eles, por exemplo, expulsam moçambicanos sob capa de ilegais. Assim, tanto a Tanzânia (em relação a Moçambique)  como Moçambique (em relação a África do Sul) reclamam benefícios ou privilégios eternos por terem sacrificado os respectivos países no quadro da (suposta) ajuda/solidariedade prestada.

 

Neste diapasão, o acto de pedir/aceitar a ajuda de outros acarreta implicações, e muitas vezes indesejáveis,  que se arrastam por tempo indeterminado. Talvez por isso, e para fechar, este seja um problema/dilema na demora da decisão e/ou efectivação  da ajuda do exterior no combate ao terrorismo em Moçambique.  Aliás, e decorrente da experiência das relações com a Tanzânia e a África do Sul bem como o facto de Moçambique ser um crónico  dependente da ajuda externa,  o alcance de que “A ajuda não é caridade” não é estranha ao país  e é, certamente, do pleno  (e doloroso)  domínio dos decisores da mártir Pérola do Índico.   

 

PS: Ainda sobre pedir ou não  ajuda,  cito um exemplo de um meu amigo. Este, em tempos e perante um problema pessoal bicudo, recusara a pronta ajuda de um seu primo, alegando de que era preferível  explorar ou esperar  por outras soluções, próprias ou de terceiros (e mais discretas), mesmo que isso acarretasse mais e maior sofrimento,  no lugar de ouvir  do tal  primo e pelo resto da sua vida e de gerações vindouras de que ele o ajudara. Estará ao alcance da Pérola do Índico semelhante e ousada decisão?

 

quinta-feira, 11 fevereiro 2021 10:05

Tripas do exame de Biologia

Todos pareciam estar hipnotizados, mas não; era apenas espuma de uma grande onda que invade alguns chefes e direcções do nosso sistema de ensino e administrativo - a desorganização.

 

Era Sábado, 06 de Janeiro, no lendário distrito de Ka-Lhamanculo, na cidade de Maputo; um "insólito" aconteceu em todas as escolas secundárias gerais, onde alunos da 12ª classe foram submetidos aos exames finais do ano passado, 2020. O que estava no tabuleiro do espanto era o exame da disciplina de biologia, marcado a nível nacional para as 10h30; nesse distrito a informação que se distribuía era a de que iniciava às 08h.

 

Naquele belo dia, os alunos chegaram cedo para combater o exame com a espingarda da caneta. Todos estavam ansiosos e motivados. Os alunos não esperavam que seriam bonificados ou trancados nas salas devido ao tempo de realização do exame que em todo país os outros cumpriram 120 minutos; e os alunos de Ka-Lhamanculo tiveram a super-benção de decifrar os ossos do exame de biologia em 240 minutos. Esse foi o drible encontrado para não abalar a incompetência dos dirigentes do sector a nível do distrito. 

 

Os alunos suportaram 04h30 de exames, sem água e nem um lanchinho devido a um erro estranho dos gestores da educação no distrito de Ka-Lhamanculo. Ninguém podia sair da sala para evitar um vulcão de fuga de respostas.  

 

O lapso dos gestores é um acto insólito que poderia ter causado um caos de propensões babilónicas e ressuscitar o velho fantasma que persegue o sector da educação - o vazamento de exames e as respectivas correcções. Trata-se de um negócio já oficial na praça: vender molhos de exames e respostas em canecas.

 

Ninguém percebeu o erro (what?). Nem as estruturas máximas do distrito, assim como as estruturas pedagógicas e administrativas. Nenhum chefe lembrou-se de que a hora oficial para a realização dos exames, a nível nacional, era 10h30 e não 08h.

 

Recuemos para o dia em que o filme da desorganização foi filmado; os alunos chegaram aos seus júris e foram distribuídos os exames e começou o processo de examinar os futuros doutores. Eram 09h quando uma equipa da inspecção foi alertada que no Ka-Lhamanculo, os anciãos de alguns rapazes tinham hipnotizado todos dirigentes e que o exame estava a ser realizado. “Mas como, sim?”, tiraram as línguas para fora os inspectores.  

 

“Quem marcou o exame a esta hora?, será que vocês não receberam o calendário nacional?”, foi a direcção distrital da educação que marcou... E qual é a solução?. Não deixem nenhum aluno sair da sala até às 12h30. Assim evitamos o pior!

Preparar bem as crianças de agora implica, de maneira lógica, em ter uma sociedade melhor no futuro. É pensar o porquê actualmente, diante de grandes índices de violência, tantos menores de idade estão nessas estatísticas. É pensar que essa criança, esperança do futuro, vê-se numa encruzilhada vital tão cedo: trabalha forçado, atravessa frequentemente a rua ou morre.

 

Segundo dados da OTI, Moçambique tem mais de 780 mil crianças trabalhando com idade entre 08 e 17 anos. Segundo esses dados, 56,63% nada recebem por seu trabalho. Eis o roubo do direito de ser criança.

 

Retiram-lhe, de maneira violenta, esse direito tão essencial comprometendo os factores biológicos, psicológicos, intelectuais e morais, numa fase de extrema importância da vida. Ao invés de carrinhos, bonecas, brinquedos. Pais, que talvez quisessem educar, precisam ensinar o trabalho. Note bem a diferença entre educar e ensinar. Falta dinheiro para comprar comida, roupa, bonecas, carrinhos. Alguns, talvez munidos de sua educação mais privilegiada, hão de pensar que não configura motivo para a delinquência o facto de trabalhar desde cedo, afinal o trabalho é dignificante. O trabalho é digno quando é exercido de forma digna. Não existe dignidade sem educação de qualidade e, não há dignidade em crianças de 10 anos trabalhando em meios insalubres, perigosos, em jornadas diárias superiores a 12 horas. Não há filhos de médicos, advogados, empresários trabalhando assim. Portanto, se fosse digno, todos desde a infância assim trabalhariam.

 

O que se vive nos mercados das cidades moçambicanas, em destaque para o Mercado Grossista do Waresta e Mercado Central, ambos na Cidade de Nampula, é de tirar lagrimas. As crianças são submetidas ao extremo da sua capacidade, elas madrugam nos mercados para vender sacos plásticos e carregar produtos dos clientes em troca de 5,00MT. Ai Meu Deus! Quando vai parar isso!

 

Crianças devem ser crianças. Esse tipo de trabalho não pode nem deve ser alternativa aos menores de idade porque marginaliza, tira deles um direito essencial de maneira tão violenta quanto àqueles que com uma faca roubam dez meticais. Por isso, lutemos todos por uma sociedade onde a criança e os seus direitos são amplamente respeitas, uma sociedade justa, de compaixão, amor ao próximo, respeito mutuo e igualdade social. Cuidem-nos como crianças do presente e adultos do futuro.

 

Legalmente as crianças hoje têm garantido o direito a um nome e nacionalidade, à saúde e à educação. Dentre os direitos da criança estabelecidos na nas leis e normas, destaco o brincar como uma necessidade da criança, um jeito gostoso de aprender e se divertir.

 

Pesquisas têm revelado que as brincadeiras ao ar livre, em parques e praças públicas deixam as crianças mais felizes. No entanto, as crianças estão cada vez mais distantes do sol, da grama, das pedras, da areia, da água, da natureza...

 

Para os pais, já não é mais possível deixá-las brincando na rua com os vizinhos. O trânsito e a tecnologia tiraram esta oportunidade. Em alguns quintais não se preveu a necessidade e o direito dos pequenos de brincar. Diante desta necessidade, eles brincam só confinados numa sala da casa, com tecnologias e nada de brinquedos essenciais e amigos de verdade, não virtuais.

 

Nas escolas infantis encontramos pátios cimentados, brinquedos inadequados à faixa etária das crianças e, logo, embargados pelos órgãos competentes. Pensem numa creche em que as crianças “olham” para o escorregador, o balanço, o gira-gira e não podem brincar. Elas existem. Pensem no período escolar de uma criança de cinco, seis, sete anos de idade, onde não há nem espaço (área verde), tempo para brincar. Eles existem.

 

Nos espaços públicos encontramos praças abandonadas, sujas, brinquedos quebrados. Imaginem uma praça, um domingo de sol, crianças ávidas para correr, pular, dançar, movimentar-se ou simplesmente olhar as plantinhas, passarinhos, sentir o vento... As crianças “olham” para os destroços do que um dia foi um brinquedo, desistem de brincar ou então arriscam-se. Elas existem. Falta segurança, água potável, banheiros públicos, dignidade para exercer o direito de brincar.

 

As crianças são o que existe de mais precioso e precisam da atenção dos mais velhos para viver dignamente esta fase da vida que chamam de infância. Como estão olhando para nós crianças nos demais dias do ano? Infelizmente, os nossos pais, professores, governantes etc. - não estão conseguindo prover à nós criança o direito de brincar e ser feliz.

 

Zinaida João Faque, aluna da 10a Classe na Escola Secundaria de Napipine em Nampula, activista social, membro do Parlamento Infantil da cidade de Nampula, pesquisadora social nas áreas dos direitos e deveres das crianças. Nascida aos 11 de Dezembro de 2005, na cidade de Nampula.