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BCI
quinta-feira, 05 setembro 2024 11:09

Carta para alguns músicos do meu país…

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Eu sei que vocês andam ocupados em gravar músicas para os vossos candidatos. Sei que fazem isso em nome dessa coisa estranha que se chama cidadania. Eu sei. Também sei que cada um escolhe o seu caminho. Eu sei de tudo isso.

 

Meus queridos músicos, eu não sei se isso de cantar “vivas, vivas” de boca aberta, à espera de um naco de pão, é mesmo essa coisa estranha chamada cidadania. Eu não sei se vale a pena fazer do estúdio um pequeno santuário para recolher míseros dízimos políticos e nem sei se a vossa língua, depois de tanto ser usada, ainda reconhecerá o sabor delicioso de uma fatia de um bolo que se chama honra.

 

A lista é longa de músicos que caíram num lodaçal de nada mesmo depois de terem usado a língua como tapete para diversos candidatos. Quantos músicos morreram de malária nos corredores do hospital central sem uma moeda para comprar uma rede que lhes pescasse a vida, quantos músicos morrem em silêncio e depois transformam os seus fãs em pais para custear uns metros de uma cova no cemitério? Os queridos candidatos, nessa altura, enviam comunicados de pesar e nada mais.

 

Vocês são os responsáveis pela vossa pobreza, vocês perpetuam a fome, a miséria e a desgraça... Não é por acaso que, hoje, a associação dos músicos virou um bar, não é por acaso que hoje vocês dependem de feriados para ter espectáculos e concertos. Não é por acaso que transformam a música, em períodos eleitorais, em um pequeno corredor que dá acesso à copa na qual ficam toalhas de mesa cheias de restos…

 

E amanhã, quando a campanha terminar, correrão atrás de banhos-marias dos nossos casamentos e aniversários, trocarão as ordens dos coordenadores da campanha pelas ordens feitas pelo dedo indicador dos padrinhos nos noivados e cantarão “vivas” de amor a casais que não conhecem: isso só para terem algumas moedinhas. E assim vão vivendo, meus queridos músicos.

 

E, amanhã, quando um manto de febre cobrir-vos o corpo, correrão para o povo mendigar moedinhas para comprar uma cápsula de paracetamol. Eu sei que amanhã aparecerão nas telas a dizer que esse país não considera os músicos e vão chamar nomes a empresários sem, no mínimo, mencionar os vossos queridos candidatos.

 

Em outros países, tão pobres como o nosso, quando chega o período eleitoral, os músicos vigiam as ideias dos candidatos sobre as suas ideias culturais, os músicos não ficam em estudos gravando louvores políticos, eles apertam os candidatos em debates e correm, à estalada, os candidatos que se esquecem que os músicos também são profissionais como os médicos, engenheiros e advogados.

 

Queridos músicos, desejo-vos uma boa campanha eleitoral. E espero, que amanhã, usem as vossas músicas para, também, cantarem as promessas que não serão cumpridas pelos vossos candidatos.

Sir Motors

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