Director: Marcelo Mosse

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Actualizado de Segunda a Sexta

Hamilton Sarto Serra de Carvalho

Hamilton Sarto Serra de Carvalho

“Carta Aberta”

I. As últimas de 2024 (em Portugal de Marcelo Rebelo de Sousa) mostram, através das legislativas, um cenário político cada vez mais assustador e perigoso. Disputadas por AD (PPD/PSD-CDS-PP-PPM); IL, BE, PS, PSD, etc., a questão que aqui se põe, a de saber se a democracia constitucional portuguesa – ao nível da qualidade da democracia internacional como exemplo do que é civilização democrática, do que é democracia constitucional, do que é rotativismo democrático (alternância democrática), do que é partilha de poder (democracia pluripartidária) – permanece firme sobre os alicerces do 25 de Abril ou se se trata de um ‘retrocesso democrático civilizacional’ parece-nos inevitável. Vozes há, mais ou menos otimistas e outras nem tanto! As otimistas, falam da existência da chegada da “tripolarização do poder” (AD-PS-CHEGA) – apesar de, em nossa opinião, não a reconhecermos como tal pela natureza belicista do Partido liderado por André Ventura na medida em que ao nível conjuntural e estrutural implica que haja consensos que nem sempre podem facilitar o processo de governabilidade à AD. Ou seja: um acordo com o CHEGA, não nos parece (em ciências políticas) aceitável; uma aliança com a extrema-direita de Ventura seria claramente um pacto com o ‘Diabo’; mancharia a própria AD e o histórico doloroso sobre a conquista da democracia portuguesa. Não é por acaso que Marcelo e Montenegro se “distanciam” de um eventual acordo político com o CHEGA.

 

II. Aliás, lembremos nas palavras de Marcelo o seguinte: (i) “(…) é importante, numa democracia que celebra 50 anos que não acompanhemos a evolução de democracias mais antigas e mais velhas que é o de aumento da abstenção em eleições que são todas elas muito importantes”; (ii) “os portugueses vão votar e, naturalmente, ponderarão aquilo que é o significado do seu voto e os portugueses têm demonstrado desde o 25 de Abril uma maturidade e uma sabedoria antecipando em muitos casos aquilo que muitas vezes só se percebe no futuro…” (Marcelo R. de Sousa, 10 de Março para o 1º Jornal da SIC notícias). Discurso realista de Marcelo, mas vejamos até onde vai o “realismo” de Marcelo na prática democrática. Primeiro ponto, Marcelo, ao jogar a democracia para as mãos do Povo, força os eleitores, quase todos, a terem de decidir tudo nas últimas 24 horas… isto é, na boca das urnas sendo resultado disso muitos dos votos, inconscientes. As sondagens de muitos meios de comunicação social, da Universidade Católica portuguesa – politizadas (ou não) para influenciar as decisões dos eleitores flutuantes – apontavam para este cenário de incerteza político-eleitoral sobre em quem votar. O grande pretexto usado foi o de que não pode ser primeiro-ministro quem não foi a votos. Ora, a pergunta aqui é: se o “voto de Marcelo” vale tanto quanto à indispensável e necessária estabilidade parlamentar… talvez seja hora de rever a Constituição para permitir que, reconhecendo a legalidade da dissolução parlamentar, situação superveniente possa ser decidida por meio de um referendo e não apenas por uma decisão presidencial (presidencialismo pós-dissolução?). E, olhem que mau Professor Catedrático… sempre atrasado… vem dizer sobre a importância do 25 de Abril nas vésperas das eleições, sobre os cuidados a ter com a implantação de uma “sociedade de radicais”, tudo isso para disfarçar ainda mais os seus intentos palacianos… numa altura em que já tinha “permitido” que o fascismo e o nazismo se instalassem na democracia portuguesa pluralista de Luís Vaz de Camões.

III. De facto, nunca, nunca na história democrática portuguesa a direita-centrista se aliou com um partido da extrema-direita radical. Nisso tudo, vemos Marcelo! Para nós, o grande autor da “tripolarização do poder” em Portugal, numa cadeira de rodas, de mãos-atadas modo “António Guterres perante as nações em guerra.” Não tenhamos ilusões, Marcelo “lança” a extrema-direita radical e o cenário de ingovernabilidade e austeridade na democracia portuguesa com pretexto na eleição e na inadmissibilidade de um cenário que integrasse um ‘primeiro-ministro interino’ de acordo com a democracia direita (Referendum); uma solução de estabilidade política, económica, social e cultural assente numa maioria relativa como a que foi encontrada e rapidamente dissolvida. Evidentemente, a conjuntura internacional, os conflitos armados internacionais (Rússia vs. Ucrânia; Israel-Hamas, etc) dariam um grande empurrãozinho ao populismo do CHEGA e óbvio que MARCELO sabia disso… Marcelo, suficientemente estudado nestas matérias, agiu com “intenção” dolosa; a intenção de aniquilar “parcialmente” a dimensão cultural – exigência da Carta das Nações Unidas, da Declaração Universal sobre os Direitos do Homem e do Tratado internacional que regula as questões sociais; a intenção de facilitar a ascensão da extrema-direita em Portugal e com isso tornar-se o autor da “tripolarização do poder” em Portugal, pelo menos de uma falsa ideia de “tripolarização do poder”. Como se há de calcular: é impossível negociar com radicais, narcisistas, machistas, mentecaptos, sectários e oportunistas que em nome dos seus interesses individuais e de um Portugal com um espírito ainda muito colonial (pelo número de idosos que tem, que viveram a época colonial e que não abandonam as ideias coloniais) vêm os seus ódios e sentimentos de vingança (íntimos e camuflados), resplandecer. É, pois, com hipocrisia que julgam o socialismo liberal sendo que também elas vivem dela… a história política tem vindo a provar que pela natureza humana e das leis os ciclos se repetem se não formos vigilantes…

 

IV. Uma “tripolarização do poder” como a que se pretende a todo o custo não vai a bem da democracia, da democratização da sociedade. Antes! A bom senso, vemos a bipolarização do poder continuar na prática democrática. Do mesmo modo que uma mulher adulta finge orgasmos para agradar quem ama, a ilusão da “tripolarização do poder” não deixa de ser importante aos olhos da comunidade internacional. É sempre importante manter o casamento aos olhos dos povos, mesmo que ambos (os cônjuges) saibam que não existe mais comunhão plena (…). Os media, uma vez mais, são os que mais sabem dar de comer aos ignorantes esses venenos promovendo essas falsas ideias. Um veneno que nos vai matando aos bocados… Não é o Ventura o principal autor da “tripolarização do poder”, é o “São MARCELO” – o troca tintas, o que se veste de “Bom Samaritano.” As “asneiras” e as “infantilidades” de Marcelo parecem infindáveis, nem SANTOS SILVA conseguiu escapar a rasteira dada por Marcelo… primeiro, estão os seus interesses individuais e políticos. Legitima a geringonça; depois, promove uma maioria parlamentar que certamente sabia que tarde ou cedo havia de resvalar para a ditadura da maioria… inflama o ego do Governo, com isso faz reacender nas massas o descontentamento mais ou menos generalizado; a bomba atómica é instalada e acionada por via da PGR, a tática mais perfeita! Onde há um campo colonial aberto, tudo flui naturalmente. Claro que a conjuntura internacional, dissemos, dão aqui um grande empurrão. Ninguém desconfia da “Justiça” – são sempre os homens de Deus (Roma locuta causa finita). Portanto, temos na Constituição formal portuguesa um sistema constitucional semi-presidencialista, mas que na prática MARCELO continua o Rei soberano, o grande mostro – o leviatã hobbesiano, o príncipe maquiavélico que emana o Estado sob as vestimentas mais sagradas do Estado – o respeito pelo Estado de Direito democrático e de Justiça social; um Estado de Direito que afasta o sistema presidencialista. Marcelo, sem fazer parecer, funciona como um verdadeiro camaleão. Tanto arrota santidade perante o grande público como destila o seu veneno em trajes do Rei João sem Terra, o tirano que forçou a imposição da Magna Carta em 1215. Assume a figura do Sto. Padre, o Francisco, e (ao mesmo tempo) o de Imperador-tirânico como se de uma monarquia ditatorial se tratasse.

 

VI. O “caso Galamba” foi o auge; a não exoneração de Galamba inflamou o ego de MARCELO, o menino mimado que não pode ser contrariado e/ou desafiado. Afinal ele é o grande Monarca. Custou a Costa (e seu Governo constitucional) – que tentou cumprir com excelso zelo e inegável diligência política as regras estabelecidas pelo Estado de Direito os seus direitos políticos constitucionais – uma demissão seguida de dissolução parlamentar que nos parece até hoje fruto dos violentos coices de MARCELO – um golpe de Estado palaciano bem estudado… Apesar disso, a estratégia de Marcelo terminou mal, isto é, para além de só conseguir criar uma mera “geringonça” (AL) na fase pré-eleitoral, o maior efeito dominó foi a má fama da existência de uma extrema-direita radical na democracia portuguesa e na democracia da União europeia (UE). Sobre a extrema-direita radical, dissemos, tendo em conta a formação académica de Marcelo, custa-nos muito a acreditar que tenha sido um “acto político” intencional… Como reza a religião de Marcelo, em Provérbios: “quem provoca o Rei, arrisca a vida.” Um duro golpe que certamente Costa (seu Governo) e a esquerda liberal ressentir-se-ão para sempre. Zezinho, o Sacerdote da Congregação Jesuíta, figura incontornável na doutrina e literatura cristã-católica, na sua Música Nênia chora. Chora perante a sepultura da democracia pluralista, (…) pela falta de inclusão e nós, seres sensíveis, choramos com ele por amor ao próximo: “tem piedade de nós Senhor, tem piedade do teu Povo; confiamos e mentiram para nós; É teu povo que não sabe mais o que esperar; Já não sabe mais em quem votar; Trapaceado e explorado e sem ninguém; Confiou e foi traído lá nas urnas; Manda-nos profetas; Manda gente honesta; Manda novos líderes, Senhor; Estes de agora não nos amam...” estamos certamente diante de um novo murro das lamentações made in MARCELO REBELO DE SOUSA.

 

VII. Espero que lhe sobre um grande peso de consciência. É com profundo desgosto que começo a acreditar que fomos iludidos. Pensávamos que apreciávamos o nosso Mestre-Catedrático por nos falar no espírito quando afinal só nos falava na letra. Mas as ciências já nos tinham advertido que um bom professor catedrático nunca se mete na política. O discurso inicial, o de nem a esquerda, nem o centro e nem a direita, mas o Povo no seu todo cego a pureza da nossa alma. No fim, revelou-se um grande promotor e defensor oficioso do seu Partido; depois de ter conseguido a estabilidade económica por conta das excelentes habilidades políticas de negociação com Bruxelas por parte de quem acaba de governar, Marcelo sacode o capote sem mestria nem elegância; sacode o Governo de Costa sem piedade, sob a deixa de um processo-crime para cima da democracia socialista. Ainda bem que continuamos democracia! A democracia de Abril, a dos nossos egrégios avós, não morre com a “ditadura” de Marcelo e Ventura. A dignidade da pessoa humana, muito apregoada e defendida (ao nível do direito internacional, regional/comunitário e estadual) não se defende só em papéis, vive-se; não se defende só para certos grupos, para ou entre iguais; defende-se a dignidade de e para todos, na medida e proporção da sua diferença, pelo simples facto de serem pessoas humanas. Não se defende só a disciplina, mas também o Amor. Viva Abril.

 

PhD in Law - Lisboa; Professor Auxiliar & Investigador da Universidade Católica de Moçambique. Antigo Director-Adjunto Pedagógico da Faculdade de Direito da Católica (UCM). Colunista do Jornal Impresso Canal de Moçambique (2012- ao presente).

segunda-feira, 18 março 2024 10:30

QUEBRANDO O SILÊNCIO (2)

O “Muro de Berlim” na liderança da RENAMO

 

I. A instalação do “muro de Berlim” na liderança da RENAMO marca o processo de democratização dentro do partido depois da morte do seu líder, Afonso Dhlakama. Na guisa da história político-constitucional da formação dos partidos políticos em Moçambique, a democracia constitucional moçambicana faz saber que tivemos – seguindo-se o Acordo Geral de Paz assinado em Roma (1992) e com a inauguração da democracia pluripartidária no contexto político – várias formações. A Guerra fratricida entre a Renamo e a Frelimo colocou a Renamo como promotora da democracia pluripartidária e, obviamente, em última análise como a mãe da democracia pluralista em Moçambique. Seria muita ingratidão do nosso lado (e do lado do Partido Renamo) negar hoje o indispensável contributo do General Ossufo Momade. (In)felizmente, acaba de conhecer um forte opositor que se intitula o mentor do processo de democratização do partido!

 

II. Venâncio Mondlane, o mais jovem deputado da AR pela Renamo – o queixoso de um processo eleitoral (“fraudulento” ou não) das últimas autárquicas em que o envolvia, o queixoso da justiça eleitoral moçambicana –, tem vindo a afirmar-se como um forte opositor à Ossufo Momade nos últimos tempos. Apesar de reunir os requisitos de elegibilidade que da lei constitucional se impõe, julgamos em nossa opinião que não deveria candidatar-se a Presidente da República, pelo menos para estas eleições de Outubro próximo. Em Ciências políticas, e em países onde a democracia se encontra mais ou menos consolidada, uma derrota eleitoral tem um significado; significa uma derrota política e uma derrota política deve merecer de quem a recebe um momento de “pausa política” para reflexão (nas academias chamamos a isso de ‘O ano Sabático’ no bom sentido). Essa “relutância” em forçar as coisas a ‘oito e oitenta’, a ‘tudo ou nada’ pode custar caro a este pequeno grande líder político e a Renamo em outubro próximo. Venâncio, apesar de estarmos juridicamente alinhado com ele – e nos parece: os tribunais, também – em matéria do cumprimento escrupuloso dos ‘Estatutos do Partido’, não pode se esquecer que é um político que exerce a política profissionalmente. Se ama a Renamo como quem ama a sua própria família devia saber que assuntos internos são para ser resolvidos ao nível do Partido, entre os seus… não pode expor politicamente o Partido dessa forma em nome do que os nossos egrégios avós considerariam por heroísmo e/ou patriotismo e os mais novos por ‘cidadania’. Essa deixa, serve também para Ossufo dirigindo-se a comunicação social sobre…

 

III. Dentro de um Partido político existe a chamada disciplina partidária. Quer queiramos ou não, temos de respeitá-la. Ela existe, justamente para ajudar os partidos a resolverem internamente os seus dilemas. Auguro momentos de paz e amor dentro do Partido. Queremos Partidos fortes. Uma concorrência democrática justa entre Partidos e candidatos. Vamos lá manter a calma e encontrar os melhores candidatos com menos manchas políticas. Eles existem. A Renamo de Dhlakama já sofreu muito, já teve um grande líder que sofreu muito com guerras externas, a sua memória não merece essas guerras internas! As imagens políticas de Ossufo vs. Venâncio andam muito desgastadas, muito beliscadas. O primeiro, porque – para além das sucessivas derrotas eleitorais enquanto presidente e candidato pelo partido – se tornou cego pelo poder antes mesmo de se tornar Presidente da República; o segundo, porque – para além da derrota eleitoral – tem pressa em se tornar Presidente do Partido e da República e, como sabemos, “a pressa é sempre inimiga da perfeição”. Mais: se no passado recente queixou-se das instituições de justiça com que confiança volta a queixar de Ossufo nas mesmas instituições de justiça da Frelimo? Para dar a conhecer a desordem e legitimar a Guerra no Partido??? Para isso é que tem servido a nossa “Justiça”, muito politizada. Parece-nos insensato. A estratégia em política é muito importante! Infelizmente, são os políticos que temos (os que saltam de galho em galho) e a comunicação social que se arma em esperta, deixa-se enganar pela Frelimo e dá cobertura ao espetáculo. Um oportunista, não tem ideologia que o limita. Já nos parece o Chega de André (A)ventura guiada por um bando de ignorantes e aventureiros. Talvez seja hora de a Renamo pensar em Elias Dhlakama – a quem felicito pela brilhante entrevista concedida recentemente ao nosso Jornal, o Semanário Canal de Moçambique – ou “ressuscitar” o líder do PDD, Raúl Domingos numa espécie de Renamo coligada moda ‘RENAMO União Eleitoral’ (Gerais, de 1999).

 

PhD in Law - Lisboa; Professor Auxiliar & Investigador da Universidade Católica de Moçambique. Antigo Director-Adjunto Pedagógico da Faculdade de Direito da Católica (UCM). Colunista do Jornal Impresso Canal de Moçambique (2012- ao presente).

sexta-feira, 08 março 2024 15:48

QUEBRANDO O SILÊNCIO (1)