Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

ME Mabunda

ME Mabunda

terça-feira, 30 novembro 2021 16:33

Soberania vs. observância da lei

A semana passada teve o condão de os moçambicanos e o mundo em geral verem uma ilustre personalidade sentada no banco dos réus… ainda que não como réu propriamente, mas como declarante - o que, aos olhos do zé-povinho, é igual! De facto, em termos semânticos, a diferença é igual: em ambas as circunstâncias, trata-se de julgamento; tanto aquele que se senta no banco como réu, como o que se senta como declarante, ambos são impiedosamente interrogados pelo mesmo juiz na busca do esclarecimento da verdade material sobre determinada ilegalidade.

Assim, podemos murmurar que vimos, sim, um gigante sentado no banco dos réus!

 

Recuando no tempo, temos é memória de Sebastião Mabote e Manuel Antônio sentarem no banco dos réus, acusados de tentativa de golpe de estado; Almerino Manhenje, acusado de uso à margem das leis dos fundos do erário público; mais adiante, recentemente, tivemos o ex-ministro Paulo Zucula. Esperamos proximamente ver… a ex-ministra do Trabalho. É pouca coisa para 46 anos de independência de uma nação. Muito insignificante para tamanhos desmandos, violações, barbaridades, ilegalidades, desacatos, actos de corrupção, e outros nomes que tais. Se efectivamente fôssemos por um estado em que governa a lei e quem age à sua margem é rigorosamente responsabilizado, muitas ilustres personalidades já teriam passado pelo banco dos réus, seja como réus de facto, mas também como declarantes ou testemunhas.

 

Mas tudo bem. Esta semana, tivemos o ilustre ex-governador do nosso banco central. De todo o seu exercício de passear a sua classe, eloquência, magistralidade, academice, solenidade - tudo temperado com aquele seu adocicado sotaque bitonga -, ficou que o Banco de Moçambique autorizou as dívidas odiosas em nome da soberania, em nome de garantir a sobrevivência do estado moçambicano. Este é o entendimento geral das declarações do ex-boss da autoridade financeira suprema, largamente reflectida, ou vertida (segundo os juristas), em muitas páginas de jornais.

 

Colocação problemática esta que o juiz não deixou passar. Retorquiu ele que "então para vocês  a soberania precede a lei?” (citação de memória), ao que o nobre declarante redarguiu que “estava em causa a existência, segurança e sobrevivência do estado; não queríamos estar numa situação de não aprovar as garantias e acordarmos amanhã sem o estado moçambicano…" (também citação de memória).

 

Viajemos juntos com o Gove, afinal ele não nos está a viajar? Então a lei moçambicana, qualquer que seja ela, área, sector ou natureza, não tem em conta a soberania nacional? É concebível, racional, que uma lei moçambicana, ainda que seja sobre o aborto, por exemplo, nao tenha como mote a salvaguarda dos interesses do nosso estado, a nossa soberania? Particularmente, as nossas leis financeiras não destacam a questão da soberania? Não visam preservar e defender a soberania do nosso estado? Uma coisa serão as nossas leis financeiras e outra serão as outras leis que visariam preservar a soberania e a existência do estado? É isso?  Há essa destrinça? De que falamos, afinal, quando sempre evocamos interesse nacional? As nossas leis não são pelo interesse e instituto nacionais?

 

Se é isso, então cabe entender que o proponente das tais leis financeiras não é moçambicano, muito menos patriota; ou que o legislador que delas se apropriou e emanou não é moçambicano! Será racional entender que o Banco de Moçambique possa propor uma lei que não tenha em mente a soberania nacional? O interesse nacional? Que a Assembleia da República emane uma lei que não salvaguarde a soberania nacional? Que o chefe de estado promulgue uma lei que não salvaguarde a soberania nacional? É isto que Ernesto Gove quis que enxerguemos? 

 

Mas mais, soberania, afinal, o que é? Não é tudo o que é nossa pertença, incluindo as leis que regram sobre o nosso estado? Então, que lei financeira é essa que não previu questões inerentes à defesa da nossa soberania?

 

Depois, quem é que proclama que a soberania do estado está em perigo? Quem e aonde? Estando em perigo, como gritam os réus - e Ernesto Gove também fez coro -, a soberania do estado, não é o chefe desse estado que, em fórum próprio, alerta, proclama e indica as medidas que devem ser tomadas e por quem para se fazer face a esse perigo de estado? É alguém andar de gabinete em gabinete com papéis na mão a recolher assinaturas, coagindo, ameaçando e intimidando?

 

Mas esta já não é responsabilidade apenas do Gove, é do chefe do governo! Este devia, depois de se aperceber, informar-se devidamente e recolher e consolidar as ideias sobre uma eventual ameaça à soberania do estado, convocar os órgãos próprios, incluindo o governo do Banco de Moçambique, e lhes instruir sobre o que devem ou não devem fazer, as medidas a tomar para salvaguardar a soberania.

 

Isto é que devia ser. Mas, entendemos, Gove quis safar a sua pele! Vamos ouvir o que a bateria de ministros que vem aí vai dizer-nos. Esperamos que não nos façam de matrecos, como o ex-governador nos fez!

terça-feira, 16 novembro 2021 08:36

O difícil caminho para a nossa realização

 

Uma das variáveis de desenvolvimento de uma sociedade é o grau de incerteza no seu dia-a-dia por parte dos seus membros. A possibilidade de de repente acontecer alguma coisa desagradável e desastrosa que ponha em causa a sua existência, da sociedade ou deite a perder todo um projecto social, ou os seus valores e percurso. Quanto maiores ou muitas forem as incertezas no dia-a-dia, menos desenvolvida será essa sociedade; menor será a estabilidade emocional, social e económica. Olhe-se para as sociedades desenvolvidas. Não há nenhum investimento, individual, colectivo, institucional ou social,  sem o controlo desta variável. Ninguém investe sem ter a certeza de que se não vai ganhar o dinheiro que projecta, pelo menos não vai perder o seu capital inicial, de investimento; isso seria o que os outros chamam de haraquiri!

 

As sociedades primitivas eram cheias de muitas incertezas, não tinham os instrumentos e mecanismos de que nos servimos hoje para reduzirmos as incertezas: o conhecimento científico, a ciência e a racionalidade! Instrumentos que nos permitem aferir o grau de risco de qualquer empreitada que pretendermos desencadear. Dependiam grandemente da natureza, pouco sabiam dos estudos de viabilidade, dos cálculos de risco, das previsões meteorológicas, se vai chover ou fazer muito calor, se haverá seca prolongada ou precipitação normal, ciclones ou vendavais e quais os efeitos disto ou daquilo.

 

Hoje, as sociedades desenvolvidas são aquelas em que o grau de incerteza é muito menor; o risco é calculado, é especulado. Nas sociedades desenvolvidas, quando os indivíduos se dirigem a instituições do estado, mas não só, sabem muitas vezes que tratamento vão encontrar. Quando chega o fim do mês, sabem quais as facturas e mais ou menos as despesas que têm que pagar (entre nós, nunca se tem a certeza do valor da factura de água, ainda que seja aproximada; tanto pode vir 100 como mil meticais). Quando saem à rua, sabem, mais ou menos, o que vão encontrar, tipo não serem assaltados de qualquer maneira, chatices desnecessárias do agente de trânsito, estradas partidas que podem danificar o carro, POS e ATM que não funcionam, lojas onde só se paga a cash, etc., etc. Portanto, incertezas atrás de incertezas!

 

O nobre dia da “Cidade das Acácias”, 10 de Novembro, coincide com a data de aniversário da minha esposa. Feliz coincidência, porque, assim, temos o feriado para todo o tipo de actividade que possamos ter programado. E de facto tínhamos programado o almojantar da ordem. Uma combinação de almoço e jantar: está fora da hora do almoço, mas também ainda antes da hora do jantar.

 

Lá fomos nós a um grande restaurante! Grande. O Casino Polana. Em plena Marginal, nas imediações da novíssima embaixada americana. E em pleno século XXI! Tudo correu às mil maravilhas… menos a sessão de encerramento. Lá veio a conta, conferimos, batia certo e lá pedimos a tal POS. Com uma voz trêmula, menos convicta, o servente que nos atendera muito bem e sempre com voz carinhosa, diz-nos que “POS não está a funcionar…” - e, cabisbaixo, acrescenta que “... aqui na porta de saída tem uma ATM em que podem ir levantar o valor…”

 

Não lhe escondi que não tinha percebido, tamanha era a surpresa que a informação que me estava a ser dada causara. Repetiu, visivelmente embaraçado. Também ficamos bastante embaraçados. Um dia especial estava a ser beliscado… mas para não estragar tudo, lá me levantei, bastante contrariado, para a tal ATM, para ir pegar o taco. As tais incertezas! Você nunca sabe o que lhe pode acontecer. Mas nem era tudo!

 

Outra surpresa das surpresas desagradáveis, num ápice o cartão é engolido! A máquina nem sequer deu chance para digitar o código!… Imagine-se como se fica nestas condições. Uma tarde que estava a correr lindamente, romântica, estava a terminar desagradavelmente. Algo completamente imprevista. E assim ficou marcada aquela data querida.

 

A pergunta é: como pode um restaurante de luxo, em plena Marginal, a zona A, não ter em certo momento uma POS a funcionar e, para piorar, a ATM? Quer dizer, os muitos cartões com que andamos não chegam para estarmos à vontade, temos que andar com dinheiros e dinheiros nos bolsos com todos os riscos: a tal incerteza!

 

É isto que é a nossa sociedade: cheia de surpresas acima de surpresas no dia-a-dia. Prenhe de incertezas. Você nunca sabe o que lhe pode acontecer ao sair à rua. Como podemos desenvolver o país assim? Como podemos investir nestas condições? Para investirmos, precisamos de economizar e para economizar, precisamos de ter certeza das despesas do mês. Ou seja, de certeza e não de incerteza. Se você nunca sabe o que vai pagar ou não ao fim do mês, como vai calcular o que pode ou não investir? As estradas estão sempre a partir o carro; a factura de água está sempre a variar; você pode ser assaltado, ou raptado a qualquer momento… as POS e ATM embelezam a cidade, no momento certo, dão dores de cabeça…

 

Vamos em frente, irmãos… isto não será o Governo a resolver!

terça-feira, 02 novembro 2021 09:39

Afinal, onde é que nós estamos a investir?

Graças a um grande amigo e a um amigo do meu filho, este fim de semana tive o grande prazer de ir viver um Chibuto que, apesar das minhas mais de cinco décadas de existência, ainda não tinha vivido, melhor, curtido, como sói dizer-se. Eu que sou chibutense de gema, natural de Malehice e criado em Chipadja!

 

Pode ser por azar meu que ao longo destes tempos todos não tenha tido oportunidade de curtir a minha cidade natal. Pode ser. Mas não foram poucas as vezes que estive por lá, são incontáveis na verdade. Mas agora, o Chibuto que me foi dado ver pareceu-me um pouco mais agitado; se calhar também porque o Chefe de Estado abriu um pouco para os convívios sociais depois de cerca de dois anos de contenção e a tendência é de… recuperar o tempo perdido.

 

O meu amigo convidou-me para um casamento da sua sobrinha; enquanto o amigo do meu filho convidou-me para cortar bolo com o pai dele que, como eu, completara anos há dias desse Outubro que já se foi. Lá nós fizemos nós à nossa lamentável N1 - sobre a nossa "auto-estrada", já escrevi alguma coisa que tarda em ser tida em consideração. Entre outras coisas, queixava-me de ao longo da via não haver chapas que ajudem a saber onde se está e quanta distância mais falta para certos pontos. Para meu azar, até a chapa que indicava que se está a entrar para a província de Gaza, ido de Maputo, ali em Incoluane, já não está mais lá… só andar, não sabes se ainda estás numa província ou já estás noutra!

 

Mas voltemos ao nosso Chibuto. Cerca de 10 horas daquele sábado, lá estávamos nós nas ruas de Chibuto. Tanta agitação nas artérias como aquela, só se via quando o Moçambola escalava aquelas “lides”, quando o saudoso Clube do Chibuto recebesse o seu adversário! O dia em que houvesse jogo em Chibuto eram enchentes de toda a ordem, toda a gente da província e das vizinhas ia lá parar. Como dirigente desportivo, desloquei-me várias vezes para acompanhar os jogos do nosso Campeonato Nacional.

 

Naquela manhã de sábado, era um pouco a mesma coisa. Caravanas para aqui e para acolá pelas parcas ruas e ruelas de Chibuto, buzinadelas, sessões de fotografias aqui e acolá. A entrada do Registo Civil, bem como as ruas adjacentes estavam bem apinhadas de senhoras em vestidos de casamento e de gente de fato e gravata. Nem havia distanciamento social ali!...

 

Tratava-se de casamentos. Tanto quanto nos foi feito saber, havia pelo menos três casamentos, a um dos quais eu era convidado. Decorreu a cerimónia do registo civil e, depois de umas voltitas pela urbe, fomos desaguar no… Desheng Comercial (Golden Peacock Resort Hotel)! Um imponente hotel que os chineses construíram na então pacata cidade de Chibuto e que faz dele não mais pacata!... vinte e dois quartos standard, três casas tipo três e quatro casas tipo dois - portanto, 39 camas no total. Além de hotel, tem um grande super-mercado, com tudo lá dentro, uma série de lojas, padaria e uma bomba de combustível. Consta que pessoas de diferentes pontos da província de Gaza vão para ali fazer compras.

 

Aquilo tem espaço que nunca mais acaba! Além do hotel, tem quatro grandes salões de eventos diversos, incluindo casamentos e aniversários, e um espação para quem prefira esticar uma tenda. E os três casamentos foram lá, ordeiramente, realizar-se; distanciamento social observado, tudo organizado.

 

O nosso casamento correu muito bem. Senti-me… como se estivesse em Maputo! É que é em Maputo onde a gente faz de tudo. Ou Maputo, ou as capitais provinciais ou grandes cidades ou vilas… um distrito, não costumamos encontrar grande e bons serviços. Senti-me bem que Chibuto tenha salões de festas dessa dimensão, espaçosas e de qualidade standard. Pena é não serem muitas. Na verdade, não tenho conhecimento de muitos mais salões em Chibuto.

 

Agora, a minha dor e indignação é que este colossal espaço, empreendimento ou infra-estrutura não é propriedade de moçambicanos. É dos chineses! Não que devesse ser só e só de moçambicanos, somos uma economia de mercado, precisamos de investimentos e não nos podemos fechar. Hoje por hoje, o mundo está globalizado e mesmo os moçambicanos podem ir investir… na China!

 

A questão é: afinal, onde é que nós estamos a investir? Onde é que nós investimos? Onde é que nós estamos? Eu incluído! Estamos à espera de quê mesmo! Temos que investir, compatriotas, sob o risco de chorarmos porque os chineses estão a fazer!

quinta-feira, 28 outubro 2021 15:55

Ainda a propósito do MDM (mas não só)

Semana passada, este espaço foi dedicado ao nosso Movimento Democrático de Moçambique - versão portuguesa do Movement for Democratic Change!, que temos na vizinhança. Nada me tira da cabeça que o nosso não teve como inspiração aqueles. Nas nossas linhas, deixávamos grafada a nossa profunda decepção com o “galo” por não ter sido aquele “galo de que estávamos à espera”! A inspiração pelos “movimentos para as mudanças democráticas'' dos vizinhos não passaram disso mesmo, não serviram para um sério aprendizado sobre como organizar e gerir um partido político. A preocupação foi de tal sorte que acabamos não dando o devido tratamento a um outro aspecto muito importante na nossa vida em geral: a forma como elegemos os nossos dirigentes.

 

Voltemos ao MDM, a despeito de que não é somente com o MDM que assistimos a incoerências e incongruências. Tudo entre nós é farinha do mesmo saco! A forma como “aparecem” os nossos dirigentes dentro das formações políticas e não só são histórias e histórias de encher livros.

 

Como todos sabemos, muito proximamente, o Movimento Democrático de Moçambique vai a votos para eleger o sucessor de Daviz Simango. Sabemos igualmente que havia três candidatos, mas que um, o José Domingos, está em vias de ser excluído, alegadamente porque não conseguiu reunir a papelada necessária. A ser verdade que não conseguiu reunir o expediente suficiente, é caso para perguntar: como é que alguém que não consegue organizar papelada pode ser bom dirigente? Um bom dirigente é, necessariamente, uma pessoa organizada, bem planificada!

 

Mas… adiante. Um cenário ideal seria aquele em que os três candidatos apresentassem aos militantes do MDM os seus manifestos eleitorais; aquilo que outros chamam de “compromisso”! Um documento bem elaborado, no qual desenvolvem as suas ideias de governação partidária, de gestão e organização, o que pretendem fazer do e no partido, a estratégia que vão seguir e tudo mais alguma coisa para pôr a turma relevante. E os militantes do partido teriam a oportunidade de ler, conhecer, perceber e debater as ideias dos que pretendem ocupar a cadeira cimeira; e daí fazerem a escolha do que lhes parecer melhor! Seria muito bonito!

 

Nada! Puro romantismo. Não é isto que estamos a ver. Não sei se há algum documento de cada um dos concorrentes. O “manifesto”... que achei mais interessante é de Domingos, que diz que é o melhor candidato a suceder a Daviz porque trabalhou muito tempo com ele. Só e só isso. Ou seja, tudo quanto se propõe a fazer, se for eleito presidente, é copiar o que o falecido lider emedemista fazia… O que ele pensa, o que tem na cabeça, nheto! E o que é que Daviz Simango fazia?… é o que tentamos resumir na crônica passada! Portanto, com Domingos teremos “mais do mesmo”! Por outras palavras ainda, nada de significativo!

 

Mas esta não é apenas trafulhice do Movimento Democrático de Moçambique! É de todos. Grandes e pequenos! E é de quase todas as nossas instituições. Raramente ouvimos falar de manifestos dos candidatos à liderança dos partidos. Nalguns nem há ou deve haver candidatos, os candidatos são candidatados! Bom seria que nos nossos partidos políticos tivéssemos candidatos munidos dos seus manifestos, das suas ideias, das suas propostas de governação e que os militantes tivessem a oportunidade de, livremente, escolherem aquelas ideias que lhes parecerem melhor articuladas, bem conseguidas, adequadas ao momento e aos desafios que o país vive.

 

O partido Frelimo já começou, aquando da eleição de candidatos a edis. Um movimento bastante desusado, em que os candidatos tinham que apresentar ideias, tinham que dizer o que pretendem ir ali fazer. Mas precisa consolidar. Precisa de fazer deste procedimento um método próprio do partido e alargá-lo a todos os outros escalões, incluindo o mais alto. Esperemos é que todos os outros, incluindo a Renamo e outros, enveredem pelo mesmo caminho.

 

Enquanto as nossas instituições políticas e outras continuarem a candidatar os candidatos, teremos tudo menos democracia real e não nos devemos queixar quando os outros nos dizem que a nossa democracia está muitos passos atrás!

terça-feira, 19 outubro 2021 09:24

O que se passa com o MDM?

Nas nossas aulas da escola secundária, os professores começavam por nos ditar o sumário das aulas que iriamos ter nesse dia. Não sei se isso ainda se faz nos dias de hoje. Vou, neste texto, seguir esse método, começar com o sumário o qual não seja: MDM, um projecto adiado! Ou MDM, uma decepção total!

 

A morte precoce de Daviz Simango trouxe a nu a impreparação, a imaturidade, a falta de consistência e de coesão e consequentemente o aborto que não é o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a despeito de um slogan muito bem conseguido que convoca muita crença, patriotismo, confiança, simpatia e adesão - Moçambique para Todos! Este ideal chegou mesmo a atrapalhar as grandes formações políticas e a atrair intelectuais e académicos. Mas… tudo se foi e continua se esfumando!

 

Quando esta formação política apareceu, ficou a expectativa de que seria aquela que iria suplantar uma Renamo que teimava em não ser um partido organizado, estruturado, elaborado e articulado. Tínhamos uma Renamo que aprofundava a desorganização interna, desdemocratizava-se galopantemente e era cada vez mais Dhlakama e só ele. Com o MDM, a democracia moçambicana esfregava as mãos de contente; pensava-se que aquele grupo de jovens empolgados iria verdadeiramente fazer diferença: estaria profundamente comprometido com a democracia, transparência, boa governação, unidade nacional, profissionalismo, maturidade e oportunidade igual para todos os “mdmeiros”, mas também para todos os moçambicanos. E ainda começaram mais ou menos bem, com resultados muito promissores, pelo menos na Assembleia da República.

 

Contra todas as expectativas e muitíssimo cedo, madrugada até, viu-se uma autêntica debandada de muitas figuras políticas de proa competentes, de créditos firmados, que tinham deixado, decepcionados, a Renamo também cheios da convicção de que a nova organização seria totalmente diferente da Renamo de Afonso Dhlakama. Gente que tinha deixado a “perdiz” com todo o entusiasmo de ir fazer um partido sério de jovens, para jovens, moderno, que vá de encontro à expectativa dos moçambicanos de terem uma democracia saudável, com uma oposição organizada, capaz, competente, à altura, democrática e… pura ilusão. Era a segunda decepção. E a democracia moçambicana averbava também é uma vez mais uma violenta derrota… decepção.

 

Afinal a nova organização política tinha aprendido bem o essencial da progenitora Renamo: desorganização, desdemocracia, intransparência, nepotismo, ineficiência, imaturidade e pouco profissionalismo - ninguém jamais se esquecerá da forma como foram constituídas (a dedo do presidente) as listas de candidatos a deputados. Tudo isto receita bastante para o descalabro que se seguiu. Se nas eleições de 2014 tinha conseguido eleger 17 deputados, o dobro do conseguido nas eleições debutantes, em 2009, que foram oito (8), em 2019 registaram uma queda que não deixou de ser estrondosa, cifrando-se apenas nos seis (6) deputados, perto de um terço do que conseguira anteriormente!

 

E eis-nos aqui: numa democracia sem oposição digna desse nome. Organizada, com órgãos a funcionar devidamente - comissão política (ou nacional), comité central (ou nacional), secretariados (do comité central/nacional, provincial, distrital e de localidade), congressos (a realizarem-se regularmente). Todos estes órgãos a funcionarem normalmente e a produzirem ideias úteis. Uma oposição com ciência da sua existência e do seu papel em uma democracia: a produzir ideias alternativas para a solução dos problemas do povo; a criticar racionalmente as políticas e estratégias governamentais. Uma oposição a praticar o evangelho de democracia e boa governação, bem como a transparência! Nada!

 

Além desta profunda decepção, o MDM ainda nos brinda com algo pior: uma inovação no processo de eleição dos órgãos do partido. Estão agora no frenesim de escolher o sucessor de Daviz Simango. O razoável numa organização política normal é os candidatos afirmarem-se através de manifestos políticos, convocar-se um congresso e os delegados, transparentemente eleitos, elegerem os órgãos em causa. O MDM vem com a inovação de que as delegações (secretariados) provinciais, muito antes do congresso, declaram as suas escolhas, os seus candidatos. Já sabemos que Maputo está com Rongwane, Manica com José Domingos e… Sofala com Lutero!

 

Que eleições teremos no MDM? Que MDM teremos para fazer face aos grandes desafios dos moçambicanos? ZIRÔOO!

terça-feira, 12 outubro 2021 07:46

A nossa paz

O antigo Presidente da República escolheu justamente o dia em que o país celebrava o Dia da Paz e da Reconciliação - 4 de Outubro - para, no seu mural no Facebook, fazer um post algo enigmático e de alcance e profundidade extraordinários, tais que não podem passar despercebidos a todo aquele moçambicano minimamente preocupado com o seu país. Como diríamos, usando a linguagem politicamente correcta, a todo o moçambicano patriota.

 

Escreveu Armando Emílio Guebuza que “Paz é quando nós, individualmente, nas nossas famílias, e nas instituições e órgãos formais do nosso Estado, não usamos as nossas posições (políticas, sociais, econômicas, ou de qualquer outra natureza) para produzirmos, ou projectarmos sobre os outros, um poder disconforme, discriminatório, selectivo…” Frase própria de um bom cultor da língua portuguesa… um poeta! Falou um poeta que, aliás, o é Armando Guebuza. A propósito, para quando mais poesia do poeta Armando Emílio Guebuza, autor de “Os Tambores Cantam”? Ou não teremos mais, o homem poeta foi completamente esmagado pelo animal político!…

 

A frase é de uma profundidade tal - um comentador na página do antigo chefe de Estado diz que se trata de uma “mensagem poderosa” - que precisamos de recorrer à semântica pura, um departamento da linguística, para interpretar e entendermos melhor o seu sentido. Está a dizer, o ex-Presidente da República, que a paz, o sossego, a tranquilidade é quando nós como indivíduos não usamos as nossas posições políticas (dirigentes políticos), sociais (líderes ou figuras de prestígio), econômicas (empresários, ou com emprego bem remunerado), ou outras, nas nossas famílias, instituições e órgãos formais do Estado para arremessar, fazer reflectir sobre os outros situações de desconforto, de discriminação, de exclusão ou segregação. Ou seja, quando não usamos a nossa posição para não deixar à vontade os outros à nossa volta, para não promovermos discriminação seja de que natureza for; não patrocinamos a exclusão e ou a segregação. É isto que o Presidente Guebuza está a dizer.

 

Podemos assumir que o antigo Presidente não quis dizer directamente que não estamos em paz, mas deixar a assertividade ao critério do leitor. E a inferência a fazer das palavras do post é mesmo que não estamos em paz porque não estamos a usar as nossas posições para promover a união, a coesão e a harmonia familiar e social entre os moçambicanos; não usamos as nossas posições para proporcionar o à vontade aos concidadãos (a disconformidade/desconformidade); para não proporcionar oportunidades iguais a todos os moçambicanos e para não incluir a todos na vida do nosso país! Esta é a mensagem clara ainda que não directamente enunciada (statement) do nosso antigo presidente!

 

Mensagem clara e corajosa.

 

Se o Ex-Presidente recorreu, nesta oportunidade, às suas capacidades poéticas para sofisticar a sua mensagem crítica, já no anterior Comitê Central não se fez de velado. Denunciou aberta e duramente o que chamou de ressurgimento do tribalismo dentro do partido de que é membro e foi dirigente, a Frelimo, e, por consequência, na sociedade moçambicana em geral. Pronunciou-se igualmente sobre o que considerou de caça às bruxas de que aparentemente ele próprio estava a ser vítima.

 

Assino por baixo das mensagens do nosso antigo Presidente da República, na totalidade. Hoje por hoje, a proveniência geográfica é informação importante para certas oportunidades. A paz ainda está bem distante da Pérola do Índico - a paz como tal e a paz espiritual. As armas ainda troam, estrondam vigorosas, seja ao nível individual, seja ao nível de estado.

 

Não haverá paz no nosso solo pátrio enquanto tivermos uma sociedade em que se desenvolve uma política de perseguição (mas não sei bem quem está a perseguir a quem), enquanto as famílias não estiverem à vontade, as oportunidades de vida não forem proporcionais para todos os compatriotas; enquanto praticarmos uma sociedade de exclusão, tribalista, de segregação, de discriminação, de nepotismos e de intolerância. Acrescentaria mais: não haverá paz enquanto não nos considerarmos todos moçambicanos, não estivermos reconciliados e não vermos permanentemente nos outros falta de patriotismo e nós os mais patriotas que os outros.

 

Mas nota importante aqui impõe-se. Não deixa de ser bastante interessante que seja quem é a levantar estas questões de fundo, estruturantes e lamentáveis na nossa sociedade. Não uma pessoa qualquer. Uma pessoa que teve tudo nas mãos! Agora, a pergunta inevitável que se (lhe) coloca é: tendo sido ele quem foi, mais alto dirigente do país, líder da sua formação política, que mecanismos procurou ele para que, como disse na reunião partidária, a Frelimo não volte àquela de 62 e para que em Moçambique o tribalismo não volte a ser uma questão que venha ao de cima, fluorescente; para que Moçambique seja declarado livre do tribalismo? Que estratégia encetou ou promoveu para que a exclusão, a segregação, a discriminação e a desconformidade voltem hoje a ser tristemente uma prática a que assistimos todos os dias. Ou durante o tempo em que esteve ao leme estas atitudes não se manifestavam?

 

Os líderes políticos não só devem deixar para os seus povos escolas, hospitais, estradas e pontes, mas devem também deixar uma sociedade de harmonia, de inclusão e em que as oportunidades são proporcionadas de igual para todos os membros da sociedade.

 

ME Mabunda

quarta-feira, 06 outubro 2021 11:01

As outras causas dos acidentes de viação

Passam sensivelmente três meses depois que tivemos, na Manhiça, província de Maputo, segundo os escribas, o pior acidente de viação de sempre no nosso solo pátrio. Estávamos na primeira semana de Julho passado. Um autocarro da Transportes Nhancale tentou ultrapassar um camião numa curva e foi chocar com outro que vinha no sentido contrário e trinta e duas vidas foram ceifadas! Foi o alvoroço e pânico jamais vistos. Choque e tristeza absolutas. Foi muita morte de uma vez nas nossas estradas. Uma comissão de inquérito foi instituída e, em cerca de dez dias, trouxe o relatório: tratou-se de erro humano! O automobilista desrespeitou a fraca visibilidade, a curva e excedeu a velocidade! Esta foi a causa principal apontada pela comissão. A propósito, o que mais aconteceu aos sujeitos deste acidente: a transportadora, os perecidos, os feridos, as viaturas danificadas e as pessoas afectadas? Entre nós, o silêncio não significa que está tudo bem, não!

 

Confesso que não tive acesso ao relatório, portanto, não o li. Mas confesso também que concordo plenamente com a constatação da comissão de inquérito. Pretender uma ultrapassagem numa curva mais ou menos apertada; um autocarro de passageiros de grande calibre a andar a grande velocidade; um camião avariado mal sinalizado na berma da estrada; e passageiros viajando no autocarro a ser mal conduzido por um motorista mas mantendo-se silenciosos e até a encorajarem-no… tudo isto são, efectivamente, erros humanos! Ingredientes mais do que bastantes para termos um aparatoso acidente. E como são. E tivemos o acidente!

 

Semana passada tive de percorrer a estrada nacional número um (EN1) por imperativos de serviço. Foi uma viagem que me levou de Maputo a Temane (Inhassoro). Íamos três colegas na viatura, uma Ford Ranger dupla cabine novinha em folha. Na ida, conduzia o meu colega, até Maxixe, a partir de onde me sentei ao volante até Vilankulo, onde pernoitamos e depois fomos a Inhassoro. No regresso, aí sim, senti bem todas as peripécias, provei e bem o "pão da massa que o diabo amassou”!.

 

Depois desta longa viagem, cerca de 1600 quilómetros (800 na ida e outros tantos no regresso), estou em condições de dizer de viva voz que estamos diante de um corredor de morte. Esta via é um corredor de morte! Há mais causas dos acidentes de viação nas nossas estradas, sobretudo neste troço do que as apontadas. Incluindo o erro humano.

 

Conduzir na nossa EN1 é um calvário. Ê conduzir num precipício. Isso mesmo: conduzir num precipício. E nesse sofrimento todo acaba ocorrendo o erro humano. O piso da nossa estrada, sobretudo de Maluana até Incoluane, não está bom. NÃO ESTÁ BOM! Não dá estabilidade nem segurança à viatura seja ela de que natureza ou calibre for. É um piso instável, não liso, em que a viatura abana perigosamente. Este estado de piso, só ele, é ingrediente mais do que bastante, quando conjugado com uma velocidade acima de 100 quilómetros por hora, para a ocorrência de acidentes. Pior numa situação de fraca ou pouca visibilidade. E também quando conjugada com a estreiteza (pequenez) da faixa: quando é que teremos uma espécie de circular de Maputo até… Nampula/Pemba/Lichinga? Receio que seja no Dia de São Nunca!

 

A outra causa de acidentes neste troço é a falta de marcação no pavimento, no chão; a falta de sinalização. Parece que as fábricas de cal fecharam entre nós. Daqui até Inhassoro, a nossa pobre “auto-estrada” ou näo está marcada simplesmente, ou a tinta branca está bastante gasta, invisível. Aquelas linhas brancas que orientam e facilitam ao motorista NÃO EXISTEM! E à noite a condução torna-se muitíssimo difícil, bastante propenso ao “erro humano”! Que tal se cada província pintasse o troço que atravessa o seu território, já que a ANE inexiste? Teríamos a nossa estrada… qual corredor de morte… em condições mínimas! Que tal?

 

Mas os nossos “erros humanos” não se esgotam com a falta de marcação/sinalização da estrada. Já agora, devíamos esmiuçar o que entendemos por erro humano, ou alargar um pouco o seu sentido. Tudo o que se enumerou até aqui são erros humanos: piso não em condições, excesso de velocidade, ultrapassagem em curvas, desrespeito à fraca visibilidade, não marcação do chão da estrada, etc., etc.!

 

A falta de informação, a ignorância no motorista em viagem é outra das causas de acidentes nas nossas estradas. Em viagem, o automobilista nunca tem informação de espécie alguma. Não há nenhum aviso sobre as condições do piso (por exemplo, na região entre Manhiça e 3 de Fevereiro), nem da estreiteza da faixa. Há chapas que nos avisam sobre a curva e velocidade a observar, embora escassas, pois há mais chapas a indicarem a velocidade limite do que a indicar o fim daquela limitação. Não são suficientes! Saindo de Maputo, são escassas, bastante escassas as chapas indicando distâncias; nunca sabes regularmente quantos quilômetros faltam para chegares a um ou outro sítio, ou mesmo ao seu destino. Só andar, andar, andar e mais andar! Entre Maputo e Xai-Xai, há-de encontrar uma ou duas; entre Xai-Xai e Maxixe… uma, ou não há nada!; entre Maxixe e Pambara, uma ou nada! Ora, isto não é bom para um motorista; cria ansiedade e nervosismo, o que traz instabilidade emocional, que um motorista não deve ter enquanto ao volante!

 

E colocar chapas de distância a cada 100 quilômetros não custa absolutamente nada! Mesmo custando, são imperiosas para a nossa segurança rodoviária. Será que só vamos ver chapas de distância somente na África do Sul e Suazilândia? Nós não conseguimos colocar nas nossas estradas?!...

 

Para mim, são mais estas as causas dos acidentes na nossa única estrada… corredor de morte! Assim, estamos à espera do próximo desastre!

 

ME Mabunda

terça-feira, 28 setembro 2021 09:13

Comandante de Ordem e Segurança Precisa-se!

O comandante do Ramo da Ordem e Segurança da Polícia da República de Moçambique, Paulo Chachine, fez notícia há dias a partir da Escola de Sargentos da Polícia “Tenente General Oswaldo Assahel Tazama”, em Metuchira, distrito de Nhamatanda, em Sofala.

 

Não foi por menos. Segundo dado a conhecer, o efectivo do Departamento da Polícia de Trânsito de Manica está “em capacitação” por trinta dias naquela instituição de formação. Presume-se que sejam todos os membros da Polícia de Trânsito da província de Manica. Quando se diz efectivo, está-se a dizer exactamente isso.

 

Até aqui tudo normal, pelo menos parece. Capacitação é um modus operandi de instituições sérias e que pretendem aprimorar cada vez mais o seu desempenho; de tempo a tempo, mandam os seus membros para refrescamento de memória.

 

No entanto, a “capacitação” ganha outro sentido quando ficamos a saber que ela decorre do facto de ao longo de todo o Corredor da Beira haver irregularidades diversas na actuação dos agentes no terreno, que vão desde extorsão a automobilistas, negociações de multas com os multados, recolha e apreensão de cartas de condução dos condutores e retenção de veículos sem justa causa, entre outras. Há poucas semanas camionistas de vários países da Região, incluindo do nosso, amotinaram-se na fronteira de Machipanda, protestando vigorosamente contra as más actuações dos polícias de Trânsito moçambicanos.

 

A Imprensa cita o comandante da Ordem e Segurança da PRM a dizer que aqueles agentes  “Não estão a ser punidos. A presença dos agentes visa apenas a reciclagem. Há muitas reclamações sobre a forma como temos estado a agir e interpelar o cidadão ou motoristas. Temos que nos preparar para melhor realizarmos as nossas actividades.” E, como que a explicar melhor, acrescentou: “Não é novidade para ninguém que alguns agentes têm interpelado pessoas ou condutores e pedem uma Coca-Cola ou 50 e 100 meticais. Vamos fazer o esforço de mudarmos e melhorar a nossa qualidade e atitude.” Mais adiante, rematou: “Não se deve orgulhar quando andam com carteiras cheias de cartas de condução e sem saber porque levaram os documentos. Em caso de infracções devem apenas passar as multas e deixar o condutor seguir viagem com a sua habilitação.”

 

Custa a acreditar que estas palavras possam estar a sair da boca de um comandante! Puro comandante! Menos ainda de um comandante da Ordem e Segurança! Difícil ainda é acreditar que estamos dentro de uma corporação policial, uma instituição com o monopólio de garantir a lei, ordem, segurança e estabilidade do cidadão e do país!

 

Os polícias não são admitidos nas fileiras policiais porque estão aptos? Formados devidamente, bem treinados, bem preparados técnica e intelectualmente? Se não estão, então por quê estão lá? Se as suas actuações não decorrem de deficiente preparação, mas de incúria ou incapacidade, por que não os demite e manda para casa?

 

Mas, pelas declarações do comandante, está claro que estamos perante actos criminosos. Extorsão, expropriação de cartas de condução sem motivos aceitáveis, retenção de automobilistas por largo tempo são, sem ‘a’ nem ‘b’, actos de corrupção. Na qualidade de “comandante do Ramo de Ordem e Segurança”, Paulo Chachine devia punir exemplarmente estas atitudes e não apelar para que “A nossa actividade tem de estar em linha com o juramento e cumprindo as normas… É necessário pensar o que temos que fazer para melhorar a nossa imagem.”

 

Claro como a água: o Sr. Paulo Chachine não sabe quais são as funções de um comandante de Ordem e Segurança!

 

Pior ainda quando, falando na mesma cerimônia, que era de abertura oficial da tal “capacitação”, o “digníssimo” revela que há agentes da PT que fazem xitiques semanais de cinco mil meticais! Confesso que nunca tinha ouvido falar de tal façanha. Segundo ele próprio se questionou, se os tais agentes não são criadores de gado ou de frango, como é que se comprometem a tal exercício de fazer xitique semanal nesse montante? Revelou ainda que há outros tantos agentes que se fazem à rua sem estarem escalados, “à procura de caril”! “Onde se procura esse caril na via pública? É possível fazer-se xitique semanal de cinco mil meticais? E no fim de semana aparece o dinheiro e até dizem… trabalhei para o xitique!”

 

Incrivel! No lugar de procurar, encontrar e punir disciplinar e criminalmente esses polícias… só papo! Só reciclagem ou capacitação! Mas, não está sozinho o homem: o seu chefe, o comandante geral, é um dos grandes oradores que país tem, mas disciplinar os agentes prevaricadores nada! É uma escola.

 

O que está a fazer aquele senhor como Comandante do Ramo de Ordem e Segurança?

 

Tirem-no, por favor!

 

ME Mabunda

terça-feira, 14 setembro 2021 07:59

Breve Prontuário do Julgamento da BO

Decorre desde 23 de Agosto passado o que muitos chamam de maior julgamento da história de Moçambique, pela sua natureza, magnitude e extensão. Em termos de natureza, é a primeira vez na nossa existência que temos um caso de julgamento de grande corrupção, no sentido de envolvimento de valores altos, à volta de cinquenta milhões de dólares, mesmo que alguns considerem que ainda falta descobrir o paradeiro dos 700 MUSD que a Krol não conseguiu nem sentir o cheiro do seu destino. Magnitude, dada a quantidade de réus envolvidos: 19, por enquanto; mas há muitos mais! Em termos de extensão, ainda não se sabe ao certo quanto tempo vai durar, mas, em princípio, não vai ser menos de seis meses. Na tentativa de ajudar na compreensão deste facto social, para usar uma expressão sociológica, vamos aqui fazer o levantamento de termos e ou conceitos que estão lá em uso e vamos procurar dar-lhes sentido, de acordo com o linguajar popular, vulgo senso comum. A ordem não vai, ao contrário dos dicionários ou prontuários comuns, obedecer à do abecedário; tentará ser na sequência do entendimento do povão. Não é fechado, o leitor pode acrescentar ou melhorar certo conceito e ou a sua significação.

 

Dívidas ocultas - Dinheiro roubado ao Estado moçambicano por um grupo de cidadãos, no valor global de 2.2 BUSD, ao abrigo do projecto de protecção da Zona Económica Especial. Não há consenso sobre a designação do fenômeno que ocorreu. Uns chamam de dívidas ocultas, outros, de dívidas não declaradas, outros ainda de dívidas ilícitas, outros ainda mais, de dívidas ilegais. Pelas argumentações de todas as partes, fica claro que se trata de dívidas ilegais, uma vez que foram contraídas à margem da lei. No processo da sua contração, devia ter havido aquiescência da Assembleia da República e do Tribunal Administrativo. Para o cidadão de rua, trata-se de dinheiro roubado ao povo, pura e simplesmente!

 

Questões prévias - Momento, antes da audiência, em que os advogados de defesa, isto é, dos caloteiros, se unem e fazem de tudo para inviabilizar o julgamento. Levantam questões e questões, até aquelas que muito antes da marcação da data do julgamento tinham já colocado ao juiz, tipo a cobertura jornalística do evento, ou a liberdade condicional de alguns arguidos, alegadamente porque os prazos de prisão preventiva tinham expirado e, outros, sendo membros dos Serviços de Segurança não deviam ser presos… tudo para que o tribunal se renda às suas pretensões. Na boca do povo, o juiz da causa desbaratou todos os malandros! E disse alto e bom tom que eles não estavam ao serviço do Estado, mas a roubarem o Estado.

 

Abu Dabi - Cidade talismã que o povo sonha em estar e conhecer. Segunda casa dos caloteiros; nos momentos áureos do calote, viviam lá de passaporte. Quase todos eles tinham vistos de residência, mesmo não residindo lá.

 

Acusação - Segundo o Ministério Público, os arguidos associaram-se para sacarem ilicitamente da órbita do Estado milhões de frangos (ie., de dólares norte-americanos). Na linguagem dos populares, os arguidos roubaram dinheiro do Estado no valor de muitos milhões de dólares.

 

Acusação verdadeira - Na elaboração de diversos entendidos, especialistas, acadêmicos, analistas e jornalistas, bem como na percepção do povo nos “chapas”, a verdadeira acusação ainda não foi feita. E a verdadeira acusação é: o governo de então violou a constituição ao contrair empréstimos para determinados projectos, em valores que obrigavam que tivesse que ter a anuência da Assembleia da República e o pronunciamento do Tribunal Administrativo. Não o fez e tais projectos são inexistentes e a Procuradoria Geral da República não agiu, nem está a agir. Mas tem a obrigação de o fazer, responsabilizando o executivo de então.

 

Acusados - Os arguidos, ou réus. Muito pouco se fala de acusados na sessão. Fala-se mais, na rua e nos chapas, de presos e réus.

 

Alcunhas - Pseudônimos que Jean Boustani atribuiu aos arguidos e outras os arguidos se foram atribuindo uns aos outros, tudo para despistarem eventuais investigações da lei. A lista detalhada pode ser encontrada no relatório da Kroll.

 

Arguidos  - Réus. Esta equivalência não reúne consenso entre os advogados. Uns entendem que devem ser considerados ‘arguidos’ porque ainda não se provou a sua culpabilidade; enquanto a designação ‘réu’ já traz consigo a carga de culpabilidade. Para o povo na rua, são aqueles que roubaram milhões ao Estado e deles se locupletaram.

 

Arguidos verdadeiros - Na voz do zé povão, os arguidos em julgamento não são os verdadeiros. Os verdadeiros são os que devem explicar onde é que foram os 2.2 biliões de dólares de que não se fala neste julgamento. No corrente, só se fala de 50 milhões. O povo espera ser esclarecido sobre todo o valor e não apenas uma pequena parcela.

 

Basetsane - Estrela da manhã, mas também da noite. Estrela da manhã… porque serviu de guia aos reis magos; mas também é da noite, porque apareceu à noite, iluminou e depois desapareceu. A Sra. apareceu, guiou e apresentou Boustani e desapareceu!…

 

BO - Cadeia de máxima segurança de Moçambique. Este é o segundo grande julgamento que acolhe. O primeiro foi há 19 anos, quando foi julgada a quadrilha que assassinou o jornalista Carlos Cardoso.

 

Boustani, Jean - Caixa negra. Arquitecto da unidade nacional de todos os caloteiros presos e não presos e nem sequer processados.

 

Dólares - Moeda norte-americana equiparada a galinhas. Os réus, para se referirem camufladamente aos milhões de dólares que estavam a tratar de embolsar ilicitamente, usavam na documentação a expressão ‘galinhas’; “cinquenta galinhas”…

 

Fardamento - Cavalo de batalha dos advogados. Pediram insistentemente ao juiz para que os seus constituintes não envergassem a roupa de reclusos nas sessões de julgamento; pedido recusado pelo tribunal.

 

Facilitador - Teófilo Nhangumele. Grande lobista. Certamente que será debitado a ele a consagração definitiva da profissão de lobista/facilitador na nossa vida social. Nhangumele defendeu com unhas e dentes a sua profissão ou ocupação de facilitador.

 

Galinhas - Vide dólares.

 

Juiz Efigénio Baptista - Figura que está a julgar o caso "dívidas ilegais”. Pessoa a quem (i) o mundo inteiro tem em olho para ver até onde vai ou pode ir; (ii) o próprio aparelho de justiça, incluindo e sobretudo a Procuradoria Geral da República, deposita confiança para restaurar a credibilidade, seriedade, honestidade, capacidade e competência há anos perdida; (iii) o povão, àvido de justiça, revoltado, deposita total confiança para a reposição da justiça e para dar uma lição aos políticos; e (iv) a quem os corruptos acham que vai repor a justiça, deixando-os ir em liberdade, a despeito de tanto roubo ao povo. Em pouco tempo, tornou-se uma das figuras mais populares e muito queridas pela população. O futuro de Moçambique e o seu próprio está nas suas mãos.

 

Ministério Público - Dra. Ana Sheila Marrengula. Para a população em geral, esta é a revelação de uma grande mulher. Muita competência, firmeza, destemida, precisa, incisiva e linguagem fina, apurada - nunca se lhe notou nenhuma gafe linguística. É de grandes mulheres como esta que Moçambique precisa. O futuro pertence-lhe!

 

Motivação política - Alegação de certos réus mancomunados com os seus advogados para atirar areia aos olhos da populaça. Estratégia para criar confusão nas cabeças das pessoas, desvalorizar o julgamento e transformar o momento em instância de perseguição política, para dar a entender que alguém está a ser politicamente perseguido.

 

Muito bem - Expressão de fôlego preferida do juiz da causa. Após toda a batalha, pequena ou grande, a expressão que segue é “muito bem”.

 

Cipriano Sisínio Mutota, também conhecido por Rosário Mutota - O coitado do grupo. O mais injustiçado. Começou a desenhar o projecto de protecção da Zona Económica Especial, mas depois foi afastado. Para seu azar, do grupo dos caloteiros, foi o que menos galinhas recebeu e depois de tanto fazer barulho. Como um azar nunca vem só, o Mutota foi abandonado pela quadrilha na BO, indo ela acomodar-se no hotel de Língamo. Com as poucas galinhas que recebeu, ele foi fazer machamba em Mocuba em local que ninguém conhece, produziu milho, gergelim e soja, cujo dinheiro da venda comeu.

 

Ndambi - Nome de um fenômeno natural - cheia decorrente de transbordo de um rio, em consequência de chuvas intensas - que o antigo Presidente da República adoptou para o seu primeiro filho. Após o seu interrogatório, ficou conhecido como ‘cinderela  mal criada’. Cinderela porque nalguma correspondência com Boustani foi assim tratado; e mal criado na sequência das várias chamadas de atenção feitas pelo juiz no curso do seu interrogatório, em que ele se comportava menos apropriadamente. Vezes sem conta interrompia o juiz, a magistrada do Ministério Público (MP) e ou o assistente do processo, tendo chegado a perguntar à representante do MP se queria um vinho, para além de manter as mãos nos bolsos do seu blusão de 260 euros todo o tempo, até agora.

 

Não respondo a essa pergunta = Não me ocorre/recordo = Não posso precisar - Expressões dos interrogados/presos para ocultarem informação. Estratégia adoptada pelos reclusos para não confessarem a verdade material ao tribunal e ao público, já que o julgamento está a ser transmitido em directo pelos media.

 

Vamos, meu caro - Expressão do juiz da causa a puxar pelo escrivão que o senso comum acha que é muito lento. Alguém já sugeriu até que o tribunal adoptasse a técnica já disponível no mercado de conversão automática do texto oral em texto escrito. Há a sensação de que se gasta muito tempo na redacção da acta.

 

Viagem - Ida (nova entrada na língua). Perguntado o réu se tinha viajado para a Alemanha, respondeu que não tinha viajado para Alemanha, mas tinha ‘ido’ para a Alemanha.

 

Vinho - Perguntado pela Magistrada do Ministério Público, Dra. Ana Sheila Marrengula, sobre qual era a outra mercadoria que o avião que num dos seus e-mails a Ndambi Guebuza Boustani indicava que tinha embalado vinho e outra mercadoria para a Presidência da República, o arguido respondeu “quer uma garrafa de vinho”?

sexta-feira, 10 setembro 2021 08:50

Os nossos amigos chinocas

Pág. 9 de 10