Nos princípios do mês de Maio do ano em curso, nas matas do distrito de Mueda, na martirizada Província de Cabo Delgado, por pouco aconteceria uma carnificina que culminaria com um escândalo de proporções catastróficas. E não foi por falta de aviso!
Tudo se deveu a uma aterragem de Forças Especiais Estrangeiras, as quais esperavam que a operação fosse secreta e sem deixar rastos. Os soldiers aterraram nos moldes hollywoodianos. De paraquedas e mochilas, desceram como raios de trovão e pousaram quão os bravos soldados das cenas cinematográficas americanas com destino ao índico a fim de combater numa guerra que em tempos os nossos protectores estabeleceram um prazo de uma semana para que os malfeitores se entregassem.
Sucede, porém, que no pretérito dia, os militares, que tinham como destino o Quartel Central de Mueda, aterrizaram numa área com mata densa e sem rede telefónica. A ideia era fazer o reconhecimento do local, no entanto, logo que chegaram numa determinada região guarnecida por milícias populares, a situação mudou de mares. Os soldados locais pensaram que fossem homens do inimigo, uma vez que por lá tudo é possível.
Em poucos minutos, o ar mudou. A tensão subiu. As carabinas foram manipuladas. Afinal, estava-se diante de um possível ataque, mas não. Longe do conhecimento deles, eram parceiros estratégicos que vinham combater ao lado dos filhos da Pérola do Índico que, desde Outubro de 2017, lutam para aniquilar em definitivo a força inimiga.
Assim, a tensão durou por meia hora, uma vez que, aparentemente, os guardiões da pátria não tinham nenhum conhecimento da vinda dos “Chucks Norris Africanos”, alegadamente porque a informação estava com um burocrata a 2.514,9 quilómetros daquele quase esquecido território no cume de Moçambique.
Com os militares já posicionados, os canhangulos em posição de mira, é quando o Coronel que comandava as Unidades recebe a informação de que eram Forças Estrangeiras parceiras – isto é, depois de várias tentativas de informar, militarmente, em meio a falhanços, os especialistas foram recebidos e, meses depois, entraram, oficialmente, os 1000 homens.
No xangana - perdoe-se-me eventual sectarismo -, há um verbo que reza ku titsika! Ku titsika quer dizer ‘deixar-se’; ‘negligenciar-se’, ‘destratar-se’, ‘abdicar de si próprio’, ‘viver de qualquer maneira’. É mais do que um verbo. É uma noção. Uma pessoa que se “tsikou” é aquela que deixou de viver a vida, deixou de ter planos e projectos de vida, de curtir; que se balda e, mesmo, deixou de se vestir como deve ser, de pentear, fazer barba, tomar banho, cortar ou limpar as unhas; deixou de viver, ainda que vivendo! Muitos sinais alarmantes vêm de todos os lados da nossa sociedade, de que nós próprios, como indivíduos, mas também como instituições, algumas das quais basilares para uma sociedade fluorescente que pretendemos, nos tsikamos!
Ao que parece, nos abdicamos de nós mesmos como indivíduos e do nosso querido Moçambique, a Pérola do Índico. Desistimos completamente; eximimo-nos de o construir com valores e princípios sólidos aceitáveis; de o erguer com pilares éticos e morais firmes! Exoneramo-nos da responsabilidade sobre nós mesmos e sobre o país! Não estou a falar do governo e suas responsabilidades, nem de quaisquer outras autoridades... Falo de nós, como indivíduos membros desta sociedade.
Apartamo-nos de nós próprios como seres racionais. Semana passada, a televisão expôs ao mundo um jovem, na cidade de Nampula, a produzir documentos diversos falsos. Com os seus computadores e softwares, fabricava uma multitude de documentos. Todos eles falsos, obviamente! Produzia desde papel timbrado de diversas instituições, relatórios de inspecções de veículos, facturas e recibos diversos e, cúmulo dos cúmulos, certificados de habilitações literárias e diplomas!...
No material exibido na televisão, estava um diploma de uma instituição superior, que o jovem produzia! Com mil e trezentos, mil e quinhentos… ali se tinha o documento, já se tinha as habilitações almejadas e a licenciatura, ou a viatura inspeccionada! O jovem e o caso de Nampula não são os únicos nesta nossa terra. Em todo o lado, falsifica-se tudo mais alguma coisa… menos o BI e passaporte agora, mas num passado recente esses documentos também se falsificavam a granel. Como todos ouvimos, certamente incrédulos, no INATTER, agora INATRO, produziam-se e vendiam-se cartas de condução… falsas.
Falsas?... não; aquelas eram autênticas, eram produzidas pela instituição certa e pelas mãos certas… só que eram atribuídas a pessoas erradas, não habilitadas para conduzir veículos automóveis. Portanto, eram autênticas, mas ilegítimas. Não temos a indicação de a quantas pessoas desabilitadas foram vendidas as cartas de condução, nem de há quanto tempo aqueles 16 funcionários desenvolviam aquela bolada, mas seria ingenuidade demais acreditarmos que aquela absurdidade ocorria fazia pouco tempo, ou que aqueles delinquentes estavam a começar a praticar aquele ilícito! Igualmente, ouvimos da rádio e lemos em jornais que, algures em Cabo Delgado e no Niassa, perto de duzentos professores foram expulsos porque se apurou que tinham sido admitidos irregularmente!… Muitos deles tinham certificados falsos, entre outras falcatruas.
A Direcção Provincial de Educação e Desenvolvimento Humano em Cabo Delgado desencadeou uma campanha de confirmação dos certificados apresentados pelos candidatos já seleccionados e de outros já efectivos e encontrou que um monte de certificados ou diplomas apresentados para a contratação não eram autênticos. Eram, portanto, falsas! Muito provavelmente produzidos por aquele jovem de Nampula! Ou eventualmente de um outro em… Pemba, Lichinga, ou Maputo! Só podemos rir, para não chorarmos! Até onde chegamos.
Não consigo entrar na cabeça daquele jovem na casa dos 30 anos que resolveu montar em sua casa uma indústria de falsificação de documentos. E não são quaisquer documentos: certificados de inspecção de veículos, certificados de habilitações literárias e… diplomas! Tal como os vendedores das cartas de condução, não temos a indicação de quantas pessoas terão adquirido, a mil ou mil e quinhentos, cada documento. Dir-se-á que o mundo está cheio de coisas más. Certo. Mas o que anda na cabeça daquele concidadão que, no lugar de se ir sentar no banco de escola, aprender, estudar, adquirir conhecimento, prefere comprar um certificado, um diploma; aquele moçambicano que, ao invés de levar o carro ao mecânico e pô-lo como deve ser, prefere comprar certificado de inspecção! Hi titsikile mesmo! Que sociedade pretendemos?
Uma sociedade em que ninguém vai à escola, só compra certificado de habilitações e ou diploma? Como podemos crescer, progredir, desenvolver o nosso país sem educação? Com diplomas comprados numa dependência? Com certificados de habilitações literárias fabricados? Queremos ser uma sociedade em que, para conduzir uma viatura, ninguém vai à escola de condução; em que as viaturas não vão à inspecção, mas têm o certificado de inspecção em dia… aliás, já somos essa sociedade: as notícias e os números de e sobre acidentes nas nossas estradas não mentem! Semanalmente temos fatalidades aos montes.
No entanto, isto não é tudo! Não podemos enumerar tudo sobre o nosso infortúnio colectivo. Mas, mais um apenas! A nossa PGR, a própria PGR, deu o braço a torcer! Abdicou dela própria! O comunicado que há dias emitiu não é nada mais nada menos do que um atirar de toalha ao chão. Sente-se assustada, amedrontada e… consequentemente, abdica das suas funções! - ainda que não o diga directamente. Se a PGR, com o mandato outorgado constitucionalmente, não tem a verticalidade de perseguir e encontrar chamadas, SMS e ameaças anónimas… deixa-se assustar e o manifesta publicamente… e nós, cidadãos ordinários? Definitivamente, eximimo-nos de uma sociedade sã e fluorescente! Hi ti tsikile! Não é o governo que nos vai inculcar valores de ética, de moral, de probidade. Nós, como indivíduos, onde estamos? Não é o governo que nos deve proibir de comprar diplomas ou de levar os carros à inspecção. Este faz a sua parte. E nós?
- Armando Artur, em entrevista fictícia *
Armando Artur pode ser um homem taciturno, ele diz que é uma forma de defesa. Não é o tempo que conta na sua vida, mas a importância das coisas que faz. Foi na AEMO onde aprendeu a valorizar a amizade e a partilha. Não guarda ressentimentos, mesmo dos malucos que em algum momento lhe apedrejaram na vida, “eu também sou maluco”.
Acompanhe na íntegra a conversa mantida num final de tarde, na varanda da sua casa, lembrando o sol a esconder-se no esplendor dos Montes Namuli.
-Nasceste em Nauela num ano qualquer. Em 1982 chegas a Maputo com um pequeno bornal no regaço, ninguém te conhecia. O que é que te moveu para um lugar movediço e tão distante da tua terra?
- Você fala do bornal que eu trazia no regaço e faz me lembrar que bornal é uma saca usada pelos soldados, obreiros e itinerantes para transportar provimentos ou mantimentos, mas a minha saca não tinha nada. Se calhar vim para aqui com a necessidade urgente de encher o coração e eu não sabia. Provavelmente aportei neste grande entreposto como um pedaço desconhecido da cordilheira de Namuli, que já tinha as palavras a zumbirem em forma de poesia dentro de mim.
- O que é que te arrebatou em primeiro lugar ao desceres num lugar que não tinha nada a ver contigo?
- Eu era imberbe, deixei-me conquistar pelo fascínio de uma grande metrópole sempre sonhada na pacatez desse lugarejo onde minha mãe me deu à luz, na verdade todo o bulício de Maputo, o frenesim consubstanciado no ruído dos carros, as pessoas a quererem passar todas ao mesmo tempo, os grandes autocarros abarrotas com pessoas penduradas nas portas, tudo isso foi um choque profundo para um rapaz atrevido que apenas confiava na poesia.
- E confiava nos búzios também!
- Depois de retirares a carne desse molusco, a carrapaça do búzio assobia ao sibilar do vento, e na esteira dos médiuns torna-se uma verdadeira bússola, dependendo das mãos que a manipulam, mas os meus búzios são outros, são cada verso da poesia que vou cantando em vários sopros de meditação. Por vezes nas paródias.
- Depois foste parar a esse efervescente alfobre que é a Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO), onde te mantens até hoje como uma das pedras angulares. O que é que significou para ti entrar nesse clube restrito?
- Se eu sou uma das pedras angulares da AEMO, só pode ser no sentido de que sou um fragmento de uma rocha maior, com o risco de me precipitar e diluir-me no mar. A AEMO é um baluarte sagrado onde aprendi a arrumar as palavras que já trazia da cordilheira de Namuli. A AEMO é um depositário de tesouros, aqui abriu-se-me a luz que me fez perceber o valor da amizade e da partilha. Sinto-me lisonjeado por fazer parte desta orquestra esquisita, em que cada um toca a música dele sozinho, tentando atingir a perfeição e querendo profusamente que os outros escutem essa música.
- Já atingiste essa perfeição?
- Olha, como já te disse, nasci em Nauela na província da Zambézia. É uma zona superabundante que faz parte dos Montes Namuli, abrange Gurúè onde se estende aquela exuberância toda das plantações de chá. Você olha para aquilo tudo e diz, que obra da natureza tão perfeita! Então, a única perfeição que reside em mim, é o lugar onde nasci.
- A propósito, há muita gente que vem das províncias de Moçambique, chega a Maputo e desumbilica-se completamente das suas origens. Como é que tem sido a tua relação com Nauela?
- Desumbilicar-me de Nauela seria abdicar da poesia, e abdicar da poesia é o mesmo que rejeitar a própria vida. Não me canso de repetir isso. Eu sou um dos grãos das poeiras da cordilheira de Namuli, mesmo que levite em escaparates reais e imaginários, de vez em quando tenho que ir para lá, poisar naquele chão para deste modo poder ressurgir e continuar a rugir fora das jaulas.
- Foste secretário-geral da AEMO durante dois mandatos. A tua consciência tranquiliza-te ao pensares no tempo que ficaste lá?
- Tranquiliza-me no sentido de que fiz tudo o que estava ao meu alcance para manter a família unida, e levar a agremiação a níveis de organização satisfatórios, claro com a colaboração de todos os confrades, cada um com a sua afinação. Mas o mais empolgante era eu dormir a pensar que no dia seguinte ia voltar ao bulício onde tudo era imprevisível, ir ao trabalho preparado para ser apedrejado sem mais nem menos por alguns malucos, alguns dos quais ainda sobrevivem, com roupa mais leve, sem a verve do veneno.
- Esses malucos deixaram-te alguns recalques?
- O poeta que me orienta é também um maluco que luta permanentemente pela paz, por isso não tenho como, mesmo que o quisesse, ter ressentimentos. Farto-me de rir quando me lembro desses momentos, com saudade.
- Você anda longe da vida pública, transformaste-te num taciturno, pareces ter medo de alguma coisa!
- Somos todos mutantes, o próprio mundo já não é o mesmo, nem a cordilheira de Namuli, como é que eu, uma pessoa tão pequenina, tão insiginificante perante esses gigantes não vou ter medo! Provavelmente seja um taciturno como tu o dizes, mas essa pode ser uma forma de defesa, pois perante uma vida absolutamente vituperada, a melhor coisa que podes fazer é ficar em silêncio, no silêncio, deixar as palavras avançarem, como se elas fossem a tua jangada e tua muralha ao mesmo tempo. Mas também não é verdade que ande longe da vida pública, depende da lupa que usas para me focares.
- Trinta e cinco anos de carreira é um marco importante para um poeta, há muitas flores espalhadas no percurso, e espinhos que podem ficar encravados para sempre na alma, muitas frustrações, incongruências. Será que depois deste tempo todo você está em condições de embalar a troucha e dizer, deixem-me voltar a Nauela beber conhaque?
- (Risos). Não há conhaque em Nauela (Risos), mas tem muita cachaça que bebo sempre quando vou para lá. Bebo para renovar e fortificar a minha relação com os espíritos lómwè que me guiam. Quanto aos trinta e cinco anos, não é isso que me vai marcar, não é o tempo que me marca, é a forma como tenho vivido a vida até aqui, lançando palavras ao léu, muitas delas grafadas em livro como um monumento erigido em memória de mim. Isso é que conta, não o tempo que levei a juntar as pedras. De resto o que importa é não sermos vencidos.
- Mesmo assim como é que te sentes perante esta efeméride que é uma comemoração da tua vida?
- A emoção é maior ao ver o envolvimento dos meus confrades na minha homenagem, significa que eles dão-me valor, significa que sou importante para eles, mesmo sem o merecer, e eu não posso querer mais nada para além desse conforto espiritual. Eles não o fazem porque brilho, mas será com certeza por amor, ao qual agradeço sem parar. Choro quando penso nisso tudo.
* Entrevista publicada na antologia em homenagem aos 35 anos do poeta
Moçambicano é maningue complicado. Nos últimos tempos têm estado a brotar sabichões neste país que nem te deixam ser bandido a vontade. Não permitem que o ladrão usufrua do seu próprio título de ladrão em paz. Já nem dá para ser gatuno tranquilamente. Aqui é fácil você ser jornalista, analista, músico, pastor, padre, sheik, até profeta, mas experimenta ser gatuno. Virão os "donos da verdade" dizer que isso é mentira, que isso é ilegal.
Se me perguntares sobre a crise económica
Que a tantas entranhas macabramente carcoma
Mesmo depois dos famigerados acertos da Kroll
Associada às ameaças de malandros doadores
Aprumada de reclamações de gente faminta
Protestos desencantados de um cúmulo de teóricos
E canções malnutridas que de pálidos lábios ecoam
NADA TE DIREI!
Se me perguntares sobre o ignorado esconderijo
Onde astuta e em tendenciosas propagandas
As moedas que dos nossos bolsos desapareceram
E hodierno nossos filhos lamentam esfomeados e imóveis
NADA TE DIREI!
Se me insistires e perguntares
Sobre as esquinas das ocultas negociações
Os conflitos armados ao relento travados
A crónica da cruel e aplaudida pobreza absoluta
E abismo mal-acostumado de paulados analistas
NADA TE DIREI!
Se me perguntares sobre o paradeiro da boa educação
Onlinamente desnutrida pela falta de qualidade e dispositivos
Em somatório pálido à ineficaz rede de acesso móvel
E os meninos que há tempo sonham com salas de aulas dignas
NADA TE DIREI!
Se insistentemente me perguntares
Sobre consultas médicas monetariamente apadrinhadas
Médicos abandonados aos desvarios da pandemia em laboratórios forjada
E o reajuste salarial que há tempos os nossos pais reclamam
NADA TE DIREI!
Se quiseres teimosamente saber
Sobre o plano agrícola carinhosamente desnutrido
Alegando suportar famílias nos campos malnutridas
Sabotadas pela desnutrição crónica do exaltado sustenta
NADA TE DIREI!
Se continuares e me perguntares
Sobre a apreciação da nossa pálida moeda
Que nos bolsos do pacato cidadão escasseia
E nas contas de decisores de políticas público-monetárias abunda
E em bolsas de nossas mamanas nos dumbanengues desaparece
NADA TE DIREI!
Se me perguntares sobre nossas mães, irmãs e filhas
Matalanizadas entre ramos secos naquela floresta governamental
E em escritórios de Supervisores de turnos e tarefas
Que defendem tutu mafia e pura obra de ficção ser
NADA TE DIREI!
Se quiseres saber sobre o relatório da Comissão de Inquérito
Para aferir os relatos do CIP e de mulheres ndlavelizadas
Por supostos agentes de disciplina e boa conduta
Indiciados de estabelecer negociações público-privadas
Para suas vontades e prazeres perante todas satisfazerem
E em suas contas, em comissão, de moedas encherem
NADA TE DIREI!
Se me perguntares sobre a consumista mambas desvenenada
Que cuspe derrotas a cada vez que na floresta desfila
E a juventude planificadamente amamentada com leite carmesim
Filhos e netos das mamanas que coloridas capulanas adoram
Mas nada fazem pelas mártires de Ndlavela e Matalane
NADA TE DIREI!
Se insistentemente me questionares
Sobre os jovens que esforços de meninos primários banalizam
Enquanto eles confiantes incalculáveis memes produzem
E socialmente, em suas redes, fotos sem conteúdos disseminam
NADA TE DIREI!
Se me perguntares sobre nossa vontade de alguma coisa querer ser
Mesmo sem prévia consulta e indicação de chefaturas monopolistas
Em meio à decadência e extinção de fortes candidatos que no povo pensam
NADA TE DIREI!
Se me perguntares sobre a nossa desviada madeira
E luxuosas máquinas que pelas fronteiras atravessam
Em boladas coadjuvadas por agentes e filhos da pátria amada
E dos cofres do Estado avultadas quantias para bolsos particulares encaminha
NADA TE DIREI!
Se me pedires para continuar a descrever
A frustração que hoje em nosso pátio sem máscaras se vive
Meu punho de escrivão encravarei
Meus pergaminhos distantes guardarei
Meus desnutridos lábios em defesa cerrarei
E NADA TE DIREI!
Por conseguinte, hoje, acanhados
Pelo sucesso do NADA TE DIREI
Os corolários desta atitude bebemos nós
E para Michafutene caminhamos, silenciosamente!
Mesmo assim, NADA TE DIREI!
A Covid-19 está a matar! Os números de pessoas infectadas não param de crescer. Os entendidos da matéria andam apavorados, mas, infelizmente, os boémios nada disso entendem.
Na cidade de Maputo, por exemplo, em bairros periféricos, as festas continuam ao rubro. As pessoas ainda bebem à moda alemã. Festejam como adeptos ingleses em partidas entre clubes rivais como Liverpool e Manchester United. Na capital, se caminhares em bairros como Magoanine, Laulane, Hulene, Mahotas, Chamanculo, Inhagoia, entre outros, percebes de antemão que alguns moçambicanos não mudam, mesmo com a já conhecida teoria dos 21 dias de repetição, mediante a qual, desde 2020, se canta e grita para usarmos máscaras, nos distanciarmos, ficarmos em casa, ou bebermos água de 15 em 15 minutos. Campanhas e apelos são feitos em todos os canais, entretanto, as pessoas fazem ouvidos de mercador.
E com efeito, a Covid-19 está a matar! Os nossos vizinhos estão a desaparecer. Porém, os cépticos ou negacionistas questionam sobre o paradeiro das pessoas que morrem desta já conhecida doença. “Nunca vi uma vítima sequer, por isso, deixem-nos curtir!” – Assim dizem os farristas da capital e de outras zonas do País, para os quais a máscara, o distanciamento social, bem como a lavagem das mãos são insignificantes regras científicas, pelo que, podem beber até suas almas abandonarem os seus pobres corpos.
Estranhamente, mesmo diante de certas operações televisionadas, mediante denúncias de vizinhos conscientes ou insatisfeitos, alguns Chefes da Polícia com negócios particulares na área de restauração, outros com parentes que operam nesta área, amigos e amantes que têm bares, restaurantes ou barracas, continuam a fazer das suas, protegendo locais onde vários farristas se embebedam e desgraçam não somente as suas almas, mas de tantos outros que nem sequer disso se apercebem.
Em bairros como Hulene, Magoanine ou Mahotas, até alguns polícias são imobilizados e impedidos de prosseguir com as operações em determinados lugares, alegadamente porque o local onde se vende álcool é de um grande Chefe da Corporação. Assim, todos os agentes escalados para fazer valer o Decreto Presidencial de Estado de Calamidade Pública querem parte da receita no final do dia – o resto não importa – as pessoas podem continuar a ser infectadas ou a infectar-se, porque só assim é que a bolada policial se manterá em pé.
Por conseguinte, a pandemia da Covid-19, na capital e noutros centros urbanos, virou o braço direito das gangues corruptas. Ela aumentou a renda diária, semanal e mensal dos destacados. Por isso, as brigadas policiais descobriram uma forma de trabalhar – chamar a imprensa ressonante e fingir que estão a trabalhar, dar a palavra ao Porta-voz que, em seguida, põe-se a deslindar nas câmaras de filmar, e assim o dia se vai.
Contudo, nos locais-chave, onde as festanças continuam a acontecer, ninguém mostra força e educação para impedir a contínua expansão do vírus maligno que, embora não seja nas dimensões da Malária, Cólera, HIV-SIDA, Ébola, Meningite e Tuberculose, está a matar e paralisar a normalidade quotidiana e os planos de diversas famílias no mundo inteiro!