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terça-feira, 13 abril 2021 07:24

Tributo ao “poeta dos acordes”, por António Prista

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Não são palavras que queria escrever. Nem sei porque escrevo. Provavelmente numa angustiante tentativa de lidar com este sentimento não descritível. Depois nem sei para quem escrever. Afinal eu perdi um amigo de 45 anos, parceiro, Mestre, irmão e compadre. Será que tenho o direito de partilhar publicamente uma dor minha?

 

É que quando se escreve tem de se ter um objectivo e que tenha a ver com os outros, se não é fútil e desapropriado. E hoje eu estou assim, a pensar que ainda no dia dos teus 70 anos falámos dos teus projectos da próxima década. Falámos na cachaça que eu recebi e não abri à tua espera, falámos no teu malfadado songbook que nunca mais sai, na tua biografia pronta mas tu sempre a insistir que o perfeito afinal existe.

 

E uma vez mais me deram o privilégio de fazer o que mais gosto: falar em em vida sobre a vida de quem faz obra com valores. Se há coisa que fico descansado é que te disse na cara aquilo que pensava de ti nas milhares de vezes que tocamos, conversamos, partilhamos dores profundas e alegrias imensas e digamos a verdade, virámos muita garrafa juntos. Desde antes do Xidiba Ndoda. Foram muitas milhares de horas, muita coisa partilhada, mas estava muito longe de estar esgotado. Não fazia parte do nosso acordo saíres assim.

 

Acontece que estas letras ficariam entre nós se não fosses tu o que és. E és património deste País. E não só. Sem confete, como dizem os brasileiros. Lembro-me que quando sai de casa para o Tributo que te fizemos em 2015 escrevi um mail todo nervoso a desculpar-me pelas falhas e explicar te que estávamos a fazer esse tributo, e cito, “pelo exemplo que tu és como artista, pelo exemplo que és como músico, pelo exemplo que és como ser humano, por tudo que passaste da maneira que passaste, pela amizade que sempre me deste e pela amizade que tenho por ti faz 40 anos”. 

 

Lembro-me também de termos nesse show justificado o Tributo porque “Os homens medem- se pelo que fazem mas também e sobretudo pelo que são. Moçambique tem sido testemunha do que FAZ e que é Hortêncio Langa. Fazer um Tributo a Hortêncio Langa não é apenas homenagear-te mas acima de tudo usar o teu exemplo para propagar, através da arte, atitudes e comportamentos que andam em falta. Tomara que os homens se inspirem no artista, na arte e no homem que é Hortêncio Langa”.

 

Não preciso de te dizer nada hoje. Fui fazendo ao longo da vida. Mas eu acho que no final de contas estou a escrever para lembrar aos outros. Sei lá. Hoje está difícil pegar a guitarra mas amanhã vamos fazê-lo com certeza e lembrar-me de ti a cada acorde, coisa que nunca vou conseguir fazer como tu, nosso poeta dos acordes. Vou pegar o Songbook que está muito mais que perfeito e que tu insistes que falta sempre algo, vou apontar uma arma à tua bi´

 

biógrafa e obrigá-la a publicar já. Porque o que tu nos deixaste e nos deste vai ficar aqui para muitas gerações.

 

Compadre hoje está difícil, mas foram muitas décadas de felicidade ao teu lado. Minha, de todos os que privaram contigo e dos que nem te conheceram. Atingiste como poucos com tua arte e com o teu ser, estar e fazer. Vou olhar sempre com saudade as tuas fotos da minha parede, os teus quadros que falam e os teus livros que como escreveste “falam de gente como nós”. Está a doer mas valeu e muito. (A.P.)

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