O Estado moçambicano está a processar judicialmente, através da Procuradoria Geral da República (PGR), as seguintes entidades: o Credit Suisse International, o Credit Suisse AG, a Privinvest Shipbuilding S.A.L. Abu Dhabi (Branch), a Abu Dhabi Mar LLC, a Privinvest Shipbuilding Investments LLC, a Logistics International SAL (Offshore) e a Logistics International Investments.
Os cidadãos Surjan Singh, Andrew James Pearse e Detelina Subeva também são réus no mesmo processo. Uma fonte da PGR confirmou o facto à “Carta de Moçambique”, esta tarde. Trata-se de uma acção de responsabilidade civil.
A acção foi intentada junto do High Court of Justice/Queens Bench Division, tendo dado entrada ontem, dia 27 de Fevereiro. Singh, Detelina e Pearse eram funcionários do Credit Suisse quando o calote dos mais de 2 bilhões de USD começou a ser montado. Os três estão acusados como réus processo americanos em que o libanês Jean Bostani e o deputado Manuel Chang são os principais réus detidos. Singh, Detelina e Pearse estão sob liberdade provisória. Na acção do Estado moçambicano ficou de fora Jean Bostani e o VTB (banco russo que também, por enquanto, não foi acusado pelos EUA).
Mas, e pela primeira vez desde que este caso estoirou em Dezembro, a Privinvest e todo o conglomerado à volta do empresário franco-libanês, Iskander Safa, está a ser processado. “Carta” confirmou junto de suas fontes que se trata de uma acção de responsabilidade civil. Ou seja, o Estado moçambicano pretende receber uma indemnização de cada um dos acusados por seu papel no calote. A opção por uma acção cível, e não criminal, está a ser comentada como comportando riscos, nomeadamente o risco do insucesso. Há quem considere que o ideal seria a PGR ter intentado primeiro uma acção criminal, e através dela exigir uma indemnização, uma vez que já está praticamente provado que houve fraude, negligência e incumprimento de regras de prudência por parte do banco suíço. Por essa via, seria mais prático os visados serem responsabilizados criminalmente primeiro e, depois e como consequência, civilmente. (Carta)
As detenções de Manuel Chang, Ndambi Guebuza, Gregório Leão, Inês Moiane e outros arguidos no famigerado caso das dívidas ilegais fizeram com que a bancada da Frelimo tomasse uma atitude camaleónica. Com efeito, a 9ª Sessão da Assembleia da República que arrancou nesta quinta-feira (28) em Maputo serviu para o partido no poder afirmar e reafirmar que distanciava-se “de forma inequívoca” dos “comportamentos desviantes”, e que as garantias soberanas e avales na Conta Geral do Estado “não significa a legalização das dívidas não declaradas”.
Margarida Talapa, chefe da bancada parlamentar da Frelimo, disse que “desde que se desvendou o caso das dívidas não declaradas, a Frelimo tem reafirmado a necessidade da responsabilização exemplar daqueles que aproveitando-se das suas funções ter-se-ão eventualmente apropriado de parte dos valores em benefício próprio, lesando o Estado Moçambicano”.
Talapa afirmou que AR criou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com a missão de investigar e recomendar as medidas apropriadas, cujo relatório foi apreciado, aprovado e posteriormente encaminhado à Procuradoria-Geral da República (PGR) para os trâmites legais subsequentes. A chefe da bancada da Frelimo disse que o seu partido distancia-se de forma inequívoca dos comportamentos desviantes que põem em causa a gestão transparente da coisa pública.Acrescentou que a Frelimo continuará a pugnar pelo combate tenaz e cerrado contra a corrupção, branqueamento de capitais e outras formas de crime organizado praticados por quem quer que seja.
Sobre garantias soberanas e avales
Para Margarida Talapa, o registo das garantias soberanas e avales na Conta Geral do Estado quando feito consoante a Legislação em vigor não significa a legalização das dívidas não declaradas, muito menos representa impedimento às actividades em curso nas instituições da justiça. Acrescentou que a Conta Geral do Estado (CGE) é equivalente ao Relatório e Balanço de Contas do exercício económico de uma empresa. “Nela devem ser registadas todas as operações que alteram ou possam alterar o património do Estado, como são os casos de garantias emitidas pelo Estado”, afirmou.
A chefe da bancada da Frelimo reiterou que o registo é necessário para o Tribunal Administrativo, enquanto auditor externo da CGE, poder fazer o devido julgamento e envio, com ou sem reservas, à AR para deliberar, aprovar ou, havendo matéria que justifique, criar CPI, como foi o caso das garantias soberanas. Talapa referiu também que sem o registo na CGE não haveria nada a julgar.
Salvaguardar os interesses dos moçambicanos
Numa outra passagem do seu discurso, Margarida Talapa encorajou o Governo a continuar focalizado na identificação de melhores soluções que salvaguardem os interesses dos moçambicanos, sem prejuízo do exercício do direito de regresso, ou seja, responsabilizar os agentes estatais que por actuação ou omissão tenham causado danos ao próprio Estado. Exortou os órgãos de administração da justiça a fazerem justiça com celeridade para a protecção dos direitos, liberdades e garantias de todos os moçambicanos. (Omardine Omar)
A situação da insegurança que se regista em alguns distritos de Cabo Delgado desde o passado dia 5 de Outubro de 2017 e os novos contornos do famigerado caso das dívidas ilegais foram os assuntos de maior destaque nos discursos da presidente da Assembleia da República (AR), Verónica Macamo, bem como das chefias das três bancadas parlamentares, durante a cerimónia que esta quinta-feira (28) em Maputo marcou o arranque da 9ª sessão da AR.
Na sua intervenção, Verónica Macamo referiu-se à situação de Cabo Delgado afirmando que “nada justifica a morte de gente inocente, pacata e trabalhadora. Nem os recursos minerais, nem as diferenças religiosas, de raça ou de ideologia, podem ser evocados para a prática de actos macabros e ignóbeis”. Acrescentou que as Forças de Defesa e Segurança (FDS) e as populações devem trabalhar em colaboração para uma maior vigilância e denúncia, visando a neutralização das acções dos malfeitores.
Por sua vez, a chefe da bancada parlamentar do partido no poder, Margarida Talapa, afirmou que “nada justifica a barbárie que os nossos concidadãos vivem em alguns distritos da província de Cabo Delgado. Nenhum ser humano dentro das suas faculdades mentais, com respeito à vida e sentido patriótico, é capaz de tamanha insensatez”. Para Talapa, as Forças de Defesa e Segurança devem fazer de tudo para que o “jacaré não cresça”.
Na opinião de Mário Ali, vice-chefe da bancada parlamentar do maior partido da oposição (Renamo), as FDS estão impávidas, impotentes e desnorteadas por causa da “situação da instabilidade social e confrontação armada que se regista na província de Cabo Delgado, que originou até ao presente cerca de 200 mortos, inúmeros feridos, centenas de deslocados e números não especificados de casas queimadas ou destruídas”. Adiantou que as FDS, “que sempre se mostram tenazes, implacáveis contra o cidadão pilha-galinha e o povo indefeso que simplesmente pretende manifestar-se para exigir seus direitos constitucionais, estão descaracterizadas, demonstram fragilidade e incapacidade de repor a ordem e tranquilidade em Cabo Delgado”.
Regime "persegue" jornalistas
Ainda na sua intervenção, Mário Ali acusou o regime vigente de perseguir jornalistas, que são detidos por apenas estarem no exercício da sua actividade profissional de informar a sociedade.
Já o chefe da bancada do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Lutero Simango, entende que a situação de terror que se vive em algumas zonas da província de Cabo Delgado está a ganhar uma dimensão alarmante de instabilidade. Para Simango, “o povo moçambicano já não suporta mais nem deseja viver em ciclos de confrontação armada, pois temos a plena consciência de que temos a responsabilidade de preparar um futuro de harmonia, concórdia nacional e uma nação livre para as futuras gerações”.
Na óptica do MDM, a partilha de informação sobre o perfil e identidade, em termos de origem, dos autores responsáveis e sua motivação, vai galvanizar a nação inteira e mobilizar os moçambicanos para o mesmo objectivo: defesa da integridade territorial. “Por isso, esperam que o Governo seja franco na sua interação porque é uma preocupação nacional e já esta a ter uma dimensão regional”, disse Lutero Simango.
Novos contornos das dívidas ilegais
Outro assunto de destaque na abertura da nona sessão ordinária da AR foi o dos novos contornos das famigeradas dívidas ocultas. É que num passado recente a AR aprovou a inclusão das mesmas na Conta Geral do Estado (CGE), através do voto maioritário da bancada da Frelimo. Entretanto, na sua intervenção Verónica Macamo referiu-se ao papel desempenhado pela AR logo que soube da detenção de Manuel Chang, antigo ministro das Finanças e deputado da “Escolinha do Barulho” pela bancada da Frelimo. Macamo disse que a AR aprovou favoravelmente o pedido do Tribunal Supremo para que a Manuel Chang fosse imposta a medida de coação máxima (prisão preventiva). Macamo acrescentou que a vontade da AR é de serem exclusivamente obedecidas as disposições legais aplicáveis.
Enquanto Margarida Talapa, da Frelimo, disse que o seu partido distanciava-se de todos os seus membros que têm comportamentos desviantes, e que põem em causa a gestão transparente da coisa, Mário Ali, do partido Renamo, defendeu que por existirem rostos como Manuel Chang, Gregório Leão, Ndambi Guebuza e outros, “ não é justo nem honesto que se obrigue todo um povo a pagar dívidas que foram contraídas para fins particulares”. Ali afirmou ser estranho que a administração da justiça estar muito preocupada com a extradição de Manuel Chang para Moçambique, enquanto o antigo presidente da República, Armando Guebuza, ainda nem foi chamado pela justiça. Para a Renamo, não se deve entreter os moçambicanos com detenções aqui e acolá de “peixe miúdo”. Numa outra passagem do seu discurso, o vice-chefe da bancada do maior partido da oposição desafiou a AR para revogar o dispositivo legal que tenta transformar dívidas inconstitucionais e ilegais em dívida limpa na Conta Geral do Estado de 2015, em resposta às inúmeras vozes da sociedade moçambicana que defendem o não pagamento das ‘dívidas ocultas’.
Para Lutero Simango, com os novos desenvolvimentos das ‘dívidas ilegais’ quem está no ‘banco de julgamento’ não são os réus, por culpa do partido que governa desde 1975, mas sim o país. Simango disse que não é ao Chang, Ndambi Guebuza ou ao Gregório Leão que o mundo quer julgar. O mundo globalizado em que vivemos hoje está a julgar o sistema judiciário moçambicano e o seu sistema político.
Responsabilizar autores das dívidas
O MDM reiterou que os responsáveis e os mentores da engenharia financeira das dívidas ocultas, ilegais e não autorizadas pela AR devem ser criminalmente responsabilizados e o Estado moçambicano não deve assumir estas dívidas.
Serão discutidas 30 matérias
A sessão ordinária da AR que arrancou esta quinta-feira (28) decorrerá até 23 de Maio. Nesta reunião do órgão máximo legislativo serão analisadas 30 matérias incluindo Perguntas ao Governo, Informações do Governo, Informação Anual da PGR, Propostas Legislativas (a proposta de Lei para a Eleição dos membros da Assembleia Provincial, Proposta de Lei de tutela do Estado sobre os órgãos de governação, descentralizada provinciais e das autarquias locais), a Proposta de Lei de Organização e Funcionamento das Assembleias Provinciais, entre outras. (Omardine Omar)
Edmundo Galiza Matos Júnior, porta-voz da bancada da Frelimo na Assembleia da República (AR), disse ontem que os responsáveis pelas dívidas ocultas devem ser julgados e condenados exemplarmente como forma de servirem de lição aos demais moçambicanos para não enveredarem por esse caminho da corrupção, “porque corrompendo ou retirando dinheiro do Estado é o próprio Estado e o povo em geral que ficam lesados”.
Galiza Matos Júnior falava numa conferência de imprensa convocada pelo seu partido para arrolar questões ligadas aos preparativos da IX Sessão Ordinária da Assembleia da República que hoje (28) inicia.Segundo o porta-voz da bancada do partido no poder na AR, está-se “na presença de determinados cidadãos que praticaram este acto. Um acto complemento isolado daquilo que é o partido Frelimo. Essas dívidas foram contraídas individualmente por determinadas pessoas que devem ser detidas. Que as nossas instituições de justiça façam o seu melhor, e não escondam nada aos moçambicanos”.
Quando questionado pelos jornalistas se a bancada da Frelimo poderia votar no sentido contrário à sua posição anterior de legalização das dívidas, Galiza Matos argumentou que “todo o trabalho inerente a essa matéria é muito importante e sensível para os moçambicanos. Deve ser feito após as reuniões da bancada parlamentar.
O colectivo da bancada deve reunir-se e debater. Também devem os deputados receber, por parte do partido, orientações para viabilizar ou não qualquer que seja a ideia ou o instrumento ou projecto. A dinâmica do parlamento certamente vai decidir sobre essa matéria”. Perante a insistência dos jornalistas sobre o “Caso Chang”, disse que "a corrupção, seja quem for que a pratica e onde se pratica, ela é nefasta e má”. (Carta)
O Presidente da República, Filipe Nyusi, reuniu-se na manhã de hoje (27), na Presidência da República, com o novo líder da Renamo, Ossufo Momade, num encontro em que os dois passaram em revista a implementação do Memorando de Entendimento sobre Assuntos Militares e delinearam os passos subsequentes visando finalizar o processo de pacificação em Moçambique. Os dois líderes fizeram-se acompanhar pelos respectivos membros na Comissão de Assuntos Militares.
Segundo um comunicado conjunto divulgado horas depois do evento, Nyusi e Momade “congratularam-se pelos avanços no processo de enquadramento efectivo nas FADM de oficiais oriundos da Renamo, na operacionalização do Comissão de Assuntos Militares e Grupos Técnicos Conjuntos que se têm empenhado em acções de planeamento operacional e logístico do DDR, bem como na preparação da documentação pertinente para facilitar o processo”.
Nyusi e Momade mostraram-se “disponíveis em honrar todos os compromissos assumidos no âmbito do Memorando de Entendimento, tendo instruído as suas equipas de trabalho a acelerarem a implementação do cronograma de actividades nele previstas”. O Presidente da Renamo assegurou que serão, em breve, entregues as listas do seu pessoal a integrar na Polícia da República de Moçambique.
Ainda segundo o comunicado, os dois líderes felicitaram aos seus membros na Comissão de Assuntos Militares e Grupos Técnicos Conjuntos pelo profissionalismo, dedicação e espírito de coesão, instruindo-os a manterem esta postura para a execução das tarefas de acordo com os prazos estabelecidos. Neste mesmo encontro houve, também, espaço para os dois chefes apreciarem a colaboração e apoio da comunidade internacional, com destaque para os membros do grupo de contacto”, exortando-os a “manterem-se empenhados e a continuarem a disponibilizar os recursos necessários” para a conclusão “dentro do prazo estipulado conforme a vontade colectiva do Povo Moçambicano”. (Carta)
Mais de dois terços dos africanos consideram a democracia a melhor forma de governo para o continente, revela um estudo do Afrobarómetro sobre 34 países, incluindo Moçambique. O trabalho desta rede de centros de estudos africanos intitulado “Democracia em África: procura, oferta e o democrata insatisfeito” concluiu que, em média, 68% dos africanos estão “fortemente comprometidos com a democracia”, 78% preferem eleições multipartidárias a um regime presidencialista ditatorial, 74% rejeitam um Estado de partido único e 72% um regime militar. No entanto, os dados variam consideravelmente quando se analisa cada país, registando-se uma diferença de 41 pontos percentuais entre os países com os maiores e menores níveis de apoio ao sistema democrático.
A Serra Leoa regista os índices mais elevados de apoio (84%) enquanto Essuatíni (antiga Suazilândia) fecha a lista com os menores (43%). Outros 20 países, incluindo Cabo Verde (70%), registam níveis de apoio ao regime democrático acima da média, enquanto os restantes 14, onde se contam São Tomé de Príncipe (61%) e Moçambique (57%), ficam abaixo. As diferenças entre países acentuam-se mais quando a questão é a rejeição de um regime militar (49 pontos percentuais de diferença), com a Zâmbia a mostrar níveis de rejeição na ordem dos 92% e o Burkina Faso com 43%. Entre os lusófonos abordados no estudo, é em São Tomé e Príncipe que é mais expressiva a recusa de um regime militar com 82%, acima da média de 72% para a globalidade dos 34 países, seguindo-se Cabo Verde com 69% e Moçambique com 53%, ambos abaixo da mesma média.
Mas, a maior diferença entre países (52 pontos percentuais) acontece quando num indicador se cruza o apoio à democracia com a rejeição de qualquer forma de regime autoritário, com a Zâmbia (67%) e a Mauritânia (66%) a liderar a lista dos países que preferem a democracia e rejeitam todas as formas de governo autoritário, percentagem que baixa para 23% na África do Sul e 21% em Moçambique. Em Cabo Verde, o nível para este indicador é de 42%, o mesmo valor que a média dos 34 países, com São Tomé e Príncipe a registar 41%, imediatamente abaixo da média.
O estudo aponta ainda alterações neste indicador registadas entre 2014/2015 e 2016/2018, com 14 países, incluindo Cabo Verde (de 57% para 42%) a registarem reduções importantes na percentagem de pessoas que preferem a democracia e rejeitam qualquer tipo de regime autoritário. Em sentido contrário, Moçambique passou de 9% para 21% a percentagem da população que apoia a democracia e rejeita qualquer regime autoritário. Os dados revelam também a perceção de que a oferta democrática é menor do que a procura, ou seja, as populações têm menos democracia do que a que desejam.
Cerca de 51% considera que o seu país é uma “democracia plena” ou com “problemas menores”, mas apenas 43% se mostram satisfeitos com o seu funcionamento. São os homens, com idade entre 46 e 55 anos, das zonas urbanas e que habitualmente debatem política com amigos e familiares que mais reclamam e apoiam um regime democrático. Entre os entrevistados “a quem nunca falta comida”, 44% mostram uma tendência democrata, enquanto esta percentagem se reduz para 30% entre aqueles a quem “sempre falta sustento”. O Afrobarómetro realiza periodicamente, desde 2000, este estudo com as mesmas questões para tentar perceber a preferência da população relativamente aos regimes políticos. Os dados publicados hoje baseiam-se em 45 mil entrevistas realizadas nos 34 países entre 2016 e 2018. (Lusa)