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quinta-feira, 06 janeiro 2022 14:46

Recordando e homenageando Severino Sumbe

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Para quem não acredita no provérbio segundo o qual a vida dá tantas voltas, eis aqui mais um exemplo, de tantos inacabáveis, das muitas voltas que, de facto, a vida dá. O que é de uma forma hoje, amanhã é outra totalmente diferente, senão, por ventura, o contrário. Verdade de hoje, não verdade ou mentira amanhã!

 

Vamos então. Em 1987, pelas mãos do então director administrativo da Escola de Jornalismo, o poeta Fernando Couto (pai de Mia Couto), e de Leite de Vasconcelos e Orlanda Mendes, na altura director-geral e directora de Informação da Rádio Moçambique, respectivamente, fui parar ao Sector dos Noticiários da nossa estação emissora mãe. A redacção central da Rádio Moçambique - o então coração de informação da estação emissora… hoje, já está desconcentrado, a partir de qualquer província, qualquer programa informativo é produzido e difundido. Na altura, tudo tinha que ir ao crivo da direcção central!

 

Entre as figuras de proa de informação da Rádio Moçambique que encontro na Secção dos Noticiários, dirigida por Tiago Viegas, estão noticiaristas colossos como Armindo Chunguane, Antonio Bernardo Cuna (ABC), Narciso Zandamela, Ramos Miguel, o Dava, a Amélia Muchanga, o Moisés Aide (já falecido, Deus o tenha) e… o Severino Sumbe! O Sumbe era o esteio do noticiário internacional da Rádio, era redactor e editor ao mesmo tempo daquele material informativo.

 

Nessas alturas, ao contrário de como é hoje em dia, as fontes das notícias internacionais eram… complicadas. Recebiam-se telexes a partir de certas agências noticiosas, Lusa, Reuter, Novost e Angop… e outras poucas mais que não me vêm à memória. Depois, havia uma secçãozinha de escutas de certas emissoras mundiais. Aqueles materiais todos, um grande maço de telexes e umas cassetes áudio iam parar às mãos e ouvidos do Severino Sumbe e ele procedia à selecção das notícias que achasse apropriadas e oportunas, depois editava e submetia ao chefe Tiago Viegas para ver e só depois disso é que iam para o ar.

 

Eu, jovem foca, recebia trabalho de todos ali na secção. Mas também do Tiago Viegas, Marcelino Alves e até da própria directora Orlanda Mendes; recebida directamente trabalho e nem tinha como reclamar; mas como um principiante reclamar? Havia ali turnos: o primeiro, das 6 horas até às 13; o segundo, das 13 às 19; e o último, das 19 horas até meia noite. Fazia-se escala rotativa, assim como dos respectivos chefes!

 

Depois de três meses, fui posto também já a fazer turnos. E um dos chefes de turno era Severino Sumbe!... para além do seu trabalho sobre o noticiário internacional, ela coordenava aquele turno em que estivesse, corrigia e editava os textos do turno. E assim tive no Sumbe meu chefe de turno com todas as prerrogativas.

 

Trabalhamos sem stress durante aqueles seis meses! Sumbe era um grande redactor! Homem muito disciplinado, muito rigoroso em tudo, mas não arrogante, nem ditador. Zeloso na pontuação, na linha, no parágrafo, no ponto. Texto conciso, curto, directo, exigências próprias do jornalismo radiofónico. Ele próprio, como pessoa, era uma pessoa rigorosa consigo próprio. Sempre a tempo e horas, aprumado e homem de poucas falas e quase não ria. Muito dedicado ao trabalho.

 

Por razões pessoais, não fiz carreira na Rádio Moçambique. Após fazer o curso médio de jornalismo, em 1988, não voltei à RM, rumei para a Sociedade Notícias, SARL. Entrei pelo jornal Notícias, mas logo fui chegar ao semanário Domingo, onde estive até Fevereiro de 2001.

 

E eis que o Severino Sumbe, passado algum tempo após o meu estabelecimento, se muda da Rádio Moçambique para o semanário Domingo! Pouco depois de ele chegar, há alterações e eu… fico subchefe da Redacção! Chefe de Severino Sumbe, portanto!... o mesmo que tinha sido meu chefe na RM!

 

Confesso que o Sumbe não se importou nada com isso. Trabalhou normalmente, com a sua seriedade, disciplina, rigor e entrega total. Era o primeiro a chegar à Redacção e muitas vezes a entregar o seu texto. E depois, quando passo a chefe de redacção, ele fica adjunto! Nunca em nenhum momento tive problemas com o Chefe Sumbe, como passámos a chamá-lo na saudosa Redacção do jornal Domingo! O rigor e disciplina dele facilitaram bastante o nosso trabalho. Muito colaborativo, nunca deixou nada, mas absolutamente nada por fazer. Muitas vezes até deixava o que estava a fazer para fazer o mais urgente, ou fazia as duas coisas! Mas sempre disponível.

 

Homem de poucas falas, como se disse, nunca se metia em fofocas. Pouco falava nem sobre a sua vida, nem sobre a vida de outros.

 

Foi um grande prazer trabalhar com o Severino Sumbe, aliás, com o Chefe Sumbe! Até sempre, mais velho.

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