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segunda-feira, 06 abril 2020 06:16

O estranho caso de Comiche

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Se for verdade que, de facto, o edil de Maputo, Eneas Comiche, é o primeiro caso curado da Covid-19, então, estamos perante um caso muito estranho que só pode ser explicado pela Ametramo. Só quem assistiu o filme "o estranho caso de Benjamim" vai entender o que está a acontecer. 

 

"O estranho caso de Benjamim" é um filme-drama lançado em 2008, baseado no conto homónimo do escritor Scott Fitzgerald, de 1921. Escrito por Eric Roth e dirigido por David Fincher, o filme foi interpretado por Brad Pitt e Cate Blanchett e conta a história da vida de Benjamin Button, um homem que, com o passar dos anos, vai se rejuvenescendo, enquanto a sua parceira envelhece. Isto é, a vida de Joaquim Button decorria de forma regressiva, do fim para o princípio. Só para começar, ele nasceu com 80 anos. Este filme recebeu 13 nomeações ao Óscar, incluindo "Melhor Filme". 

 

Dizia, se for verdade que Eneas Comiche é o primeiro doente curado da Covid-19 em Moçambique, então, temos aqui também um "estranho caso", onde, pela primeira vez na vida real, estamos a viver com uma pessoa cuja vida é vivida de forma regressiva. Pela primeira vez, temos um curado que nunca foi tratado, porque nunca esteve internado, porque nunca adoeceu. Um indivíduo que, primeiro, é curado e, depois, se infecta. 

 

Tudo o que se sabe até hoje é que, no Palácio da capital, quem está doente é a Primeira Dama. Aliás, que pode até ser paranóia dela, uma vez que ela não recebeu os resultados dos exames médicos realizados no dia 23 de Março juntamente com o seu marido. Portanto, o seu marido (o edil) está a espera de dois resultados dos testes feitos nos dias 19 e 23.

 

Se Eneas Comiche está curado da Covid-19 (repito, se for ele a pessoa curada), então, dentro de dias, vai circular um comunicado - assinado e estampado com carimbo do Conselho Autárquico de Maputo - a comunicar (passe a redundância) que o edil está a ser tratado no ICOR; mais logo vai circular outro comunicado dando conta que o edil acaba de ser internado; em seguida, um outro a dizer que o edil acusou positivo ao teste de coronavírus; dias depois, um comunicado referindo que o governante decidiu ficar em quarentena domiciliária voluntária; depois um outro dando conta que o edil acaba de regressar de Londres e; finalmente, um comunicado anunciando a viagem de Comiche à Londres. Quer dizer, vamos assistir estranhamente a vida de Comiche de frente para trás. 

 

Esta situação só pode não ser considerada estranha num país onde os governantes pensam que comunicação institucional é brincadeira. Onde se pensa que dirigir um departamento de comunicação é fazer fifias. Onde se entende que trabalhar em comunicação institucional é ser especialista em desmentidos. 

 

Conheço alguns colegas que trabalham em comunicação institucional do Estado cuja principal tarefa é comprar bilhetes de espectáculos do director, acompanhar a esposa do director ao salão, comprar comida de cachorro da filha do director, fazer reservas do director nos "escondinhos", arranjar gajas com "matunas" carnudas para o director, cambiar dólares do director na esquina, encobrir boladas do director, e quejandos. Gajos que só sabem imprimir e circular comunicados de imprensa que nem sabem quem escreveu. Ao fim do dia, o departamento de comunicação institucional acaba se transformando em caixa de ressonância e morgue de desmentidos. 

 

Compatriotas, comunicação é ciência. Tem suas teorias, modelos, métodos, metodologias, abordagens, paradigmas, axiomas, etecetera. Vale a pena não comunicar do que comunicar mal. Uma comunicação incoerente cria uma cadeia de comunicações igualmente incoerentes. A má comunicação persegue. Hoje, a capital do país e o seu edil estão reféns da sua incompetência comunicativa. 

 

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