Uma consulta sobre a revisão da Lei da Terra, de 25 anos, foi lançada quinta-feira (16 de julho) pelo presidente Filipe Nyusi. Mas a consulta será controversa, com conflitos burocráticos, políticos e internacionais. A terra é propriedade do Estado e não pode ser vendida ou hipotecada, e os moçambicanos têm o direito de "usar" a terra, de acordo com a constituição moçambicana (art. 109).
Na sua declaração de abertura, Nyusi disse que isso não vai mudar. Essa sempre foi a visão da Frelimo.Mas os EUA e o Banco Mundial vêm pressionando pela privatização de terras há décadas. Isso trará o maior conflito. Moçambique tinha um contrato de 2007-2013 com a Millennium Challenge Corporation (MCC) do governo dos EUA, que inesperadamente não foi renovado pelos EUA, em parte porque a privatização da terra era uma condição e, no final, Moçambique simplesmente recusou. Em Dezembro de 2019, o MCC escolheu Moçambique como país para um novo programa, ainda em negociação, e a privatização da terra certamente será exigida.
A Frelimo está dividida sobre esta questão. Muitos na elite adquiriram terras e estão mantendo-as para vender se a lei (e a constituição) mudarem. Outra questão é que a lei não faz distinção entre terras urbanas e rurais, e já existe um grande mercado ilegal de terras urbanas, pois tecnicamente as casas podem ser vendidas, mas não a terra sob elas.
Finalmente, existe um potencial confronto burocrático / político. Existem dois ministérios e dois principais doadores, os EUA e o Banco Mundial, que concordarão em promover a privatização da terra, mas que agora têm projetos concorrentes em diferentes ministérios. O projeto USAID Speed + é "melhorar a estrutura legal que rege a administração da terra". O projeto Mozland, de US $ 100 milhões do Banco Mundial, inclui um componente de revisão da política nacional de terras.
A maior parte é para um escritório de advocacia moçambicano criar um registo central de títulos de terras que foram emitidos. Isso foi criticado porque rapidamente se tornará desatualizado, e a real necessidade é capacitar as administrações distritais a atualizar e manter um registro de terras local que seria inserido em um registro nacional.
O Presidente deixou claro que a consulta será realizada no Ministério da Terra e do Meio Ambiente. Mas a ministra Ivete Maibase é júnior na hierarquia da Frelimo. Celso Correia, a pessoa mais poderosa do governo, tinha sido Ministro de Terra, Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural, mas no novo governo ele está chefiando um super-ministério, Agricultura e Desenvolvimento Rural - tendo levado o Desenvolvimento Rural com ele quando se mudou. Ele também levou consigo o Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável, com US $ 100 milhões em dinheiro do Banco Mundial no projeto MozLand; Maibase manteve o programa USAID Speed + de US $ 37 milhões, mas termina no próximo mês (agosto de 2020). Assim, ambos os ministérios têm projetos de registo e reforma agrária. Mas na provável luta burocrática e política, Correia tem mais influência política e financeira do que Maibase.
O presidente da Comissão ministerial de Revisão da Política Nacional de Terras, que conduz a consulta, é Andre Calengo, advogado especialista em direito fundiário, que liderou parte do projeto USAID Speed +, e também é chefe (régulo) em Messumba, Lago, Niassa. Outro membro é João Carrilho, ex-vice-ministro da Agricultura e um dos redatores da lei fundiária de 1995. (Joseph Hanlon)
Na autoridade colonial em Moçambique, os régulos eram uma extensão do poder do Estado, eficaz nos seus propósitos, com certa capacidade repressiva. Eram os gestores da terra no nível mais inferior do Estado. A independência, alterou-lhes o “status quo”. Foram negligenciados por seu passado colaborativo com o colonialismo. Mais recentemente “reintegrados” como um instrumento de arremesso político do Estado.
André Calengo é “régulo” herdeiro de Messumba, na região do lago Niassa.
Foi a pessoa escolhida pelo Governo para presidir a reforma da Lei da Terra. A escolha não decorre de nenhuma das situações anteriores. Calengo é um especialista na matéria. Ele explicou à “Carta”, em entrevista ao Coordenador Abilio Maolela, como vai feita a reforma da Lei da Terra.
Leia, a seguir, os excertos da conversa:
Quando é que inicia, efectivamente, o processo de auscultação pública para a revisão da Política Nacional de Terras?
O Presidente fez este apelo de participação de todos e o nosso papel, como Comissão, é atingir maior número possível de cidadãos e/ou grupos sociais de sectores a partir do seu local de residência, de trabalho e demais actividades. Nesta situação de “confinamento”, em que estamos, vamos ter algumas limitações. Por isso, estamos à espera de fazer isso, assim que as condições forem criadas. Portanto, se for em termos de auscultação, através de encontros, teremos de esperar. Mas a auscultação também deve ser feita através de outros meios, como é o caso dos meios de comunicação social (estamos a ir à rádio, à televisão, rádios comunitárias), assim como de plataformas digitais.
Pode explicar-nos porque o cidadão terá de ser consultado, tanto a nível da sua residência, assim como a nível do seu local de trabalho?
Por exemplo, no local de residência, referimo-nos às reuniões do bairro, onde podemos juntar dois a quatro quarteirões para nos receberem e discutirmos o assunto. Mas também queremos ouvir, por exemplo, docentes, jornalistas. Portanto, a este nível falamos de uma consulta no seu local de trabalho. Estes vários espaços têm, de algum modo, a ver com a questão da terra porque jornalistas, enquanto actores, discutem estas questões.
Quanto tempo irá durar o processo?
O processo foi pensado para durar um ano e meio [18 meses]. Por isso, temos todo o tempo para, no momento oportuno, começarmos a fazer as reuniões públicas.
Tendo em conta a sensibilidade do assunto, um ano e meio será suficiente para discutir, em toda a extensão do país, este assunto?
Tendo em conta a experiência, penso que sim. Este debate vem de há 10 anos. Desde a conferência comemorativa dos 10 anos da Lei de Terras, em 2007, que estas questões vêm sendo discutidas, por isso, nesta altura, as questões principais são mais ou menos conhecidas. O que precisamos de encontrar são as soluções e várias das opções possíveis já foram debatidas.
Acreditamos que é tempo suficiente para conduzirmos o processo. A Comissão é composta por 10 membros, mas não está a trabalhar sozinha. Está a criar uma rede de parceiros de auscultação, integrada por Organizações da Sociedade Civil [15] e, em cada província, pelo menos duas integram a rede. Também temos uma rede de parceiros para atingir sectores específicos, por exemplo, o MISA-Moçambique para dialogar com os jornalistas.
Portanto, são parceiros que têm a sua rede de contactos e seus grupos-alvos identificados. Por isso, essa rede permite-nos que, num espaço de três meses, de forma simultânea (se as condições melhorarem), possamos atingir vários grupos. Depois, sistematizamos os debates num período de dois a três meses e, num segundo momento, voltamos a realizar uma nova onda de auscultações públicas durante três meses. Portanto, criando condições logísticas, é possível realizar consultas em sítios críticos.
Será que a Comissão Técnica leva, para o terreno, algumas propostas de revisão ou apenas vai colher opiniões dos cidadãos?
Do discurso do Presidente pudemos retirar uma lista de questões e o papel da Comissão é detalhar esta lista e levá-la para o debate. Portanto, a Comissão vai para o debate já com uma lista de questões. Já identificamos temas e, em cada uma das temáticas, as questões que se colocam. Isto, na primeira fase. Na segunda fase ou ronda de consultas, a Comissão irá levar os ante-projectos da Política Nacional de Terras e da Lei de Terras elaborados, com base nos debates realizados na primeira fase.
O Presidente da República já avançou algumas premissas que poderão nortear os debates e uma delas é de que a terra continuará a ser propriedade do Estado. Gostávamos de saber se isto equivale a dizer que a mesma não será vendida ou haverá uma diferença?
Por acaso, esta é uma das questões que vai a debate. Há vários pronunciamentos, com alguns a dizer que é mesma coisa e outros a dizer que não é a mesma coisa. O que importa, agora, é encontrarmos um consenso em relação a este ponto.
Qual é o entendimento da Comissão?
A Comissão não pode ter uma interpretação. Ela deve captar as interpretações dos cidadãos e tentar sistematizar e transmitir isso ao Governo. O que irá fazer é dizer que, de acordo com aquilo que ouvimos, o que se propõe é isto e, no nosso ponto de vista, como técnicos, achamos que este é o caminho. Mas isto a partir das contribuições dos cidadãos.
A actual Política proíbe a venda da terra, mas na prática ela tem sido vendida...
Esta questão enquadra-se na temática da transmissibilidade da terra e, como deve lembrar-se, o Presidente levantou esta questão. Temos de discutir como é que resolvemos esta questão da transmissibilidade. O nosso papel é irmos escutar: existe uma prática e como ela se concilia com a Lei ou como a Lei se concilia com a prática. Então, eis a questão.
Mas o que estará a falhar neste momento? Será a lei ou a sua implementação? Recordo-me que, em 2017, a UNAC e o OMR organizaram debates, nos quais houve consenso de que havia uma fraca implementação deste instrumento legal.
Há um debate no sentido de que, em alguns aspectos da Lei, a interpretação que se tem da mesma, mesmo entre os juristas, não coincide. Há alguma divergência, o que, de per si, é uma razão para se debater e se encontrar uma interpretação consensual. Temos também outras áreas, em que a Lei pode estar clara, mas a prática é outra. Portanto, a pergunta é: vamos continuar a dizer uma coisa e a prática social ser outra? O que é que falta aqui? É a implementação? Este debate também é para melhorarmos a parte da implementação. Em algumas coisas, eventualmente, o debate vai dizer que o problema é da implementação e devemos melhorar neste e naquele aspecto. O debate não significa, necessariamente, revermos a Lei. O debate é também para reafirmarmos o nosso cometimento ou compromisso com a Lei.
O Chefe de Estado diz que a nova Política Nacional de Terra deve “preencher as actuais lacunas relacionadas à ligação entre o uso e aproveitamento de terra e o acesso aos recursos naturais e a sua exploração sustentável”. Até ao momento, o acesso aos recursos naturais tem-se mostrado um exercício conflituoso, por um lado, porque as comunidades entendem que estão a perder as suas terras a favor do capitalismo selvagem sem uma “compensação justa” e, por outro, pelo facto de não serem envolvidos na gestão destes. Como conciliar estes interesses?
Mais uma vez, esta é a missão da Comissão: ir auscultar. O Governo, tal como as organizações da sociedade civil e outros actores, quando se encontram no Fórum de Consulta de Terras, chegaram à conclusão de que alguma coisa não está certa. Há aqueles que defendem que a Lei deve ser revista e outros dizem que há alguns procedimentos que devem ser revistos. O importante, neste ponto do debate, é que há um reconhecimento claro do Governo de que esta situação não deve continuar; e que, doravante, com este exercício, possamos encontrar uma situação, onde cada projecto implementado represente uma oportunidade para a comunidade. Então, eu o convidaria que daqui a seis ou sete meses possamos sentar e vermos juntos o que está a ser proposto.
O Presidente da República pede também para que se clarifique o conceito de “comunidades locais”. Há quem entende que esta afirmação esteja relacionada ao facto de algumas Organizações da Sociedade Civil “assessorarem” comunidades, sobretudo as afectadas pela indústria extractiva. Será esta a interpretação correcta desta afirmação?
Acredito que, quando o Presidente diz que temos de clarificar (como país) o que é comunidade local, é que a nossa experiência mostra que não há convergência sobre o que é comunidade. Por exemplo, há que perceber como a comunidade se representa e/ou actua nas consultas comunitárias no exercício dos seus direitos. Há um artigo da Lei de Terras que diz que a questão da representação da comunidade será tratada em sede própria, porém, esta Lei nunca foi aprovada e já estamos há mais de 20 anos, desde que a Lei de Terras foi aprovada, e ainda não está esclarecida a questão da representação da comunidade. Outra questão que se coloca sempre que se fala sobre a comunidade, é do exercício de direito sobre parcelas de terras (o papel da comunidade em relação ao meu talhão), pois, há locais comuns. Aliás, o debate tem sido concentrado na comunidade rural, mas também temos de pensar na comunidade urbana.
O Fórum de Monitoria de Orçamento (FMO) defendeu, esta segunda-feira, ter chegado a hora do Credit Suisse indemnizar Moçambique pelos danos causados ao seu povo, decorrente daquele que é tido como o maior escândalo financeiro de que a história recente do país tem registo, as chamadas “dívidas ocultas”.
“É hora de o Credit Suisse compensar os moçambicanos pelos danos causados pelo escândalo financeiro das dívidas ocultas”, refere o FMO, na sua newslatter, intitulada “caminho aberto para o Credit Suisse compensar Moçambique pelos danos causados, publicada esta segunda-feira.
Tal acepção emerge do desfecho que conheceu, recentemente, o caso do escândalo multibilionário da Malásia, que envolveu ex-colaboradores do grupo financeiro americano, o Goldman Sachs Group Inc. O Goldman Sachs, refere o FMO, cintando a Bloomberg, fechou um acordo de 3.9 mil milhões de USD com a Malásia para pôr fim ao escândalo financeiro relacionado com o 1Malaysia Development Bhd (1MDB), que se arrastava há quase uma década.
De concreto, o acordo inclui o pagamento de 2,5 mil milhões de USD e uma garantia de devolução de 1,4 mil milhão de USD em recursos de activos vinculados ao Fundo Soberano 1Malaysia Development Bhd. O acordo prevê ainda a retirada de todas as acções criminais contra aquele banco de investimentos norte-americano.
O acordo é descrito, nos meandros financeiros, como sendo uma grande vitória para administração do Primeiro-Ministro da Malásia, Muhyiddin Yassin, em exercício há quatro meses.
Tendo em conta os desenvolvimentos do caso malaio e o facto de o dossier “dívidas ocultas”, perpetrado por funcionários de topo do Credit Suisse em parceria com governantes moçambicanos, figurando o antigo Ministro das Finanças dos dois mandatos de Armando Guebuza, Manuel Chang, o rosto visível da mega fraude, o FMO entende ter chegado o momento daquele banco suíço indemnizar o povo moçambicano pelos danos socioeconómicos.
Os empréstimos contratados junto daquela instituição financeira, sublinhou o FMO, a par de terem sido ao arrepio da lei, aumentaram os níveis de insustentabilidade da dívida pública e não trouxeram qualquer benefício para o crescimento e desenvolvimento do país.
A plataforma das Organizações da Sociedade Civil considera que o Executivo moçambicano, para além de não realizar os serviços de dívida relacionados com as “dívidas ocultas”, deve fazer diligências junto das autoridades das terras helvéticas para a rápida e exemplar responsabilização daquela instituição financeira.
O Estado Moçambicano, através da Procuradoria-Geral da República (PGR), moveu, recorde-se, em Londres, Reino Unido, um processo judicial contra o Credit Suisse com vista à anulação da dívida de cerca de 600 milhões de USD da PROINDICUS e solicitou uma indemnização que cubra as perdas resultantes do escândalo das famigeradas “dívidas ocultas”.
A acção movida pela PGR visou, igualmente, três antigos funcionários do grupo Credit Suisse, nomeadamente, Surjan Singh, Andrew Pearse e Detelina Subeva, que, tempestivamente, contestaram, rejeitando qualquer acção incorrecta e consideraram que Moçambique não tem direito à compensação.
Um grupo de organizações suíças parceiras do FMO exigiu, recentemente, que o Governo suíço cancele as dívidas dos países pobres e altamente endividados, numa lista em que consta Moçambique.
Há meses, o Ministério Público (MP) moçambicano propôs a dissolução da PROINDICUS, EMATUM e MAM por considerar que a situação de liquidez das três empresas é inferior à metade do capital social. As propostas do MP basearam-se na análise dos relatórios de contas das três empresas, sendo que as mesmas suspenderam as suas actividades por um período superior a três anos.
O Credit Suisse foi um dos principais credores da dívida de cerca de 2,2 mil milhões de USD contratadas em 2013 e 2014, no segundo e último mandato de Armando Guebuza, ocultada à Assembleia da República e aos doadores internacionais. (I. Bata)
Em situação pouco comum, foi adiado, sexta-feira última, o julgamento do caso da auto-proclamada Junta Militar da Renamo, que decorre no Tribunal Judicial do Distrito de Dondo, província de Sofala. A retomada está prevista para daqui a duas semanas.
“Trapalhada” do Juiz da causa, Carlitos Teófilo, no que respeita à convocatória de declarantes (no caso peritos) está na origem do adiamento da sessão de julgamento. O Tribunal havia reservado a passada sexta-feira para ouvir peritos do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC), mas tal não chegou a ter lugar devido à “falta de atenção” daquele magistrado judicial que, ao invés de convocar os do nível central (autores da peritagem), optou pelos de nível local.
A interrupção da sessão aconteceu depois de o perito do SERNIC ter dito, em sede do Tribunal, que não era competente para explicar o conteúdo do processo, precisamente, porque a perícia foi conduzida por técnicos de nível central, ou seja, da Direcção da Nacional.
O juiz Carlitos Teófilo disse que, na verdade, ele é que não leu ao pormenor o cabeçalho do documento, sendo que este faz referência clara à Direcção Nacional do Serviço Nacional de Investigação Criminal, como sendo a entidade que conduziu o processo e, por conseguinte, competente para prestar esclarecimentos em torno da peritagem.
Os peritos do SERNIC foram convocados pelo Tribunal para elaborar sobre o conteúdo constante do processo, entre outros, as mensagens trocadas entre os réus antes de serem detidos, contidas num disco, que são tidas como sendo de vital importância para a descoberta da verdade material.
“Relatório da peritagem é este que tenho aqui. Por acaso, eu é que não fiz questão de ler com pormenor o cabeçalho, mas, na verdade, aqui está a Direcção Nacional do SERNIC, a da técnica criminalística. Significa que a peritagem de alguns documentos que andam por aqui foi feita a nível central. Seria um erro ou se calhar não seriam capazes de poder interpretar o que está nos discos. Portanto, é um contratempo e significa que não temos como, senão fazer uma precatória aos nossos colegas de Maputo para que eles, numa data que nós vamos propor, estejam aqui para nos ajudar a interpretar algumas questões”, disse o juiz Carlitos Teófilo.
No banco dos réus estão sentados seis arguidos. São eles: Sandura Vasco Ambrósio, António Bauaze, Gabriel Domingo, Eugénio Domingos, Aniva Joaquim e Domingos Marime, acusados do crime de conspiração contra a segurança do Estado. Estes são tidos como os indivíduos que municiam a auto-proclamada Junta Militar, a quem as autoridades policiais imputam autoria moral e material dos ataques armados que têm estado a ter lugar nas províncias de Sofala e Manica, ambas na região centro do país.
Na verdade, os sinais de uma desorganização colossal sempre pairaram desde que o julgamento iniciou a 10 de Julho prestes a findar. Para audição tida lugar na última quarta-feira, por exemplo, haviam também sido notificados peritos do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC), para, entre outros, elaborar sobre os contornos da detenção de Domingos Marime, mas estes não compareceram à sessão, alegadamente porque receberam demasiadamente tarde as convocatórias e porque o seu objecto era claro.
A par do adiamento, a semana passada foi marcada pela audição do co-réu Sandura Vasco Ambrósio, antigo deputado da bancada parlamentar da Renamo. Em sede do tribunal, o empresário não fez outra coisa senão negar todas as acusações. Disse não ser o financiador e que nunca recrutou jovens para fazer parte do quadro de pessoal da sua empresa de segurança privada, denominada Mamba, para, seguidamente, engrossar as fileiras daquele movimento dissidente da Renamo.
A narrativa de que teria sido ele (Sandura Ambrósio) quem mandou recrutar jovens para sua empresa foi levada ao Tribunal por António Bauaze, um dos co-réus, também acusado do crime de conspiração contra a segurança do Estado. (Carta)
O Inspector-geral do Ministério dos Recursos Minerais e Energia, Obete Matine, diz haver esquemas de corrupção que levam a Polícia a encobrir o garimpo ilegal no país. Para além da Polícia, Matine diz ainda haver funcionários do Ministério envolvidos na exploração ilegal de recursos minerais.
“O exemplo concreto é que tivemos um técnico do Ministério dos Recursos Minerais e Energia envolvido no esquema de tráfico de pedras de Nhamatanda para Maputo. Essa questão não é apenas de uma instituição, é válida para várias outras, da mesma maneira que quando chegamos em áreas de mineração artesanal e ilegal, encontramos algumas pessoas da Polícia que protegem essa área”, afirmou, em declarações à Rádio Moçambique.
Como forma de acabar com o problema, Matine disse, semana finda, ser urgente combater o tráfico de produtos minerais, um mal que, no seu entender, envolve corrupção, crimes transfronteiriço, contrabando e provoca guerras, como tem acontecido em vários países ricos em recursos minerais.
Para o Inspector-geral do Ministério dos Recursos Minerais e Energia, a introdução de scâneres nas Salas VIP dos aeroportos é outra medida que deve ser tomada para combater o tráfico de produtos minerais no país.
“É uma mensagem cujo controlo toda a pessoa honesta estimula. Eu próprio, Inspector-geral, sou controlado por onde ando. E eu acredito que todas as pessoas que são líderes, lideram por exemplo e não têm medo do controlo ou do estímulo ao controlo para a protecção dos recursos minerais no país”, afirmou Obete.
Com vista a desencorajar a extracção e venda ilegal de pedras preciosas, a Inspecção-geral dos Recursos Minerais e Energia tem também estado a fazer apreensões dos minérios e posterior venda em hasta pública. Na última sexta-feira (24), abateu 3.5 mil kg de diferentes minérios em Quelimane, uma operação que, conforme “Carta” apurou, resultou no encaixe de pouco mais de 600 mil Meticais aos cofres do Estado. (Evaristo Chilingue)
O fracasso em resolver a crescente guerra civil de Cabo Delgado está agora atraindo uma ampla gama de atores que esperam lucrar. E muitos vêm com agendas neocoloniais, racistas e anti-islâmicas, ou tentando usar Moçambique como um peão nos jogos globais de xadrez.
Conforme relatamos abaixo, a França, os Estados Unidos, a África do Sul e muitas empresas militares privadas já estão envolvidas ou desejam participar. Alguns moçambicanos e outros lucram com a guerra ou com os recursos de Cabo Delgado. A população local ganhou pouco com esses recursos. Na falta de esperança ou perspectivas, alguns jovens começaram a atacar os símbolos dessa riqueza e de um estado que protegia os ricos e não os pobres. As pessoas de fora já se juntaram. As empresas de segurança privada protegem as instalações de gás, os mercenários apoiam o governo e os militantes islâmicos apoiam os insurgentes - transformando isso numa guerra na qual indivíduos e instituições ricas são protegidas, e os pobres sofrem ainda mais.
Existem 250.000 pessoas deslocadas e cerca de 700.000 afetadas e que precisam de ajuda. “O mundo ainda não tem ideia do que está acontecendo, por causa da indiferença e porque parece que já nos acostumamos às guerras. Há guerra no Iraque, há guerra na Síria e agora também há uma guerra em Moçambique”, disse o bispo de Pemba, Luiz Fernando Lisboa, na semana passada.
Quantidades crescentes de dinheiro estão sendo gastas militarizando esta guerra e socorrendo os afetados. Se, cinco anos atrás, até parte desse dinheiro tivesse sido compartilhada com os pobres e marginalizados de Cabo Delgado, a guerra nunca teria começado. O ponto de não retorno está sendo passado, onde a única resposta é intensificar a acção militar, criar desesperança e recrutar insurgentes no terreno e impulsionar uma guerra que durará uma década? Ou ainda há uma chance de mostrar aos jovens de Cabo Delgado que eles podem compartilhar a riqueza e os recursos da província e ter um futuro?(Joseph Hanlon)