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Crime

Régio Conrado e Calton Cadeado

Passam dois anos desde que um grupo supostamente composto por 30 homens armados com catanas e armas de fogo atacou, durante a madrugada do dia 05 de Outubro de 2017, postos policiais na Vila-Sede do distrito de Mocímboa da Praia, na província de Cabo Delgado, tendo resultado na morte de dois agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM) e três membros do grupo, de acordo com a informação confirmada, na altura, pelo Comando Geral da Polícia.

 

Após o ataque, houve várias reacções, com destaque para o Comandante-Geral da PRM, Bernardino Rafael, que deu vários ultimatos ao grupo para que se entregasse. Aliás, Bernardino Rafael chegou a apresentar, no princípio dos ataques, alguns indivíduos de diferentes nacionalidades, como estando ligados ao fenómeno.

 

Na ocasião, Rafael estipulou um período de uma semana para que o grupo se entregasse, entretanto, isto não aconteceu e os ataques alastraram-se para os distritos de Nangade, Quissanga, Palma, Macomia, Muidumbe, Mecúfi e Meluco.

 

A par dos supostos autores apresentados por Bernardino Rafael, a detenção, em Setembro de 2018, do empresário sul-africano Andrew Hannekom, acusado de ser um dos responsáveis pela logística e financiamento dos insurgentes, levantou diversas questões na opinião pública. O indivíduo acabaria por perder a vida, em Janeiro deste ano, no Hospital Provincial de Pemba, supostamente vítima de envenenamento, deixando mistérios sobre sua personalidade, pois, o “dossier” foi tratado pelas entidades máximas dos dois países, tendo ficado “trancado a sete chaves”.

 

A outra individualidade que, durante este período, procurou a todo o custo tranquilizar e desdramatizar a situação foi o Ministro da Defesa Nacional (MDN), Atanásio M’tumuke, que sempre disse que tudo estava controlado. Entretanto, nas últimas semanas, o governante mudou de discurso, chegando a pedir ajuda externa para “eliminar todos os malfeitores (insurgentes)”.

 

A situação acentuou-se quando, nos últimos dias, bases das Forças de Defesa e Segurança (FDS) foram atacadas e mortos vários militares e civis nos distritos de Macomia e Mocímboa da Praia. Devido à situação, o Chefe de Estado e Comandante-em-Chefe das FDS, Filipe Nyusi, defendeu que “estamos a sofrer uma invasão camuflada” e que “já é momento de colocar um ponto final”. A posição foi reforçada pelo Chefe do Estado-Maior General, Lázaro Menete, que reconheceu estarmos diante de uma situação de guerra.

 

Coincidentemente, dias depois, o país recebia três helicópteros do modelo MI-17, oriundos da Síria, supostamente através dos “irmãos russos” que, segundo apurámos, já se encontram no território nacional a apoiar técnica e taticamente o exército moçambicano. Mesmo com estes factos, os ataques não param e a 05 de Outubro de 2019 completar-se-ia dois anos de insurgência ou “invasão camuflada”, que já matou centenas de pessoas, entre civis, militares e membros do grupo desconhecido, para além da destruição de propriedades e bens privados e públicos. Nos últimos dias, tem-se relatado ameaças de ataques aos postos de votação no próximo dia 15 de Outubro.

 

Face a este cenário, “Carta” procurou os académicos Régio Conrado, Doutorando em Ciências Políticas e Calton Cadeado, docente universitário, para perceber o que estará por detrás das acções bárbaras que se verificam na província de Cabo Delgado. Entre os aspectos arrolados no debate, destacamos os factores que influenciam aquela violência, os possíveis interesses, o significado da suposta presença de militares russos em Cabo Delgado, o papel do Estado moçambicano no combate a este fenómeno e o futuro da província de Cabo Delgado e do país, no geral.  

 

 

Factores da violência extrema

 

Para o pesquisador Calton Cadeado “não há uma resposta única para este fenómeno”. A fonte explica: “quem analisa as questões de segurança diz que não devemos ser adeptos do factor único para explicar aspectos de segurança, sobretudo, quando estamos em período de confrontação, envolvendo violência”.

 

Citando a pesquisadora de conflitos Mary Caldon, que estuda “novas e velhas guerras”, o docente universitário defende que nas “novas e velhas guerras” é difícil verificar o limite entre o crime organizado e o terrorismo.

 

“Estamos a falar, por exemplo, de um actor que você diz que é um terrorista, mas também pode ser um mercenário, também pode ser um agente do crime organizado, então, há uma miscelânea de factores que estão envolvidos neste tipo de situações”, argumentou o docente da Universidade Joaquim Chissano, antigo Instituto Superior de Relações Internacionais.

 

Entretanto, o nosso entrevistado diz ser difícil transportar esta teoria para realidade moçambicana, pois, “não sabemos quem são estes actores”. “Há nomes que estão a circular, mas não sabemos quem são estes actores para vermos se ele é um terrorista, se é um mercenário, se é um agente do crime organizado, se é um drop dillerarm diller”, explica a fonte, sublinhando que, neste momento, o grupo pode ser qualquer coisa (terroristas, mercenários, garimpeiros ilegais ou mesmo de insurgência militar).

 

Por isso, para o académico, o debate deve começar com a seguinte questão: que fenómeno é este? Face a questão, o pesquisador recorre a outro estudioso de conflitos e segurança para compreender o fenómeno (Patrice Chaball, que desenvolveu a teoria da instrumentalização da desordem) para, novamente, perguntar: quem teria interesses em fazer a instrumentalização da desordem?

 

Cadeado sublinha que a grande surpresa deste grupo é o facto de não mostrar cara, passados dois anos de ataques e decapitações, pelo que, “pode ser terrorismo, guerra civil, insurgência ou qualquer coisa”, pelo facto de ninguém saber o que está a acontecer naquela província do norte do país. A isto, a fonte chama de “surpresa estratégica” porque a sociedade, o Estado e os estudiosos foram pegos de surpresa com a forma de agir do grupo.

 

Cadeado lembra que o Ministério da Defesa Nacional (MDN), os Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE) e a Polícia da República de Moçambique (PRM) fizeram diversos estudos para perceber certas dinâmicas nas fronteiras nacionais, mas ninguém imaginava que, passado algum tempo, o país iria sofrer ataques de “pessoas sem rosto”.

 

Tal como Calton Cadeado, o Doutorando em Ciências Políticas, Régio Conrado, cuja tese de doutoramento tem como enfoque as províncias de Niassa e Cabo Delgado, defende ser errado associar a questão da violência extrema em Cabo Delgado a um e único factor, mas sim deve ser associado a uma extensa lista de razões, em que constam as fracturas de ordem social, económica, política, cultural, que estão a ser negligenciadas por determinados sectores do poder a nível de Moçambique.

 

Por outro lado, o académico busca a experiência dos outros países para defender que a exploração dos recursos naturais atrai vários males, pelo que Moçambique está na “linha da mira”.

 

Para Régio Conrado, se a pobreza fosse o único factor, “porquê a província de Niassa, que é a mais pobre e excluída do país, não está a viver a mesma situação?”, questiona, sublinhando haver fracturas internas estruturantes que exigem algumas cautelas na abordagem do fenómeno.

 

Segundo Conrado, a insurgência não é um movimento qualquer e que existem várias fragilidades no país, sobretudo, no que concerne ao controlo de fronteiras, uma vez que o país é vizinho da Tanzânia, que faz fronteira com o Quénia e República Democrática do Congo, que vivem fenómenos similares nos seus territórios.

 

Outro elemento chamado ao debate pelo nosso entrevistado é o facto de a religião muçulmana ser praticada há vários séculos no nosso país, mas sem nunca se ter registado qualquer violência entre os praticantes desta e de outras religiões, assim como conflitos envolvendo fiéis do Islão, em Moçambique.

 

Para Conrado, passados estes dois anos sem que o grupo se tenha revelado e emitido suas posições e, em contrapartida, aparecer organizações internacionais terroristas reivindicando ataques, demonstra que o grupo tem uma origem externa e que o governo deve mudar de abordagem e procurar novos elementos para perceber o fenómeno, uma vez que estão a matar civis e militares, o que demonstra que o grupo tem objectivos que precisam ser apurados.

 

 

Interesses por detrás da insurgência

 

Neste ponto, Régio Conrado entende que existem vários interesses geopolíticos relacionados com o facto de Moçambique ser epicentro de recursos minerais e energéticos, facto que leva o país a estar na “mira” de diversos interesses económicos e políticos.

 

“Esta hipótese pode atrair instabilidade, uma vez que as multinacionais, quando vêm, trazem empresas de segurança compostas por militares e mercenários para garantir os seus interesses e pelos países envolvidos na exploração dos hidrocarbonetos. Caso algumas empresas sejam rejeitadas, podem financiar estes grupos extremistas, porque os mesmos são experientes na ‘economia de guerra’ e podem usar este elemento para impedir que Moçambique dê um boom”, defende Conrado.

 

Já Calton Cadeado entende que existem objectivos políticos, económicos e ideológicos, entretanto, estes estão ocultos. Para Calton Cadeado, mesmo com as fragilidades do Estado (fraca presença em alguns locais, falta de recursos humanos qualificados, materiais e infra-estruturas), nunca houve ataques. Por isso, questiona: “Porquê agora? Porque estes ataques começaram agora que Moçambique descobriu recursos minerais?”

 

A esta perspectiva, Cadeado avança que podem existir duas dimensões, uma associada ao garimpo ilegal, que após o governo reforçar o controlo sentiram-se frustrados e estão a retaliar e outra ligada a “teorias de conspiração”, como é o caso da existência de empresas internacionais privadas de segurança com interesses de garantir a protecção dos investimentos, mas com as quais o Estado moçambicano não quis trabalhar.

 

“Uma vez que as multinacionais de hidrocarbonetos sempre trabalham em paralelo com as empresas de segurança privada e que podem estar a usar a violência para determinar a incapacidade do Estado, ou seja, passar um atestado de incompetência ao Estado para, posteriormente, virem propor-se para acabar com o fenómeno”, explica o académico.

 

Questionado quem seriam os maiores interessados na desestabilização de Cabo Delgado, Cadeado respondeu tratar-se hipoteticamente de mais uma teoria de conspiração. Sustentando a sua afirmação, o nosso entrevistado questiona o facto de, constantemente, o Estado Islâmico emitir comunicados, reivindicando a autoria dos ataques e os serviços secretos norte-americanos e italianos, até aqui, não terem reagido. Explica a fonte que estes países têm interesses fortes naquela região e os seus serviços secretos não se preocupam em verificar a autenticidade das mesmas, sabendo-se que sempre que aquele grupo emite um comunicado, a secreta destes países faz uma análise detalhada dos comunicados.

 

O académico lembra que não é novidade que as empresas de segurança privada norte-americanas e italianas manifestaram interesse em garantir a protecção dos investimentos, mas que não houve um avanço por parte do Estado. Recorda ainda que onde há uma empresa multinacional de hidrocarbonetos, há sempre uma empresa privada de segurança e que muitas delas são de antigos quadros dos serviços secretos ou dos exércitos dos respectivos países.

 

Eric Prince e Yevgeny Prigozhin

 

Significado da suposta presença de tropas russas em Cabo Delgado

 

Relativamente ao significado da suposta presença de militares russos em Cabo Delgado, Régio Conrado afirmou que a escolha da Rússia é bem-vinda, dada a experiência militar daquele país do leste europeu, que, na sua óptica, demonstrou isso na Síria, quando o Estado Islâmico demonstrava ter vencido o Governo de Bashar al-Assad, tendo melhorado a situação com a sua intervenção.

 

Para Conrado, a situação iria se complicar caso o governo escolhesse a França, porque esta já demonstrou a sua forma de actuação em países como a República Centro Africana (RCA) e Mali, onde a violência atingiu níveis elevados com a sua intervenção.

 

Conrado defende ainda que as FDS não estão suficientemente preparadas e modernizadas e sublinha que “nenhum país, hoje no mundo, é capaz de vencer, sozinho, uma insurreição radical”, pelo que os moçambicanos não se devem preocupar com as parcerias que o governo faz, mas sim nos resultados.

 

Conrado faz lembrar que o grupo que fustiga Cabo Delgado vem usando a tática da guerrilha, usada pela Renamo na guerra dos 16 anos, pelo que “a aposta do governo (pela Rússia) é de salutar”.

 

Por sua vez, o pesquisador Calton Cadeado diz que a se confirmar a presença russa, em Cabo Delgado, será uma estratégia de contrabalançar o poder para que não se dê o monopólio ao ocidente, uma vez que os russos estão com uma política um pouco “agressiva de retorno à África”, que mais do que a vertente económica e política, também passa por treinar Forças Especiais, como se registou em certos países africanos (como é na República Centro Africana).

 

Cadeado lembra que existem fortes laços históricos entre os dois países, desde os tempos da luta de libertação, para além da experiência russa no combate ao terrorismo na Chechénia, assim como eles também têm interesses na bacia do Rovuma. Entretanto, defende que o Estado moçambicano tem uma perspectiva de diversificação de parcerias para fazer mais amigos, daí ter optado pelos russos para garantir a defesa e segurança no norte.

 

Papel do Estado e o futuro de Cabo Delgado e do país

 

Para Régio Conrado, a responsabilidade primária do Estado não devia ser de alarmar as pessoas, mas sim garantir a serenidade da população e, nesse caso, entende o académico, o Estado saiu-se bem.

 

“Agora, o Estado deve reforçar as fronteiras devidamente, assim como os ataques, de hoje em diante, devem ser feitos de fora para dentro, uma vez que alguns insurgentes vêm de outros países”, considera Conrado.

 

De acordo com Conrado, a comunicação deve ser eficaz com as populações e, enquanto se combate, é importante que se criem mecanismos de desenvolvimento inclusivo a nível daquela região e não só, para além de fazer de tudo para vencer este movimento.

 

No entender de Conrado, não deve haver “sentimentalismo” no combate contra este tipo de movimentos, por isso o governo deve ter uma reacção agressiva, séria, rigorosa e contínua para vencer este grupo. No entanto, Conrado defende que os moçambicanos não devem estar preocupados com as parcerias, mas, sim, com os resultados político-militares.

 

 

Por seu turno, Calton Cadeado defende que, a partir das últimas declarações do Presidente da República, de que estávamos diante de uma invasão camuflada e as do Chefe do Estado-Maior General, de que estamos perante um estado de guerra disfarçado, a abordagem deve ser ofensiva, uma vez que, desde 2017, a abordagem do Estado foi mais reactiva ou defensiva.

 

O académico espera que, a partir das últimas reacções, o Comando Operativo, sediado em Cabo Delgado, não dependa tanto das decisões de Maputo, mas ganhe mais poder para agir nas referidas zonas de ataque e, relativamente à presença russa, faz lembrar que o Estado tem legitimidade de contratar e cooperar com quem bem entender. (Omardine Omar)

Entre as 03 a 05 horas desta terça-feira (01 de Outubro), a aldeia Nantodola, no distrito de Mocímboa da Praia, província de Cabo Delgado, registou o rapto de cerca de 20 pessoas, entre mulheres e crianças.

 

Os detalhes da operação são escassos, mas fontes contam que durante o ataque os insurgentes queimaram 10 casas, porém, não se observou o pior, graças à intervenção das Forças de Defesa e Segurança (FDS).

 

Fontes locais relatam um cenário de horror e medo, com várias casas desabitadas num raio de 30 km, porque alegadamente os insurgentes, nas suas novas incursões, ameaçam atacar os postos de votação no dia 15 de Outubro, caso se insista em realizar o escrutínio nos referidos locais.

 

Esta situação comprovou-se ao longo de toda a segunda-feira (30 de Setembro), quando os insurgentes deslocaram-se às aldeias de Rua-rua, Nguri e Natibo, onde incendiaram várias casas e, na tarde desta terça-feira (01 de Outubro), foram à aldeia Mungue, onde fizeram o mesmo acto. A estratégia passa por incendiarem casas nas aldeias abandonadas para desencorajar o regresso das populações.

 

O outro distrito que voltou a ser atacado quando eram 05 horas da passada segunda-feira (30 de Setembro) foi o distrito de Muidumbe, concretamente, os povoados de Namatil e Samala, no Posto Administrativo de Chitunda, na localidade de Meangueleua. Na ocasião, os insurgentes queimaram várias casas, apoderaram-se de produtos alimentares, levando a população a abandonar os locais.

 

De salientar que o Estado Islâmico voltou a emitir, nesta terça-feira (01 de Outubro), a 11ª reivindicação dos ataques e fontes da secreta falam da existência de sete células do grupo de insurgentes actuando ao longo dos distritos a nordeste de Cabo Delgado. (Omardine Omar e Paula Mawar)

Apesar da falta de confirmação por parte das autoridades moçambicanas e russas, fontes não autorizadas a nível das Forças de Defesa e Segurança (FDS), assim como pesquisadores independentes sobre a matéria, confidenciaram à “Carta” que Moçambique recebeu diverso material bélico para fazer face aos ataques que ocorrem na província de Cabo Delgado, desde o passado dia 05 de Outubro de 2017, tendo já produzido um número indeterminado de vítimas humanas, entre insurgentes, civis e militares.

 

As fontes ouvidas pelo nosso jornal revelaram-nos que o Antonov An-124, pertencente a Russian Air Force, com o registo RA-82038, saiu no passado dia 24 de Setembro da Síria com destino a Moçambique, tendo aterrado no Aeroporto Militar de Nampula no passado dia 25 de Setembro. Aliás, contrariamente ao que “Carta” e outros órgãos de comunicação social avançaram, a descarga do material aconteceu no Aeroporto Militar de Nampula e não Internacional de Nacala. Também está em curso um exercício titânico da inteligência para descobrir quem difundiu as imagens.

 

Entretanto, nossas fontes revelaram-nos que o Antonov An-124 transportava três helicópteros russos do tipo MI-17, que foram prontamente distribuídos por algumas áreas estratégicas para o controlo e combate aos insurgentes. De acordo com a fonte, um helicóptero foi destinado ao distrito de Palma, onde se encontram os mega-projectos de gás e uma das mais afectadas pela insurgência. Outro foi alocado à base militar de Mueda, onde estão concentradas as operações militares. O terceiro está no Quartel Regional de Nacala-Porto.

 

 

Refira-se que o material chega num período em que o governo moçambicano endurece o discurso em relação ao combate a este fenómeno, com o Presidente da República a pedir o ponto final à situação e o Ministro da Defesa Nacional a falar da eliminação do grupo, que só no presente mês já realizou mais de 10 incursões, em distritos como Macomia, Palma, Muidumbe e Mocímboa da Praia, tendo assassinado mais de 30 civis e militares.

 

Embora haja cepticismo quanto à intervenção do Estado Islâmico nos ataques, o facto é que a organização terrorista tem emitido comunicados em algumas plataformas, Twitter e Telegram, reivindicando os ataques e exibindo armamento bélico supostamente roubado às FADM.

 

Sublinhar que as aldeias Milamba, Pequeue, Natugo 2, Gaza, Namaneco e Mitacata, no Posto Administrativo de Quiterajo, Nagulue, Simbolongo e Nambija 2, no Posto Administrativo de Mucojo, todas localizadas no distrito de Macomia, aos poucos vão se tornando zonas fantasmas, devido à retirada da população. (Carta)

Dois dias depois de o Presidente da República e Comandante em Chefe das Forças de Defesa e Segurança (FDS) ter reconhecido a gravidade do drama que se vive na zona norte da província de Cabo Delgado e, consequentemente, exigido aos oficiais das forças estatais a adopção de novos métodos para lidar com o fenómeno, as FADM receberam, na manhã desta quinta-feira, equipamento militar proveniente da Federação Russa.

 

Um cargueiro russo foi fotografado, na manhã de ontem, a descarregar material bélico (com destaque para armas de grande calibre e munições) no Aeroporto Internacional de Nacala, na província de Nampula.

 

Não há informações sobre a operação, entretanto, fontes da “Carta” garantiram que o material, que foi retirado da aeronave pela Trans Ruccs Phoenix, empresa de transporte de carga pertencente a Rui Chong Saw, ex-Edil de Nacala-Porto, foi de seguida transportado por um Antanov da Força Aérea moçambicana para a província de Cabo Delgado, onde desde 05 de Outubro de 2017, um grupo ainda não identificado aterroriza os distritos de Macomia, Mocímboa da Praia, Palma, Nangade, Quissanga, Muidumbe e Mecúfi.

 

O Ministério da Defesa Nacional (MDN) diz não saber nada sobre o assunto. Contactado pela “Carta”, o porta-voz do Ministério, Custódio Massingue, disse ser uma novidade que o país recebeu um apoio militar russo.

 

O cargueiro russo chega ao país um mês depois de o Governo ter aprovado, em sessão de Conselho de Ministros, a resolução que ratifica o acordo sobre entrada de navios militares da Rússia nos portos nacionais, um acordo assinado em Abril de 2018, entre os Ministros da Defesa Nacional, Atanásio M’tumuke, e da Rússia, Sergei Shoigu. Na ocasião, a porta-voz do Governo, Ana Comoane, disse que o acordo visava combater a pirataria, mas sem clarificar o tipo de pirataria.

 

Entretanto, fontes ligadas ao processo explicaram ao nosso jornal que o material não é proveniente das Forças Militares Russas, mas sim de um grupo de mercenários daquele país do Leste Europeu, denominado “Grupo Wagner”, uma empresa militar privada daquele país, que actua em várias regiões pelo mundo, principalmente no leste da Ucrânia e na Síria.

 

De acordo com as fontes, o Grupo já se encontra no país há pouco mais de um mês e encontra-se baseado em três quarteis da zona norte, nomeadamente Nacala (Nampula), Macomia e Mueda (Cabo Delgado). As fontes asseguraram ainda que, contrariamente ao que foi posto a circular, há dias, de que os referidos militares estariam na “linha do fogo”, estes encontram-se nos quarteis a dar auxílio técnico-táctico às forças moçambicanas. (Carta)

É um cenário de terror, desespero total e de “Deus nos acuda!”. Fontes da "Carta" contam que já não há pessoas na aldeia Mbau, no Posto Administrativo com mesmo nome, no distrito de Mocímboa da Praia, que geograficamente faz limite com o Posto Administrativo de Quiterajo, no distrito de Macomia, onde há sensivelmente 15 dias foram assassinados oficiais da Forças Defesa e Segurança (FDS).

 

O facto é que entre as 19 horas da passada segunda-feira (23 de Setembro) e as 01 hora da madrugada de terça-feira (24 de Setembro), a população daquela aldeia viveu um autêntico terror, fruto de 07 horas de intensos ataques, que resultaram na morte de 15 pessoas, conforme garantiram fontes da “Carta”, naquele ponto do país.

 

As fontes relatam que aquela segunda-feira parecia mais um dia normal, como eram os últimos, mas tudo mudou quando os insurgentes entraram, num momento em que a maior parte das vítimas encontrava-se num ambiente descontraído, consumindo bebidas alcoólicas e escutando música. Fontes relatam que, à sua chegada, os “insurgentes” cercaram as pessoas que se encontravam no seu “ambiente de festa”, na sua maioria jovens.

 

Conforme explicaram à nossa reportagem, durante o a incursão àquela comunidade houve uma troca de tiros entre as FDS e os insurgentes, mas devido a “operação” montada pelos insurgentes, que se acredita que tinham mais homens e artilharia pesada que as FDS, não houve como evitar o pior.

 

A fonte disse à "Carta" que, após a chacina, os insurgentes voltaram a atacar a mesma aldeia na manhã do dia 24 de Setembro, pelas 09 horas, tendo saqueado produtos alimentares nas barracas daquela aldeia. Contam ainda que o grupo incendiou as barracas e algumas casas daquela aldeia e a sede do partido Frelimo, naquele Posto Administrativo.

 

“Carta” soube ainda que, devido a clima de medo instalado naquela região do país, os residentes daquela aldeia decidiram abandonar o local, como nas outras aldeias dos distritos de Macomia, Muidumbe e Palma, deixando naquele Posto Administrativo apenas os agentes das FDS e algumas autoridades locais.

Duas mortes em Muidumbe

 

Fontes da “Carta” contam ainda que, na mesma segunda-feira, houve um ataque no distrito de Muidumbe, concretamente na povoação de Limala, Localidade de Muenguela, onde dois homens de idades compreendidas entre 28 e 30 anos de idade foram surpreendidos e decapitados pelos insurgentes, quando se encontravam na sua machamba. O ataque, de acordo com as fontes, ocorreu por volta das 10 horas.

 

Situação similar aconteceu na manhã do dia 20 de Setembro, sexta-feira, na aldeia Ncumbi, a 20 Km da vila de Palma, onde um homem é dado como desaparecido, após ter saído de casa supostamente a procura da sua esposa que também era tida como desaparecida, mas que acabou voltando à casa. Segundo as fontes, a esposa do desaparecido terá saído na companha de amigas (10 no total, incluindo ela) para descascar mandioca seca e, devido a sua demora, o indivíduo saiu para procurá-la, não tendo voltado mais para casa.

 

Perseguições e detenções em Macomia

 

Outra situação relacionada aos ataques, que foi reportada à “Carta”, é das alegadas detenções e perseguições de supostos empresários, Sheiks e familiares de pessoas que, alegadamente, têm ligações com os insurgentes. De acordo com as fontes, no passado dia 19 de Setembro, quinta-feira, um cidadão que exerce as profissões de alfaiate e guarda de segurança, natural de Mitacata, em Quiterajo, distrito de Macomia, foi detido durante a calada da noite pela Unidade de Intervenção Rápida (UIR), quando se encontrava no seu posto de trabalho. Não há detalhes sobre a sua detenção, mas aventa-se a possibilidade de ter ligações com os insurgentes.

 

A UIR também tentou deter, mas sem sucesso, o Sheik Sujai Aifa, pertencente a mesquita "Alfurkan". A detenção não aconteceu porque, no referido dia, o mesmo encontrava-se na cidade de Pemba. Fontes afirmam que o Sheik está na lista das FDS, alegadamente por ser financiador dos insurgentes, por um lado e, por outro lado, porque alguns dos membros do grupo foram alunos da sua madrassa (escola de formação islâmica).

 

Ainda em Macomia, fontes garantem que no passado dia 18 de Setembro, seis pessoas foram detidos pelos agentes da UIR por alegadamente estarem em conluio com os insurgentes. (Omardine Omar e Paula Mawar)

O clima de instabilidade militar, que se apossou da província de Cabo Delgado, região norte do país, completa, no próximo dia 05 de Outubro, dois anos. Foi, precisamente, na madrugada do dia 05 de Outubro de 2017 que indivíduos empunhando armas brancas e de fogo irromperam o distrito de Mocímboa da Praia adentro, tendo, na sequência, assassinado, ferido, ligeira e gravemente, e destruído residências e edifícios públicos.

 

Para já, um dado salta à vista. As Forças de Defesa e Segurança (FDS) continuam sem encontrar o antídoto para debelar e, quiçá, colocar um fim à matança que se assiste naquele ponto do país, cuja realidade, no terreno, tende a deteriorar-se.

 

Só nos últimos 20 dias, “Carta” contabilizou um total de 10 ataques, todos protagonizados, tal como refere a população local, por indivíduos inspirados no radicalismo extremo.Esta terça-feira (23), num encontro que manteve com oficiais superiores das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), por ocasião da celebração dos 55 anos da sua criação, o Presidente da República, Filipe Nyusi, voltou a abordar a intricada e cada vez mais complexa situação daquela província do norte do país, vista como a futura solução para as deficitárias contas públicas, quando arrancar, em 2023, a exploração do Gás Natural Liquefeito (GNL) na Bacia do Rovuma.

 

Desde que iniciaram os ataques em Outubro de 2017, os insurgentes visaram os distritos de Mocímboa da Praia, Palma, Macomia, Nangade, Quissanga, Meluco, Muidumbe e Mecúfi. Até ao momento, os distritos de Mueda, Namuno, Metuge, Balama, Chiúre, Ancuabe, Montepuez, Pemba e Ilha do Ibo figuram da lista dos que ainda não foram alvo dos insurgentes.

 

O Presidente da República e Comandante em Chefe das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) reconheceu as dificuldades em colocar um ponto final no terror que se vive naquela província nortenha do país. Filipe Nyusi centrou, desta vez, a sua abordagem no facto de a situação já ir tarde demais e que os oficiais deviam adoptar novos métodos para lidar com a mesma.

 

É sim, tal como disse o Comandante em Chefe, chegado o momento de colocar um ponto final à situação que se vive em Cabo Delgado, pelo que deve figurar no topo das prioridades.

 

“Já está a ser tarde para cuidar deste assunto e, se for preciso, voltem à preparação”, de modo que a resposta “não seja na base da politização das Forças Armadas de Defesa de Moçambique, mas sim na base de competência de comando”, anotou Filipe Nyusi.

 

Ontem, durante as celebrações do 25 de Setembro, dia das Forças Armadas, o Presidente da República voltou a abordar o assunto. Depois de depositar uma coroa de flores em memória aos heróis nacionais, Filipe Nyusi destacou que tudo deve ser feito para desmantelar os focos de instabilidade.

 

“Temos de tudo fazer para desmantelar esses focos”, disse o Chefe de Estado, garantindo estar “mais do que claro que estamos a ser vítimas de uma invasão camuflada”.

 

E para combater os ataques, o Ministro da Defesa Nacional, Atanásio N’tumuke, pediu na terça-feira o apoio de parceiros internacionais que, na sua óptica, pode ser materializado, através de trocas de informações pontuais e estratégicas entre várias FDS.

 

Refira-se que, desde que iniciaram os ataques a 05 de Outubro de 2017, pouco mais de três centenas e meia de pessoas já perderam a vida. (Carta)

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