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quarta-feira, 14 abril 2021 07:10

Sobre a destruição de dunas primárias na praia de Chongoene: investigação deve ir até às últimas consequências

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Nos dias 8 e 9 de Abril correram informações com registo fotográfico e de vídeo sobre a violação do direito do ambiente por via da destruição de dunas primárias na Praia de Chongoene por uma determinada empresa chinesa, denominada DINGSHENG MINERALS.

 

No dia 09 de Abril corrente, o Conselho dos Serviços de Representação do Estado, por via do SERVIÇO PROVINCIAL DE INFRA-ESTRUTURAS emitiu uma notificação sobre o assunto epigrafado direcionada à DINGSHENG MINERALS, a ordenar a imediata e incondicional interrupção das obras em curso no local, até a regularização de todo o processo nos termos legalmente estabelecidos. No entanto, não se percebe até que ponto é possível regularizar-se algo ilegal.

 

Aliás, na sua notificação, a SERVIÇO PROVINCIAL DE INFRA-ESTRUTURAS deixou claro que a DINGSHENG MINERALS não possui qualquer licença ou autorização legal para as obras em questão, que consistem na abertura de uma via de acesso (estrada) para a Praia de Chongoene, o que é grave e preocupante.

 

Ora, curiosamente, sob o lema “Por um Judiciário Protector do Meio Ambiente”, teve lugar, a tradicional abertura solene do ano Judicial, referente ao ano de 2021.

 

A protecção do meio ambiente foi o símbolo escolhido pelo judiciário como uma questão prioritária a salvaguardar e essa escolha não foi ao acaso, mas resultado da tomada de consciência da degradação ambiental, sobretudo pela acção humana, num contexto de arbitrariedades, corrupção e impunidade.

 

Na sequência, a Procuradora-Geral da República (PGR) referiu no discurso, entre outros aspectos, o seguinte:

 

  • Com o lema desta efeméride queremos assumir o nosso comprometimento do reforço das acções tendentes a prevenir e combater energicamente as agressões ao meio ambiente, que são, em última análise, agressões à humanidade.”;
  • “… devemos olhar para o papel do judiciário na protecção do meio ambiente, não apenas na perspectiva da preservação de espécies de fauna e flora, da exploração de recursos naturais, ou da protecção contra as diversas formas de poluição, mas também da protecção primária dos direitos fundamentais dos cidadãos.”

 

  • “São crimes muitas vezes cometidos por grupos organizados, com recurso a esquemas de corrupção e falsificações, constituindo verdadeiros cartéis do crime organizado.”

 

  • “O Ministério Público, enquanto um instrumento legal do Estado colectividade, ao qual incumbe garantir a observância da legalidade e exercer a acção penal, não vai vacilar na missão de, em conjunto com o seu órgão auxiliar, o Serviço Nacional de Investigação Criminal, investigar e instruir os processos-crime que culminem na submissão dos prevaricadores, sejam quais forem, à justiça penal.”

 

A questão da destruição de dunas primárias na praia de Chongoene pela DINGSHENG MINERALS faz lembrar os compromissos assumidos aquando da abertura do ano judicial de 2021. Onde está a PGR e o Governo de Moçambique perante tamanha arbitrariedade e violação do meio ambiente? Como foi possível chegar a essa situação?

 

De lembrar que ainda na mesma abertura do ano judicial, Sua Excelência Carlos Agostinho do Rosário, Primeiro-Ministro, em Representação de Sua Excelência Filipe Jacinto Nyusi, Presidente da República de Moçambique, referiu no seu discurso que: “O Estado moçambicano, através do Governo e outros órgãos, está comprometido em ir de encontro com a sua obrigação de garantir o equilíbrio ecológico e a protecção do meio ambiente visando o bem-estar colectivo.”

 

A sociedade está indignada com este facto da destruição de dunas primárias na Praia de Chongoene pela DINGSHENG MINERALS e precisa compreender os contornos deste caso, bem como as acções concretas em prática para a efectiva e almejada salvaguarda do meio ambiente ora em destruição.

 

DA MATÉRIA DE DIREITO:

 

O ambiental é um direito fundamental que está consagrado no artigo 90 da Constituição da República de Moçambique nos seguintes termos:

 

  1.          “Todo o cidadão tem o direito de viver num ambiente equilibrado e o dever de o defender.”
  2.          “O Estado e as autarquias locais, com a colaboração das associações de defesa do ambiente, adotam políticas de defesa do ambiente e velam pela utilização racional de todos os recursos naturais.”

 

Os factos acima relatados violam, não só a Constituição da República, mas também a Lei do Ambiente que estabelece as regras de gestão ambiental e de prevenção de danos ambientais que não foram observados pela DINGSHENG MINERALS. O Regulamento de Avaliação do Impacto Ambiental e o Regulamento de Prevenção da Poluição e Protecção do Ambiente Marinho e Costeiro também foram postos em causa pelos actos desta empresa chinesa.

 

Moçambique assumiu compromissos internacionais sobre a protecção do ambiente como é o caso da Convenção Africana para a Conservação da Natureza, bem como a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Este último é um compromisso mundial que compreende 17 Objectivos que cobrem as dimensões económica, social e ambiental, mas que neste caso estão a ser desrespeitados.

 

Os Ministérios da Terra e Ambiente (MTA) e o Ministério do Mar, Águas Interiores e Pescas são relevantes para a questão da protecção do meio ambiente e devem activamente intervir para o esclarecimento do presente caso.

 

Na estrutura funcional do MTA existe a AGÊNCIA NACIONAL PARA O CONTROLO DA QUALIDADE AMBIENTA- AQUA que, ponto de vista legal, é responsável pelo monitoramento ambiental e pela realização de auditorias ambientais, conforme dispõe o artigo 5 do Decreto n.º 2/2016 de 10 de Fevereiro que cria, pelo que tem algo a fazer e dizer neste caso.

 

Mais ainda, nos termos do artigo 235 da Constituição da República, “ao Ministério Público compete representar o Estado junto dos tribunais e defender os interesses que a lei determina, controlar a legalidade, os prazos das detenções, dirigir a instrução preparatória dos processos-crime, exercer a acção penal e assegurar a defesa jurídica dos menores, ausentes e incapazes.” É, pois, nestes termos que deve o Ministério Público intervir em defesa das comunidades e do meio ambiente como garante da legalidade das acções ou activiadades das empresas, defendendo assim os interesses que a lei determina.

 

Importa notar que algumas das actividades da empresa chinesa em questão podem constituir matéria criminal, de tal modo que é dever do Ministério Público investigar e exercer a devida acção penal.

 

DO PEDIDO:

 

O lema da abertura do ano judicial de 2021 “Por um Judiciário Protector do Meio Ambiente” e as leis de protecçõa do ambiente em vigor em Moçambique não devem constituir uma letra morta ou uma mera vontade sem acção. Por isso, se requer-se à PGR e aos relevantes gestores públicos sobre o ambiente como é o caso do Ministério da Terra e Ambiente para, dentro das competências que lhes são conferidos por lei, intervir neste caso com vista a: Investigar seriamente e em tempo útil os actos de destruição da duna da Praia de Chongoene e tomar as medidas necessárias para a responsabilização dos infractores e efectiva protecção do ambiente em causa.

 

João Nhampossa

Sir Motors

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