Segundo informações que circularam, o Ministro da Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Técnico-Profissional referiu que as universidades deveriam ter um corpo docente composto por professores doutorados. Essa é a regra geral no ensino superior em todo o mundo, excepto em países como Moçambique, onde: (1) existem poucas bolsas de estudo; (2) as universidades não investem no corpo docente; (3) dos doutores existentes, sobretudo em determinadas áreas de conhecimento, uma elevada percentagem dedica-se à política e a negócios. As razões desta emigração de doutores para outras actividades são: (1) salários miserabilistas; (2) inexistência de recursos para investigação (excepto uns poucos de casos que conseguem mobilizar recursos externos); (3) carreiras docentes pouco transparentes e distorcidas; (4) dificuldades de publicação em revistas de referência (moçambique não tem nenhuma).
Em consequência, não é surpreendente afirmar acerca da mediocridade do ensino em geral e do superior em particular. Com excepções, são poucos os departamentos na Universidade Eduardo Mondlane que fazem investigação; qual das outras universidades, públicas e privadas, tem pesquisa continuada, com envolvimento de estudantes e docentes, que publica regularmente e possui cooperação/internacionalização na investigação? A reprodução da mediocridade parece ser um propósito, e não só porque a qualidade requer muito investimento e resultado de longo prazo.
Neste contexto, a declaração do Ministro é extemporânea. Não o seria se houvesse um programa de formação docente a longo prazo, bolsas de estudo, e as universidades privadas obrigadas, efectivamente, a aumentar os graus dos respectivos corpos docentes.
O Conselho de Reitores foi extemporâneo porque as universidades pouco ou nada fazem para qualificar os docentes, embora se saiba que quem manda nas universidades não são os reitores, mas os patrões através dos responsáveis da administração. Os reitores são extemporâneos porque sabem que nas universidades, efectivamente instituições de ensino superior (e não dumba nengues do ensino superior), o corpo docente tem como funções principais a investigação, o ensino e a extensão universitária (também pouco ou nada se faz no nosso país). Estas funções são realizadas por doutorados que devem possuir (nem sempre) competências, tempo, vontade e incentivos para realizarem pesquisa.
Os reitores, pelo que foi dito, são demagógicos quando afirmam que há profissionais com muita experiência, conhecimento e competência e que podem ensinar. Sim, há alguns bons profissionais, mas é aceite que, em geral, um bom profissional, seja automaticamente um bom pesquisador e docente? O contrário também é verdadeiro: um bom pesquisador e docente não tem necessariamente de ser um bom profissional e gestor em actividades produtivas e de serviços ou em gestão de burocracias. Sim, pode haver uns poucos profissionais que podem leccionar, mas não é a regra. Profissão em actividades extrauniversitárias e universitárias implica perfis de personalidade, atitudes e posicionamentos bem diferentes entre si.
Os reitores, pelo que se soube, são manipuladores de expressão, quando recorrem à autonomia universitária para se contratar profissionais, mesmo sem licenciatura, para leccionar nas universidades. E eles, reitores, sabem que foram demagógicos, quando utilizaram o conceito e o princípio da autonomia universitária. Se foram demagógicos, é porque lhes convém manter o corpo docente com mais de 70% de licenciados a quem pagam miseravelmente. Se não foram demagógicos, então não sabem o que significa autonomia universitária. E isso seria grave. Ou, finalmente, alguns não foram sérios. Termino sabendo que dentro do Conselho de Reitores há pessoas competentes e que, certamente, se distanciam do seu Conselho.
Por estas e por outras, mas conscientemente e em defesa de interesses de grupos e de umbigos (desprestígios construídos), a má qualidade se reproduz. Uma aldrabice às actuais e futuras gerações e um atentado ao desenvolvimento do país.