A Conferência Episcopal de Moçambique, representada pelos Bispos Católicos, condenou esta terça-feira (22), o assassinato, no passado dia 18 de Outubro, de Elvino Dias e de Paulo Guambe, ambos ligados ao partido Povo Optimista para o Desenvolvimento de Moçambique (PODEMOS).
A posição dos bispos católicos vem juntar-se a de vários cidadãos, instituições, organizações e governos que, a cada dia, continuam a condenar o duplo homicídio. “Condenamos o bárbaro assassinato de duas figuras políticas a relembrar com evidência, com semelhanças no método, outros assassinatos de figuras políticas ou da sociedade civil, também ligadas a partidos da oposição, ocorridos na sequência de anteriores eleições”, lê-se no comunicado dos Bispos.
Em comunicado emitido no contexto das eleições gerais e provinciais de 09 de Outubro, os bispos afirmam que a Igreja Católica é apartidária, porém, defendem que isso não significa que a instituição renuncie ao seu compromisso político e social, a um caminho concreto para a construção de uma sociedade mais democrática, inclusiva, justa e fraterna, na qual todos devem viver em paz, com dignidade e futuro.
“Por isso, sendo voz da Igreja Católica, nós os Bispos não podemos omitir de denunciar esta grave situação que o país atravessa e a violência que gera mergulhando todos no caos”, lê-se no documento.
Eleições fraudulentas
Sobre as últimas eleições, os Bispos referem que mais de metade dos moçambicanos que tinham sido inscritos não se fizeram presentes para exercer o seu direito ao voto, o que significou a mais elevada abstenção eleitoral na história das eleições multipartidárias, o que parece indicar que as irregularidades e fraudes registadas em eleições anteriores demonstraram a grande parte da população que a sua vontade, expressa nas urnas, não é respeitada, tornando inútil o exercício deste importante direito cívico.
“Infelizmente, mais uma vez, verificaram-se fraudes grosseiras. Repetiram-se enchimentos de urnas, editais forjados e tantas outras formas de encobrir a verdade. As irregularidades e fraudes, a grosso modo impunemente praticadas, reforçaram a falta de confiança nos órgãos eleitorais, nos dirigentes que abdicam da sua dignidade e desprezam a verdade e o sentido de serviço que deveria nortear aqueles a quem o povo confia o seu voto. Desta forma, empurram o povo não só a comprovar as suas desconfianças, mas também a se questionar sobre a legitimidade dos eleitos”, defendem os Bispos.
Face a estes comprovados dados adulterados, os sacerdotes católicos questionam se os órgãos eleitorais poderão certificar os resultados. Defendem que a aplicação da lei eleitoral na fase do apuramento dos votos a nível nacional por parte das autoridades competentes, por si só, não pode garantir resultados fidedignos se os dados não o são. Afirmam que “certificar uma mentira é fraude”.
No comunicado, os Bispos católicos apelam ainda ao respeito pelo direito à manifestação pacífica, mas alertam igualmente os jovens para que não se deixem instrumentalizar e serem arrastados em acções de vandalismo e desestabilização.
Defendem que a juventude seja escutada e a ela dar resposta sobre suas inquietações. “Não podemos deixar que partidos políticos e grupos de poder continuem a promover as suas influências nefastas sobre ela, incutindo políticas de desprezo, de ódio e de vingança ou demonstrando ausência de valores de respeito pela verdade e honra”, destacam os sacerdotes.
A mensagem, reiterada, e hoje ainda mais sublinhada pelos Bispos, é de um forte apelo para que se trave a violência, os crimes políticos e o desrespeito pela democracia. Apelam para que haja coragem de enveredar pelo diálogo e de repor a verdade dos factos.
“Nós os Bispos Católicos de Moçambique apelamos a todos os directamente envolvidos neste processo eleitoral e no conflito gerado para que façam do exercício do reconhecimento das culpas e do perdão e a coragem da verdade o caminho que permita o retorno à situação normal de um país que se quer vivo e activo e não silenciado pelo medo da violência”, exortam os sacerdotes.
Refira-se que a Comissão Nacional de Eleições divulga, amanhã, os resultados finais da votação de 09 de Outubro, passado que, até ao momento, apontam para vitória da Frelimo e Daniel Chapo em todas províncias do país com mais de 60% dos votos. (Carta)
O Governo moçambicano refutou ontem ter existido uma “intenção objetiva” de disparar gás lacrimogéneo contra jornalistas durante confrontos entre a polícia e manifestantes na cidade de Maputo, com pelo menos três profissionais feridos.
“O que eu não posso assumir, porque não é verdade, porque eu também assisti, é que tenha havido disparos contra jornalistas”, disse Filimão Suaze, porta-voz do Conselho de Ministros, em declarações a jornalistas após mais uma sessão do órgão.
Segundo o responsável, os jornalistas terão sido atingidos pelas balas de gás lacrimogéneo porque estavam posicionados num lugar onde estavam também os manifestantes que a Polícia pretendia dispersar, o que levou à interrupção da conferência de imprensa do candidato presidencial Venâncio Mondlane.
Suaze acrescentou que os agentes em serviço, que estavam a dispersar os “ajuntamentos informais”, não terão, em certo momento, sido capazes de distinguir os jornalistas dos manifestantes. “Não posso afirmar que terá havido uma intenção objetiva de atingir qualquer jornalista com esses objetos”, declarou o porta-voz, referindo que, oportunamente e após uma análise, o Governo se vai pronunciar sobre o assunto.
“Sobre esta matéria, em momento oportuno, vai haver um pronunciamento, quando já tiver sido feita a análise de até que ponto foram atingidos jornalistas, quais foram as consequências e até que ponto pode ser tido como uma ação de cortar o vosso trabalho, o que certamente não foi”, prometeu o responsável.
O Sindicato Nacional de Jornalistas (SNJ) repudiou também os actos de violência contra os profissionais registados na segunda-feira, pedindo, igualmente, que os jornalistas atuem sempre em observância das medidas de segurança pessoal. “O secretariado executivo do SNJ está a trabalhar no sentido de apurar detalhes sobre a ocorrência”, refere a entidade em comunicado enviado à comunicação social.
Na segunda-feira, a polícia moçambicana reprimiu manifestações convocadas pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane contra suposta fraude eleitoral e o homicídio de dois apoiantes seus, entre os quais o seu advogado, Elvino Dias.
Os apoiantes de Mondlane levaram os protestos para vários bairros, no centro da cidade e nos subúrbios, como Polana Caniço, Xiquelene e Maxaquene, onde a polícia realizou disparos e lançou gás lacrimogéneo para dispersar qualquer concentração e os manifestantes, por sua vez, respondiam com o arremesso de pedras e pneus queimados.
Pelo menos 16 pessoas ficaram feridas, cinco ainda internadas, avançou hoje fonte hospitalar, e outros 30 cidadãos foram detidas na capital moçambicana, segundo a Ordem dos Advogados de Moçambique.
A resposta policial às manifestações foi condenada pela comunidade internacional e houve vários apelos à contenção de ambas as partes, nomeadamente de Portugal, da União Europeia e da União Africana.
A capital moçambicana voltou hoje à normalidade, com transportes a funcionar e filas de trânsito nas principais ruas da cidade, sendo visível o reforço policial após os violentos confrontos do dia anterior.
O candidato presidencial Venâncio Mondlane convocou hoje mais dois dias de paralisação e manifestação “pacífica” nacional em Moçambique a partir de quinta-feira, dia previsível do anúncio dos resultados das eleições gerais pela Comissão Nacional de Eleições (CNE). (Lusa)
Está, novamente, a causar indignação e repulsa a brutalidade demonstrada, mais uma vez, pela Polícia da República de Moçambique (PRM) nas manifestações desta segunda-feira, em Maputo, convocadas pelo candidato presidencial Venâncio António Bila Mondlane para repudiar o assassinato do advogado Elvino Dias e do cineasta Paulo Guambe, mandatários do candidato e do PODEMOS, respectivamente.
Em conferência de imprensa concedida esta terça-feira, em Maputo, a Renamo repudiou os actos de violência protagonizados pela Polícia, através da sua Unidade de Intervenção Rápida (UIR – Polícia antimotim) na capital do país, sobretudo nos bairros de Maxaquene e Urbanização.
Para o maior partido da oposição, os actos presenciados na segunda-feira colocam em causa a dignidade humana e minam a paz social. “O que presenciamos é uma afronta não só aos princípios democráticos, mas também à dignidade humana. Cada acto de violência é uma ferida aberta em nossa sociedade e, essas feridas, se não tratadas, podem transformar-se em cicatrizes que levarão gerações para curar”.
Segundo a Renamo, é necessário lembrar que as pessoas que se fazem aos protestos não são inimigas do Estado, mas “cidadãos que, por meio da manifestação pacífica, buscam um Moçambique melhor para todos nós”.
A “perdiz” sublinha que a liberdade de expressão e o direito à manifestação são pilares fundamentais de qualquer sociedade justa e democrática. “São a essência da nossa luta por justiça, igualdade e direitos humanos. Quando pessoas saem às ruas para reivindicar seus direitos, clamar por mudanças ou simplesmente expressar suas opiniões, não estão apenas a cumprir um dever cívico, mas exercendo um direito conquistado com sacrifício de filhos e filhas desta pátria”, defende, enfatizando que a segurança pública deve basear-se na protecção e na confiança e não no medo e opressão.
“Todos nós devemos engajar-nos no debate público, participar nas decisões que afectam nossas vidas e exigir transparência e responsabilidade de nossos dirigentes, sem medo de sermos silenciados. A Polícia precisa perceber que cada voz importa e a participação cidadã é a chave para uma democracia vibrante”, acrescenta.
“Estamos unidos por um profundo sentimento de repúdio à violência que se espalhou pelo país após as eleições. Em tempos de divergências políticas, é essencial manter a civilidade e o respeito mútuo, valores que são a base de uma sociedade democrática e plural”, remata, realçando a sua indignação com as “cenas impensáveis” testemunhadas esta semana.
Refira-se que esta não é a primeira vez em que a Polícia recorre à violência para reprimir os direitos fundamentais dos cidadãos. Só no ano passado, por exemplo, Moçambique assistiu a diversos casos de violência policial, com destaque para os testemunhados nas marchas de homenagem ao rapper Azagaia (a 18 de Março) e nas marchas de repúdio aos resultados das eleições autárquicas. Em todas estas situações, a Polícia lançou gás lacrimogéneo, feriu e matou cidadãos. (Carta)
Já é conhecida nova fase da contestação dos resultados eleitorais do dia 09 de Outubro, que apontam para vitória da Frelimo e seu candidato Daniel Chapo, em todas províncias do país. Hoje, o candidato presidencial Venâncio Mondlane, que reivindica a vitória eleitoral, anunciou mais dois dias de paralisação das actividades económicas em todo país, a ter lugar nos dias 24 e 25 de Outubro corrente, ou seja, quinta e sexta-feira desta semana.
Em uma declaração pública feita no final da manhã desta terça-feira, em sua página oficial do Facebook, Venâncio Mondlane defendeu que a nova fase da greve será caraterizada por uma manifestação pública e deverá decorrer em todos bairros e distritos do país.
“Estamos a decretar a abertura das portas da revolução em Moçambique. Por isso, a partir do dia 24, que é o dia em que a Comissão Nacional de Eleições vai apresentar os resultados, nós vamos activar a segunda etapa das manifestações, do nosso roteiro revolucionário em Moçambique. Vamos subir a fasquia, vamos paralisar o país por dois dias”, declarou.
Segundo Venâncio Mondlane, a manifestação de quinta e sexta-feira não só visa contestar os resultados eleitorais, mas também contra os sequestros, raptos, gás lacrimogénio e balas verdadeiras, que são disparadas pela Polícia contra o povo indefeso. Afirma que, tal como ontem, a actividade económica deverá estar encerrada, incluindo os serviços públicos. Diz ainda que, desta vez, não haverá pontos de concentração, sendo que cada bairro deverá organizar sua própria manifestação, mas de forma pacífica.
Mondlane afirma que o povo não pode ter medo de sacrificar os dois dias pelo bem do país e apela aos membros dos partidos da oposição, incluindo da Renamo e MDM, a se juntar a luta. Entende que esta é a única oportunidade que os moçambicanos têm de mudar o rumo político do país.
Na sua declaração, Mondlane diz ainda que a paralisação será um presente à CNE (Comissão Nacional de Eleições) que, na quinta-feira, deverá anunciar os resultados finais da votação do dia 09 de Outubro que, até ao momento, dá vitória à Frelimo e Daniel Chapo com mais de 60% dos votos, um resultado contestado pelo candidato suportado pelo PODEMOS, que reivindica a vitória com mais de 53%.
“Vamos dar um presente à CNE, um bolo de paralisação, um bolo feito com gás lacrimogénio e vamos deixar lá no meio da CNE para que eles [os vogais do órgão] possam se deliciar num bom lanche”, afirmou.
Numa declaração de 50 minutos e 22 segundos, Mondlane reiterou que a sua vida continua em risco e que o plano de o “abater” ainda está em marcha, pelo que encontra-se “na parte incerta”, mas dentro da Cidade de Maputo. “Neste momento, por motivos de segurança, estou aqui em Maputo, mas com muita mobilidade porque a minha segurança está em causa, não restam dúvidas”, afirmou.
Refira-se que esta segunda-feira, Moçambique observou a primeira greve geral convocada por Venâncio Mondlane, marcada por tumultos na Cidade de Maputo, provocados pela Polícia, através da sua Unidade de Intervenção Rápida, que recorreu à gás lacrimogénio para impedir a realização da marcha de repúdio ao assassinato dos mandatários do candidato e do PODEMOS, Elvino Dias e Paulo Guambe, respectivamente. (Carta)
O sol nasceu tímido e as nuvens decidiriam cobrir o céu, fazendo antever uma segunda-feira cinzenta, na capital moçambicana. Assim começava o dia 21 de Outubro de 2024, data em que estava agendada, em todo o país, uma marcha de repúdio ao assassinato de Elvino Dias e Paulo Guambe, mandatários do candidato presidencial Venâncio Mondlane e PODEMOS, respectivamente, ocorrido na noite da última sexta-feira, em Maputo.
De uma marcha pacífica, convocada na passada quarta-feira pelo candidato a Presidente da República, Venâncio António Bila Mondlane, e reafirmada no sábado, muito cedo se revelou num verdadeiro foco para tumultos, tendo a Polícia da República de Moçambique (PRM), através da Unidade de Intervenção Rápida (UIR), como protagonista.
Logo nas primeiras horas do dia, a PRM destacou seu batalhão antimotim para o local, junto com os seus blindados (mais de três viaturas), gás lacrimogéneo, helicóptero e cães-polícia, no lugar de enviar uma equipa de protecção, tal como recomenda a legislação para este tipo de eventos.
Anacleto Armando, residente no bairro da Munhuana, nos subúrbios de Maputo, conta que chegou ao local da concentração (o mesmo lugar onde foram brutal e covardemente assassinados Elvino Dias e Paulo Guambe) por volta das 08h00 e, logo à chegada, deparou-se com um contingente policial “preparado para guerra”.
“Quando começamos a nos juntar em grupo, a Polícia começou a atirar gás lacrimogéneo e nem nos deu espaço de nos organizarmos. Ninguém provocou a Polícia, ela é que começou a dispersar-nos com gás lacrimogéneo”, narra Armando, em conversa com “Carta”.
Empunhando uma bandeira da República de Moçambique, Anacleto Armando defende não ter entendido a atitude da Polícia que, aliás, chegou a atirar gás lacrimogéneo para o local onde o candidato presidencial estava a conceder uma entrevista aos jornalistas. Pelo menos três jornalistas ficaram feridos no incidente, filmado em directo pela estação portuguesa RTP.
“Era suposto realizarmos uma marcha pacífica, sem nenhum vandalismo, em protesto contra os resultados eleitorais e em repúdio ao assassinato de Elvino Dias e Paulo Guambe. Mas, estranhamente, a Polícia já estava aqui armada até aos dentes”, afirma Anacleto Armando.
Por isso, o jovem, de 25 anos de idade, não tem dúvidas de que se trata de um atentado ao Estado de Direito Democrático. “Isto é um atentado ao Estado de Direito Democrático, nós estamos aqui para exercer um direito que nos é dado pela Constituição da República. Isto é uma prova de que estamos num Estado tirano, que não quer preservar os direitos de todos os cidadãos. Estávamos para marchar, mas fomos reprimidos com gás lacrimogéneo, o mesmo que podia ser usado para outros fins”, defendeu a fonte, sublinhando que o aparato policial podia estar a salvar vidas em Cabo Delgado, onde os terroristas semeiam luto há sete anos.
No entanto, garante que não irá recuar. “Não vamos recuar, vamos até ao fim. A Polícia não tem armamento suficiente para nos manter aqui até anoitecer. Vamos continuar aqui até anoitecer”, atirou.
Entretanto, contrariamente as suas promessas de não recuar, Anacleto Armando e mais uma dezena de jovens fugiram do local da entrevista (Avenida Joaquim Chissano, esquina com Acordos de Lusaka), segundos depois, ao ver um carro blindado aproximar-se do local, lançando gás lacrimogéneo de forma indiscriminada.
Quem também aponta a Polícia como responsável pelos tumultos desta segunda-feira, na Cidade de Maputo, é Alberto José, um jovem residente no bairro do Boquisso, uma zona de expansão do Município da Matola, província de Maputo.
Alberto José afirma ter encontrado a UIR já posicionada na Praça da OMM, local escolhido para concentração dos manifestantes. “Saí de casa para me juntar à marcha, uma vez que se disse que seria uma manifestação pacífica contra a má governação no nosso país. Mas, a minha chegada, por volta das 8h00, a Polícia já estava a disparar para as pessoas sem nenhum motivo”, conta a fonte, limpando o rosto com um pano molhado para reduzir os impactos do gás lacrimogéneo.
“Ao invés de persuadir a população para não aderir à marcha, a polícia está a disparar e isso é um dos motivos que leva as pessoas a destruir bens públicos”, acrescenta, garantindo que saiu de Boquisso por entender que tinha de demonstrar a sua indignação perante o rumo que o país está a tomar.
“Sou moçambicano e, nessa qualidade, tenho o direito de me manifestar, como também o dever de proteger este país e contribuir para o bem do meu país e este é um dos contributos que estou a dar para o bem do meu país. A Polícia tinha de estar aqui para garantir que a marcha ocorresse de forma ordeira, mas não é o que aconteceu”, sublinha.
A marcha foi impedida antes mesmo de iniciar e o caos tomou conta da Cidade de Maputo. Diversas avenidas da capital do país (com destaque para Milagre Mabote, da Malhangalene, Joaquim Chissano, Acordos de Lusaka, Vladimir Lenine e Rua da Resistência) foram bloqueadas pelos manifestantes, que queimaram pneus e derrubaram contentores de lixo, postes de iluminação e painéis publicitários para impedir o avanço da Polícia.
Igualmente, foram lançadas pedras e garrafas em retaliação ao gás lacrimogéneo, que era lançado de forma indiscriminada pela Polícia. Parte dos casos de maior tensão foi registada nos populosos bairros da Maxaquene, Mafalala, Urbanização, Mavalane, Ferroviário e Polana Caniço, onde os manifestantes literalmente impediram a circulação de pessoas e viaturas. Aliás, há vídeos amadores retratando a vandalização de viaturas particulares em algumas avenidas, com recurso a catanas.
Dados avançados na noite de ontem pelo Hospital Central de Maputo indicam que pelo menos 16 pessoas ficaram feridas na sequência dos tumultos. Entre os feridos, refira-se, há três jornalistas. (A. Maolela)
A cidade de Maputo, especificamente o bairro da Maxaquene, nas proximidades da avenida Vladimir Lenine, enfrentou ontem momentos de terror, com a Polícia disparando balas reais e lançando gás lacrimogéneo, inclusive nas residências, bem como recorrendo a cães para amedrontar a população indefesa.
Veículos Mahindras circulavam de um lado para o outro e disparos de balas verdadeiras eram ouvidos, enquanto barricadas e pneus queimados se espalhavam durante as manifestações de repúdio contra o duplo homicídio dos apoiantes de Venâncio Mondlane e dos resultados das eleições do dia 9 de Outubro.
O cenário caótico persistiu até às primeiras horas da noite no bairro da Maxaquene. A população continuava a incendiar pneus para impedir a passagem dos automobilistas. Desde as primeiras horas do dia, os jovens do bairro demonstravam determinação em não cessar e a Polícia teve de fazer uma permuta: os agentes que estavam de serviço durante a tarde recuaram e, ao cair da noite, outro grupo entrou em acção no local.
Ainda de manhã, blindados rugiam e os agentes da Unidade de Intervenção Rápida (UIR) estavam a atacar a população indefesa de forma indiscriminada. Os populares ganhavam ânimo ao cair da noite, continuando a queimar pneus na avenida Milagre Mabote até ao início das avenidas Joaquim Chissano e Vladimir Lenine.
O comércio neste bairro ficou completamente encerrado e houve também vandalização de algumas infra-estruturas, painéis publicitários e bloqueio de várias vias. Os jovens do bairro iam arremessando pedras e garrafas por cima da Polícia, sem demonstrar nenhum medo. A coragem pairava sobre eles e criava mais raiva da Polícia que ia entrando dentro do bairro a tentar perseguir um por um.
Em termos globais, o bairro da Maxaquene destacou-se ontem em termos de violência e desordem. Havia cenas de postes de energia queimados, garrafas quebradas e arremessadas no meio da estrada, culminando numa escalada de violência sem precedentes, o que fez com que o helicóptero da polícia sobrevoasse continuamente o bairro.
Alguns jovens do bairro foram feridos pela Polícia e alguns jornalistas também sofreram durante escaramuças entre a população e os membros da PRM. Num autêntico filme de terror, a Polícia invadiu alguns becos daquele bairro de lata, onde até crianças não escaparam ao gás lacrimogêneo, provocando desespero em muitas mães que tentavam proteger os seus filhos.
Recorde-se que a Polícia da República de Moçambique já havia lançado um aviso de que havia de abortar qualquer acto de violência que pudesse surgir. Por outro lado, a Comissão Nacional de Eleições tem, até esta quinta-feira, o prazo para anunciar os resultados finais das eleições de 09 de Outubro, contestados pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, que defende ter ganho o escrutínio. (Marta Afonso)