Membros da Marinha de Guerra afectos no arquipélago das Quirimbas são acusados de raptar um agente económico informal na ilha Quirambo, na noite da última terça-feira (19). Os fuzileiros circulam em diferentes ilhas, a partir do seu quartel na ilha do Ibo.
As causas do rapto ou captura são até aqui desconhecidas, embora se suspeite estarem relacionadas com o combate ao terrorismo, uma vez ser esta a missão daqueles agentes de defesa e segurança naquela área da costa de Cabo Delgado.
Fontes na ilha do Ibo disseram que a captura do referido comerciante ocorreu à calada da noite, quando de repente foi visto um grande contingente a escalar a sua residência. "O que sabemos é que ele foi levado, mas não sabemos para onde. Os militares foram com ele na embarcação, deixando a esposa e as crianças", disse à "Carta" um residente local.
Outro residente também confirmou: "ouvimos que foi levado, nós o conhecemos. Costumava vir aqui no Ibo comprar alguns produtos, então hoje (quinta-feira) ouvimos que foi capturado", disse, acrescentando que o comerciante era deslocado da aldeia Darumba no posto administrativo de Mucojo.
Refira-se que, nos últimos dias, devido ao patrulhamento da Marinha de Guerra, a actividade pesqueira, a principal fonte de sobrevivência da população no arquipélago das Quirimbas, não têm sido realizada normalmente.
Na segunda-feira (18), Jesus Barreto, Fuzileiro da Força Naval em Pemba, disse a jornalistas que há um trabalho com as lideranças locais para passar documentos aos pescadores para não serem confundidos, uma vez que está a intensificar a patrulha na costa da província de Cabo Delgado. As autoridades dizem ter estabelecido um perímetro de segurança que não pode ser ignorado. (Carta)
A Assembleia da República aprovou esta quinta-feira (21), na generalidade, a Proposta de Lei que estabelece o regime jurídico aplicável às Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPME). Este marco legislativo é considerado um passo significativo no fortalecimento do sector industrial e comercial do país.
No seu discurso em sede do parlamento, o Ministro da Indústria e Comércio, Silvino Moreno, referiu que o objectivo principal desta lei é criar condições objectivas que valorizem o papel das MPME na economia nacional, que representam cerca de 97.1% das empresas operacionais em Moçambique.
A proposta visa também incentivar os agentes económicos que actuam na informalidade a adoptarem a formalidade, promovendo assim a criação de uma base jurídica sólida para a participação activa das MPME no crescimento económico. Com a sua aprovação, espera-se um aumento na geração de empregos, produção de riqueza, arrecadação de impostos e maior sustentabilidade económica.
Entre os diversos aspectos contemplados na lei, destacam-se a certificação, direito de preferência, facilidades de acesso à informação sobre serviços financeiros e criação de um fundo de apoio ao fomento e desenvolvimento das MPME. Ao abrigo da lei, prevê-se igualmente a alocação de 1% do orçamento das empresas envolvidas em grandes projectos para apoiar as MPME, redução de taxas para obtenção do selo “Made in Mozambique”, redução de taxas e emolumentos das custas judiciais, criação de facilidades para organização de feiras comerciais, entre outros.
Refira-se que esta lei foi moldada com base em contribuições provenientes de consultas feitas em todo o país, garantindo assim que os beneficiários primários foram ouvidos e considerados no processo legislativo. Com a implementação efectiva deste novo quadro jurídico, espera-se um ambiente mais propício para o crescimento e desenvolvimento sustentável das MPME em Moçambique, contribuindo assim para uma economia mais robusta e inclusiva. (Carta)
Não me canso de percorrer o mercado Mafurreira, tenho-o entranhado todos os dias, quase todos os dias nas manhãs, sem procurar, no entanto, nada em especial a não ser a necessidade de rever as mesmas pessoas com as quais lido há anos, e assim, nas saudações que vão acontecendo quase mecanicamente, busco espraecer-me, mais do que querer comprar qualquer coisa. Todavia, vou notando em cada passo, que as minhas amigas deixaram de ser as mesmas vendedeiras dos tempos em que o negócio fluía, perderam o entusiamo.
Já são quase doze horas e muitas delas, a maioria, ainda não “fizeram” cem meticais. Outras nem sequer o mínimo que seria preciso para comprar pão para as crianças que esperam lá em casa, não há negócio. As pessoas passam nos corredores, apreciam os produtos colocados nas bancas, porém não compram, nem sequer perguntam o preço, o que torna o cenário ainda mais desesperador para as negociantes que podem voltar para casa de mãos vazias, e não poucas vezes, com os produtos deteriorados.
É triste querer comprar tomate, cebola e pimento, numa conta que não chega aos cinquenta meticais e ficar a saber que a senhora que me atende não tem troco, “nunca vi esse dinheiro desde que amanheceu”, e eram duzentos meticais que eu trazia. A companheira do lado também, sentada num saco feito esteira com as pernas flectidas e o corpo apoiado no braço, sem qualquer esperança, ainda não vendeu nada, e se vier a fazê-lo será com muita sorte. Então esta situação magoa.
Tivemos tempos em que as coisas floresciam. Havia muita conversa e risos no mercado, entre o movimento do dinheiro que entrava e dos produtos que saíam. O brilho no rosto das mulheres, que nos deixavam sentir o estado vivo da alma, ressurgia em cada gesto e isso era o sinal inequívico da aurora. Era assim, intensamente ao longo de toda a manhã, todos os dias, e aos finais de tarde quando os funcionários voltavam para casa e passavam por alí e enchiam o saco plástico para a alegria da família. Hoje não, o desespero é total, ninguém compra nada, não há “mola de impulsão”.
Os intervalos das onze para o “matabicho-almoço”, outrora passados quase em regabofe, com peixe frito, pedaços de frango, salada e pão, chá quente com limão, e bastante tagarelice para alimentar o coração, passaram a ser frustrantes e dolorosos. Há um silêncio na Mafurreira. As mulheres passam maior parte do tempo a dormir no chão sobre as capulanas sem sonho, ninguém compra nada.
Ainda no mesmo espaço temos as peixeiras que passam o tempo todo espantando as moscas sobre o marisco. “Compra, amigo! Se não tens dinheiro, leva, vais pagar amanhã! Mas essa condescendência toda pode significar que está-se no fim da linha, ou no princípio do fim da linha, e o peixe vai apodrecer, e se calhar nós também.... estamos a apodrecer!
Os portos moçambicanos movimentaram em 2023 mais de 63 mil toneladas de mercadorias, um aumento de 12,3% face a 2022, praticamente metade a partir de Maputo, segundo dados da execução orçamental a que a Lusa teve ontem acesso.
De acordo com o relatório do Ministério da Economia e Finanças, este desempenho contrasta com o movimento portuário de 56,1 mil toneladas de janeiro a dezembro de 2022, mas alguns portos até registaram quebras no ano passado.
No porto de Maputo, o maior do país, foram movimentadas mais de 31,2 mil toneladas de mercadorias, um aumento de 16,7% face a 2022, seguido do porto de Nacala-Velha, com 13,8 mil toneladas (+20,3%), do porto da Beira, com 13,6 mil toneladas (-1,3%) e do porto de Nacala, com três mil toneladas (+14,9%).
O desempenho dos portos de Maputo, Nacala e Nacala-Velha “deve-se ao aumento do nível de manuseamento do combustível, trigo, fertilizantes e ao aumento da demanda e pelo desvio de carga nos outros portos”, explica-se no relatório.
Por outro lado, a “redução da produção de manuseio de combustível e magnetite” influenciou o movimento no porto de Beira.
Nos portos secundários, o de Topuito movimentou em 2023 quase 1.015 toneladas (-3,9%), o de Pemba 269,5 toneladas (-18,6%) – devido à “redução de navios” naquela infraestrutura portuária - e o de Quelimane 17,3 toneladas (+59,9%).
O Governo moçambicano admitiu em 23 de fevereiro que a extensão da concessão do porto de Maputo por 25 anos, cuja adenda ao contrato foi assinada nesse dia, vai produzir ganhos de mais de oito mil milhões de dólares (7,3 mil milhões de euros) para a economia.
“Com a extensão da concessão, projetamos benefícios diretos para a economia nacional, incluindo mais de oito mil milhões de dólares em rendas, dividendos e impostos diretos”, afirmou o vice-ministro dos Transportes e Comunicações, Amilton Alissone, após a assinatura da adenda ao contrato de concessão do porto ao consórcio MPDC, que estende o período de gestão do porto de Maputo até 13 de abril de 2058.
As intervenções a realizar no âmbito do alargamento da concessão da infraestrutura vão permitir a criação de mais de 1.000 empregos diretos e 5.000 empregos indiretos, contribuindo significativamente para o desenvolvimento socioeconómico do país, avançou.
Um decreto que aprova a extensão foram também aprovados os termos do Plano de Negócios para a realização de investimentos adicionais “visando aumentar a capacidade de manuseamento de carga no Porto de Maputo, estando a concessionária autorizada a realizar investimentos adicionais” de 2.060 milhões de dólares (1.900 milhões de euros) na Área de Concessão Portuária.
A concessionária do porto de Maputo prevê investir nos próximos três anos 600 milhões de dólares (553,4 milhões de euros) na expansão da infraestrutura portuária, a primeira fase de investimento na adenda ao contrato de concessão.
Em entrevista à agência Lusa, o diretor executivo da Sociedade de Desenvolvimento do Porto de Maputo (MPDC), Osório Lucas, explicou que essa primeira fase vai aumentar a capacidade do terminal de contentores, dos atuais 170.000 para 530.000 contentores em três anos.
“E vai aumentar também a capacidade do Terminal de Carvão da Matola, de sete milhões [mtpa] para 12 milhões. E a nossa capacidade na carga geral vai subir de 10 milhões [mtpa] para 13 milhões, na fase 1, que estará concluída nos próximos três anos”, detalhou.
A MPDC prevê chegar a um volume manuseado de carga de 50,9 mtpa (milhões de toneladas por ano) em 2058, no final do período desta nova prorrogação do contrato, de mais 25 anos (a contar de 2033).
Estima igualmente até 2058 o aumento da capacidade operacional dos atuais 37 mtpa para 54 mtpa e da capacidade do terminal de 270 para um milhão de contentores, a expansão do Terminal de Carvão da Matola de 7,5 para 18 mtpa e do Terminal de Carga Geral de 9,2 para 13,6 mtpa.(Lusa)
A violência renovada desencadeada pelo grupo Estado Islâmico-Moçambique (ISM) entre 8 de Fevereiro e 3 de Março forçou quase 100 000 pessoas a fugirem das suas casas, segundo revela a ONU. A nova onda de ataques ameaça minar meses de ganhos no combate ao terrorismo obtidos pelas Forças Armadas de Defesa de Moçambique e pelos seus parceiros regionais, a Missão Militar da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral em Moçambique (SAMIM).
Os insurgentes aterrorizam Cabo Delgado desde 2017, tendo matado quase 5 000 pessoas e deslocado quase 1 milhão. Através dos seus canais de propaganda, o ISM assumiu a responsabilidade por 27 ataques em Fevereiro que mataram 70 pessoas e destruíram 500 igrejas, casas e edifícios públicos no distrito de Chiure.
O Presidente Filipe Nyusi prometeu responder com “medidas contundentes”.
“A situação acalmou muito e as populações estavam a regressar”, disse aos jornalistas no dia 3 de Março. “Todas as aldeias ocupadas por terroristas foram recuperadas. Mas agora, nas últimas semanas, há uma tendência de pequenos grupos começarem a realizar ataques em algumas aldeias e descerem para os distritos do sul de Cabo Delgado.”
O Presidente do Zimbabwe, Emmerson Mnangagwa, que se reuniu com Nyusi à margem da cimeira da União Africana em Fevereiro, indicou que a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) está a repensar os seus planos para uma retirada completa.
“A situação não se acalmou realmente”, disse ele, segundo o jornal zimbabweano The Herald. “Mas esse mandato está a chegar ao fim, por isso estamos a discutir como podemos lidar com a situação.”
A SADC irá considerar manter uma presença na cidade costeira de Pemba como base para operações ofensivas enquanto se retira de outros distritos de Cabo Delgado, de acordo com o site português Africa Monitor.
Criada em Julho de 2021, a SAMIM é composta por tropas de Angola, Botswana, República Democrática do Congo, Lesoto, Malawi, África do Sul, Tanzânia e Zâmbia. O novo comandante da SAMIM, major-general sul-africano Patrick Dube, está a supervisionar uma redução faseada prevista para ser concluída em Julho.
Depois de visitar em Fevereiro as tropas ruandesas estacionadas em Cabo Delgado, Nyusi viajou para a Argélia no início de Março para obter mais apoio no combate ao terrorismo. O Presidente argelino, Abdelmadjid Tebboune, comprometeu-se a enviar equipamento para os membros das Forças Locais em Cabo Delgado que lutam contra o ISM juntamente com as forças de segurança.
“Isto vai acontecer”, disse Nyusi aos jornalistas.
O Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, Filippo Grandi, também se comprometeu a apoiar Cabo Delgado durante a sua recente visita à província.
“O mais importante ainda é como ajudar o governo a encontrar soluções para as pessoas deslocadas, seja ajudando-as a regressar às suas casas ou transferindo-as para outros locais ou mantendo-as onde estão”, disse aos jornalistas depois de se reunir com Nyusi em Maputo, no passado dia 4 de Março. (África Defense Fórum)
Apenas 72 gavetas, das 140 existentes para a conservação de corpos, funcionam na Morgue Municipal anexa ao Hospital Central de Maputo (HCM). A inoperância de 68 gavetas propicia actos de corrupção por parte dos funcionários para a cedência de espaço para a conservação de corpos. Nesta quarta-feira (20), a Vereadora de Saúde do Conselho Municipal de Maputo, Alice de Abreu, visitou de surpresa a Morgue do HCM para inteirar-se das reclamações dos utentes e fiscalizar o andamento das obras em curso.
“Constatamos que os munícipes contribuem para as cobranças ilícitas, aliciando os trabalhadores da Morgue. Assim sendo, apelamos aos munícipes para que evitem esses actos de corrupção, ligando para os números que fazem a gestão destes serviços”, disse.
“Se eu for à morgue do HCM e constatar que não há capacidade para conservação porque todas as câmaras estão cheias, não devo tentar aliciar o funcionário para que coloque o corpo do meu ente querido”.
Em relação ao facto de quase metade das gavetas não estarem a funcionar, Alice de Abreu disse que estão em curso obras para aumentar a capacidade de conservação dos corpos, num investimento de oito milhões de Mts, disponibilizados pelo Conselho Municipal da Cidade de Maputo.
De Abreu garantiu que decorrem obras de manutenção das câmaras para que funcionem por mais tempo. Na ocasião, a Vereadora disse que um dos maiores constrangimentos que se regista na Morgue é a falta de reclamação dos corpos, o que também contribui para a fraca capacidade de resposta. Só em 2023, não foram reclamados 3000 corpos e, após trinta dias, foram levados à vala comum. (M.A)
As bancadas parlamentares da Renamo e do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) defendem que o Acordo de Extradição, celebrado entre os Governos de Moçambique e Ruanda, em Junho de 2022, e viabilizado ontem pela Frelimo, visa simplesmente agradar o regime de Paul Kagame, na medida em que o mesmo não traz quaisquer benefícios para o nosso país. A posição foi manifestada ontem pelos deputados Alberto Ferreira, Muhamad Yassine e Silvério Ronguane, durante o debate em torno da proposta da Resolução que ratifica o referido Acordo.
Segundo Alberto Ferreira, deputado da Renamo, o Acordo de Extradição com o Ruanda faz emergir inquietações óbvias “dada a tipologia do regime anti-democrático, autocrático e ditatorial”, por um lado, e pelo suposto envolvimento do Ruanda em conflitos regionais, com destaque para os ataques terroristas protagonizados pelo movimento rebelde M23, no norte da RDC (República Democrática do Congo), cujo patrocínio é atribuído ao Ruanda.
“Um país sério não pode ratificar um acordo com finalidade de agradar os amigos. Moçambique não pode ser um Estado vassalo do Ruanda”, defende Ferreira, para quem o Acordo colocará cidadãos ruandeses refugiados no país “a viver num estado hostil e inseguro”. Aliás, o académico sublinha que a retroactividade da lei mostra que “os inimigos de ontem do regime ditatorial poderão ser perseguidos e extraditados”.
Silvério Ronguane, deputado do MDM, também alinha no mesmo diapasão. Suspeita que o país se tenha tornado num protectorado do Ruanda, na medida em que o Acordo não traz qualquer vantagem para Moçambique. “Quantos moçambicanos julgados, presos e/ou condenados no Ruanda que levam o Governo a ter interesse nesta matéria, na medida em que um acordo deve servir às partes signatárias”, questiona.
“A Ministra da Justiça pode explicar à bancada do MDM qual é o histórico de criminosos entre estes dois países que justificam e fundamentam este acordo? Havendo histórico de prisões, julgamentos e condenações entre Moçambique com países como Brasil, Índia e Tailândia, como é possível ignorá-los e colocar a frente um país sem nenhum histórico conhecido”, acrescenta.
Já o deputado Muhamad Yassine, também da Renamo, defende que o Acordo de Extradição com o Ruanda “é uma carta sem validade” e questiona as razões que levam o Governo a não celebrar o mesmo tipo de acordo com o Governo turco que, em 2017, também pediu ao Chefe de Estado ajuda na caça aos seus adversários políticos que, supostamente, tentaram assassiná-lo em Julho de 2016.
A “comparação” não agradou o Chefe da bancada parlamentar da Frelimo, Sérgio Pantie, que a considerou “infeliz”. “Estamos a comparar realidades diferentes. Ruanda é um país africano e irmão de Moçambique e há razões fundadas para que Moçambique tenha defendido que, com o Ruanda, vamos assinar”.
Segundo Pantie, o Acordo de Extradição com o Ruanda visa simplesmente agradecer aquele país pelo seu apoio na luta contra o terrorismo. “Precisamos de agradecer e ser gratos a um povo irmão, a um povo da nossa região e a um povo de África que tem estado com Moçambique de mãos dadas e de corpo e alma para vencermos esta batalha contra o terrorismo”.
Estou tranquila – Helena Kida
A Ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos garante estar de consciência tranquila por, alegadamente, saber que não assinou Acordo para permitir a perseguição de ruandeses em Moçambique e muito menos para a aplicação de penas pesadas no seu país de origem.
Segundo Helena Mateus Kida, o Acordo de Extradição celebrado com o Governo de Paul Kagame tem balizas, sendo que o mesmo começou a ser negociado antes de 2020 e que só foi concluído em 2022, depois de se certificar de que o Ruanda havia abolido a pena de morte.
“Não se extradita à toa, é preciso nos convencerem de que a conduta que baseia o pedido de extradição é também crime no nosso país. Depois de chegarmos à conclusão de que também é crime no nosso país, vamos ver quais são as penas aplicáveis porque não se faz automaticamente. Por isso, tenho a tranquilidade de dizer que estou consciente, porque não queremos ajuste de contas políticas”, defendeu.
Sem explicar as vantagens que o Acordo traz para Moçambique, Kida defendeu que os cidadãos moçambicanos não precisam de ser campeões no mundo do crime e que Moçambique “alberga uma grande comunidade de ruandeses”.
“Queremos que venham de qualquer Estado e de qualquer país, mas que sejam honestos e que nos ajudem a construir o país e não sermos eleitos para albergar criminosos de outros Estados”, frisou, sublinhando que Moçambique deseja assinar o mesmo tipo de acordo com vários países do mundo.
Refira-se que a proposta de Resolução que ratifica o Acordo de Extradição entre Moçambique e Ruanda foi viabilizada na manhã de ontem com 169 votos favoráveis da bancada da Frelimo, contra 51 da oposição: 47 da Renamo e quatro do MDM. Ruanda, sublinhe-se, é o quarto país a celebrar Acordos de Extradição com Moçambique, depois do Brasil (2009), Zimbabwe (2016), Vietname (2020) e Ilhas Maurícias (2020). (A. Maolela)
A Ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Helena Kida, admitiu, esta quarta-feira, haver execução de ruandeses no território nacional. A governante confirmou estes dados, quando tentava convencer os deputados da Renamo e do MDM sobre a pertinência do Acordo de Extradição, celebrado entre Moçambique e Ruanda e que ontem foi viabilizado pela bancada parlamentar da Frelimo.
“Não é segredo para ninguém que houve execuções [de ruandeses] dentro do nosso país e que mancham o nosso país”, afirmou a governante, sem dar detalhes sobre as tais execuções. Para a Ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, os referidos actos podem ter resultado da “nossa inércia”, pelo facto de “não termos um instrumento que nos permita pelo menos saber quem são essas pessoas que estão a ser perseguidas”.
Por essa razão, Helena Kida entende que o Acordo de Extradição com o Ruanda vai permitir que se saiba quem são as pessoas que voltaram para o Ruanda, assim como monitorar o que estará a acontecer com cada uma delas. Na sua óptica, as execuções ocorridas em Moçambique podem ter resultado de acerto de contas entre criminosos e/ou a mando do Governo daquele país. “Se não encontrarmos mecanismos apropriados, cada um há-de encontrar uma forma de resolver”, defende.
Refira-se que esta foi a primeira vez em que o Governo admitiu haver execução de ruandeses em Moçambique. A confirmação chega quase três anos depois do assassinato, em Setembro de 2021, de Revocat Karemangingo, ocorrido no bairro da Liberdade, no Município da Matola, província de Maputo.
Revocat Karemangingo, ex-militar, era vice-Presidente da Associação dos Ruandeses Refugiados em Moçambique e lidera a lista dos ruandeses que estavam na mira do regime de Paul Kagame. Ainda em 2021 (Maio), sublinhe-se, um outro cidadão ruandês, de nome Ntamuhanga Cassien, foi raptado na Ilha de Inhaca, na Cidade de Maputo, por desconhecidos. Os dois casos nunca foram esclarecidos pelas autoridades moçambicanas.
Os dois casos de 2021 juntam-se ao assassinato, em Outubro de 2012, do ex-director do Banco de Desenvolvimento do Ruanda, Theogene Turatsinze, ocorrido na capital do país, cujo corpo foi encontrado amarrado com cordas, dois dias depois de ter sido dado como desaparecido.
Frisar que a comunidade ruandesa refugiada em Moçambique tem denunciado, constantemente, a existência de esquadrões de morte no país, denúncias que subiram de tom após a chegada das tropas ruandesas em 2021, com o objectivo de combater a insurgência, na província nortenha de Cabo Delgado. (A. Maolela)
Simião Ponguane, um dos mais destacados jornalistas da TVM, perdeu a vida esta quarta-feira (20), no Hospital Central de Maputo, vítima de doença prolongada.
Segundo uma nota da TVM, nos últimos três anos, Simião Ponguane lutava contra um cancro no fígado, tendo tentado tratamento dentro e fora do país, mas sem sucesso. Ponguane era um dos mais antigos colaboradores da TVM e preparava-se para a reforma. Jornalista irreverente e de discurso “terra a terra”, notabilizou-se com reportagens no terreno e Grandes Entrevistas a diversas personalidades.
Para o jornalista Edmundo Chauque, o país perde um professor de ideias. “O timbre carismático e a sua voz prendiam milhões de telespectadores. Ríspido e directo, soube chamar os “bois” pelos nomes. Não tinha subterfúgios. Não tinha rodeios”.
O nosso entrevistado lembra ainda a veia jornalística de Simião Ponguane: Ou o entrevistado" boiava" por assim dizer, se não dominasse o assunto ou "apanhava em directo".
“São inúmeros os bons exemplos da grandeza de Simião partilhados nas gerações [dos Faduco, Mavanga, Sitoi...] que nos foram transmitindo e aprendemos. Perdemos a voz dos que não têm voz. Em Moçambique e na diáspora. Vai ser difícil encontrar um jornalista da estirpe de Simião. Douto no saber e pronto a ensinar. "Ponguane é um herói de todas as frentes”, disse à “Carta”, Edmundo Chauque.
Simião Ponguane morreu, mas as obras não morreram
No seu depoimento sobre a vida e obra de Simião Ponguane, a jornalista Joana Macie disse que ele morreu, mas as suas obras ficaram. “O apelo que deixo neste momento é que a nova geração deve recorrer aos trabalhos de Ponguane para aprender como é que se posiciona perante uma fonte”.
Em vida, Simião Ponguane desempenhou vários cargos na Televisão de Moçambique: foi chefe da Redacção, Director de Informação, Director do Canal Internacional, Assessor do Conselho de Administração e Correspondente da TVM na África do Sul. Foi também Correspondente da Voz da América. Ainda não há detalhes em relação às cerimónias fúnebres. (Carta)
A bancada parlamentar da Frelimo aprovou, na manhã de hoje, na generalidade, a Proposta de Resolução que ratifica o Acordo de Extradição entre as Repúblicas de Moçambique e do Ruanda, assinado em Junho de 2022, pelos Ministros de Estado para os Assuntos Constitucionais e Legais do Ruanda e da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos de Moçambique. O documento foi viabilizado com 169 votos favoráveis da bancada maioritária, contra 51 da oposição: 47 da Renamo e quatro do MDM (Movimento Democrático de Moçambique).
A Frelimo, na voz da deputada Muanarera Abdala, defende ter votado a favor da ratificação do Acordo pelo facto de os dois países manterem boas ralações de cooperação, que se demonstram no plano militar, onde tropas ruandesas apoiam as Forças de Defesa e Segurança (FDS) Na luta contra o terrorismo na província de Cabo Delgado.
Por sua vez, o deputado Muhamad Yassine, da Renamo, afirma que a sua bancada parlamentar reprovou o documento em respeito ao artigo 20 da Constituição da República que, no seu número dois, estabelece que a República de Moçambique “concede asilo aos estrangeiros perseguidos em razão da sua luta pela libertação nacional, pela democracia, pela paz e pela defesa dos direitos humanos”.
Para o maior partido da oposição, o Acordo assinado pelo Governo com o regime de Paul Kagame visa simplesmente perseguir e extraditar opositores políticos do presidente ruandês que se encontram refugiados no país. Aliás, argumento idêntico foi usado pelo MDM para justificar a sua posição.
Silvério Ronguane afirma que Moçambique deixou de ser um país que protege os perseguidos e se tornou num país opressor. Disse ainda não haver qualquer histórico criminal de moçambicanos naquele país, pelo que o acordo vai beneficiar o Ruanda e não a Moçambique.
Lembre-se que o Acordo de Extradição entre Moçambique e Ruanda não colhe consenso no país, devido a presença massiva, em Moçambique, de opositores do presidente ruandês, que há mais de duas décadas vêm sendo perseguidos.
Uma das organizações da sociedade civil que se manifestou publicamente contra o acordo é o Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD), que chegou a recomendar, em Março de 2023, a Assembleia da República a não ratificar o documento.
“Os cidadãos ruandeses que estão na mira do regime do Presidente Paul Kagame estão a ser perseguidos em razão da sua luta pela democracia, concretamente, a diversidade de opiniões. (…) Trata-se de cidadãos que fugiram do Ruanda devido à perseguição política e vivem em Moçambique com o estatuto de refugiados, uma condição que lhes foi reconhecida pelo Estado moçambicano”, sublinhara a organização. (Carta)