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quarta-feira, 30 janeiro 2019 05:28

O comboio dos bitongas não volta mais

Ao Fazal Lacá, um machope nascido em Inharrime, e que Niassa arrebatou até à morte.

 

Não era só dos bitongas, mas também dos machopes. Misturava as duas etnias em carruagens com bancos de madeira, e uma ou duas com estofos de napa para os privilegiados. Mexia com os locais por onde passava, fazendo tremer a terra. Parava em estações e apeadeiros do tipo “farwest”  - para embarque e desembarque - estendidos ao longo de uma extensão de cerca de noventa quilómetros entre a cidade de Inhambane e a vila de Inharrime. Era uma festa. Proporcionada por uma máquina à vapor numa altura em que não se falava, como hoje, da poluição do ambiente. E esse tempo não dá indicações de que vai voltar um dia.

 

Estou apinhado num “chapa”. Sou uma lenha. Que se junta à outras lenhas que vão compor um feixe  pronto para ser destruído a qualquer momento numa curva ou numa ribanceira, ou ainda num embate frontal irresponsável. Porém o que me reconforta apesar desse desconforto é que aqui dentro, onde mesmo assim estamos todos sentados, não há algazarra. O nosso silêncio colectivo dá total liberdade à música que se ouve nas colunas que libertam som equalizado. Boa música, em volume baixo para  o sossego da alma!

 

Lá vamos nós. De Inharrime à cidade de Inhambane. De “chapa”. Apertados. Oiço o som dos pratos da bateria anunciado a entrada em cena de Hugh Masekela que vai cantar o embalsamante “Stimela”. Transformando o pequeno autocarro que nos transporta como sardinhas desdenháveis numa agradável discoteca. E toda essa levitação do espírito faz esquecer o sofrimento do corpo. Ao mesmo tempo que me recordo do tempo em que nesta terra tivemos um “stimela” que fazia parte da nossa história. Mas do registo desse “poema lírico”, ficaram apenas os hangares transformados num mamarracho, e uma locomotiva negligenciada. Lembrando-nos que aquele comboio era um poema dos bitongas. E dos machopes.  

 

Arrancaram os carris. De aço. Como se estivessem  a arrancar-nos o coração. Sem nos dizerem nada. Sem direito à consulta. Vieram buscar as locomotivas e as carruagens e os vagões. Meteram tudo em grandes camiões e foram-se embora. Deixando-nos com a saudade da música que o comboio cantava para dentro de nós: “pouca-terra, pouca-terra, pouca-terra”. Hoje já não há nada disso. Aliás, Eusébio Johane Ntamele já cantava: “khombo la mina mamana, va ranga hi mbilu va lhomula” (que azar é o meu, mãe: a primeira coisa que fizeram foi arrancar-me o coração). E se te arrancam primeiro o coração, o quê que vai restar de ti?

 

Tudo aquilo era um regalo. Por exemplo, quando a máquina apitasse, anunciando a chegada, homens e mulheres e velhos e crianças e paralíticos, desciam como várias ondas do mar que vão ser despejadas na estação. Ou no apeadeiro. Uma parte deles ia receber os familiares ou amigos. Mas a grande  maioria  ia apenas celebrar a chegada do comboio. Que traz no seu bojo passageiros distribuidos entre os bitongas e os machopes. Todos queriam abraçar a máquina com os olhos e a alma.

 

Os vagões vinham cheios de lenha. Troncos para os fogueiros. As carruagens de carga abarrotavam de mandioca fresca, milho, farinha de mandioca, mel, ananás, manga e quejandos. Cumplicidade. Os Caminhos de Ferro de Moçambique por estas bandas não faziam muito dinheiro com o empreendimento. Contudo davam alegria às pessoas. Ofereciam vida. Quase de graça. Também hoje se calhar as máquinas à vapor não façam parte do nosso tempo. Mas a poesia celebra-se eternamente.

segunda-feira, 28 janeiro 2019 16:29

O parecer de Eduardo Namburete

Sobre o pedido de consentimento do TS à AR para a prisão preventiva do deputado Manual Chang

 

 O Tribunal Supremo, pelo punho do Venerando Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo, Dr. Rafael Sebastião, endereçou um ofício à Presidente da Assembleia da República solicitando que a Assembleia da República dê “... o consentimento para a imposição da medida de coacção máxima (que ao caso é a prisão preventiva), nos termos do artigo 173 da Constituição da República e do artigo 13 do Estatuto do Deputado, aprovado pela lei nº 31/2014 de 30 de Dezembro”. 

 

O Tribunal Supremo justifica o seu pedido “por haver receio de fuga uma vez que o arguido se encontra fora do país correndo-se o risco de não atingir os fins do processo, além da perturbação da instrução do processo mantendo-se o arguido em liberdade”.

 

De acordo com o ofício do Tribunal Supremo, o até aqui Deputado da Assembleia da República Manuel Chang é acusado de vários crimes, nomeadamente o de Abuso de cargo ou funções, previsto e punido pelo artigo 16 da Lei nº 9/87 de 18 de Setembro; crime de violação da legalidade orçamental, previsto e punido nos termos do artigo 9 da lei nº 7/98, de 15 de Junho, conjugado com o número 5 do artigo 22 da Lei nº 15/97 de 10 de Junho, referente ao Orçamento e à Conta Geral do Estado, artigo 11 da Lei nº 1/2013 de 7 de Janeiro que aprova o Orçamento do Estado para 2013 e artigo 11 da Lei nº 1/2014, de 24 de Janeiro que aprova o Orçamento do Estado para 2014 e artigo 77 al. a) da Lei nº16/2012 de 14 de Agosto; crime de Burla por defraudação, previsto e punido pelos artigos 451 nº 3 e 421 nº 5, ambos do Código Penal vigente; crime de Peculato, previsto e punido nos termos do artigo 313, conugado com o artigo 437, ambos do Código Penal vigente; Corrupção passiva para acto ilícito, previsto e punido nos termos do artigo 7 da Lei nº 6/2004, de 17 de Junho; e Branqueamento de capitais, previsto e punido nos termos conjugados dos artigos 4, nº 1, al. a), artigo 7, nº 1, als. i), k) e t), e artigo 75, nº 1, al. a) da Lei nº 14/2013, de 12 de Agosto.

 

O pedido do Tribunal Supremo é explícito e não deixa margem de dúvidas quanto aos seus propósitos que é para que a Assembleia da República dê o seu consentimento para que Manuel Chang seja preso. E esse pedido é feito com base no artigo 173 da Constituição da República e do Estatuto do Deputado. Vamo-nos concentrar na Constituição da República e abstrairmo-nos, por alguns instantes do Estatuto do Deputado, em respeito ao que estabelece o nº 4 do artigo 2 da Constituição da República, que as normas Constitucionais prevalecem sobre todas as restantes normas do ordenamento jurídico.

 

O artigo 173 da Constituição da República que é citado pelo Tribunal Supremo para fundamentar o seu pedido, estabelece no seu nº 1 que “nenhum Deputado pode ser detido ou preso, salvo em caso de flagrante delito, ou submetido a julgamento sem consentimento da Assembleia da República”. Fazendo uma leitura atenta a este número, evidente fica que o Deputado só pode ser detido ou preso em caso de flagrante delito, assim como ser submetido a julgamento somente com o consentimento da Assembleia da República.

 

No caso concreto, a pretensão do Tribunal Supremo é prender preventivamente o Deputado Manuel Chang, o que, não se estando em presença de flagrante delito, seria uma grosseira violação do estabelecido na primeira parte deste nº 1 do artigo 173 da Constituição da República. O pedido de consentimento da Assembleia da República só faria sentido se fosse para submeter o Deputado Manuel Chang a julgamento, conforme se pode extrair da segunda parte deste mesmo nº 1 do artigo 173.

 

Atento ao estabelecido no artigo 173 da Constituição da República, e não se estando perante um flagrante delito, o pedido do Tribunal Supremo constitui um apelo à violação da Constituição da República, porquanto não estão reunidos os requisitos constitucionais para que o pedido proceda. A Assembleia da República poderia dar o seu consentimento, não para a prisão do Deputado Manuel Chang, mas sim para ele ser submetido a julgamento, o que se efectivaria através do levantamento da imunidade parlamentar de que Chang goza enquanto Deputado, observando-se as formalidades previstas no artigo 16 do regimento da Assembleia da República.

No ano passado, ainda sem a plataforma de “Carta”, despoletei uma questão candente: o ensino privado em Moçambique é uma autêntica selva e a educação das nossas crianças, que devia ser acessível também no ensino privado, acaba sendo um autêntico fardo no orçamento das famílias, sobretudo nas de classe média. Grosso modo, as escolas fazem cobranças de forma indiscriminada; cada uma tem sua tabela de propinas. Como é que preços são formados? Será que elas pagam impostos? Quando despoletei o escândalo, houve da parte das autoridades da educação uma intenção de actuar.  E também da parte das autoridades tributárias uma promessa para autuar. 

 

 Mas foram promessas em vão. A selva continua intacta e os espinhos do capim crescendo, violentando os nossos bolsos. Os cidadãos estão praticamente indefesos. Ninguém define os critérios de cobrança de propinas no ensino privado. Algumas escolas dizem que usam o famoso currículo de Cambridge, mas trata-se de uma farsa curricular. A maioria vende gato por lebre. O sector privado da educação está praticamente desgovernado.  Em Maputo, há dezenas de escolas privadas ditas de elite que, só porque se localizam em bairros nobres como a Polana ou a Sommerschield, cobram uma pipa de massa. Escolas são montadas em vivendas e casarões sem as mínimas condições para albergarem um ensino de qualidade em todas as componentes, incluindo a educação física e actividades extra-curriculares. Não tém laboratórios de ciências nem bibliotecas apetrechadas. São uns autênticos "dumba-nengues" do ensino. Mas cobram valores astronómicos, funcionando como uma mafia instalada para sugar os bolsos dos cidadãos, que não têm alternativa porque, salvo algumas raras excepções, o ensino público é uma lástima. 

 

O facto é que o negócio das escolas privadas virou uma forma de endinheiramento fácil dos seus proprietários. Em Setembro, depois que denunciei essa selva fiscal e curricular, esperava ver acções concretas. Mas parece nada estar a acontecer. Agora que as aulas estão à porta, milhares de pais andam à nora. Seus bolsos estão a saque. O mais revoltante é que, quase todas as escolas, cobram uma taxa fantasma referente ao mês de Janeiro, por inteiro: 200, 300, 400 USD. Mas porquê pagar Janeiro se as aulas começam em Fevereiro? Ninguém sabe, ninguém explica o racional desta cobrança e ninguém manda para-la. É uma grande aberração. Um assalto indecente. Mas na modorra do desgoverno em que vivemos como esperar que alguém saia em defesa da decência?

segunda-feira, 28 janeiro 2019 07:25

Se eu fosse a Buchili

Se eu fosse a Biatriz, a digníssima dona procurad(or)a, saía um pouquinho do ar condicionado, descia uns passitos ali ao mercado central e comprava uma sebenta (caderno) daquelas de capa dura, de cor preta, escrita "caderno escolar". Aproveitava esse tempo em que país e encarregados de educação estão a comprar material escolar para os seus filhos e afins para fazer também minhas compras lectivas. Dizia, comprava uma sebenta de capa dura, preta, com letras brancas a frente "caderno escolar" e três esferográficas "Bic": azul, preta e vermelha. Um kit de apontamentos. Escrevia o meu nome naquele quadradinho branco que vem na capa. Ali onde é para pôr "escola", ia escrever "Kempton Park Magistrate", na "disciplina" seria "Princípios Básicos de Direito" e na "turma" ia escrever "Pé-Gê-Ere de Moz". Então, ia começar a passar apontamentos da professora Elivera Dreyer, aquela senhora magnífica que está a dar aulas de Direito, de borla, ali na casa vizinha. Ficava bem quietinha e muito atenta às aulas dela. 



Convenhamos, pessoal, aquela forma de argumentar uma acusação para matrecar um gatuno diplomático, imune e com altos níveis de glicemia, cercado por advogados caros e reputados da máfia, são autênticas lições gratuitas de Direito para a dona Bia e seus apaniguados. Não é brincadeira! Nem o mancar, nem a palidez, nem a diabetes mellitos, consegue salvar o homenzinho das garras da senhora. Na Pé-Gê-Ere aquelas audições deviam ser assistidas em tela gigante, num anfiteatro, com direito a apontamentos e tudo. Que "granda" aula, meu Deus! Chiiiça! 



Continuando, eu ia aproveitar essas audições de Joannesburg para fazer meus apanhados para enfrentar os 17 arguidos que ainda me sobram na lista. Podia usar essas cabulas para, pelo menos, assustar aqueles gatunos da lista que não são diplomáticos nem imunes e marcava alguns pontos neste meu pobre e insignificante mandato. Pelo menos teria alguma coisa para contar aos meus netos. Um dia talvez estaria escrito na história do judiciário moçambicano como uma menina atrevida que tentou destruir um ninho de marimbondos de luxo. Podia não conseguir, mas ia tentar. 



Ao invés de estar aí atrapalhanda em resgatar um lesa-pátria confesso, ela devia já estar a fazer algo mais interessante, como por exemplo, deitar fora aquele relatório encriptado e começar a trabalhar seriamente com o original da Kroll que chama os gatunos pelos seus próprios nomes de registo, sem alcunhas nem pseudónimos. Não devia gastar tempo fazendo parcerias com o Tribunal Supremo e o Parlamento, que só vai somar mais vergonhas. Devia fazer algo mais palpável e visível. É preciso aproveitar algumas oportunidades que a vida nos oferece. As vezes é preciso nos olharmos no espelho e termos um pouco de vergonha na cara. É preciso sentirmos pena do nosso travesseiro a noite. Isso de ir trabalhar enquanto o cérebro ainda está em Bilene de férias não é uma coisa para habituar. 



Daqui a pouco, o Chang e seu pâncreas vão embarcar, a palestra da doutora Elivera vai terminar e vocês vão continuar aqui com a vossa dúzia e meia de surrupiadores de luxo e um monte de comunicados, convocatórias e cartas de pedido de resgate que não deram em nada. Aproveitem cabular ao menos. O tempo é esse. 

- Co'licença!

Não é nova a ideia de venda de estrelas. Promotores turísticos colocam estrelas e constelações, como produto ao alcance de seus clientes. Assim, os pacotes turísticos ganham novos atractivos. Ponta Mamoli e alguns outros resorts, coincidentemente, já fazem uso e recurso destas técnicas promocionais. Não vendem estrelas, mas potenciam o paz, sossego e calmaria, como antídoto de qualquer stress. Tudo, obviamente, associado ao prazer de contemplar o potencial turístico, a culinária e a beleza exótica de ecossistemas especiais. No meio do turbilhão que sacode títulos e manchetes jornalísticas, Naomi Campbel, a célebre modelo, negra, britânica, passou alguns dias no sul de Moçambique. Mais exactamente, na Ponta Mamoli. Esse "lodge" encalhado no majestoso ecossistema Maputaland-Pondaland que, faz algum tempo, despertou os apetites e curiosidades de cientistas e ambientalistas, de todas as partes do mundo. 

 

O "hotspot" de biodiversidade da Maputaland-Pondaland, que se estende por mais de 275.000 kms quadrados, através de Moçambique, Suazilândia e África do Sul, faz parte das 34 áreas de conservação de biodiversidade consideradas das mais biologicamente ricas e diversificadas do planeta. Porém, e infelizmente, são regiões ameaçadas e com algumas espécies endémicas em risco. Portanto, têm, por conseguinte, potencial para serem economicamente exploradas e viabilizadas, e possuem características sui géneris. Aliás, como diz a própria Naomi Campbel, o céu nunca foi o limite, pois nós próprios somos o limite que pretendermos.

 

Mas não foi apenas a Naomi Campbel que visitou o complexo White Pearl, neste 2019 que agora inicia. A modelo croata Nina Vagic, igualmente de enorme reputação mundial e colega de longa data da outra, veio junto. Luciano Huck, do Brasil, famoso e aclamado apresentador de televisão da Globo, e a sua esposa Angélica também estiveram no país, desta feita em Inhambane. Até o Presidente do Botswana escolheu este canto para repousar. Nada acontece por simples coincidência. O mais importante segredo do turismo é sempre um bom plano de marketing. O marketing quando estabelecido de forma estratégica e, com alvos definidos, tem a condição de atingir alvo certos e, depois, os resultados aparecem! Verdade que a estabilidade que o país vive, os sinais externos que emite, contribuem e mobilizam. As estâncias precisam de fazer a sua parte, assegurando que as estadias sejam serenas, tranquilas e, acima de tudo, proveitosas. 

 

Estas presenças servem para ajudar e publicitam o emergente turismo moçambicano. Colocam o país na rota dos circuitos de turismo de baixa intensidade e alto rendimento. Deste modo, as instâncias turísticas ganham seus espaços de eleição e competitividade. As vantagens comparativas despontam e os padrões de qualidade criam seus segmentos de mercado. Assim funciona a indústria turística pelo mundo. 

 

Mas, não basta potencial. Tão-pouco o marketing por si só faz milagres. Os contornos vão muito para além destes elementos. Temos de ser competitivos e propiciar as condições atractivas para os visitantes. Ao longo de anos, o maior diferenciador de incentivo foi o turismo cibernético. Para o interior das coutadas desaguavam caçadores desportivos que, a troco de troféus, a preço de banana, alimentaram as coutadas e comunidades vizinhas. A instabilidade militar reduziu consideravelmente a apetência pela fauna nacional!

 

Os furtivos, então, encontraram espaço para os desmandos. As praias, podem agora substituir estes segmentos e despontar como os novos delfins do turismo nacional.  Convenhamos, desta forma, que estas e outras visitas não têm aparecido por acaso! 

 

As estâncias ainda apresentam preços pouco competitivos e a promoção tem sido feita extras-muros. Próximo das constelações. As primeiras visitas do Prince Harry, seguidas depois do Dolce & Gabbana, abriram os caminhos para que estas novas visitas aconteçam. Poderemos esperar por mais, principalmente, se a mobilização boca a boca continuar. Porém, as exigências vão aumentar e o nível de preparação terá de ser outro. 

 

Na recente visita da dupla Naomi e Nina ficou evidente o nível de exigência. Chegaram com volume de bagagem anormal e acomodar esses volumes exigiu perícia. Apenas bebiam, por força de seus contratos profissionais, água da Evian. Isso, porém, só foi alertado, com as visitantes já no terreno. Não adiantaria pensar em fazer compensações. Mesmo estando em locais remotos foi necessário encontrar soluções, bem como equacionar outras questões  tão exigentes como sendo o cuidar do cabelo, das unhas e etc. Ter os mesmos funcionários, para o atendimento personalizado, também, foi uma experiência desafiante. Estes requintes e confortos, têm de ser associados a momentos de rara qualidade, educativas descobertas, pura diversão e relaxamento. 

 

Obviamente, tudo isto serve e serviu de aprendizado para a gestão do White Pearl, como de toda a cadeia que esteve envolvida. A primeira impressão, como diz um adágio popular, é a que mais conta. Então, para começo de jornada, elas ficaram impressionadas, como têm ficado os restantes visitantes. Moçambique tem, por natureza, o dom da hospitalidade, por conseguinte, beneficia desse factor de forma proveitosa. Este teste foi muito mais que um investimento, foi o reafirmar de uma vontade de todos nós, de fazer do país um destino privilegiado. 

 

Naomi, assim que terminou a visita, fez um "post" na sua página onde agradece ao White Pearl e a Moçambique por a ter acolhido, pelas experiências e hospitalidade. Oxalá, está exclusiva menção chegue aos olhos e banhe os ouvidos de outros tantos candidatos visitantes. Como promotora da Channel e outras marcas, abrem-se perspectivas de novas visitas e outras estrelas e constelações. 

sexta-feira, 25 janeiro 2019 07:42

"Síndrome de Deus"

Depois que Manuel Chang foi preso e foram, igualmente, revelados o esquema e os valores do calote, muitos são os moçambicanos que se perguntam: Mas, o que deu no Manuel Chang e seus comparsas para roubarem tanto dinheiro assim e da maneira que roubaram? O que se passou nas suas cabeças? Será que não tiveram um pingo de medo? Roubar um país daquela maneira? E eu respondo: Não estavam nem aí. Não se passou nada na cabeça deles naquele momento, a não ser levarem o dinheiro, ficarem ricos e viverem numa boa. Não tiverem medo nenhum. Roubar é o que você diz, para eles é levar o que lhes é de direito. 


Mas porquê? Por nossa culpa. Nós confundimos respeito com medo. Para nós, os nossos governantes são DEUSES. São intocáveis. Podem tudo. Tudo gira em torno deles. Tudo depende deles. Nunca erram. Nunca se enganam. São os mais sábios entre nós. O país ou o ministério é do dirigente.

 
Tudo começa com os adjectivos e alcunhas que atribuímos a eles: o visionário, o filho mais querido, o enviado de Deus, etecetera. Para nós, sua excelência, excelentíssimo, senhor, doutor, presidente, ministro, e afins, não são suficientes. Nós veneramos o governante e ultrapassamos os limites humanamente admissíveis, o que acaba criando nas pessoas aquilo que eu vou desde já chamar de "síndrome de Deus". Ou seja, a pessoa acaba se achando "O Deus Todo Poderoso": aquele que está acima de tudo e de todos, incluindo a Lei. Nós endeusamos exageradamente que o governante acaba perdendo a ética e o cuidado de gerir a coisa pública. Perde a noção do perigo. Acaba assumindo que aquilo tudo é dele e ele pode fazer e desfazer e passa a ver o país, a província ou o ministério como sua capoeira. Aliás, como todos sabem, nesse famigerado calote os dinheiros eram tratados por "galinhas".


Não nos passa pela cabeça que o Presidente da República, o Primeiro-Ministro, o ministro, o vice, o governador, deputados, e quejandos, são também "funcionários públicos". O salário deles vem dos nossos impostos. Temos de monitorá-los. É a nós que eles devem prestar contas. Ser governante não é profissão, é missão. Não é eterno, é passageiro. Subordinação não é vassalagem. 


Na verdade, nós é que criamos os nossos próprios Changs, Cambazas, Cetinas, e companhia. Outros vão também criando os seus Obiangs, Salva Kiirs, Bongos, Mugabes, Dos Santos, e por aí fora. A culpa é nossa. A quantidade e qualidade de sentinelas de prontidão que defendem parvoíces dos nossos governantes é preocupante. Nós não temos gestores públicos, temos Messias. Nós não temos governantes, temos pessoas escolhidas por Deus, temos profetas. Nós somos governados por pessoas que podem fazer tudo o que lhes apetece. Pessoas que podem até levar dinheiro do povo para fins particulares sem que ninguém os impeça. Parece que não, mas Manuel Chang não está a acreditar que aquilo que ele está a passar hoje é realidade. Nunca imaginou. Para ele, aquilo não é normal. Ele ainda não se considera gatuno. Ainda não está curado da "síndrome de Deus" que nós criamos nele. E pior, alguns de nós também não estão a acreditar, incluindo o nosso judiciário. A nossa Pé-Gê-Ere, outra incubadora desses deuses, está desnorteada. 


Chang e companhia orquestraram aquela fraude muito fresquinhos e nunca consideraram a possibilidade de serem encontrados e muito menos de serem responsabilizados. Dai que o homem não sente remorso nenhum, e tenta convencer a Justiça a viver numa casa alugada perto da Ressano para "dar gás" e continuar a viver à francesa como está habituado. Mas o que mais me preocupa é que nós também ainda não estamos preparados para apontar o dedo àquele feitio de gatunos. Para nós, a prisão do Deus Chang é um teste a nossa fé: "síndrome do crente devoto".