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segunda-feira, 11 setembro 2023 09:18

Como vai responder Moçambique ao advento dos golpes na África Ocidental? (Para que serve o Banco de Moçambique se não consegue pensar?)

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Joaquim Chissano reagiu à actual onda golpista em África condenando-a, dizendo mesmo que era um retrocesso anti-democrático. Mas afinal o que é mais democrático: um governo autocrático e corrupto, sustentado por eleições ciclicamente fraudulentas ou um golpe militar com amplo suporte popular?

 

A onda golpista é um ataque à hegemonia do ocidente no concerto internacional das nações, que perpetua relações de dominação colonial, sob novos termos, mas sempre com conluio interno como na escravatura, com a inerente pilhagem de recursos do nosso continente.

 

Os jovens golpistas da África Ocidental estão a dizer basta a essa pilhagem dos nossos recursos com a cumplicidade dos líderes africanos.

 

Moçambique deve aprender com isso e reformar o actual quadro fiscal com as multinacionais que cá operam. A percepção de que estamos a ser roubados, com a cumplicidade e benefícios para uma elite política minoritária, está cada vez mais generalizada entre a juventude pauperizada: o paraíso da Mozal, o acumulado desmando da Sasol, os “subsídios” estatais à Jindal (a HCB vai lhe reabilitar a estrada que destruiu), os lucros fabulosos da Ruby Mining de Montepuez e a fiscalidade complacente entre Moatize e Benga.

 

A percepção da expropriação é maior. Incluindo os receios de que a nova narrativa da transição energética pode esconder novas formas de expropriação à população campesina, por via de grandes projectos de uso de terra sob pretexto de economia verde.

 

O golpismo vigente é um alerta para nós, para as elites políticas de Moçambique. O discurso e a acção política devem mudar. Nyusi foi legitimar o crocodilo fraudulento de Harare, a maioria dos líderes da região não caíram na ladainha da Zanu!

 

Nyusi foi à cimeira africana do clima; mas Museveni gazetou porque o principal orador era John Kerry, que foi lá debitar umas lições americanas para os líderes mentecaptos de África, que não entendem nada de clima.

 

Na semana passada, o Governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, entre erros gravosos de perspectiva histórica, foi ler (e muito mal lido) o habitual clichê de receitas do FMI, queixando-se do despesismo governamental, mas sem apresentar uma proposta de soluções que confronte a caixa fechada com que o Fundo olha para Moçambique, perpetuando a pobreza. Afinal, para que serve o Banco de Moçambique se não consegue pensar?

 

Enfim…

 

Uma leitura magistral sobre o que significa a onda golpista para África e para as relações internacionais pode ser vista neste “Bottom Line” da Al Jazeera.

 

Chamo também a atenção para a leitura do mais recente ensaio de Severino Ngoenha et all (2023), que discute justamente a questão da disrupção das relações de dependência coloniais no quadro dos BRICS e a proposta subjante de uma nova multipolaridade.

 

Eis uma questão problematizadora do texto em referência: 

 

“O que é interessante nos BRICS é a busca de uma alternativa aos 700 anos de hegemonia desumana do Ocidente feita lei e imperativo de relações entre nações e povos. Não se trata só da desdolarização da economia-mundo, mas também da revisão do estatuto das instituições globais (Nações Unidas, Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial…), que desde o fim da Segunda Guerra regem, tutelam e garantem o status quo: as assimetrias das relações económicas e de poder entre as potências vencedoras da guerra e o resto do mundo.

 

A questão que se nos põe, como país e como região, é como participar neste esforço de mudança de paradigma, participar para prevenir que não seja uma ulterior partilha do mundo, desta vez entre os antigos ricos e os ricos emergentes. Aliás, se não estivermos atentos, se não anteciparmos a direcção dos ventos, os BRICS (potenciais novos-ricos) não vão representar simplesmente uma subida em flecha de uma nova força económica global, eles vão confrontar-se, como já acontece hoje no Sudão, Etiópia, Sahel (…), com as velhas forças de dominação (EUA e a Europa) em conflitos económicos e até bélicos, com os nossos países e continente a servirem de campo de batalha”.

MM

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