O debate instrutório do caso do jornalista Amade Abubacar (e do seu colega Germano Daniel) inicia esta manhã no Tribunal Provincial em Pemba, Cabo Delgado. O teor da acusação, na posse de “Carta”, é este: Amade Abubacar supostamente usou uma conta do Facebook, em nome de Shakira Letícia Júnior, para lançar mensagens não abonatórias contra as Forças de Defesa e Segurança (FDS). Por essa via, diz o libelo, ele terá cometido os crimes de instigação pública, instigação simples e injúria.
Esta acusação difere da inicial. Quando foi detido no dia 4 de Janeiro deste ano em Macomia, num momento em que fotografava refugiados da insurgência que chegavam àquela sede distrital, Amade Abubacar era acusado de violar o “segredo de Estado” com recurso a meios informáticos através da conta de Shakira Júnior no Facebook.
Toda a acusação não tem um único elemento de prova senão declarações de 5 colegas do jornalista, funcionários da Rádio Comunitária Nacedje, de Macomia. Os cinco foram arregimentados pelo Ministério Público para esse efeito. São eles o Delegado da Nacedje, o seu assessor, o chefe da Redacção, um Coordenador e uma gestora. Também estão na lista dos declarantes que lhe incriminam o Secretário Permanente de Macomia e uma jovem de nome Rufina, cuja fotografia apareceu no referido perfil do Facebook.
Todos eles estão, à excepção de Rufina, ligados ao Estado. A Rádio Comunitária Nacedje é um órgão adstrito ao Instituto de Comunicação Social (ICS), uma entidade pública. A acusação assenta nas suas declarações e nunca houve perícia técnica que determinasse que a conta Shakira foi criada por Abubacar. Ou seja, não existem provas nenhumas.
Shakira Júnior Lectícia manteve durante 13 meses uma conta no Facebook exaltando a insurgência em Cabo Delgado. Publicava fotografias de jovens que aparentemente haviam aderido aos grupos que espalham o terror em aldeias remotas do norte de Moçambique. A foto do seu perfil era falsa. “Carta de Moçambique” investigou e localizou parte desses jovens, fotografados a exibir maços de dinheiro como se tivessem sido pagos por sua participação nas matanças. Para quem não leu, a reportagem sobre Shakira foi publicada a 13 de Dezembro do ano passado, poucas semanas após o nascimento de “Carta” https://cartamz.com/index.php/politica/item/403-carta-investigou-o-misterioso-shakira-lecticia-e-como-ele-usou-o-facebook-para-exaltar-a-insurgencia-no-norte-de-mocambique)
E Amade Abubacar, que já trabalhava como nosso colaborador desde 26 de Novembro em Macomia, usando o pseudónimo Saíde Abibo, foi quem fez boa parte da reportagem no terreno. A 9 de Dezembro deste ano, Shakira Lectícia Júnior exibira no seu perfil uma mulher sentada na cama de um quarto que ele alegava ser de uma residencial de Macomia. A mulher vestia roupas interiores. ‘Prostituta de Macomia é bonita’, escreveu ele”. “Carta”, através de Amade Abubacar, localizou a senhora.
Na reportagem do caso, escrevemos o seguinte sobre a senhora: “Chama-se Rufina e vive no bairro central de Macomia. É mãe de três filhos. Foi esposa de um mecânico da praça local. Mais tarde se juntou a um professor da Escola Secundária Padre Paulo de Macomia. Separou-se do professor e vive agora de pequenos negócios, entre os quais o fabrico e venda de Kabanga, uma bebida tradicional caseira na base de farelo de milho. Suas fotos foram alegadamente tiradas por um amigo. Não conseguimos falar com Rufina. Na sua casa em Macomia disseram que tinha ido à machamba, num lugar distante. Um amigo descreve-a como uma mulher meiga e ‘normal’, sem traços de estar alinhada com os insurgentes”. Agora, essa mesma Rufina foi arrolada como testemunha incriminatória. Não se sabe porquê. Estranho!
Quando foi detido no dia 4 de Janeiro, a Amade Abubacar foi confiscado um telefone. Dias antes ele sofrera um roubo em casa, onde lhe tiraram o laptop. Mesmo antes de ter sido “raptado” pela Polícia nesse dia 4 de Janeiro, Amade já nos tinha revelado desse roubo. No seu telefone foram encontradas fotografias que ele baixara do perfil de Shakira. Parte dessas fotos serviram de ilustração à reportagem publicada na “Carta”, onde denunciamos a perfídia de Shakira. São fotos que até tinham inundado as redes sociais naqueles dias. Facto é que no exacto dia em que nossa reportagem foi publicada, a conta de Shakira no Facebook foi encerrada.
Mas Amade continuou no encalço doutras pistas tentando desvendar a identidade de Shakira. Como jornalista num distrito, ele dominava suficientemente, e tinha paixão, as tecnologias de informação. Mas até ser indiciado como tendo aberto a conta de Shakira vai uma longa distância.
Quando foi raptado pela Polícia no dia 4 de Janeiro, duas semanas depois de lhe ter sido roubado o laptop em casa, foi alegado que Amade Abubacar estava a fotografar um posto policial. Mas isso era uma mentira. Naquele dia, Macomia estava a ser inundada de centenas de refugiados da insurgência, vindos de aldeias do interior. Amade Abubacar encontrou nisso motivo de reportagem. Aliás ele era um abnegado jornalista, talvez o único em Cabo Delgado que mais se preocupava em reportar a guerra silenciosa que afecta a região deste Outubro de 2017.
Quando foi raptado pela Polícia, as autoridades que tutelam o ICS, nomeadamente o Gabinete de Informação do Primeiro Ministro, através da sua directora Emília Moiane, veio alegar que Abubacar não estava ao serviço do órgão naquele dia e, por isso, só podia estar a realizar actividades conspiratórias contra os poderes públicos. Outra mentira: ele era também correspondente da “Carta” e eventualmente trabalhava com outras publicações de fora de Cabo Delgado.
A relação de Amade Abubacar com “Carta” sob o pseudónimo Saíde Abibo, iniciou logo nos primeiros dias deste jornal, dado à estampa pela primeira vez a 22 de Novembro de 2018. Em pouco tempo, e graças à sua colaboração, “Carta” tornou-se numa das publicações que mais cobertura dava à insurgência em Cabo Delgado.
Quando este jornal foi lançado, a cobertura da insurgência em Cabo Delgado foi definida como uma das prioridades editoriais. Para termos informação a partir do terreno era preciso encontrarmos fontes locais, mas de preferência um jornalista local destemido e trabalhador, disposto a seguir instruções a partir de Maputo. Alguém com um leque de fontes locais implantadas em Mocímboa da Praia, Nangade, Palma, Meluco e Macomia.
Em pouco tempo de buscas, foi-nos apresentado Amade Abubacar como o jornalista ideal. Efectivamente, ele começou a escrever para “Carta de Moçambique” a 26 de Novembro. Seu “debut” foi com um artigo intitulado “Populares perseguem atacantes de Squaia e capturam 7 jovens”. Desde esse dia, “Carta” passou a ter um jornalista no terreno cobrindo a insurgência. Usando uma prática comum em toda a parte, escolhemos um pseudónimo para assinar seus artigos sobre a matança em Cabo Delgado: Saíde Abido.
No passado dia 11 de Fevereiro, “Carta” mostrou as evidências de que Amade Abubacar era seu colaborador. Eventualmente, essas evidências alteraram substancialmente a suspeição que recaía sobre ele. Mas a acusação permanece, mesmo sem provas. O debate instrutório que começa hoje em Pemba só pode levar ao único fim esperado: a absolvição do jornalista por completa falta de provas.(Marcelo Mosse)
Os atacantes que operam em oito distritos da província de Cabo Delgado realizaram mais uma acção armada, nesta terça-feira, 21 de Maio, agora visando a aldeia Simbolongo, no Posto Administrativo de Mucojo, em Macomia. Nesta incursão, três cidadãos do sexo masculino foram mortos a tiro. O ataque aconteceu por volta das 17 horas.
As vítimas foram surpreendidas quando estavam em plena quebra do jejum, afirmam fontes da "Carta" em Macomia. Simbolongo é uma aldeia da localidade Pangane e dista cerca de 80 quilómetros da sede distrital.
Segundo as fontes, depois da acção, os insurgentes, em número não revelado, roubaram comida e fugiram para as matas. A zona vive um cenário de insegurança. Os residentes têm sido perseguidos pelos insurgentes nas suas idas ao mar, onde pescam para seu sustento.
Descreveram-nos que a frequência de perseguições a cidadãos indefesos aumentou nas últimas semanas, levando a que poucos se façam à faina no mar. Este cenário acontece depois que, muito recentemente, as Forças de Defesa e Segurança desmantelaram uma das principais bases dos insurgentes, que se localizava numa mata na região entre os postos administrativos de Mucojo e Chai.
Mucojo é uma região cujas populações estão agora a braços com uma situação de fome severa, acelerada pelos efeitos do ciclone tropical Kenneth. Na região não há electricidade e nem se fala por telefone. Com suas casas destruídas pelo ciclone, as pessoas vivem em pequenos abrigos. (Carta)
Os insurgentes que aterrorizam a província nortenha de Cabo Delgado continuam a seu bel-prazer a levar a cabo incursões armadas naquele ponto do país. Depois de algumas semanas sem ataques no distrito de Nangade, eis que neste domingo (19 de Maio) os insurgentes surpreenderam os residentes da aldeia Ngalonga naquele distrito, onde terão morto duas pessoas e incendiado mais de 100 palhotas.
Há quase 19 meses que alguns distritos da província de Cabo Delgado (Macomia, Mocímboa da Praia, Palma, Nangade, Quissanga Muidumbe e Meluco) vivem um verdadeiro terror, com os ataques militares protagonizados por um grupo de insurgentes, cuja motivação é desconhecida, assim como ainda não se conhece a data do “cessar-fogo”, apesar dos esforços do governo de Filipe Nyusi.
Foi num ambiente de suspense, nervosismo e ansiedade que, nesta segunda-feira (13 de Maio), anónimos, jornalistas, advogados e outros interessados aguardavam o anúncio da sentença do julgamento do caso do pedido americano de extradição do cidadão paquistanês Tanveer Ahmed Allah ou, simplesmente, Galby, procurado pela justiça norte-americana por tráfico de drogas.
A leitura da sentença estava marcada para as 11 horas, entretanto, mesmo com a presença de representantes dos Estados Unidos da América (EUA) e dos advogados do acusado na sala de audiências do Tribunal Supremo, nem a Procuradora Amabélia Chuquela, nem o Juiz Conselheiro Luís Mondlane, que preside ao caso, se fizeram presentes, uma situação que deixou todos os presentes boquiabertos.
O silêncio do Tribunal em relação à situação prolongou-se por quase quatro horas. Só por volta das 15 horas é que uma funcionária veio anunciar que o julgamento estava adiado, porque o colectivo de juízes ainda não tinha decidido sobre o caso, uma vez que estava a atender a um outro caso, "mais complexo" que o do paquistanês. O réu chegara, entretanto, ao Tribunal por volta das 10:30 horas, sob fortes medidas de segurança.
Tanveer Ahmed é acusado por um Tribunal do Texas, nos EUA, de ser “barão de drogas”. Aliás, aquando da sua detenção, no ano passado, no município da Matola, província de Maputo, Ahmed encontrava-se com 34 kg de cocaína e mais 2 kg de haxixe. O paquistanês foi detido conjuntamente com outros três cidadãos, dois de origem tanzaniana (Kassimo Ali Selemane e Adamo Mussa Munhamane) e um queniano (Abraham Msee Mussa).
Kassimo Ali Selemane foi condenado a dois anos de prisão por uso de documentos falsos e Adamo Mussa Munhamane a 18 anos de prisão. Por sua vez, Abraham Msee Mussa foi absolvido pelo Tribunal Judicial da Província de Cabo Delgado, assim como Tanveer Ahmed.
Segundo apurámos, aquando da detenção da “rede” de Ahmed, foram apreendidas 24 viaturas roubadas e que eram usadas como instrumentos do crime. Tanveer Ahmed Allah encontra-se detido, desde 10 de Janeiro e, conforme a “Carta” apurou de fontes próximas do processo, “não há dúvidas de que o visado é mesmo barão de drogas” e que “tem protecção de certas figuras políticas e judiciárias a nível nacional, que tudo podem fazer para não ser extraditado para os EUA”.
Tanveer Ahmed é visto como quem coordena as actividades de uma rede internacional a nível da África Austral. A leitura da sentença da extradição do visado foi remarcada para esta quarta-feira (15 de Maio). (Omardine Omar)
Mais um ataque aconteceu, na madrugada desta segunda-feira (13 de Maio), no distrito de Mocímboa da Praia, em Cabo Delgado. Segundo apurou “Carta”, de fontes locais, quatro pessoas do sexo masculino foram esquartejadas pelos insurgentes no povoado de Anga, a sensivelmente 7 km da residência oficial do administrador do distrito, Marques Tamadune Naba.
Segundo as fontes, a população daquele povoado acredita que o grupo que praticou o acto macabro terá pernoitado no local. Os autores do ataque não foram identificados.
As nossas fontes relatam que, contrariamente aos outros ataques, desta vez, os insurgentes não incendiaram nenhuma residência, tendo decapitado apenas os cidadãos em causa. Embora as fontes oficiais do distrito confirmem a morte de duas pessoas, fontes da “Carta” disseram que foram quatro as pessoas decapitadas. O distrito de Mocímboa da Praia foi o ponto de entrada dos insurgentes quando a 05 de Outubro de 2017 atacaram esquadras daquele ponto da província de Cabo Delgado. (Carta)