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quinta-feira, 25 julho 2019 09:07

A poeira da solidão

Se o "Indivíduo" que provocou deliberadamente o calote diz que sente que "há muita poeira, uma espontânea e outra, provocada", imagina então malta nós que fomos apanhados de surpresa. Se ele que o filho recebeu 50 milhões de dólares vê poeira nisto tudo, imagina então malta nós que não vimos nenhuma folha. 

 

Este texto é escrito a respeito da febre de enchimentos que grassa o país. Todo o mundo quer encher alguma coisa: os lábios, os glúteos, os seios, os bicípites e outros músculos, incluindo o músculo que está a pensar. Isto a nível do corpo humano. Por outras esferas: os bolsos, as estatísticas, as facturas, o “chapa”, as urnas de votação, a lista das “marandzas” e por ai em diante. Uma autêntica e veloz corrida aos enchimentos. Na senda, partilho abaixo um episódio interessante (acho) de um dos empolamentos mais procurados da florescente indústria de enchimentos em Moçambique. 

 

Há uns anos um grupo de quatro funcionários de uma instituição da capital do país esteve em Lichinga, província de Niassa, numa jornada laboral. Um bónus de um final de semana pelo meio - intencionalmente encaixado para uns dias extras de ajudas de custo e de lazer com as contas pagas – foi aproveitado pelos viajantes para uma merecida tarde de sossego no Lago Niassa. E já agora: encherem a lista de locais visitados e as redes sociais com as melhores imagens (fotos e vídeos). 

 

Chegados ao Lago e devidamente instalados numa sombra de pau-a-pique os colegas foram passando a tarde na companhia de líquidos nacionais e do delicioso peixe local que é uma das atracções da bela praia do Lago. O ambiente estava agradável e o papo seguia a mesma onda. Cada um foi descrevendo peripécias de viagens anteriores em trabalho e o devido aproveitamento para uns dias de turismo. Um deles contou que certa vez conseguiu enquadrar a família numa dessas viagens de trabalho. Um outro colega disse que fez o mesmo com a diferença de ter enquadrado uma “Emília” e não a família. Em fim, outros enchimentos e com as contas pagas.  

 

A dada altura, um senhor de idade - que por ali zanzava com um saco e ares de quem estivesse em actividades de pesquisa - tomou a direcção dos “vientes” (não da terra/província). Depois de anunciar a entrada, pousou o saco e cumprimentou o grupo com honras militares. Uns minutos depois já estava palavreando sobre a sua vida, ressaltando na fala a troca do “r” pelo “l”. Na sua trajectória sobressai o facto de ter sido, no tempo do governo de Salazar, um marinheiro da armada naval portuguesa. E para quem quisesse tirar a prova dos nove o velho prometeu mostrar a farda e o álbum de fotografias. 

 

Depois de algum tempo a entreter o grupo com a sua história – uma estratégia de “marketing” – o velho exibiu o conteúdo do saco: um suposto produto que tornava resiliente o membro masculino. Segundo as palavras do velho “o membro enchia e não caia” (pressupondo a queda em combate), ditas enquanto mostrava e descrevia outras maravilhas do mágico produto. E para dar mais crédito recorreu da própria experiência, anotando que mantinha a sua mulher – bonita e muito jovem - graças ao produto e por nenhum outro motivo. A-propósito: o nome do tal produto foi ocultado para não influenciar as vendas e o potencial risco de alguns indicadores do sector da saúde sofreram uma subida negativa e considerável. 

 

Encerrada a sessão de “marketing” passou a de certificação do produto. Para tal cada um ligou para familiares e amigos a nível nacional. Muitas chamadas foram para Tete e Sofala, províncias com fama no tipo de produto em causa. Aliás e para recordar, numa das recentes edições da Facim, a principal feira de negócios de Moçambique, foi um produto semelhante – e de uma das duas províncias – que foi o mais procurado, tendo esgotado nos primeiros dias quando não nas primeiras horas. 

 

Concluído o “due diligence” o resultado favoreceu as finanças do velho. Com a aquisição os quatro colegas - animados com o produto e encorajados com o respectivo “no objection” popular - delineiam os respectivos planos e o “casting” para a necessária estreia. Pelo desfecho do “casting” o produto não se destinaria ao consumo caseiro, contrariando a experiência do velho quanto as vantagens do seu uso doméstico. Contudo, as duas abordagens concorriam para o mesmo objectivo: a manutenção.   

 

Cumprido o objectivo da ida ao Lago Niassa e na efusiva solenidade de despedida do velho marinheiro – pela companhia e pelo mágico produto - este fez questão de fazer um aviso à navegação quanto ao uso do produto adquirido. A advertência foi clara e sombria: o produto apenas funciona para situações de complemento (reanimação) e não de falecimento (ressuscitação) do ente querido. (Se) “Molleu, Molleu!”: foram as fulminantes palavras do velho marinheiro enquanto batia em retirada. Uns passos depois, notando que o grupo estava com sérias dificuldades de digestão e para que não ficasse nenhuma réstia de dúvidas, o velho - em tom jocoso e bem audível - enfatizou: Molleu, Molleu!  

 

PS (i): o recurso a certos sectores da florescente indústria de enchimentos pode ser satisfatório em curto prazo e estar a ocultar situações que possivelmente careçam de outro tipo de intervenção e para outro tipo de resultados em médio e longo prazo. Apostar em soluções de ressuscitação talvez fosse melhor e sustentável do que as de reanimação. E pelos vistos ninguém/o país não se dá ao trabalho de investir (não se enche de ideias) para criar as condições necessárias nesse sentido, incluindo o velho marinheiro do Lago Niassa. 

 

PS (ii): num texto anterior e a reboque de eleições que se avizinham, mormente quanto aos polémicos dados e ditos empolados da província de Gaza sugeri, a título de ajuda, aos gestores das eleições (CNE/STAE) que declarassem a inclusão, no recenseamento eleitoral, de dados da Faixa de Gaza (médio-oriente),quiçá, uma extensão ultramarina – e por reivindicar - do antigo Império Nguni (de Gaza). Na sexta-feira passada, a CNE veio a terreiro confirmar os dados de Gaza. Na prática a CNE reiterou a posição inicial que entra (pelo que se consta) em colisão com os dados/previsões do INE, Instituto Nacional de Estatísticas. Resumindo: Tudo na mesma. E na mesma continua também a minha sugestão.

 

Edmundo Carlos Alberto, a esquerda de Beatriz Buchili, pode ser o próximo Procurador-Geral da República

O PR Filipe Nyusi acaba de exonerar Edmundo Carlos Alberto do cargo de Procurador-Geral adjunto da República. Só espero que não seja para nomeá-lo Procurador-Geral da República porque ele é, de facto, uma figura completamente inútil ao sector da Justiça. Nunca ninguém soube o que ele faz. Desde os tempos em que foi vice-Ministro do Interior, Carlos Alberto tornou-se mais conhecido pela sua ausência e incompetência. Aliás, nessa altura houve um episódio em que ele sonegou informação numa investigação do jornalista Carlos Cardoso sobre roubo de carros. Nessa altura, sua credibilidade foi muito afectada porque pareceu ter ficado claro que ele estava a defender os larápios. Era uma espécie de polícia protegendo ladrões.

 

Ya! Compatriotas, gostaria apenas de recordar-vos que Abel Xavier era simplesmente a pessoa que tinha sido encarregue de SELECIONAR-A-DOR. Não é ele a nossa DOR. A DOR, que ele teimava em SELECIONAR e TREINAR, ainda continua connosco. 

 

O que eu quero dizer é o seguinte: o facto de Abel Xavier ter deixado os Mambas não significa que começaremos a ter melhor prestação. Não! Significa que temos que começar a debater o nosso futebol seriamente. Significa que temos que combater as causas do nosso fracasso. O afastamento do Abel é - talvez - a primeira fase de um processo que se espera longo e difícil. É um bom começo, diga-se! 

 

quarta-feira, 24 julho 2019 06:44

O SOPRO DO DECANO - GABRIEL CHIAU

A Universidade Pedagógica de Maputo (UP-Maputo), na sua nova versão, tem a honra de voltar a homenagear um dos mais talentosos e nobres músicos moçambicanos, Gabriel Ruben Chiau.  Octogenário e cuja paixão pela música se estende desde a  longínqua  década de 50, na missão Suíça, pela mão pastor Daniel Clerc. Gabriel Chiau, como carinhosamente o conhecemos, tem, ao longo de décadas, personificado, com mestria, os propósitos do homem e da sua mente.

 

quarta-feira, 24 julho 2019 06:00

O tempo do Kivis e Inhambane 70

 

Nessa altura emergia uma panóplia de ouro, composta por jovens que haviam nascido para fazer aquilo mesmo. Foram escolhidos já no ventre das mulheres que os geraram, e a única possibilidade que tinham, nessa condição, era brilhar. Cintilaram mais do que o tempo que os cometas levam a luzir por sobre a terra. E alguns deles continuam a reverberar até hoje. Passado quase meio século.

 

Tudo aquilo era um turbilhão. Uma cascata cujas águas era a música em si. O que acontecia na cidade de Inhambane, na verdade parecia também uma ramal do pop, ou o pop feito pelos manhambanas. Com o propósito único de fazerem parte da loucura. O kivis, por exemplo, um agrupamento que tinha a base em Nassurdine Adamo, Badru, Dionísio, e Suamado, fazia parte dessa paródia. Eles lembravam, em determinados momentos, sobretudo pela maneira como se vestiam, os Beatles.

 

Desse alfobre único, alvoreceu ainda o Inhambane 70, uma banda de família que tinha em Manuel Vicente Pires (pai), o próprio badalo para marcar o compasso. Mas foi José Pires (um dos filhos), alcunhado “Quality” pelos amigos, aquele que mais se elevou entre todos os membros do grupo, usando os  dedos de veludo para tocar piano ao mais alto nível. Ele marcou profundamente  o tempo dos clubes nocturnos na cidade de Maputo, um pouco depois da Independência Nacional, tocando particularmente em lugares como Hotel Polana. E se não chegou ao nível de Nat King Kol, é porque Zé Pires não tem voz para cantar.

 

Jaco Maria é dessa gesta, e teremos poucas margens de erro se afirmarmos que ele é uma das pedras mais brilhantes de entre todos aqueles que vieram daquela época. Gostava de calças à “boca de sino” puxadas até um pouco acima do umbigo e usava camisas extremamente apertadas. Mas esse era o estilo do momento, trazido um pouco do vertiginoso Jimmy Hendrix. Significa que Jaco provavelmente será o manhambana desse tempo que se tornou mais visível. Se calhar pelo poder cataclítico da voz, onde reside toda a sua alma.

 

Mas a cidade de Inhambane é fundamentalmente um lugar de êxodo. Todos os que são daqui querem partir, para nunca mais voltar. O Chico da Conceição nunca mais voltou, nem o Magid Mussá.  De outros, nem os corpos, na horizontal, como o Nassurdine Adamao.  Ficou a história deles que ninguém a conta para os jovens.  Já não há matinés dançantes onde o Kivis e o Inhambane 70, alí na Associação Africana, eram o centro da gravitação da juventude.

 

Outros tempos!