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Actualizado de Segunda a Sexta

quarta-feira, 15 setembro 2021 05:04

Conheça as penas previstas aos crimes em julgamento na B.O.

Já passam 14 dias, desde que a 6ª Secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo começou a julgar o Processo de Querela nº 18/2019-C, que decorre no Estabelecimento Penitenciário Especial de Máxima Segurança (vulgo B.O), localizado no Município da Matola, província de Maputo. Até ao momento, já foram ouvidos nove réus, dos 19 arrolados no processo relativo ao famoso “caso das dívidas ocultas”.

 

Com as audições dos réus a caminharem para a sua recta final e com alguns arguidos a assumirem não estarem arrependidos pelo facto de se terem beneficiado de parte dos 2.2 mil milhões de USD contratados com garantias ilegais do Estado moçambicano, cresce também a expectativa do público em torno das molduras penais a serem aplicadas pelo juiz Efigénio José Baptista, quando anunciar o seu veredicto.

 

“Carta” compulsou a Lei n.º 24/2019, de 24 de Dezembro, que revê o Código Penal, para se inteirar das molduras penais aplicáveis a cada um dos crimes que estão em julgamento na tenda instalada na antiga B.O. Lembre-se, os arguidos das “dívidas ocultas” estão sendo acusados pela prática dos crimes de violação das regras de gestão, posse de armas proibidas, associação para delinquir, chantagem, peculato, abuso de cargo ou função, falsificação de documentos, uso de documentos falsos e branqueamento de capitais.

 

De acordo com o Código Penal, no seu artigo 226, o crime de posse de armas proibidas, que é um dos crimes imputados a Bruno Langa, “é punido na pena de 8 a 12 anos de prisão, se pena mais grave não couber”. É punido por este tipo de crime todo aquele que, “sem o devido licenciamento, fabricar, importar, adquirir, ceder, alienar ou dispuser por qualquer título, e bem assim transportar, guardar, deter ou usar armas destinando-as ou devendo ter conhecimento que se destinavam a ser utilizadas como instrumentos de agressão”. Bruno Langa era proprietário de uma pistola e de uma arma de caça.

 

Quanto ao crime de chantagem, no seu artigo 298, o Código Penal refere que “é punido com prisão até 1 ano e multa correspondente, sem prejuízo do proclamado para as penas de furto, se houver dano material”. O crime de furto, diga-se, está previsto no artigo 270 do mesmo documento, estabelecendo prisão até 6 meses e multa até 1 mês, se o valor da coisa furtada não exceder 10 salários mínimos; prisão até 1 ano e multa até 2 meses, se exceder 10 salários mínimos e não for superior a 40 salários mínimos; prisão até 2 anos e multa até 6 meses, se exceder 40 salários mínimos e não for superior a 125 salários mínimos; prisão de 2 a 8 anos, com multa até 1 ano, se exceder 125 salários mínimos e não for superior a 500 salários mínimos; e prisão de 8 a 12 anos, se exceder a 500 salários mínimos. Ou seja, neste tipo de crime, a pena máxima é de 12 anos.

 

Aliás, de acordo com o Código Penal, as penas previstas no artigo 270 também são aplicáveis para o crime de peculato, previsto no artigo 434 daquele instrumento legal: “O servidor público que, em razão das suas funções, tiver em seu poder dinheiro, cheques, títulos de crédito, ou bens móveis ou imóveis pertencentes ao Estado ou autarquias locais ou entidade pública ou a pessoa colectiva privada ou a particulares, para guardar, despender ou administrar, ou lhes dar o destino legal, e alguma coisa destas levar ou se apropriar, ou deixar levar ou apropriar ou furtar a outrem, dissipar ou aplicar a uso próprio ou alheio, em prejuízo do Estado, dessas pessoas colectivas ou particulares, faltando à aplicação ou entrega legal, é punido com a pena imediatamente superior à correspondente ao crime de furto, tendo em atenção o valor da coisa, se penas mais graves não couberem”.

 

Já pela prática do crime de abuso de cargo ou função, previsto no artigo 431, o réu “é punido com pena de prisão até 2 anos e multa até 1 ano, salvas as penas de corrupção se houverem lugar”. São elegíveis a este tipo de crime os servidores públicos. Neste caso, os três oficiais do SISE, a ex-Secretária particular de Armando Guebuza e o seu antigo Conselheiro Político.

 

Para o crime de tráfico de influências, previsto no artigo 447 do Código Penal, o agente “é punido com pena de prisão de 6 meses a 2 anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal, se o fim for o de obter uma qualquer decisão ilícita favorável”. No processo em julgamento na B.O, são acusados por este tipo de crime Renato Matusse, Maria Inês Moiane e Armando Ndambi Guebuza.

 

Por sua vez, o crime de falsificação de documentos, previsto no artigo 322, é “punido com pena de prisão de 1 a 2 anos e multa correspondente”. Entretanto, no artigo 323, o legislador sublinha que a pena pode ser agravada, passando de 1 a 8 anos de prisão, se a falsificação respeitar a documento autêntico ou autenticado; ou se o acto for praticado por servidor público no exercício das suas funções. As mesmas penas são aplicáveis a quem praticar o crime de uso de documentos falsos, tal como refere o artigo 324 do Código Penal: “quem fizer uso dos documentos falsos declarados nos artigos antecedentes, ou dolosamente fizer registar algum acto ou cancelar algum registo, será condenado como se fosse o autor da falsidade”.

 

“Carta” não conseguiu descortinar os crimes de associação para delinquir e de violação das regras de gestão, na Lei n.º 24/2019, de 24 de Dezembro, porém, o crime de associação para delinquir era previsto na Lei n.º 35/2014, de 31 de Dezembro. No seu artigo 458, a referida Lei estabelece que o crime de associação para delinquir é punido com pena de prisão maior de 2 a 8 anos, porém, “quem dirigir ou chefiar os grupos, organizações ou associações referidas nos números anteriores é punido com pena de prisão de 8 a 12 anos de prisão”. Os arguidos Bruno Langa, Teófilo Nhangumele, Armando Ndambi Guebuza, Cipriano Mutota, Gregório Leão, António Carlos do Rosário e Ângela Leão são acusados por este tipo de crime, mas não se sabe quem era líder.

 

crime de branqueamento de capitais, por seu turno, está previsto na Lei nº 14/2013, de 12 de Agosto, conhecida como Lei de Branqueamento de Capitais, sendo que é punido com pena de prisão de 8 a 12 anos a quem “converter, transferir, auxiliar ou facilitar qualquer operação de conversão, transferência de produtos do crime, no todo ou em parte, de forma directa ou indirecta com objectivo de ocultar ou dissimular a sua origem ilícita ou de auxiliar à pessoa implicada na prática das actividades criminosas a eximir-se das consequências jurídicas dos seus actos”, assim como quem “ocultar ou dissimular a verdadeira natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou titularidade de produtos do crime ou direitos relativos a eles”. Já quem “adquirir, possuir a qualquer título ou utilizar bens, sabendo da sua proveniência ilícita no momento da recepção” é punido com 2 a 8 anos de prisão maior.

 

Analisados todos os tipos de crime, constata-se que a pena máxima prevista em cada um dos crimes em julgamento na BO é de 12 anos de prisão.

 

Concurso de crimes e determinação das penas

 

Os arguidos das dívidas ocultas são acusados pela prática de mais de um crime, definidos pelo Código Penal, no seu artigo 43, como sendo “concurso de crimes”. O diploma legal refere que “há concurso de crimes, quando o agente comete mais de um crime na mesma ocasião, ou quando, tendo perpetrado um, comete outro antes de ter sido condenado pelo anterior, por sentença transitada em julgado”.

 

Entretanto, no nº 1 do artigo 124, o Código Penal estabelece que “quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado à condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena, sendo na determinação da pena considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”, porém, refere o nº 2 do mesmo artigo, “a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo, no caso de prisão, ultrapassar 30 anos; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes”. Isto é, ninguém pode ser condenado a mais de 30 anos de prisão. (A. Maolela)

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