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quinta-feira, 25 novembro 2021 13:26

Dívidas ocultas: os trilhos das 8 toneladas de vinho e o seu lado sinistro!

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Sérgio Mundaí* nasceu em Bajone, na província da Zambézia. Na tenra idade, treinava karatê e no bairro vários jovens levavam “txaia”. Dadas as suas habilidades físicas, a família fez de tudo para que Mundaí fizesse parte das Forças de Defesa e Segurança (FDS), ramo que abraçou por mais de 20 anos, até que uma mega oportunidade surgiu – foi seleccionado para fazer parte da Unidade de Protecção de Altas Individualidades (UPAI), mas desta vez na capital do país, cidade de Maputo.

 

Embora competente, Sérgio Mundaí tinha um vício – bebia bastante. Só que na UPAI o homem era escalado para trabalhar em dias em que não se pudesse envolver numa bebedeira super agressiva e faltar ao trabalho. Mas, mesmo no trabalho, sempre que fizesse parte de uma equipa que levasse um chefão a uma festa, o homem dava uma escapadinha e tomava uns drinks na cozinha, ou mesmo levava e escondia as garrafas.

 

Sucede que, num belo dia, Mundaí e seus colegas são seleccionados para uma brigada especial, encarregue de transportar oito toneladas de vinho, provenientes das bandas de Abu Dhabi e que entrariam via Terminal da Base Aérea, na cidade de Maputo. Neste dia, todos se questionavam o porquê de não passar pelas alfândegas e pelos oficiais do Terminal de Cargas, tratando-se de uma carga de género. Entretanto, ninguém tinha resposta, apenas se dizia nos corredores que a mercadoria era especial e que não devia ser mexida e nem inspeccionada, daí que o avião que trouxe a mesma aterrou num local especial como na Base Aérea – mas o coração dos homens de grande business no aeroporto sangrava!

 

Naquele dia, os homens escalados para a missão não sabiam o que iriam transportar, daí que, chegando no local, depois da mercadoria ser descarregada, os oficiais questionaram o que era aquilo – eis que alguém responde dizendo que era vinho! Espantado e ao mesmo tempo satisfeito, Sérgio Mundaí deu um pulo mágico e subtraiu uma caixa, acreditando que se tratava mesmo de vinho e que uma caixinha daquelas não iria fazer falta.

 

A equipa seguiu ao destino com a mercadoria. No local, os oficiais da UPAI foram dispensados e ficaram os homens da contabilidade a fazer o cálculo do vinho, até que um dos contabilistas se apercebeu que faltava uma caixa e prontamente comunicou os seus superiores que o vinho não estava completo…. Preocupados, os superiores contactaram os homens de Abu Dhabi, informando que a mercadoria não estava completa e eis que os homens responderam dizendo que tinham todas as provas de que eram 8 toneladas de vinho! Encetou-se diligências para se perceber o que havia acontecido.

 

Do outro lado, convencido de que iria provar uma boa taça de vinho, não é que Sérgio Mundaí se surpreende ao abrir a caixa – eram na verdade maços de notas em dólar – o homem ficou boquiaberto, o que é isso? Dinheiro? Então, aquilo tudo que transportamos era dinheiro e não vinho? Se questionava Mundaí. De imediato, Sérgio Mundaí fecha-se no quarto e começa a contar o dinheiro que passava uns 20 maços em notas de 100 USD cada.

 

Metido a esperto, Sérgio Mundaí arranjou formas de tirar o dinheiro de casa e esconde-lo. Por outro lado, as diligências decorriam silenciosa e sigilosamente, procurando-se saber quem havia sumido com a caixa de vinho! Não é que, entre os interrogados, um acabou revelando que, no dia do transporte, o colega Sérgio Mundaí havia subtraído uma caixa de vinho. Chamado para responder, Mundaí negou tudo e jurou em nome de todos seus antepassados que haviam perdido a vida que não teria visto e nem levado a tal caixa. Entretanto, o pesadelo só estava a começar!

 

Deixaram o tempo passar. Num certo dia, em plena hora do almoço, homens armados e a paisana bateram ao portão da casa de Mundaí. No dia, o homem estava de calções e uma camiseta interior jogando conversa com a esposa, os filhos e vizinhos. A instrução era calar, intimidar o homem a falar e, caso não revelasse onde estava o dinheiro que estava na caixa de vinho, lhe tirassem a vida e escavassem toda a casa atrás daqueles maços.

 

Começou o pesadelo, Sérgio Mundaí foi imobilizado, torturado e baleado em frente dos filhos, enquanto era questionado, onde estava o dinheiro. O homem simplesmente dizia: “eu não sei de que vocês estão a falar”. Depois de minutos sem falar e com tiro alojado na perna, parte do grupo arrastou-o até ao carro, enquanto isso, um grupo sentava-se no seu sofá, servindo seu whisky, apreciando a senhora Mundaí e assistindo televisão com as portas fechadas. O outro grupo levava o homem para um lugar incerto, onde foi assassinado e depois deixado nas bandas de Chiango!

 

Uma hora depois, o grupo voltava com enxadas e pás atrás dos maços de dinheiro que, entretanto, nunca foram achados e a família de Mundaí teve de fugir da zona com medo de ser apagada! No entanto, não se sabe se foram os chefões que mandaram o grupo para cometer tal façanha, ou foi alguém que acompanhou a história nos bastidores e quis ficar com o garrafão de vinho cheio de maços de USD supostamente descartado. Quem sabe, se Mundaí estivesse vivo, testemunharia, com propriedade, o que de facto estava nas 8 toneladas de vinho enviadas de Abu Dhabi pelo maestro Jean!

 

*Nome fictício. Facto real e organizado consoante a imaginação do autor

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