Em um texto do sociólogo Elísio Macamo uma idosa, que em jeito de nota conclusiva da sua preocupante apreciação sobre a real situação e o rumo do país, pergunta: “Afinal quando é que a independência vai acabar?”
“O rumo do país é tal que exige o concurso de outras forças e estratégias para enfrentá-lo”. Quem o diz é um amigo que nos meses de Agosto faz sempre questão de passar as suas férias na terra natal, no interior profundo da província de Gaza.
“É para renovar lealdades (com os antepassados) e recarregar baterias”. A justificação quando preguntado sobre a razão dos seus “tours d'agosto” à terra. Uma tradição que contrasta com a matriz e cognição ocidental do honorável amigo.
E por ser Agosto, o mês das suas religiosas férias anuais, não me surpreendem os registos audiovisuais da época que desfilam diariamente no seu “status”.
Entretanto, desta vez salta à vista o local das férias por não ser o habitual, mas algures pelo continente europeu. Questionado o detalhe, a pronta resposta: “Os espíritos emigraram e tive que vir ao encontro deles”.
A ser verdade - que os espíritos estão também a emigrar - é caso para secundar a pergunta da idosa ou, no mínimo, que a questão levantada seja o ponto de partida para uma profunda reflexão nacional sobre o real “Estado Geral da Nação”.
PS: Por conta da intensa onda de calor que abala a Europa neste verão, leva-me a colocar a possibilidade de os espíritos/ancestrais africanos estarem mesmo a emigrarem para a Europa. Agora resta saber se emigram em busca de melhores condições de “vida” ou apenas atrás dos seus mais novos descendentes que para lá têm rumado em debandada nos últimos anos.
Confesso que fiquei de rosto rente à barriga quando vi a guita que os diversos partidos tiveram para a campanha eleitoral. Há muita guita neste país. Diga-se uma coisa: nós somos um país pobre, mas cheio de dinheiro. Um país sem grandes saídas, mas que sempre se vira quando o assunto é arranjar dinheiro para distribuir...
Nós somos um país pobre, mas cheio de dinheiro; a frase pode ser complicada, pode ser poética demais; se calhar podia dizer com todos os grumos de saliva: nós somos aquele bêbado que não deixa nada em sua casa, mas, aos fins-de-semana, varre contas e contas em todos os bares. Nós somos a riqueza mais pobre da nossa estupidez.
Só temos dinheiro para a campanha eleitoral. Não temos dinheiro para o professor que faz horas extras e ao fim do mês recebe notas de reclamações, não temos dinheiro para injectar e curar a magreza das contas bancárias dos médicos, não temos dinheiro para meter na algibeira do juiz que martela, todos os dias, a nossa justiça torta e com poucos pregos, não temos dinheiro para o polícia que arrasta a AKM carregada de ferrugem, na baixa da cidade, e assiste aos raptos de boca aberta.
Afinal, anda, nos corredores da campanha eleitoral, tanto dinheiro assim! Afinal, há tantos partidos assim? Eu conheço um tipo que sempre concorre às eleições, de cinco em cinco anos, abre um estaleiro novo no Chamanculo e tem um quintal cheio de carros. Esse fulano é presidente do partido, é também secretário-geral, é também tesoureiro, é também chefe de limpeza da sua sede (sua sede é uma mochila de costas cheia de papéis), é também presidente da liga juvenil composta só por ele próprio, é também membro único da liga da mulher, é também assessor jurídico e ocupa todas as pastas da assembleia geral composta só por ele próprio.
Esse tipo, este ano, teve uma boa guita, uma boa mola. Quando começar a campanha vai fazer o que já nos habituou ali no bairro: comprar pacotes de massa, canetas de feijão, umas caixas de cerveja e pôr os miúdos desempregados do bairro a marcharem com a única bandeira que ele usa há séculos desde que descobriu esse negócio de viver de campanhas. E depois vai pingar uns cartazes em algumas avenidas, estampar umas duas camisetas para ele e a esposa e aparecer na TV sem um mínimo de vergonha para dizer “as nossas delegações estão a trabalhar, vamos ganhar”. Eu acho que ele ainda está estonteado, pois nunca recebeu tanto dinheiro assim.
Infelizmente, em Moçambique, tudo que tem o nome campanha envolve muito dinheiro, muita guita mesmo. Quem nunca viu o mar de dinheiro que anda nas campanhas de vacinação que só terminam vacinando os salários gordos dos coordenadores provinciais sentados nos escritórios? A campanha nacional de combate ao HIV/SIDA, muitas vezes, combate a fome dos chefes, a campanha de combate à malária muitas vezes só serve para construir mansões de chefes no lugar de comprar redes mosquiteiras.
A campanha contra a corrupção só enche escritórios de relatórios e no fim de tudo a corrupção é que vence, pois, fica bem ao canto a rir-se por ter criado mais corruptos quando tentavam combatê-la. Tem sido sempre assim. E agora temos a campanha eleitoral, meu Deus. Tudo que é campanha tem muita guita, em Moçambique. Já agora, quem não se recorda da campanha nacional de vacinação contra a COVID-19 que só fez os chefes sorrir de felicidade e riqueza por detrás das máscaras? Tudo que é campanha tem muita guita…
Cada vez mais o Venâncio Mondlane se mostra um apaixonado pela direita fascisante. Em Portugal abraçou o “Chega”, o horror das camadas mais desfavorecidas da antiga colônia, e agora acaba de enviar para o Brasil uma mensagem de apreço ao Jair Bolsonaro, o horror das camadas mais desfavorecidas do Brasil. Há uma contradição que ele deve claricar quanto antes, pois conheço muitos indecisos relativamente à dar-lhe apoio.
Falo da contradição entre sua expressa colagem ideológica à direita (ele identifica-se como centrista) quando seu discurso é dissimuladamente de apoio aos desfavorecidos, ao “povo”, aos marginalizados da sociedade moçambicana.
Afinal como ficamos? Não será seu este discurso com o respaldo da esquerda socialista um mero expediente para chegar ao poder? Porque é que ele não deixa o povo de lado!l?
Diga de sua justiça, meu caro amigo! Desembuche! Quero perceber!
No âmbito das nossas eleições gerais de 9 de Outubro próximo, estamos como aquele avião bastante embalado, a levantar voo e que, na sequência disso, só algo bastante extraordinário, rocambolesco mesmo, é que pode fazer abrandar a velocidade, o ímpeto e abortar o levantamento do voo!
Na sequência, temos acompanhado o périplo dos nossos quatro candidatos presidenciais nas suas investidas. Vezes sem conta, têm sido confrontados com uma questão fundamental, à qual, sem uma abordagem inteligente, racional e persistente toda a sua aventura, atrevimento, sonho não lograrão os efeitos que pretendem, muito menos conseguirão aliviar a pressão em que vivem os moçambicanos.
A questão, bastante pertinente, mordaz, incontornável e cortante, é: onde irão eles buscar dinheiro para… até começarem a sua governação e depois arrancarem. Ou seja: quando em Fevereiro entrarem na Ponta Vermelha, onde irão eles ter dinheiro para o país mostrar, pelo menos, algum ânimo.
Uma questão crucial. Não sei se na data em que nos encontramos, meados de Agosto, os funcionários públicos e outros mais receberam os salários de Julho! Os médicos têm estado a marcar e ou a remarcar a data de entrada em greve… fundamentalmente, porque não têm os seus pagamentos em dia; os professores têm estado a… brincar de trabalhar, justamente porque têm estado a ser devidas horas extras (só horas extras?) de há dois, três anos; os juízes preparam-se para greve - coisa inédita na nossa vida, nunca tinha ouvido que juízes entram em greve… -; os magistrados do Ministério Público também estão a preparar a sua greve - também nunca tinha ouvido falar!… etc., etc. e etc! É este o ambiente que temos.
De onde irá, seja quem for o incumbente, trazer dinheiro para, logo à chegada, fazer face a este quadro tenebroso, em que as pessoas, em lugar de celebrarem o novo Presidente da República, estarão com expectativa máxima sobre os salários em atraso… Tenho ouvido com atenção as respostas, algo titubeantes e atabalhoadas. Compreendo que assim seja: ou não querem que as suas próprias organizações políticas e os adversários entendam claramente o que vão fazer por razões estratégicas - e, se é isso, dou alguma cumplicidade, algum benefício da dúvida. Mas, se é que não têm ideias organizadas sobre este aspecto, só posso condescender para com o candidato da nossa Frelimo que foi mandado querer quando ia fazer uma passeata em terras outras, depois da extraordinária! Como podia ter pensado se ainda não se querera a si próprio!
Precisamente para não deixar à deriva o nosso próximo inquilino, eis algumas dicas, tipo aquela cábula que muitos levaram à sala de exame, sobre a questão crucial posta acima!
As renegociações com os megaprojectos são um imperativo nacional. Devem acontecer. Mas, tenhamos isto em mente, não trarão resultados, dinheiro, overnight! Para que tal aconteça, muitos processos terão que correr, incluindo judiciais. Mas elas devem acontecer, sim; é inaceitável o que está a acontecer. Os benefícios da sua exploração devem ser, também, sentidos pelos moçambicanos, o nosso Estado e Moçambique!
Mas, para poder conseguir pagar salários, o que deve ser feito de imediato é a revisão das regalias de todas as entidades públicas da nossa República: Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, Presidente do Conselho Constitucional, Presidente do Tribunal Supremo, Ministros, Deputados, eliminação da figura de vice-ministros vs. valorização da figura de Director Nacional; eliminação imediata das figuras de secretários de estado das províncias vs valorização dos governadores provinciais; refinamento das instituições do Estado - eliminar a duplicação e acabar com aquelas irrelevantes. Não faz sentido termos uma ECA e um ISArC num mesmo orçamento de um mesmo Estado; termos uma faculdade de um único curso numa universidade do Estado… Pelas condições que o país vive, são incomportáveis as regalias que damos aos nossos antigos Presidentes da República. Vamos proceder à revisão e ajustamento.
Não faz sentido alguém sonhar em Maputo, matabichar em Magude ou Xai-Xai, almoçar em Quelimane e jantar em Pemba, depois voltar dormir em Maputo. A deslocação de chefe de Estado, com a movimentação logística que envolve, é uma grande fonte de gastos do erário público, dinheiro que justamente faz falta aos professores, médicos, enfermeiros, funcionários públicos, agora juízes e procuradores, para não falar de polícias e militares, quase todos eles em greve silenciosa. Não faz sentido que num país como o nosso o ministro continue a ter três viaturas para uso pessoal, uma residência especial, arrendada ou comprada; não faz sentido o deputado ter tudo o que se lhe está a dar: salário, renda de casa, telefone, água e luz, senha de presença, subsídio de representação… e depois, para realizar uma tarefa de selecção de integrantes do corpus de gestão do fundo Soberano, sejam pagos à parte, sejam-lhes atribuídas ajudas de custo e senhas de presença… Tenhamos coragem: aceita ser ministro; quer ser deputado?… as condições que o país pode dar neste momento são estas - a África do Sul de depois de Maio é isto: não há residência especial para o ministro fora a casa do Estado, nem manutenção de casa…
Feitas estas poupanças, veremos que no nosso poço começará a pfelar alguma água para… darmos a BEBER a todos os professores, enfermeiros, médicos…
Fica aqui a cábula!
ME Mabunda
Defendo que o Estado não deveria ser concorrente do privado. Exceptuando, talvez, em áreas críticas como distribuição (a produção pode ser por privados) de energia, água e questões de soberania, mormente controlo, defesa e segurança territorial, o Estado deveria estar longe da gestão de empresas.
Em áreas puramente económicas não só é uma concorrência desleal, pois, na fase mais primária do financiamento, e quando necessário, o Estado pode imprimir papel moeda.
Felizmente, o cidadão “INFLAÇÃO” está lá para subverter tentativas abusivas da máquina de impressão, por um lado.
Por outro lado, temos o factor ineficiência. Ao longo dos anos, o IGEPE foi provando ser um cemitério de empresas públicas, mostrando mais uma vez que não é papel de Estado geri-las.
As receitas do Estado irão para os seus cofres apenas quando houver um ambiente conducente a negócios, em que o sector privado, via um sistema financeiro justo, possa ir buscar dinheiro a um custo justo, e o IVA, o IRPS, o IRPC e mesmo os impostos sobre dividendos e outros sejam transparentemente cobrados e aplicados no bem público.
“Não existe dinheiro público, só existe dinheiro de quem paga impostos”, disse Margaret Thatcher, antiga Primeira-Ministra do Reino Unido. O poder desta frase ecoa até hoje em todos os cantos do mundo e Moçambique não seria excepção, pois, mesmo se o financiamento de uma ponte for via um banco estrangeiro, a dívida será saldada por fundos públicos, estes que tecnicamente não existem, pois são dos contribuintes!
Vindo de uma economia centralizada, houve alguma coragem para se privatizar algumas empresas, privatizações que em algum momento foram um descalabro porque foram induzidas por motivos dúbios e porque as empresas foram abocanhadas por gente cujo único activo que tinha era conhecer quem toma decisão.
Ao longo dos anos, empresas que deveriam ser privatizadas não foram e, por desculpas estapafúrdias, essas empresas continuam a mamar da teta do Estado. Uma dessas empresas é a LAM, uma companhia que nos anos 80/90 deu-nos muito orgulho de sermos moçambicanos, pois Madrid, Copenhaga, Sofia, Paris só para citar algumas cidades, eram destinos regulares da nossa companhia de bandeira.
Nesta minha idade sei muito bem o que quero, mas, mais importante, o que não quero. Num mundo onde há muitas alternativas, eu atravesso o mundo para chegar a um sítio como Lisboa e chego feliz, definitivamente, com companhias aéreas escolhidas a dedo. Por norma, não aceito abuso se eu estou a pagar, sendo oferta nem contarei os dentes do cavalo! De modo que quando apareceu o voo Maputo-Lisboa da LAM, para mim foi apenas mais uma notícia, até há algumas semanas, quando a minha filha entrou de férias e a mãe por alguma razão insistiu em ir com a LAM. Também nesta idade não discuto, muito menos com a Comandante-em-Chefe da minha casa. Então, o pedido foi uma ordem. E lá fomos. Tenho de reconhecer que foi um bom voo de Maputo a Lisboa.
A máxima de “If you can’t buy twice, you can’t afford it” veio à tona: no regresso, quando estávamos no aeroporto para o voo das 16:45, fomos informados que o voo passaria para as 20! De balde! Não tinha havido informação no telefone nem no e-mail. Aqui uma pessoa pergunta: afinal aqueles números de telefone que nos pedem quando compramos bilhetes são para o quê?! É que com uma mensagem atempada, uma pessoa fica a beber café no Pinóquio!
Saímos quase às 22h00 e felizmente chegamos bem. Na semana passada, cansei-me de chatear amigos por causa de uma viagem à Beira. Fui à Beira, via Joanesburgo! Pronto. Ontem pedi um bilhete prémio ao Flamingo para uma questão particular. Eu tenho quase que certeza que o número de milhas que acumulei ao longo do tempo dá para ir à lua e voltar na primeira classe.
O meu cartão do Bim/LAM diz Gold e no check-in acho que é Blue (abaixo do Silver). O Flamingo nunca te manda extrato, o único e-mail que recebes deles é no dia do teu aniversário, portanto nunca sabes quanto tens em milhas. Falava do bilhete prémio. A resposta do Flamingo é de eu dirigir-me para uma das lojas da LAM pelo menos dois dias antes da viagem.
Quer dizer, um pai que vive na Ucrânia e quer que a filha viaje com suas as milhas para Lichinga, esse pai deve voltar para Moçambique para fazer essa operação! Senhores, Daniel Chapo está a dizer no seu manifesto para reduzirmos o contacto entre os utentes e funcionários públicos, para reduzirmos a corrupção, a LAM é a primeira companhia a levantar o dedo e remar em direcção contrária.
Não interessa quantas vezes vamos mudar os Conselhos de Administração ali, a solução é privatizar, os aeroportos também. Eswatini e Tanzânia em algum momento ficaram sem companhia de bandeira, há cancros cuja única solução é amputar o membro. Em Moçambique, ainda é possível.