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segunda-feira, 19 abril 2021 07:56

Terrorismo em Cabo Delgado: Falta de transparência na gestão dos recursos é fonte de descontentamento, divisão e luto – apontam Bispos Católicos

A falta de transparência na gestão dos recursos naturais é apontada, pelos Bispos da Igreja Católica, em Moçambique, como a fonte do descontentamento, divisão e de luto na província nortenha de Cabo Delgado, que é assolada pelo terrorismo desde Outubro de 2017.

 

Segundo os sacerdotes, no lugar de serem postos ao serviço das comunidades locais e tornarem-se fonte de sustento e de desenvolvimento (com a construção de infra-estruturas, serviços básicos e oportunidade de trabalho), os recursos naturais são subtraídos, alimentando a revolta e o rancor, particularmente no coração dos jovens.

 

A tese consta da última Declaração dos Bispos Católicos de Moçambique, emitida na última sexta-feira, no final da primeira Sessão Plenária da Conferência Episcopal de Moçambique, em 2021, que teve lugar na cidade de Maputo.

 

“Deploramos a prevalência deste estado de coisas, sem indicações claras de que a breve trecho haverá superação das causas que alimentam este conflito. Este estado de coisas faz crescer e consolidar a percepção de que por detrás deste conflito há interesses de vária natureza e origem, nomeadamente de certos grupos de se apoderarem da nação e dos seus recursos. Recursos que, no lugar de serem postos ao serviço das comunidades locais e tornarem-se fonte de sustento e de desenvolvimento, com a construção de infra-estruturas, serviços básicos, oportunidade de trabalho, são subtraídos, na total falta de transparência, alimentando a revolta e o rancor, particularmente no coração dos jovens, e tornando-se fonte de descontentamento, de divisão e de luto”, defende a Conferência Episcopal de Moçambique.

 

Num documento de duas páginas, no qual manifestam o seu sentimento de repúdio e de condenação aos actos de barbárie cometidos naquele ponto do país, os bispos católicos apontam também a “ausência de esperança num futuro favorável” como um dos “motivos fortes” que move os jovens a se deixarem aliciar e a juntarem-se às várias formas de insurgência: da criminalidade ao terrorismo e do extremismo político ao religioso.

 

“Reconhecemos que um dos motivos fortes que move os nossos jovens a se deixarem aliciar e a juntarem-se às várias formas de insurgência, desde a criminalidade ao terrorismo, ou também aquela outra insurgência, não menos nociva, do extremismo político ou religioso, assenta na experiência de ausência de esperança num futuro favorável por parte dos nossos jovens. Para a maioria deles, não há oportunidades de se construir uma vida digna. Sentem que a sociedade e quem toma as decisões ignoram o seu sofrimento e não escutam a sua voz. É fácil aliciar pessoas, cheias de vida e de sonhos, mas sem perspectivas e que se sentem injustiçadas e vítimas de uma cultura de corrupção, a aderirem a propostas de uma nova ordem social imposta com a violência ou a seguir ilusões de fácil enriquecimento que conduzem à ruína”, afirmam os bispos católicos, questionando: “como podem ter os jovens perspectivas se o próprio país parece não ter rumo, um projecto comum, no qual são convidados a serem colaboradores activos e que alimente a sua esperança?”.

 

Para os membros da Conferência Episcopal de Moçambique, “nada justifica a violência”, nem a situação difícil de falta de uma perspectiva colectiva. Sublinham que as religiões têm uma grande contribuição a dar na resiliência das comunidades e perseguir um ideal de sociedade unida e solidária, pelo que, “limitar a sua acção não favorece a procura de soluções”.

 

“Em Cabo Delgado, pessoas indefesas são mortas, feridas e abusadas. Elas vêem seus bens pilhados, a intimidade dos seus lares violada, suas casas destruídas e cadáveres de seus familiares profanados. São obrigadas a abandonarem a terra que os viu nascer e onde estão sepultados os seus antepassados. Estes nossos concidadãos, a maioria mulheres e crianças, são empurrados para o precipício da insegurança e do medo”, sublinham, manifestando a sua total solidariedade com “os mais fracos e com os jovens que anseiam uma vida digna”.

 

Referir que os ataques terroristas na província de Cabo Delgado já causaram a morte de mais de duas mil pessoas e a deslocação de mais de 700 mil indivíduos, na sua maioria crianças, mulheres e idosos. Só o ataque terrorista registado no passado dia 24 de Março, na vila-sede do distrito de Palma, causou a morte de centenas de pessoas e a deslocação de perto de 19 mil pessoas, de acordo com os dados da Organização Internacional das Migrações. (Carta)

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