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sexta-feira, 17 julho 2020 05:41

Revisão da Política Nacional de Terras: “Estado continuará a ser proprietário da Terra e outros recursos naturais” – garante Filipe Nyusi

O Estado moçambicano continuará a ser o proprietário da Terra e dos outros recursos naturais. A garantia foi dada esta quinta-feira pelo Presidente da República, durante o lançamento do processo de Auscultação Pública sobre a Revisão da Política Nacional de Terras, que culminará com a revisão da Lei nº. 19/97, de 01 de Outubro, denominada Lei de Terras.

 

Falando a partir do município da Matola, província de Maputo, Filipe Nyusi avançou ainda que todos os moçambicanos continuarão a ter o direito de acesso à terra, assim como os direitos adquiridos pelas famílias e comunidades locais deverão sempre ser protegidos.

 

Segundo o Chefe de Estado, estas são as principais premissas que não devem ser alteradas durante a revisão da Política Nacional de Terras, cujo processo foi lançado, oficialmente, em Novembro de 2017, aquando da realização, em Maputo, da IX Sessão do Fórum de Consulta sobre Terras, que coincidiu com a celebração dos 20 anos da Lei de Terras.

 

“As balizas principais já foram estabelecidas. O Estado moçambicano continuará a ser o proprietário da Terra e os outros recursos naturais; todos os moçambicanos têm direito de acesso à terra; os direitos adquiridos pelas famílias e comunidades locais deverão sempre ser protegidos. Estas são as três e principais premissas dos debates, enquanto o resto dos assuntos pode ser mexido. Este pilar vem do comando constitucional e dos consensos alcançados”, disse Filipe Nyusi.

 

Lembre-se, a actual Política Nacional de Terras defende que a terra é propriedade do Estado e que não pode ser vendida, alienada, hipotecada ou penhorada. Reconhece também a participação das comunidades na gestão dos recursos naturais e obriga a consulta comunitária, antes da concessão de posse de terras para investimentos. Aliás, no seu discurso, o Chefe de Estado fez referência ao facto de a actual Lei de Terras valorizar as normas tradicionais de posse de terra que, na sua óptica, faz uma conciliação com os procedimentos e requisitos formais e burocráticos.

 

A privatização ou não da terra tem dominado, nos últimos anos, grande parte dos debates públicos, havendo quem defenda a sua privatização, devido à actual “pilhagem” de terra, protagonizada, geralmente, por líderes comunitários e servidores públicos.

 

De acordo com o Presidente da República, a revisão da Política Nacional de Terras deve responder aos desafios da consolidação das estruturas da economia do mercado, tendo em conta os desafios impostos pelo aumento do número de habitantes, o acelerado crescimento da população urbana, as mudanças climáticas e a emergência dos megaprojectos, que demandam milhares de hectares, causando, em alguns casos, conflitos de terra.

 

“Não vamos dificultar e nem excluir a ninguém no acesso do uso e posse de terra. Pelo contrário, devemos conceber e implementar mecanismos que facilitam o gozo pelos moçambicanos deste recurso-base da vida e bem-estar dos moçambicanos”, disse Filipe Nyusi, acrescentando que não quer ver traduzido um cenário, em que as famílias e comunidades locais percam as suas terras porque as autoridades atribuíram aos novos ocupantes (privados ou públicos).

 

“Pelo contrário, devemos trazer, na nova lei, mecanismos que evitem tais situações. Às vezes, há vozes que se fazem defender as comunidades, mas penso que não. Querem, sobremaneira, dificultar o desenvolvimento do país e nós gostaríamos que, durante os debates, tivessem em conta isso. O país não pode parar e a lei que tem de estar em vigor deve ser a lei de Moçambique e não Lei e/ou visões importadas”, afirmou Nyusi.

 

Apesar de não ter feito referência a nomes, ficou claro que o Chefe de Estado se dirigia às Organizações da Sociedade Civil que se têm mostrado preponderantes para travar, em algumas situações, casos de expropriação de terra pelos megaprojectos sem as devidas e justas compensação e indemnização.

 

Segundo o Chefe de Estado, espera-se que a revisão traga um quadro legal e institucional ajustado à nova dinâmica social e económica, que promove o Direito de Uso e Aproveitamento de Terra (DUAT) que responda melhor às expectativas de todos. “O quadro a ser proposto deve responder às preocupações dos cidadãos, individualmente e/ou em grupo, às empresas e de todos os interessados. Os moçambicanos querem conviver com um regime legislativo sobre a posse de terra mais previsível e seguro no contexto actual da economia do mercado, um regime justo que promova investimento com base na terra”, avança Filipe Nyusi.

 

Para Filipe Nyusi, a nova Política de Terra deve preencher as actuais lacunas relacionadas à ligação entre o uso e aproveitamento de terra e o acesso aos recursos naturais e a sua exploração sustentável. “Queremos conviver com um quadro legal e operacional que estanque o açambarcamento de terras, a especulação e corrupção, que reduza o risco de conflitos, que combata a existência de terras ociosas e que reforce, em particular, a protecção dos direitos das comunidades locais, em especial da mulher nas zonas rurais e dos jovens”, disse a fonte, avançando, aliás, a necessidade de se clarificar o conceito de comunidade local e seu reforço como importante mecanismo para a garantia efectiva da posse de terra pelos cidadãos e famílias rurais e de zonas peri-urbanas.

 

Referir que a Comissão Técnica para a revisão da Política Nacional de Terras é composta por 10 elementos, entre eles juristas, sociólogos, arquitectos e activistas sociais. A Comissão é coordenada por André Jaime Calengo (jurista, formado em estatísticas económicas, especialista em políticas e legislação sobre Terras e Recursos Naturais; formador do Centro de Formação Jurídica e Judiciária e consultor do Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação – FAO).

 

Os outros membros da Comissão Técnica são: João Manuel Zamith de Franco Carrilho (engenheiro, quadro das áreas da agricultura, terra e desenvolvimento rural e membro do grupo que preparou a Política Nacional de Terras em vigor e a respectiva Lei); Audete Faustino Mogumela (jurista, quadro sénior do Ministério da Terra e Ambiente e ex-Coordenador do Projecto Acesso Seguro a Terras em Cabo Delgado); Jorge Chicuei (jurista, especialista em Políticas e quadros legais sobre Terras, Recursos Naturais e Conservação, colaborador do Centro de Estudos da Agricultura e Gestão de Recursos Naturais, na Universidade Eduardo Mondlane); Armindo Chaúque (quadro sénior do Ministério da Terra e Ambiente, especialista em Planeamento Físico, Ordenamento Territorial e Gestão de Sistemas Ambientais); Eduardo Alexandre Chiziane (professor na Universidade Eduardo Mondlane, advogado e consultor independente); Sérgio Baleira (sociólogo, especialista em gestão e administração de terras, organização e desenvolvimento comunitário, docente da Universidade Eduardo Mondlane e formador do Centro de Formação Jurídica e Judiciária); Luís Mário Muchanga (activista social e Director-Executivo da União Nacional de Camponeses); Gustavo Sobrinho Djedje (doutorado em Ciências Ambientais e consultor ambiental científico); Bruno Miguel Carlos Vedor (arquitecto, consultor independente, especialista em Planeamento Urbano e Infra-estruturas e membro da CTA). (A. Maolela)

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