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quarta-feira, 08 abril 2020 06:01

Edil de Tete usurpa terrenos do Estado: A César o que… não é de César

Fernando Bemane E César Carvalho

César de Carvalho, o famigerado Presidente do Conselho Autárquico da Cidade de Tete, reeleito em 2018 – após 10 anos à frente daquela edilidade aos quais se seguiu um interregno de um mandato – volta a estar nas bocas do mundo. E, tal “como era no princípio, agora e sempre”, pelos piores motivos.


Facto é que, informações em poder da “Carta” dão conta que o edil, a exemplo do que aconteceu noutros tempos, apoderou-se de um terreno reservado à construção do Complexo Desportivo Municipal de Tete, no bairro Matundo, parcelou-o em dois, (auto) “atribuiu-se” uma das partes, e deu de presente a outra ao seu camarada Fernando Bemane, Primeiro Secretário Provincial do Partido Frelimo.

Trata-se de uma reserva do Estado, que há mais de 10 anos tem o aval, e toda a documentação já tramitada junto do Governo Provincial (através da Direcção Provincial da Juventude e Desportos), para a construção de um Estádio Municipal e de outras infra-estruturas adjacentes.

 

Mais: o próprio governo central, não só tem conhecimento da existência do projecto, como também se envolveu, através do Fundo de Promoção Desportiva, na angariação de fundos para que o sonho da construção desse Complexo Desportivo Municipal se tornasse uma realidade.

Aliás, o lançamento da primeira pedra para a edificação do referido Complexo Desportivo aconteceu em Janeiro do ano passado, tendo sido devidamente reportado pelos diversos órgãos de comunicação social. As obras chegaram mesmo a ter início, mas a verdade é que, contra todas as expectativas, assim que César de Carvalho tomou posse como edil mandou parar tudo, sem dar explicações a quem quer que fosse.

Na altura, munícipes de Tete não perceberam lá muito bem o que se estaria a passar, porém, hoje, volvido um ano, tudo parece fazer sentido: as intenções obscuras do edil passavam por abocanhar o espaço, ficar com parte dele, e atribuir a outra parte ao seu camarada Fernando Bemane – o qual, por sinal, já iniciou com as suas próprias obras.

 

Ao que tudo indica trata-se de (mais um) “pagamento de favores”, pelo facto de Bemane, no cargo que ocupa a nível do partido, ter sido a pedra angular para que De Carvalho voltasse a merecer a confiança dos camaradas, a ponto de voltar a ser eleito, depois de um interregno de um mandato, e uma série de tentativas frustradas de voltar à ribalta política.

Em boa verdade, César de Carvalho é sobejamente conhecido como “o homem dos envelopes”, ou seja, alguém que não olha a meios para atingir os seus fins, quando se trata de ascender a cargos públicos/políticos.

 

Ele possui um longo historial que aponta para esse sentido, sendo que nos dois (primeiros) mandatos em que esteve à frente da autarquia (2003/13), foi acusado de um sem fim de falcatruas, esbanjamento do erário público e toda a gama de más práticas, que acabaram chamuscando não só a sua imagem, mas sobretudo a da Frelimo.


Um “currículo” nada abonatório

 

Segundo se sabe, ao longo dos 10 anos em que foi Presidente do Conselho Autárquico de Tete, César de Carvalho fez sempre de saco azul os cofres da edilidade, comprando simpatias dentro do partido Frelimo e dos munícipes, com recurso ao erário público.

 

Como corolário do seu percurso sinuoso em dez anos da chancelaria no Município, De Carvalho acabou, entre outras coisas, enfrentando algumas vezes a barra dos tribunais, sendo que a mais mediática aconteceu quando o Gabinete Central de Combate à Corrupção, através do processo 12/GCCC/2013, o acusou dos crimes de “abuso de cargo e de falsas declarações”, por se ter (auto) atribuído dois terrenos, através de despachos por si assinados, além de ter usado os seus subordinados Arnaldo Morais Charimba, Luísa Gandar e Isaías Sardinha, então vereadores, para despachar a seu favor um total de 12 talhões, localizados nos bairros Samora Machel, Chingodzi, Matundo, Francisco Manyanga e Josina Machel.

 

Na mesma acusação, o Ministério Público, referia: «por exemplo, no dia 27 de Janeiro de 2007, o arguido César de Carvalho requereu a si próprio uma ocupação de terra e, no dia seguinte, a 28 de Janeiro, ele próprio deferiu o seu pedido, atribuindo-se DUAT sobre uma área de 5280m², no bairro Chingodzi, para fins de habitação».

 

O processo em questão nunca conheceu grandes avanços: o Tribunal Judicial da Cidade de Tete julgou o caso e César de Carvalho foi absolvido. Aliás, para a opinião pública, o mesmo serviu apenas de “ameaça” para o impedir de avançar como independente, caso fosse chumbada a sua candidatura nas eleições internas do partido – o que viria de facto a acontecer.

 

Outro caso que também se tornou célebre foi o da disputa de terras envolvendo a família William Nabat, sendo que César de Carvalho foi acusado de tentar usurpar um espaço localizado no bairro Josina Machel, onde a referida família vivia havia mais de 60 anos.

E o rol de “makas” envolvendo César de Carvalho prossegue: algum tempo depois de ter deixado a presidência da edilidade, 325 funcionários municipais foram expulsos, sob a acusação de que estavam a trabalhar ilegalmente no Município de Tete.
Ou seja, no acto da contratação dos visados, não foram obedecidos os requisitos e métodos preconizados para o ingresso na Função Pública – o Município fechou os olhos à lei e avançou com a contratação desses cidadãos.

 

E afinal veio a constatar-se que a maioria desses funcionários eram nada mais e nada menos que membros do partido Frelimo, que obtiveram o emprego como “gratificação” pelo seu empenho e activismo político durante a campanha eleitoral para as eleições autárquicas que culminaram com a vitória da Frelimo e do seu candidato… César de Carvalho!

 

Os revezes…

 

Depois de tanta “poeira”, durante os primeiros 10 anos em que esteve à frente do Município de Tete, é óbvio que De Carvalho não granjeou grandes simpatias mesmo a nível do seu próprio partido.
Ainda assim, o “mayor” tentou encetar algumas tentativas (inglórias) de se manter na ribalta.

Em 2013, com o seu segundo mandato prestes a atingir o epílogo, César de Carvalho ainda tentou estabelecer-se no cargo, através da distribuição de favores aos bairros e a figuras influentes da Frelimo. Essa foi a forma que encontrou para se recompor nas eleições internas, porém, a Comissão Política do seu partido excluiu-o da lista de pré-candidatos, impedindo-o assim de chegar a votos.

 

No ano seguinte, para as eleições legislativas, César de Carvalho voltou a tentar uma nova “chance” de voltar à vida política: falhou redondamente ao posicionar-se no 13.º lugar na lista do seu partido que, entretanto, conseguiu eleger apenas 11 Deputados.

 

Mas mesmo assim – e como quem corre por gosto não cansa – não se coibiu de voltar à carga, em 2015: depois do então Primeiro Secretário Provincial da Frelimo, Xavier Sacambwera, ter sido nomeado Director Nacional de Florestas, César de Carvalho candidatou-se à sua substituição.
Debalde: a mesma Comissão Política que o havia excluído “na secretaria”, aquando das internas para o cargo de edil, voltou a preteri-lo, em favor de Fernando Bemane de Sousa – o mesmo que, curiosamente, agora se tornou no seu “amigo do peito” nesta questão do espaço municipal usurpado.

… E as “voltas por cima”

 

Não obstante os supramencionados revezes, e mesmo com toda a contestação interna de círculos críticos e da opinião pública tetense, De Carvalho conseguiu sempre eleger-se a membro de todos os órgãos da Frelimo: membro do Comité da Frelimo na Cidade, membro do Comité Provincial da Frelimo e membro do Comité Central da Frelimo.

 

Em 2016, contra todas as expectativas, foi indicado para o cargo de Director Regional Centro do Fundo de Investimento e Património de Abastecimento de Água (FIPAG), com sede na Beira, num “acto promocional” tido (na altura) como visando afastá-lo dos circuitos internos de poderes dentro da Frelimo, a nível da Província de Tete.
Tal nomeação não deixou de ser sobejamente contestada, não só a nível interno (do seu próprio partido), mas sobretudo por quadros do FIPAG, os quais consideravam que a empresa tinha gente com competência técnica mais do que suficiente para poder dirigir a região centro do FIPAG, não havendo, vai daí, necessidade de se recorrer a um “político com percurso duvidoso”.

Mal sabiam os contestatários que César de Carvalho voltaria “com tudo”, dois anos depois, ao candidatar-se e ser novamente eleito edil de Tete, para um terceiro mandato.

 

Mandato que, até agora, parecia estar a decorrer na “santa paz do Senhor”, até emergirem as informações supracitadas, dando conta de que abocanhou um terreno predestinado à construção do Complexo Desportivo Municipal, retalhou-o, ficou com uma parte, e “agraciou” ao Primeiro Secretário Provincial da Frelimo com a outra… (Carta)

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