Entre os dias 04 e 05 de Outubro de 2017, o distrito de Mocímboa da Praia, na província de Cabo Delgado, vivenciava um ataque por homens desconhecidos que, durante meses, as autoridades governamentais procuraram banalizar. O facto é que, dias depois, os distritos da zona norte e centro da província começaram a acompanhar episódios de decapitações, saque de bens, sequestros de crianças e mulheres, incêndio de palhotas e destruição de propriedades diversas.
De Outubro de 2017 a esta parte, passam dois anos e seis meses, que as autoridades governamentais não dão uma explicação do que está a acontecer em Cabo Delgado. E, enquanto o Governo vai-se mantendo no silêncio, o grupo vai demonstrando, cada vez mais, a sua musculatura, lançando ofensivas nas sedes distritais.
Nos últimos dias 06 e 07 de Abril, os homens “sem rosto” voltaram a ocupar os distritos de Mocímboa da Praia, Muidumbe (nas aldeias de Miangalewa, Namakande, Ntchinga e Muatide), Quissanga (em Bilibiza) e aos arredores de Mueda.
Conforme garantiram populares da aldeia de Ntchinga, no distrito de Muidumbe, próximo ao distrito de Mueda, os insurgentes, como são tratados, orientaram uma reunião com a população local, na qual dirigiram-se a esta na língua local kimuani (com um sotaque de Mocímboa da Praia) e que ficou registada através de um vídeo de 2 minutos e 50 segundos que, posteriormente, foi posto a circular nas redes sociais.
“Carta” traduziu o que o suposto porta-voz dos “homens sem rosto” diz: “Nós ocupamos para mostrar que o governo do dia é injusto. Humilha os pobres e dá vantagem aos chefes. Quem fica detido são os da classe baixa, então isso não é justiça. As pessoas queiram ou não, estamos a defender o Islão. Pretendemos um governo islâmico, não governo de descrentes. Nós somos filhos daqui e essas caras não são novas. Nós, lá no mato, somos tantos. Nós queremos tirar os militares, para nós eles são porcos. Eles e vocês se juntavam, desejando que nós fôssemos mortos, pois não! Allahu Akbar (Deus é grande)”.
Acrescentando, o indivíduo diz: “este governo islâmico é de paz. O governo que vocês têm não é justo, são coisas de pessoas e não estão no Alcorão. Estamos a sair aqui na aldeia, não destruímos nada. Se tem algo destruído não é da nossa conta. É do vosso governo injusto. Nós temos tido todas as informações e os planos que os militares, os porcos, preparam contra nós”.
De acordo com relatos populares colhidos pela nossa reportagem, no Posto Administrativo de Miangalewa, “os homens sem rosto” ficaram durante todo o dia de ontem, 07 de Abril, uma vez que os agentes das Forças de Defesa e Segurança (FDS), alegadamente, colocaram-se em fuga. Conforme contam as fontes, pouco mais de 300 militares retiraram-se do local, deixando a população à sua sorte e os invasores, sem respostas, iam cantando em língua local: “ninguém nos pode parar, ninguém nos vai derrotar”.
As fontes (civis) garantem que, durante os dois dias, os insurgentes não fizeram nenhum saque, porém, fontes militares afirmam que saquearam bens da população. Conforme contam, no confronto houve seis mortos e um motorista foi ferido. Na ocasião, foram queimados o estaleiro da empresa contratada para construir a ponte, o acampamento dos militares e o estaleiro da empresa de segurança Arkhê.
Já Bilibiza, no distrito de Quissanga, de acordo com fontes populares, foi ocupada na segunda-feira, 06, e na ocasião realizou-se uma reunião com a população, que foi informada para passar a seguir as práticas islâmicas e que as pessoas não podiam ter medo.
Nesta terça-feira, 07, foram levados 40 jovens para supostamente irem ao posto de Mahate levar arroz para a população se alimentar. Refira-se que, durante a reunião, os “homens sem rosto” disseram que “a luta deles era contra os militares e outras personalidades ligadas ao Estado”.
No ataque acima descrito foram queimados o hospital de Muatide, a Escola Secundária de Luanda e outras infra-estruturas públicas e privadas.
A situação de insegurança que se vive nos distritos de Mocímboa da Praia, Quissanga, Muidumbe, Palma, Nangade, Macomia, Meluco, Mueda e Ibo levantou rumores de um possível ataque na Cidade de Pemba, capital provincial de Cabo Delgado, levando as autoridades a decretarem um recolher obrigatório para todos e a patrulha passou a ser exercida a pente fino.
No entanto, Augusto Guta, porta-voz do Comando da Polícia da República de Moçambique, em Cabo Delgado, em entrevista concedida à Rádio Zumbo FM, na semana finda, desmentiu essas informações.
Guta disse: “nos dias que correm, circulam muitas informações que, de certa forma, fazem com que a ordem e segurança pública estejam ameaçadas e a população, acima de tudo, esteja com sentimento de insegurança à flor da pele”. Acrescentou: “a polícia, assim como as FDS, está a fazer um trabalho, de modo que o sentimento de insegurança não seja uma questão de facto na população”.
O porta-voz da PRM, em Cabo Delgado, disse que estão atentos a todas as informações que chegam e que o suposto ataque à Cidade de Pemba no dia 07 de Abril não passava de um boato porque as FDS estavam a fazer um trabalho com objectivo de garantir a segurança em todos os distritos da província.
Aliado a este suposto rumor no domingo, 05, dois homens supostamente pertencentes ao grupo dos malfeitores foram capturados quando, alegadamente, faziam reconhecimento na localidade de Nacuta, no distrito de Metuge, sita a 39 km da Cidade de Pemba onde foram espancados pela população, tendo um perdido a vida e outro encontra-se gravemente ferido. (Carta)