Durante a sessão das alegações finais, realizada nesta segunda-feira (19 de Agosto), o Ministério Público (MP), representado pelo Procurador João Nhane, pediu que os réus fossem condenados pelos crimes que lhes são imputados, como forma de motivar o trabalho da justiça. Segundo a acusação do MP, entre 2003 e 2012, Bernardo Xirinda contratou uma série de pessoas e serviços com objectivos de saquear o Estado.
O MP explicou que o ex-Embaixador Bernardo Xirinda contratou os serviços de um cozinheiro de nacionalidade russa, de nome Oslom Andenov, num contrato de três anos, com um salário estimado em 1.000 USD mensais. Entretanto, o mesmo trabalhou apenas por três meses, mas continuando a receber salário, que era pago directamente pelo Embaixador em numerário, alegadamente porque já eram muito próximos, devido à convivência que tinha com o respectivo colaborador e outros.
Situação similar aconteceu com uma intérprete de nacionalidade moçambicana de nome Aliria Malate, contratada nos mesmos termos de Andenov, com um salário estimado em 3.050 USD. Esta também viria a desvincular-se três meses depois, porém, continuando a auferir o salário, sendo que o valor, de acordo com o MP, seria encontrado numa conta do ex-Embaixador, sediada em Nova Iorque (Estados Unidos da América).
Outra situação apresentada pelo MP tem a ver com um filho de Bernardo Xirinda que, em 2011, passou a estudar na Universidade de Kingston, em Londres, na Inglaterra, com uma bolsa cedida pelo Governo moçambicano. Mas, estranhamente, Xirinda terá orientado o co-arguido e ex-Adido Financeiro Horácio Paulo Matola a transferir 7.600 USD para, alegadamente, pagar as propinas do filho. O valor também foi parar na conta particular do Ex-Embaixador Bernardo Xirinda, nos EUA.
De acordo com o MP, pesa ainda sobre Bernardo Xirinda e Horácio Matola o facto de, no exercício das suas funções, se terem beneficiado do valor da Embaixatriz, Sónia Keda, que tinha direito de receber um subsídio mensal. Sucede que, após a sua saída da Embaixada de regresso ao país, por razões que o MP não avançou, Bernardo Xirinda ordenou a Horácio Matola que parasse de canalizar o subsídio da esposa.
Entretanto, mesmo depois de ordenar o cancelamento, Xirinda beneficiou-se dos 16 mil USD da esposa, tendo esta, meses mais tarde, reclamado junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação (MINEC). O valor viria a ser reembolsado pelo Estado moçambicano.
Ainda segundo o Procurador João Nhane, o processo teve muitos momentos de pausa, devido às dificuldades apresentadas pelos visados e testemunhas com o objectivo de apagar algumas provas. Entretanto, estes não conseguiram lograr os seus intentos graças à deslocação do Inspector do MINEC, Francisco Neto, que permitiu apurar alguns aspectos, mesmo não tendo conseguido interagir com os visados, como é o caso do motorista de nacionalidade russa, Alexander Serguei.
Relativamente ao co-arguido Horácio Paulo Matola, o MP disse que este não respeitou os princípios recomendados aos funcionários do Aparelho do Estado, ao nunca ter recusado as orientações criminosas do seu superior hierárquico durante aquele período.
Contra argumentando, o advogado Mário Cumbane, em representação de Bernardo Xirinda, começou por criticar a decisão da 7ª secção do TJCM, de recusar o pedido para inclusão de testemunhas, residentes em Moscovo.
Para Cumbane, o funcionário da Embaixada Oslom Andenov encontrava-se de férias, razão pela qual não foi possível ouvi-lo na altura em que a Inspecção do MINEC se deslocou a Moscovo. Quanto aos valores arrolados, a defesa entende que não existem provas de que os mesmos tenham beneficiado Bernardo Xirinda, porque o co-arguido apresentava relatórios mensais, semestrais e anuais.
Cumbane explicou que a questão dos funcionários que, alegadamente, foram contratados para trabalhar três anos e três meses e que depois viriam a ser desvinculados, é uma situação por apurar, porque são duas versões, sendo uma do MINEC e outra do co-arguido, sendo que, segundo a Lei, em casos similares deve-se beneficiar o acusado.
O advogado ainda problematizou o depoimento do ex-Ministro do MINEC, Oldemiro Baloi, segundo o qual, o Tribunal Administrativo (TA) em 2009/10 deslocou-se para Moscovo, onde não achou nada. Cumbane disse que os funcionários tinham um subsídio diário de 380 USD de deslocação e é este valor que terá parado na conta do ex-Embaixador, nos EUA. Para a defesa, o que houve foram falhas administrativas e não criminais.
Mário Cumbane exigiu que o MP e o TJCM apresentassem provas concretas da acusação contra o seu cliente, caso contrário, ilibassem-no de todas as acusações que lhe são imputadas. A defesa disse ainda que a dívida da Embaixada, avaliada em 256 mil USD, deveu-se ao défice orçamental do MINEC, facto com que a Inspecção da instituição não concorda.
Já a defesa do co-arguido Horácio Paulo Matola, representada pelo advogado Alberto Sabão, disse que o MP não apresentou nenhuma acusação concreta contra o seu cliente. Para a defesa, não cabia a Matola recusar a ordem do seu superior porque isto tem outros contornos. Alberto Sabão disse que o valor de 161 mil USD para transporte não cabia ao Adido, mas sim ao MINEC porque este conhecia a situação da Embaixada.
Entretanto, o MP rebateu as posições dos advogados, segundo as quais não existem provas para condenar os seus clientes. De acordo com o MP, tudo o que os co-arguidos fizeram foi de forma intencional e deliberada porque não se entende como um Embaixador assina a folha salarial no lugar de cozinheiro, motorista, servente, entre outros e assim como pagava salários em numerários, enquanto existem mecanismos de pagamento, como transferências bancárias. Além disso, nunca houve nenhuma autorização sem provas documentais, conforme afirmou Leonardo Simão. Para o MP, os dois arguidos devem ser condenados a penas exemplares. (Omardine Omar)