Cinco dias depois da validação e proclamação dos resultados das VI Eleições Autárquicas, em 61 municípios, o Acórdão do Conselho Constitucional (CC), divulgado na última sexta-feira, continua a dividir opiniões, com a generalidade da comunidade jurídica moçambicana a defender que o mesmo representa um retrocesso na jurisprudência eleitoral.
Esta segunda-feira, o Consórcio Eleitoral “Mais Integridade”, constituído por sete organizações da sociedade civil e que observou o processo em todas as autarquias do país, defende que o órgão liderado por Lúcia Ribeiro perdeu a oportunidade de enviar uma mensagem clara de que “não pactua e nem tolera” a fraude, caracterizada por “enchimentos de urnas, uso do voto especial para efectuar votos múltiplos, discrepâncias entre os resultados da contagem e os dados dos editais das mesas, desconformidade entre cópias dos editais originais distribuídos nas mesas das assembleias de voto e editais usados no apuramento intermédio em várias comissões distritais ou de cidade e a obstrução à observação eleitoral independente e à fiscalização pelos delegados de candidaturas”.
Segundo o “Mais Integridade”, que realizou uma contagem paralela que deu vitória à Renamo em quatro municípios, incluindo nas cidades de Maputo e Matola, o Conselho Constitucional não foi preciso sobre a matemática que usou para fazer com que certos municípios passassem à gestão da oposição e outros, igualmente contestados, se mantivessem com o partido no poder.
“Para o Consórcio Eleitoral Mais Integridade, o facto de os Acórdãos do Conselho Constitucional serem irrecorríveis não os torna infalíveis e, mais ainda, exige, exactamente, a necessidade de terem uma maior fundamentação”, defende aquela plataforma de observação eleitoral, para quem um dos aspectos mais críticos na decisão deste ano é o facto de o Conselho Constitucional ter alterado resultados eleitorais sem explicar como é que chegou às alterações, particularmente se resultaram ou não de investigação própria.
“E foram vários tipos de alterações, que carecem de explicação: entre eles, votos retirados à Frelimo e entregues à Renamo e que influenciaram o aumento de mandatos da Renamo; e votos retirados à Frelimo e entregues à Renamo, ao ponto de este partido da oposição vencer as eleições em alguns Municípios”, detalha a fonte, questionando que editais e actas foram usados: do apuramento parcial, do apuramento intermédio, do apuramento geral ou as cópias entregues pelos partidos da oposição.
O Consórcio Eleitoral Mais Integridade considera que o Conselho Constitucional escusou-se a assegurar que a sua decisão “se traduzisse na materialização do Estado de Direito Democrático e na realização da Paz Social”, conforme a exortação feita pelo Consórcio no dia 1 de Novembro corrente.
“Questiona-se, por exemplo, porque o Conselho Constitucional mandou repetir a votação no Município de Marromeu e não na cidade de Maputo e Matola, onde também foram reportadas graves irregularidades susceptíveis de influenciar o resultado eleitoral. Isto representa um retrocesso na jurisprudência do próprio Conselho Constitucional. Quando, em 2018, anulou os resultados de algumas mesas, em Marromeu, o Conselho Constitucional investigou os casos e chegou à conclusão de que tinha havido irregularidades, que foram bem explicadas no respectivo acórdão”, sublinha a fonte.
Por essa razão, o Consórcio entende que a principal função do Conselho Constitucional devia ser de assegurar que “as eleições no país não continuem a decorrer em clima de desconfiança e crispação, com incertezas derivadas da ausência da verdade eleitoral em virtude da actuação dos órgãos eleitorais, já de si descredibilizadas”, ainda que as suas decisões pudessem ferir certos interesses partidários, particularmente nas cidades de Maputo e Matola.
“Ao mudar resultados em certas autarquias e mandar repetir em outras, o Acórdão deste órgão veio provar que os órgãos eleitorais, nomeadamente a CNE e o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE), que chancelaram os resultados nas 65 autarquias, não estiveram ao serviço da verdade e da justiça eleitoral”, sublinha.
Refira-se que o Consórcio Eleitoral “Mais Integridade” submeteu, ao Conselho Constitucional, resultados da sua contagem paralela, porém, os dados não foram usados. Da sua contagem, para além das cidades de Maputo e Matola, a Renamo havia ganho o escrutínio nas autarquias de Chiúre e Quelimane, estas últimas entregues à “perdiz” pelo Conselho Constitucional. (Carta)